EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 123.031/2013
Ementa:
1) Ação direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade de cargos de provimento em comissão criados pela Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara Municipal de Carapicuíba.
2)
Cargos
de provimento em comissão que não retratam atribuições de assessoramento,
chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e
profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos
de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança.
Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art.
144).
3) Cargos em excessiva quantidade, e em número consideravelmente superior aos cargos de provimento efetivo. Excepcionalidade, no vigente ordenamento constitucional, dos cargos de provimento em comissão. Violação do princípio da razoabilidade (art. 111 da Constituição Paulista).
O
PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO,
no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar
Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no
art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda
no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de
São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº
123.031/2013, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de
Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE em face das
expressões: “Assessor Parlamentar” e “Auxiliar
Parlamentar”, constantes do art. 6º, § 1º
e Anexo II da Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara Municipal de
Carapicuíba, pelos fundamentos expostos a seguir:
1. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
O protocolado que instrui esta inicial de ação direta
de inconstitucionalidade foi instaurado a partir de representação encaminhada
pela Promotora de Justiça de Carapicuíba (fls. 02/06).
O art. 6º, § 1º, da Resolução nº 79, de 28 de maio de
2013, da Câmara Municipal de Carapicuíba, dispõe o seguinte (fl. 11):
“Capítulo III
Dos Cargos de Provimento em Comissão
Art. 6º - Os ocupantes dos cargos de provimento em comissão são de livre nomeação e exoneração feita pelo Presidente da Câmara.
§ 1º - Para o provimento dos cargos em comissão denominados “Assessor Parlamentar”, “Auxiliar Parlamentar”, “Chefe de Gabinete” e “Diretor Parlamentar” procederá, obrigatoriamente, a indicação de cada Vereador.
§ 2º - O cargo de “Auxiliar Parlamentar” será extinto em 31/12/2016.”
O Anexo II da Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013,
da Câmara Municipal de Carapicuíba, que estabelece o quadro dos cargos
comissionados prevê o seguinte (fl. 17):
ANEXO
II
QUADRO DOS CARGOS COMISSIONADOS
DENOMINAÇÃO |
CARGA HORÁRIA
MENSAL |
QUANT. |
REQUISITO DO CARGO |
Assessor de Comunicação |
40 horas semanais |
02 |
Ensino
Superior Completo em Jornalismo |
Assessor Parlamentar |
40 horas semanais |
68 |
Ensino
Médio Completo ou Cursando |
Auxiliar Parlamentar |
40 horas semanais |
17 |
Ensino
Médio Completo ou Cursando |
Chefe de Departamento |
40 horas semanais |
03 |
Ensino
Médio Completo ou formação na área específica, quando necessária |
Chefe de Divisão |
40 horas semanais |
08 |
Ensino
Médio Completo ou formação na área específica, quando necessária |
Chefe de Gabinete |
40 horas semanais |
17 |
Ensino
Médio Completo |
Diretor Geral |
40 horas semanais |
01 |
Ensino
Médio Completo |
Diretor Parlamentar |
40 horas semanais |
17 |
Ensino
Médio Completo |
O ato normativo transcrito, na parte em que criou os
cargos de provimento em comissão de Assessor Parlamentar e Auxiliar Parlamentar
é inconstitucional por violação dos arts. 111, 115, incisos I, II e V, e 144 da
Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.
2.
DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS EM
COMISSÃO
A resolução
nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara Municipal de Carapicuíba, traz a
seguinte descrição das atribuições dos cargos de Assessor Parlamentar e
Auxiliar Parlamentar (fls. 20/21):
“ANEXO VI
DESCRIÇÃO DOS CARGOS COMISSIONADOS
- Assessor de Comunicação: (...)
- Assessor Parlamentar: Responsável pelo assessoramento técnico nas matérias de interesse do Vereador em relação ao trâmite de assuntos administrativos e legislativos; coordena serviços básicos do gabinete, como serviços de correio, atendimento telefônico, atendimento ao público, serviços de mensageiro, etc.
- Auxiliar Parlamentar: Auxilia o vereador nas matérias legislativas de seu interesse, podendo elaborar minutas e assessorar o parlamentar em reuniões.
- Chefe de Departamento: (...)
- Chefe de Divisão: (...)
- Chefe de Gabinete: (...)
- Diretor Geral: (...)
- Diretor Parlamentar: (...)”
3. DA NATUREZA TÉCNICA OU BUROCRÁTICA
DAS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELOS OCUPANTES DOS CARGOS COMISSIONADOS
Os cargos de provimento em comissão de Assessor Parlamentar
e Auxiliar Parlamentar têm natureza meramente técnica, burocrática, operacional
e profissional.
As atribuições previstas para os
referidos cargos, relacionadas a suporte técnico, supervisão, gerenciamento,
coordenação, orientação, fiscalização, interlocução, controle, acompanhamentos
e informações são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou a
dar suporte a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas,
administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior em
que se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do
governo.
O Assessor Parlamentar desempenha atividades técnicas
burocráticas relacionadas ao assessoramento técnico nas matérias de interesse
do Vereador, coordenando serviços básicos do gabinete, como a própria Resolução
diz, serviços de correio, atendimento telefônico, atendimento ao público,
serviços de mensageiro, etc.
Já o Auxiliar Parlamentar desempenha atividade
meramente burocrática relativa ao auxílio do Vereador nas matérias legislativas
de seu interesse, podendo elaborar minutas e assessorar o parlamentar em
reuniões.
Verifica-se, portanto, que as atribuições
previstas para os cargos mencionados, relacionadas a suporte técnico,
coordenação, supervisão, gerenciamento, coordenação, fiscalização, controle,
são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou dar suporte a
decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas,
administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior onde
se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do
governo.
Embora na descrição das atribuições dos
cargos mencionados haja referência genérica a atividade de programar,
coordenar, chefiar, supervisionar, dirigir, organizar a análise das
características de cada unidade indica que são destinadas a atender
necessidades executórias ou a dar suporte subalterno a decisões e execução.
Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas,
distantes dos encargos de chefia, direção, assessoramento e comando superior em
que se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do
governo.
Além destes aspectos indicativos de que
os cargos impugnados desempenham funções subalternas, de
pouca complexidade, exigindo-se tão somente o dever comum de lealdade às
instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor, a descrição
genérica de suas atribuições evidenciam a
natureza puramente profissional, técnica, burocrática ou operacional, fora
dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior.
Dessa forma, os cargos comissionados anteriormente
destacados são incompatíveis com a ordem constitucional vigente, em especial com o art. 111, 115, incisos I, II e V, e
art. 144, da Constituição do Estado de São Paulo.
Essa incompatibilidade decorre da inadequação ao
perfil e limites impostos pela Constituição quanto ao provimento no serviço
público sem concurso.
Embora o Município seja dotado de autonomia política
e administrativa, dentro do sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da
Constituição Federal), esta autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita
ao âmbito pré-fixado pela Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13.
ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 459).
A autonomia municipal deve ser exercida com a
observância dos princípios contidos na Constituição Federal e na Constituição
Estadual (cf. Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de direito constitucional, 9ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 2005, p. 285).
No exercício de sua autonomia administrativa, o
Município cria cargos, empregos e funções, mediante atos normativos,
instituindo carreiras, vencimentos, entre outras questões, bem como se
estruturando adequadamente.
Todavia, a possibilidade de que o Município organize
seus próprios serviços encontra balizamento na própria ordem constitucional,
sendo necessário que o faça através de lei, respeitando normas constitucionais
federais e estaduais relativas ao regime jurídico do serviço público.
A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve
ser o preenchimento dos postos através de concurso público de provas ou de
provas e títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral (prevista
inclusive no art. 37, I, da Constituição Federal; bem como no art. 115, I, da
Constituição do Estado de São Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento
dos cargos e cargos de natureza técnica ou burocrática.
A criação de cargos de provimento em comissão, de
livre nomeação e exoneração, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o
governante e o servidor, para que adequadamente sejam desempenhadas funções
inerentes à atividade predominantemente política.
Há implícitos limites à sua criação, visto que, assim
não fosse, estaria na prática aniquilada a exigência constitucional de concurso
para acesso ao serviço público.
A propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em
precedente do E. Supremo Tribunal Federal, que “a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes
com as praxes do nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser
encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional do concurso
(STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito
administrativo brasileiro, 33. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).
Podem ser de livre nomeação e exoneração apenas
aqueles cargos que, pela própria natureza das atividades desempenhadas, exijam
excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com
relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem
além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e
qualquer servidor.
É esse o fundamento da argumentação no sentido de que
“os cargos em comissão são próprios para
a direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente
que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua
orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Por essas
razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade
nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais
cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o
nomeado deixa de gozar de sua confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, 3ª ed., São
Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).
Daí a afirmação de que “é inconstitucional a lei que criar cargo em comissão para o exercício
de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente
profissional, fora dos níveis de direção,
chefia e assessoramento superior” (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores
públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).
São a natureza do cargo e as funções a ele cometidas
pela lei que estabelecem o imprescindível “vínculo
de confiança” (cf. Alexandre de Moraes, Direito
constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que
justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam
ser destinados “apenas às atribuições de
direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317).
Essa
também é a posição do E. Supremo Tribunal Federal (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT
VOL-01765-01 PP-00169).
Não
é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza o
provimento em comissão, a atribuição do cargo deve reclamar especial relação de
confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das
diretrizes políticas do governo.
Pela
análise da natureza e das atribuições dos cargos impugnados não se identificam
os elementos que justificam o provimento em comissão.
Escrevendo na vigência da ordem constitucional
anterior, mas em lição plenamente aplicável ao caso em exame, anotava Márcio
Cammarosano a existência de limites à criação de postos comissionados pelo
legislador. A Constituição objetiva, com a permissão para tal criação, “propiciar ao Chefe de Governo o seu real
controle mediante o concurso, para o exercício de certas funções, de pessoas de
sua absoluta confiança, afinadas com as diretrizes políticas que devem pautar a
atividade governamental. Não é, portanto, qualquer plexo unitário de
competências que reclama seja confiado o seu exercício a esta ou aquela pessoa,
a dedo escolhida, merecedora da absoluta confiança da autoridade superior, mas
apenas aquelas que, dada a natureza das atribuições a serem exercidas pelos
seus titulares, justificam exigir-se deles não apenas o dever elementar de
lealdade às instituições constitucionais e administrativas a que servirem,
comum a todos os funcionários, como também um comprometimento político, uma
fidelidade às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, uma lealdade
pessoal à autoridade superior (...). Admite-se que a lei declare de livre
provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria superior,
mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre provimento e
exoneração cargos como os de auxiliar administrativo, fiscal de obras,
enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador, e outros mais, de cujos
titulares nada mais se pode exigir senão o escorreito exercício de suas
atribuições, em caráter estritamente profissional, técnico, livres de quaisquer
preocupações e considerações de outra natureza” (Provimento de cargos públicos no direito brasileiro, São Paulo, RT,
1984, p. 95/96).
No caso em exame, evidencia-se claramente que os cargos de provimento em comissão, antes
referidos, destinam-se ao desempenho de atividades meramente burocráticas ou técnicas, que não exigem, para seu
adequado desempenho, relação de especial confiança.
É necessário ressaltar que a posição aqui sustentada
encontra esteio em julgados desse E. Tribunal de Justiça (ADI 111.387-0/0-00,
j. em 11.05.2005, rel. des. Munhoz Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de
janeiro de 2005, rel. des. Barbosa Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30
de janeiro de 2008, rel. des. Elliot Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des.
Armando Toledo, j. 16.07.2008, v.u.).
4.
NÍVEL DE ESCOLARIDADE EXIGIDO PARA OS
CARGOS EM COMISSÃO
Verifica-se que para os
cargos em comissão de Assessor Parlamentar e Auxiliar Parlamentar, o nível de
escolaridade exigido – “ensino médio completo ou cursando” – não reflete a
imprescindibilidade do elemento fiduciário em concurso às atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior.
A exigência apenas de
“ensino médio completo ou cursando”, reforça a natureza de unidades executórias
de pouca complexidade, de nível subalterno, sem poder de mando e comando à
justificar o provimento em comissão.
De outro lado, não há,
evidentemente, nenhum componente nos postos previstos na lei local que lhes
imponha atribuição de formulação, direção e execução das diretrizes políticas superiores
do governante a ser desempenhado por alguém que detenha absoluta fidelidade a
orientações traçadas, sendo, por isso, ofensivas aos princípios de moralidade,
eficiência e impessoalidade (art. 111, Constituição Estadual) que orientam os
incisos II e V do art. 115 da Constituição Estadual.
A propósito do nível de
escolaridade compatível com cargos de provimento em comissão, destacam-se os
seguintes julgados desse Colendo Órgão Especial:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -Legislações do Município que Alvares Machado que estabelece a organização administrativa, cria, extingue empregos públicos e dá outras providências - Funções descritas que não exigem nível superior para seus ocupantes - Cargo de confiança e de comissão que possuem aspectos conceituais diversos – Afronta aos artigos 111, 115, incisos II e V, e 144 da Constituição Estadual — Ação procedente. (TJSP, ADIn 0107464-69.2012.8.26.0000, Rel. Des. Antonio Carlos Malheiros, v.u., j. 12 de dezembro de 2.012)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITÜCIONALIDADE - Legislações do Município que Tietê, que dispõe sobre a criação de cargos de provimento em comissão - Funções que não exigem nível superior para seus ocupantes — Cargo de confiança e de comissão que possuem aspectos conceituais diversos — Inexigibilidade de curso superior aos ocupantes dos cargos, que afasta a complexidade das funções - - Afronta aos artigos 111, 115, incisos II e V, e 144 da Constituição Estadual — Ação procedente.” (TJSP, ADIn 0130719-90.2011.8.26.000, Rel. Des. Antonio Carlos Malheiros, v.u., j. 17 de outubro de 2.012)
A escolaridade exigida
para os mencionados cargos afasta a complexidade da função, haja vista não
exigir os conhecimentos específicos que possuem as pessoas que ostentam nível
superior de ensino e estão em condições de exercer atribuições de chefia,
direção e assessoramento superior que justifica o provimento em comissão.
5. DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA
PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE
Pela análise da Resolução nº 79/2013 que “Dispõe sobre a organização administrativa,
o quadro geral de pessoal, o regime jurídico e vencimentos dos servidores da
Câmara Municipal de Carapicuíba e dá outras providências”, verifica-se os
cargos efetivos em número de 64 (sessenta e quatro) nos termos do Anexo IV, e os
cargos de provimento em comissão em número de 133 (cento de trinta e três) nos
termos do Anexo II, de modo que representam mais de 67% (sessenta e sete por
cento) do quadro de pessoal daquela casa legislativa (fls. 17/19 do Protocolado
nº 123.031/2013).
Essa situação revela, com clareza, a violação dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, previstos no art. 111 da
Constituição Paulista, que em sua perspectiva substancial exige
proporcionalidade e razoabilidade no que diz respeito às leis que delimitam
aquilo que conhecemos como Direito Material.
Como anota Diogo de Figueiredo Moreira Neto, o
princípio da razoabilidade “visa a
afastar o arbítrio que decorrerá da desadequação entre meios e fins”, tendo
importância tanto quando da criação da norma, como quando de sua aplicação”
(Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p.
101). Também nesse sentido Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito
administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 95).
Em sede doutrinária, Gilmar Ferreira Mendes,
examinando a aplicação do princípio da razoabilidade ou proporcionalidade pelo
Col. Supremo Tribunal Federal, anotou “de
maneira inequívoca a possibilidade de se declarar a inconstitucionalidade da lei
em caso de sua dispensabilidade (inexigibilidade), inadequação (falta de
utilidade para o fim perseguido) ou de ausência de razoabilidade em sentido
estrito (desproporção entre o objetivo perseguido e o ônus imposto ao
atingido)” (cf. A proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, publicado em Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade,
São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos
Editor, 1998, p. 83).
Para superar o denominado “teste de razoabilidade”, é
necessário que a lei preencha, em síntese, três requisitos: (a) necessidade;
(b) adequação; e (c) proporcionalidade em sentido estrito.
Em outras palavras, é imperativo que o diploma legal
se mostre efetivamente indispensável (necessidade), que se apresente apropriado
aos fins a que se destina (adequação), e, por último, que os sacrifícios ou
encargos dele decorrentes sejam aceitáveis do ponto de vista dos benefícios que
produzirá (proporcionalidade em sentido estrito).
O exacerbado número de cargos de provimento em
comissão, no caso em exame, não passa pelo “teste de razoabilidade”, pois o
excesso de cargos de Assessor Parlamentar (sessenta e oito), Auxiliar
Parlamentar (dezessete), e Diretor Parlamentar (dezessete), se mostra
desnecessário, inadequado e desproporcional.
O provimento de cargos sem concurso só é necessário em
pequena medida (excepcionalidade), e isso é indispensável à sua adequação e
para que o ônus que recai sobre o erário, nesse quadro, se mostre aceitável
(proporcionalidade).
Note-se que o Col. Supremo Tribunal Federal já
afirmou, em mais de uma oportunidade, que deve haver certa correlação entre o
número de cargos de provimento efetivo e o número de cargos de provimento em
comissão, para que estes não se relevem inconstitucionais.
E à falta de um parâmetro constitucional numérico
objetivo, mostra-se legítima a conclusão de que se os cargos de confiança têm
natureza excepcional, seu número não pode jamais superar o número de cargos de
provimento efetivo.
Nesse sentido:
“(...)
Cabe ao Poder Judiciário verificar a regularidade dos atos normativos e de administração do poder público em relação às causas, aos motivos e à finalidade que os ensejam. Pelo princípio da proporcionalidade, há que ser guardada correlação entre o número de cargos efetivos e em comissão, de maneira que exista estrutura para atuação do Poder Legislativo local. (RE 365.368-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 22-5-2007, Primeira Turma, DJ de 29-6-2007.) No mesmo sentido: ADI 4.125, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 10-6-2010, Plenário, DJE de 15-2-2011.
(...)”
No caso em exame, o número previsto, atualmente, de
cargos de provimento em comissão é de 133 (cento e trinta e três), como é
possível extrair do Anexo II da Resolução nº 79/2013 (fls. 17), e de cargos
efetivos é de 64 (sessenta e quatro) de acordo com o Anexo IV da Resolução nº
79/2013 (fls. 18/19), totalizando o quadro de pessoal em 197 (cento e noventa e
sete), o que representa, como já dito, que mais de 67% (sessenta e sete por
cento) são comissionados.
Contraria o princípio da razoabilidade (quando menos
do ponto de vista da proporcionalidade em sentido estrito) que a exceção tenha
se tornado a regra.
Em outras palavras, o número de cargos de provimento
em comissão não pode ser maior que o número de cargos de provimento efetivo,
sob pena de violação do art. 111 da Constituição Paulista.
6. DOS PEDIDOS
a)
Do Pedido Liminar
À
saciedade demonstrado o fumus boni iuris,
pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do
Município de Carapicuíba apontados como violadores de princípios e regras da
Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento
desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a
consequente oneração financeira do erário.
Está claramente
demonstrado que os cargos de provimento em comissão de Assessor Parlamentar e
Auxiliar Parlamentar não retratam atribuições de assessoramento, chefia e
direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a
serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento
efetivo.
O perigo da demora
decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e
da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação.
Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres
públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.
Basta
lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para
ocuparem tais cargos, certamente, não serão revertidos ao erário, pela
argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da
prestação e da efetiva prestação dos serviços.
A
ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a
apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de
inconstitucionalidade.
Note-se
que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível
restabelecer o status quo ante.
Assim,
a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de
maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.
De
resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao
menos, a excepcional conveniência da medida.
Com
efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares
para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante,
que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados
à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADI-MC 125, j.
15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADI-MC 568, RTJ
138/64; ADI-MC 493, RTJ 142/52; ADI-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).
À luz deste perfil, requer-se a concessão de liminar
para a suspensão parcial, até o final e definitivo julgamento desta ação, das
expressões “Assessor Parlamentar”
e “Auxiliar Parlamentar”, constantes do
art. 6º, § 1º e Anexo II da Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara
Municipal de Carapicuíba.
b)
Do Pedido Principal
Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e
processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada
procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade das
expressões “Assessor Parlamentar”
e “Auxiliar Parlamentar”, constantes do
art. 6º, § 1º e Anexo II da Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara
Municipal de Carapicuíba.
Requer-se ainda que sejam requisitadas informações ao
Presidente da Câmara Municipal de Carapicuíba, bem como posteriormente citado o
Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
Termos em que, aguarda-se deferimento.
São Paulo, 22 de julho de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
aca/dcm
Protocolado nº 123.031/2013
Assunto: inconstitucionalidade
da Resolução nº 79, de 28 de maio de 2013, da Câmara Municipal de Carapicuíba
1.
Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade,
em face das expressões “Assessor
Parlamentar” e “Auxiliar Parlamentar”, constantes do art. 6º, § 1º e Anexo II da Resolução nº
79, de 28 de maio de 2013, da Câmara Municipal de Carapicuíba, junto ao E.
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2.
Oficie-se ao interessado,
informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 22 de julho de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
aca/dcm