EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado nº 0042.940/2013

 

 

Ementa:

1)     Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 3º da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso, que aplica aos Procuradores Municipais, investidos no cargo público de Procuradores Gerais do Município, Coordenadores Jurídicos e Assessores Jurídicos como o limite para recebimento de valores mensais o subsídio mensal em espécie dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

2)     O teto remuneratório dos servidores municipais não pode exceder os subsídios do Prefeito Municipal. Violação do art. 115, XII e 144 da Constituição Estadual c.c. o art. 37, XI da Constituição Federal.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 0042.940/2013, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE  em face do art. 3º da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso, pelos seguintes fundamentos:

1.     ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade e, a cujas folhas reportar-se-á, foi instaurado a partir de representação do cidadão Jorge Luis da Rosa (fls. 03/04).

O art. 3º da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso, tem a seguinte redação:

“(...)

Art.3.º: Os valores a serem recebidos mensalmente, por cada advogado, não poderão ser superiores ao valor estipulado pelo artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal/88, aplicando-se como limite o subsidio mensal em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.”

A lei é verticalmente incompatível com nosso ordenamento constitucional, como será demonstrado a seguir.

2.     FUNDAMENTAÇÃO

O ato normativo ora impugnado viola o art. 115, II, da Constituição Estadual e o art. 37, XI, da Constituição Federal, aos quais está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão do art. 29 da Constituição Federal e do art. 144 da Carta e Paulista, que estabelecem o seguinte:

Constituição Federal

“(...)

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

(...)

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.”

Constituição Estadual

“Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

XII - em conformidade com o art. 37, XI, da Constituição Federal, a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

Verifica-se, portanto, que o art. 37, XI, da Constituição Federal (com a redação dada pela emenda constitucional nº 41/2003), estabeleceu o chamado teto, limite máximo para a remuneração e subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos, percebidos cumulativamente, ou não, e incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

Tal limite aplica-se à Administração direta, autárquica e fundacional e abrange os membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluindo os detentores de mandato eletivo e demais agentes políticos. Nos termos do § 11 do art. 37 da Constituição Federal (incluído pela Emenda Constitucional nº 47/2005), não se computam para efeito dos limites referidos as parcelas de caráter indenizatória previstas em lei, o que, de todo modo, já se podia deduzir da própria noção de subsídio.

De acordo com a referida norma constitucional, são previstos dois limites máximos a considerar na implementação do sistema remuneratório e de subsídios: o primeiro, já predeterminado pela Constituição, para cada poder; o segundo, a ser fixado por lei da União ou de cada unidade federada, contido, porém, pela observância do primeiro, mas ao qual poderá ser inferior, excetuadas apenas as hipóteses de teto diverso estabelecidas na própria Constituição da República.

Assim, na esfera municipal adota-se como teto remuneratório os subsídios do prefeito. Este limite máximo pode ser reduzido por lei municipal, mas jamais superado.

  Na linha deste princípio remuneratório, a Constituição Estadual estabeleceu como teto os subsídios do Governador do Estado (art. 115, XI). Não foi, porém, o que ocorreu no município em relação a servidores que desempenham atividade de advocacia pública.

O dispositivo legal impugnado possibilitou aos Procuradores Municipais receber valores mensais, incluindo aqueles decorrentes das verbas honorárias, até o limite do subsídio mensal em espécie dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Desta forma, estabeleceu teto superior ao limite constitucional, violando o princípio remuneratório previsto no art. 37, XI da Constituição Federal, de observância obrigatória pelos municípios nos termos do art. 29 da Constituição Federal e 144 da Constituição Estadual. 

Nos termos dos arts. 18, 29, caput, e 30, incisos I a VII, da Constituição Federal, e do art. 144 da Constituição do Estado de São Paulo, os municípios foram dotados de autonomia administrativa e normativa, podendo legislar sobre os assuntos que sejam de interesse local, inclusive sobre a organização do funcionalismo, o seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria, etc.

A autonomia administrativa e normativa não pode ser confundida com soberania, porquanto a própria Constituição – que é a fonte da qual promana todo o poder estatal - impõe limites à atuação dos municípios, ao exigir deles obediência aos princípios estabelecidos nela própria e na Constituição do respectivo Estado, conforme, aliás, reza o seu art. 29 da Constituição Federal e art. 144 da Constituição Estadual.

   A autonomia legislativa dos municípios fica assim compelida a atender os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na Constituição Estadual.

O art. 144 da Constituição Estadual é denominado “norma estadual de caráter remissivo, na medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia municipal, remete para as disposições constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello, 18-10-2010, DJe 26-10-2010).

Daí decorre a possibilidade de contraste da lei local com o art. 144 da Constituição Estadual, por sua remissão à Constituição Federal.

Nem se pode cogitar a exclusão das verbas honorárias da composição da remuneração dos servidores públicos que desempenham atividade de advocacia pública, haja vista a referência expressa do art. 37, XI, da Constituição Federal à remuneração de subsídios “percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal”.

Neste sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

 “Procuradores do Município de São Paulo: teto de remuneração: inclusão, no cálculo, das parcelas referentes a honorários de advogado, adicional de função, regime de dedicação exclusiva e gratificação de nível superior conferidos a todos os integrantes da categoria.” (AI 352.349-ED, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 28-10-2003, Primeira Turma, DJ de 21-11-2003.) No mesmo sentido: AI 500.054-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 15-12-2009, Primeira Turma, DJE de 5-2-2010.

   "Os honorários advocatícios não foram equiparados, para efeito da exclusão do teto previsto no art. 37, XI, da CF às vantagens pessoais. Entendimento do Plenário do STF (RE 220.397/SP), que persiste em face da EC 19/1998, tendo em vista o decidido na ADI 2.116-MC." (RE 225.263-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 26-3-2002, Primeira Turma, DJ de 26-4-2002.)

Do exposto, é necessário concluir a incompatibilidade do art. 3º, da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso, com os arts. 115, XII e 144, da Constituição Estadual c.c. o art. 37, XI, da Constituição Federal.

3.     DO Pedido liminar

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura do preceito normativo do Município de Valparaíso apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se dispêndio indevido de recursos públicos e a consequente oneração financeira do erário.

À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 3º, da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso.

4.     DO PEDIDO PRINCIPAL

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade do art. 3º, da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Valparaíso, bem como posteriormente citado o Procurador Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

 

São Paulo, 27 de maio de 2013.

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

 

 

aca


Protocolado nº 0042.940/2013

Assunto: Inconstitucionalidade do art. 3º da Lei 2.141, de 07 de dezembro de 2.011, do Município de Valparaíso

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.

2.     Comunique-se a propositura da ação ao interessado.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 27 de maio de 2013.

 

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

 

 

aca