EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Protocolado nº 072.537/12

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 270, de 28 de outubro de 2011, do Município de Taboão da Serra.

 

 

 

Ementa:

 

Ação direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 270, de 28 de outubro de 2011, do Município de Taboão da Serra, que Altera a Lei Complementar nº 132/2006 que Institui o Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra.

Ausência de participação popular e de planejamento técnico na produção da lei que alterou o Plano Diretor Participativo do Município de Taboão da Serra. Inconstitucionalidade por violação dos arts. 180, I, II e V, 181 e 191, da Constituição Estadual.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV da Constituição Federal, e ainda art.  74, inciso VI e art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE da Lei Complementar nº 270, de 28 de outubro de 2011, do Município de Taboão da Serra, que Altera a Lei Complementar nº 132/2006 (Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra), pelos seguintes fundamentos:

 

1. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade e, a cujas folhas reportar-se-á, foi instaurado a partir de encaminhamento pelo Conselho Superior do Ministério Público de requerimento apresentado a Promotoria de Justiça de Taboão da Serra para instauração de inquérito civil (fls. 04/57).

A Lei Complementar nº 270, de 28 de outubro de 2011, do Município de Taboão da Serra, que alterou a Lei Complementar nº 132/2006 (Plano Diretor Participativo do Município de Taboão da Serra), tem a seguinte redação:

Art. 1º Ficam fazendo parte da Lei Complementar nº 132, de 26 de dezembro de 2006, os seguintes Quadros e Mapas:

I - Quadros:

a) Quadro 07 - Perímetros das Zonas Predominantemente Residenciais 1 - ZPR 1;

b) Quadro 15 - Perímetros das Zonas Industriais - ZI;

 II - Mapa 06 - Zoneamento.

 Art. 2º A área identificada como ZPA-20 na Lei Complementar nº 132/2006 que "Institui o Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra nos termos dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, Capítulo III da Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 - Estatuto da Cidade - e da Lei Orgânica do Município de Taboão da Serra" passa à condição de Zona Industrial, identificadas como ZI-16.

Art. 3º Fica inserida no Quadro 15 - Perímetros das Zonas Industriais - ZI, a Zona ZI-16 com as confrontações constantes da Zona ZPA-20 da legislação em vigor.

Art. 4º As áreas classificadas como ZPA-16 e ZPA-17 na Lei Complementar nº 132 de 26 de dezembro de 2006, com as alterações introduzidas pelas Leis Complementares nº 164 de 24 de abril de 2008 e 176 de 3 de fevereiro de 2009, que dispõem sobre o Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra passam para a condição de Zona Mista 1, recebendo a denominação de ZM 1-09 e ZM 1-10, respectivamente.

Art. 5º Ficam revogados os Quadros 07 e 15 e o Mapa 06 da Lei Complementar nº 132 de 26 de dezembro de 2006, alterada pelas Leis Complementares nº 164/2008 e 176/2009.

Art. 6º A área identificada como ZEIS 1-07, nas confrontações com a área identificada como ZPA-20, contidas na Lei 132/2011, que "Institui o Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra nos termos dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, Capítulo III da Lei 10.257, de 10 de julho de 2001 - Estatuto da Cidade - e a Lei Orgânica do Município de Taboão da Serra, passa à condição de área identificada como ZPR-3.

 Art. 7º Fica alterada a área em que consta como ZEIS2-07 passando a ser caracterizada como ZPR-3.

 Art. 8º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação

A redação final da referida Lei Complementar, cujo projeto foi apresentado pelo Executivo e que previa apenas dois artigos (os atuais artigos 1º e 5º), resultou de acréscimos dos demais dispositivos legais por força de emendas, com alteração significativa no zoneamento da cidade.

A participação popular, observada durante a fase de elaboração do Plano Diretor de Taboão da Serra (Lei Complementar nº 132/2006), não foi atendida em relação ao presente ato normativo que alterou a estrutura do zoneamento e do ordenamento da cidade.

O projeto de lei do executivo e as emendas aditivas apresentadas não foram fundados em estudo e planejamento técnico, e nem submetidas ao crivo do Conselho Municipal ou de qualquer outra forma de participação da comunidade.

O ato normativo impugnado padece de incompatibilidade vertical com a Constituição do Estado de São Paulo, como adiante será demonstrado.

 

2. DO PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

O processo legislativo do referido diploma legal contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, a qual está subordinada a produção normativa municipal por força do seguinte preceito, ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal:

“Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

A lei local impugnada contrasta os seguintes preceitos da Constituição Paulista:

         (...)

Art. 180. No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:

I - o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de seus habitantes;

II - a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, plano, programas e projetos que lhes sejam concernentes;

(...)

V - a observância das normas urbanísticas, de segurança, higiene e qualidade de vida;

(...)

Art. 181. Lei municipal estabelecerá em conformidade com as diretrizes do plano diretor, normas sobre zoneamento, loteamento, parcelamento, uso e ocupação do solo, índices urbanísticos, proteção ambiental e demais limitações administrativas pertinentes.

(...)

Art. 191. O Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico.”

 

3. DA Violação Ao princípio do planejamento

O ato normativo impugnado desrespeitou a necessidade de planejamento, princípio que deve ser observado na edição de leis relacionadas ao uso do solo.

Nos termos dos art.180, II e 181 § 1º da Constituição Estadual, pode-se extrair que planejamento é indispensável à validade e legitimidade constitucional da legislação relacionada o uso do solo.

Todo e qualquer regramento relativo ao uso e ocupação do solo seja ele geral ou individualizado (autorização para construção em determinado imóvel, alteração do uso do solo para determinada via, área ou bairro, etc.) deve levar em consideração a cidade em sua dimensão integral, dentro de um sistema de ordenamento urbanístico, razão pela qual a exigência de planejamento e estudos técnicos.

O art.182 caput da CF disciplina que “a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.

O inciso VIII do art.30 da Constituição Federal prevê ainda a competência dos Municípios para “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento, e da ocupação do solo urbano”.

Em decorrência dos dispositivos acima apontados pode-se concluir que: (a) a adequada política de ocupação e uso do solo é valor que conta com assento constitucional (federal e estadual); (b) a política de ocupação e uso adequado do solo se faz mediante planejamento e estabelecimento de diretrizes através de lei; (c) as diretrizes para o planejamento, ocupação e uso do solo devem constar do respectivo plano diretor, cuja elaboração depende de avaliação concreta das peculiaridades de cada Município; (d) a legislação específica sobre uso e ocupação do solo deve pautar-se por adequado planejamento e participação popular.

A norma urbanística é, por sua natureza uma disciplina, um modo, um método de transformação da realidade, de superposição daquilo que será a realidade do futuro àquilo que é a realidade atual.

Para que a norma urbanística tenha legitimidade e validade deve decorrer de um planejamento que é um processo técnico instrumentalizado para transformar a realidade existente no sentido de objetivos previamente estabelecidos. Não pode decorrer da simples vontade do administrador, mas de estudos técnicos que visem assegurar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (habitar, trabalhar, circular e recrear) e garantir o bem- estar de seus habitantes.

O planejamento não é mais um processo discricionário e dependente da mera vontade dos administradores. É uma previsão e exigência constitucional (Art.48, IV, 182 CF e art.180, II da CE). Tornou imposição jurídica, mediante a obrigação de elaborar planos, estudos quando se trate da elaboração normativa relativa ao estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano.

O planejamento urbanístico não é um simples fenômeno técnico, mas um verdadeiro processo de criação de normas jurídicas, que ocorre em duas fases: uma preparatória, que se manifesta em planos gerais normativos, e outra vinculante, que se realiza mediante planos de atuação concreta, de natureza executiva.

Discorrendo a respeito do tema Joseff Woff consigna que o plano urbanístico não constitui simples conjunto de relatórios, mapas e plantas técnicas, configurando um acontecer unicamente técnico. Compenetrando-se da realidade a ser transformada e das operações de transformação que consubstanciam o processo de planejamento, sob pena de ser mera abstração sem sentido, o plano urbanístico adquire, ele próprio, por contaminação necessariamente dialética, as características de um procedimento jurídico dinâmico, ao mesmo tempo normativo e ativo, no sentido de que os anteprojetos elaborados por técnicos e especialistas adquirem a categoria de diretrizes para a política do solo e sua edificação, ao mesmo temo que, em seus desdobramentos, se manifesta como conjunto de atos e fundamentos para a produção de atos de atuação urbanística concreta. (El Planeamiento Urbanístico del Território y lãs Normas que Garantizan su Efectividad, conforme a la Ley Federal de Ordenación Urbana, em La Ley Federal Alemana de Ordenación Urbanística y los Municípios, p. 28 ,  apud José Afonso da Silva, Direito Urbanístico Brasileiro,  2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 83).

A propósito do tema, José Afonso da Silva chega a observar que:

Muitos fatores contribuem para dificultar a implantação desse processo, tais como carência de meios técnicos de sustentação, de recursos financeiros e de recursos humanos, bem assim certo temor do Prefeito e da Câmara de que o processo de planejamento substitua sua capacidade de decisão política e de comando administrativo. (Direito Urbanístico Brasileiro, 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 83).

A ordenação do uso e ocupação do solo é um dos aspectos substanciais do planejamento urbanístico. Preconiza uma estrutura orgânica para a cidade, mediante aplicação de instrumentos legais como o do zoneamento e de outras restrições urbanísticas que, como manifestação concreta do planejamento urbanístico, tem por objetivo regular o uso da propriedade do solo e dos edifícios em áreas homogêneas no interesse do bem-estar da população, conformando-os ao princípio da função social.

Para que o zoneamento seja legítimo, há de ter objetivos públicos, voltados para a realização da qualidade de vida dos habitantes da cidade e de quem por ela circule.

O zoneamento, como atividade urbanística, busca a transformação e orientação da realidade das cidades, dando uma sistematização senão a ideal, pelo menos, a possível e mais adequada. Por esse motivo é que a delimitação das zonas, sua localização e área com definição dos usos e restrições urbanísticas, dependem de um estudo que deve levar em conta a situação existente e os objetivos do poder público com respeito às características a dar a cidade, segundo as possibilidades atuais e futuras do seu desenvolvimento, tal como precisa ser com qualquer tipo de planejamento.

Como instrumento legal urbanístico, o zoneamento deve ser estruturado, sistematizado para que possa proporcionar o adequado e sustentável crescimento da cidade tendo sempre em vista o bem-estar da comunidade.

A sistemática constitucional - relativa à necessidade de planejamento, diretrizes, e ordenação global da ocupação e uso do solo - evidencia que o casuísmo, nessa matéria, não é em hipótese alguma admissível.

O ato normativo que altera sensivelmente as condições, limites e possibilidades do uso do solo urbano sem realização de qualquer planejamento ou estudo específico, viola diretamente a sistemática constitucional na matéria.

Não se admite, nesse quadro, modificações individualizadas, pontuais, casuísticas e dissociadas da estrutura sistêmica da utilização de todo o solo urbano estampadas no mapa de zoneamento e nas demais normas da Lei Complementar impugnada. Caso contrário, tornaria inócuo e sem qualquer validade todo o planejamento e estudos realizados pelo Poder Executivo, por ocasião da propositura e aprovação da Lei Complementar objeto das alterações que instituiu o Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra.

José Afonso da Silva, ensina, quanto às hipóteses de alteração de zoneamento, que:

“(...) recomenda-se, nessas alterações, muito critério, a fim de que não se façam modificações bruscas entre o zoneamento existente e o que vai resultar da revisão. É preciso ter em mente que o zoneamento constitui condicionamento geral à propriedade, não indenizável, de tal maneira que uma simples liberação inconseqüente ou um agravamento menos pensado podem valorizar demasiadamente alguns imóveis, ao mesmo tempo que desvalorizam outros, sem propósito. É conveniente que o zoneamento resultante da revisão ou da alteração constitua uma progressão harmônica do zoneamento revisado ou alterado, para não causar impactos, que, por sua vez, geram resistências que dificultam sua implantação e execução. É prudente avançar devagar, mas com firmeza, energia e justiça” (Direito Urbanístico. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 251).

Acerca da importância do planejamento urbanístico que deve preceder a toda e qualquer legislação elaborada nesta matéria, discorre Toshio Mukai que:

“(...) a ocupação e o desenvolvimento dos espaços habitáveis, sejam eles no campo ou na cidade, não podem ocorrer de forma meramente acidental, sob as forças dos interesses privados e da coletividade. Ao contrário, são necessários profundos estudos acerca da natureza da ocupação, sua finalidade, avaliação da geografia local, da capacidade de comportar essa utilização sem danos para o meio ambiente, de forma a permitir boas condições de vida para as pessoas, permitindo o desenvolvimento econômico-social, harmonizando os interesses particulares e os da coletividade” (Temas atuais de direito urbanístico e ambiental. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 29).

No caso em tela, pela análise do processo legislativo da Lei Complementar Municipal nº 270/11, verifica-se que não foram providenciados estudos técnicos ou qualquer planejamento abalizado para as alterações decorrentes da proposta do Executivo e das emendas parlamentares.

As alterações foram propostas sem qualquer subsídio técnico que a justificassem, sem possibilidade de serem submetidas a debate público, sem planejamento ou critério para a preservação da estrutura orgânica do Plano Diretor.

As normas contidas na Lei Complementar impugnada trazem inegável e direta interferência no zoneamento e no planejamento urbano do município, comprometendo o crescimento organizado da cidade e a ocupação ordenada de seus espaços.

Deste modo, patente a inconstitucionalidade do ato normativo que, sem qualquer estudo prévio consistente, e de forma casuística e pontual, alterou o mapa de zoneamento urbano, ferindo frontalmente o disposto nos artigos 180, caput e inciso II, e 181, caput e § 1º, ambos da Constituição Estadual, bem como, por força do artigo 144 da Constituição Estadual, os princípios constitucionais estabelecidos nos artigos 182, caput e §1º, e 30, inciso VIII, da Constituição Federal.

 

4. DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR

 A transformação da realidade urbana interfere amplamente na propriedade privada urbana, impondo limites e condicionamentos ao seu uso.

A validade e legitimidade da norma urbanística, em virtude dos condicionamentos e limitações que impõe à atividade e aos bens dos particulares e de seu objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes, pressupõe participação comunitária em todas as fases de sua produção.

Os planos e normas urbanísticas devem levar em conta o bem-estar do povo. Cumprem esta premissa quando são sensíveis às necessidades e aspirações da comunidade. Esta sensibilidade, porém há de ser captada por via democrática e não idealizada autoritariamente. O planejamento urbanístico democrático pressupõe possibilidade e efetiva participação do povo na sua elaboração.

Sendo democrático, ele se coloca contra pressões ilegítimas ou equivocadas em relação ao crescimento e ordenamento da cidade, busca contê-la e orientá-las adequadamente.

O princípio da participação comunitária no estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano é uma exigência da Constituição Estadual (art. 180, II e 191).

O entendimento jurisprudencial sufraga a necessidade não só de prévio estudo técnico e planejamento como da participação comunitária na produção de normas de ordenamento urbanístico. Neste sentido, convém transcrever as seguintes ementas:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Leis n°s. 11.764/2003, 11.878/2004 e 12.162/2004, do município de Campinas - Legislações, de iniciativa parlamentar, que alteram regras de zoneamento em determinadas áreas da cidade - Impossibilidade - Planejamento urbano - Uso e ocupação do solo - Inobservância de disposições constitucionais - Ausente participação da comunidade, bem como prévio estudo técnico que indicasse os benefícios e eventuais prejuízos com a aplicação da medida - Necessidade manifesta em matéria de uso do espaço urbano, independentemente de compatibilidade com plano diretor - Respeito ao pacto federativo com a obediência a essas exigências - Ofensa ao princípio da impessoalidade - Afronta, outrossim, ao princípio da separação dos Poderes - Matéria de cunho eminentemente administrativo - Leis dispuseram sobre situações concretas, concernentes à organização administrativa - Ação direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade das normas.” (ADI 163.559-0/0-00).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Ribeirão Preto. Lei Complementar n° 1.973, de 03 de março de 2006, de iniciativa de Vereador, dispondo sobre matéria urbanística, exigente de prévio planejamento. Caracterizada interferência na competência legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo local. Procedência da ação.” (ADI 134.169-0/3-00, rel. des. Oliveira Santos, j. 19.12.2007, v.u.).

Imperioso ainda destacar o entendimento inserto na ementa que se segue, no sentido da necessidade da participação popular, também na fase de discussão do projeto de lei, diante de eventuais emendas substitutivas:

“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI COMPLEMENTAR DISCIPLINANDO O USO E OCUPAÇÃO DO SOLO - PROCESSO LEGISLATIVO SUBMETIDO A PARTICIPAÇÃO POPULAR - VOTAÇÃO, CONTUDO, DE PROJETO SUBSTITUTIVO QUE, A DESPEITO DE ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS DO PROJETO INICIAL, NÃO FOI LEVADO AO CONHECIMENTO DOS MUNÍCIPES – VÍCIO INSANÁVEL - inconstitucionalidade declarada. "O projeto de lei apresentado para apreciação popular atendia aos interesses da comunidade local, que atuava ativamente a ponto de formalizar pedido exigindo o direito de participar em audiência pública. Nada obstante, a manobra política adotada subtraiu dos interessados a possibilidade de discutir assunto local que lhes era concernente, causando surpresa e indignação. Cumpre ressaltar que a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com idéias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhes expõem os interesses envolvidos e as conseqüências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta" (ADI 994.09.224728-0)

Deste modo, padece de inconstitucionalidade o ato normativo por subtrair a possibilidade e exigência constitucional da participação popular, ferindo frontalmente o disposto nos art.180 caput e inciso II, art.181 caput e §1º e art.191, ambos da Constituição Estadual; bem como, por força do art.144 da Constituição Estadual, os princípios constitucionais estabelecidos nos art.182 caput e §1º, e o art.30 e inciso VIII da Constituição Federal.

 

5. DO PEDIDO LIMINAR

Estão presentes, na hipótese examinada, os pressupostos do fumus bonis iuris e do periculum in mora, a justificar a suspensão liminar da vigência e eficácia do ato normativo impugnado.

A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos expostos, que indicam, de forma clara, que as alterações promovidas no Plano Diretor Participativo e o Sistema de Planejamento Integrado e Gestão Participativa do Município de Taboão da Serra (Lei complementar nº 132/2006) pela Lei Complementar nº 270/2011 padecem de inconstitucionalidade.

O perigo da demora decorre especialmente da ideia de que sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos preceitos questionados, subsistirá a sua aplicação, com um crescimento desordenado da cidade, com comprometimento ao planejamento urbanístico, ao bem estar da população, à qualidade de vida e ao desenvolvimento sustentável da comuna, que dificilmente poderão ser sanados, na hipótese provável de procedência da ação direta.

Basta lembrar que a ocupação do solo com base nas alterações de uso providas no mapa de zoneamento, poderá levar a situações urbanisticamente não desejáveis que poderá gerar conflitos e intranquilidade na comunidade.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.

Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, dificilmente será possível restabelecer o status quo ante.

Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já eventualmente já se verificaram.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.

No contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia da Lei Complementar nº 270/2011 do Município de Taboão da Serra

6. DO PEDIDO PRINCIPAL.

Por todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Declaratória, para que ao final seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade Lei Complementar nº 270/2011 do Município de Taboão da Serra

Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

São Paulo, 27 de novembro de 2012.

 

 

        Márcio Fernando Elias Rosa

        Procurador-Geral de Justiça

aca

Protocolado nº 072.537/12

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 270, de 28 de outubro de 2011, do Município de Taboão da Serra.

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.

2.     Comunique-se a propositura da ação a interessada.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 27 de novembro de 2012.

 

 

 

 

        Márcio Fernando Elias Rosa

        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

aca