EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

 

Protocolado nº 19.411/2015

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade de cargos de provimento em comissão constantes dos Anexos II e III, da Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá que “DISPÕE SOBRE A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA PREFEITURA MUNICIPAL DE GUARUJÁ, DENOMINA AS SECRETARIAS MUNICIPAIS, DEFINE ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS DOS ÓRGÃOS DE ASSESSORAMENTO DIRETO, INTERMEDIÁRIO E DE GESTÃO MISSIONAL DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”.

2)      Atribuições dos cargos de provimento em comissão de Assessor Estratégico I, II, III e IV, Assessor Especial I, II, III e IV, Diretor I, II e III, Diretor Médico I, II e III e Médico Regulador, que não retratam assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança. Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art. 144).

3)      Assessor Estratégico I, II, III e IV, Assessor Especial I, II, III e IV, Diretor I, II e III, Diretor Médico I, II e III. Dispositivos que criam cargos comissionados semelhantes e instituem diferença remuneratória.

4)       Violação do art. 39, §1º, da Constituição Federal, ao qual a produção normativa municipal está vinculada por força dos arts. 144 e 297 da Constituição do Estado de São Paulo.

5)      Cargos de provimento em comissão de Procurador Geral do Município. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).

 

 

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 19.411/2015, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face das expressões “Assessor Estratégico I”, “Assessor Estratégico II”, “Assessor Estratégico III”, “Assessor Estratégico IV”, “Assessor Especial I”, “Assessor Especial II”, “Assessor Especial III”, “Assessor Especial IV”, “Procurador Geral do Município”, “Diretor I”, “Diretor II”, “Diretor III”, “Diretor Médico I”, “Diretor Médico II”, “Diretor Médico III” e “Médico Regulador”, constantes dos Anexos II e III, da Lei nº 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, pelos fundamentos expostos a seguir.

1.     DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade, e a cujas folhas reportar-se-á, foi instaurado para a análise da inconstitucionalidade de alguns cargos comissionados na estrutura administrativa do Município de Guarujá.

O Anexo II da Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, que relaciona os cargos públicos de provimento em comissão e funções gratificadas, tem a seguinte redação (fls. 94/143):

“(...)

ANEXO II

 

Relação de cargos e de funções gratificadas

 

 

Símbolo

Salário

Cargos

Nível de Direção Superior

 

Secretário Municipal

DAS-1

R$ 14.100,00

19

Secretário Adjunto

DAS-2

R$ 13.100,00

19

Chefe de Gabinete

DAS-1

R$ 14.100,00

1

Nível de Assessoramento Superior

 

Assessor Estratégico I

DAS-3

R$ 8.050,00

7

Assessor Estratégico II

DAS-4

R$ 7.475,00

14

Assessor Estratégico III

DAS-5

R$ 6.900,00

13

Assessor Estratégico IV

DAS-6

R$ 4.000,00

129

Assessor Especial I

DAS-7

R$ 3.300,00

8

Assessor Especial II

DAS-8

R$ 2.415,00

105

 

Assessor Especial III

DAS-9

R$ 1.250,00

122

Assessor Especial IV

DAS-10

R$ 1.050,00

27

Nível de Direção Técnico Operacional

Procurador Geral do Município

DAS-11

R$13.100,00

1

Nível de Direção Técnico Operacional

Diretor I

DAS-12

R$ 7.475,00

62

Diretor II

DAS-13

R$ 5.750,00

14

Diretor III

DAS-14

R$ 5.175,00

15

Nível de Coordenação e Supervisão Operacional

 

Coordenador I

FG-s1

R$ 2.300,00

17

Coordenador II

FG-s2

R$ 2.116,00

36

Coordenador III

FG-s3

R$ 1.932,00

171

Supervisor I

FG-s4

R$ 1.495,00

32

Supervisor II

FG-s5

R$ 1.150,00

45

Supervisor III

FG-s6

R$ 1.035,00

161

 

Corregedor da Guarda Municipal

FG-COR

R$ 2.300,00

1

Gestor Orçamentário e Financeiro

FG-GOF

R$ 2.116,00

21

Gestor de RH

FG-GRH

R$ 2.116,00

21

Especialistas Saúde

Diretor Médico I

DAS-15

R$13.100,00

1

 

Diretor Médico II

DAS-16

R$ 7.500,00

1

Diretor Médico III (SAMU)

DAS-17

R$ 4.500,00

1

Médico Regulador

DAS-18

R$ 5.000,00

5

Coordenador enfermagem

FG-SCE

R$ 1.495,00

21

Coordenador Administrativo

FG-SCA

R$ 1.035,00

21

(...)”

O Anexo II da Lei nº 4.004/ 2013, na parte em que cria os cargos de provimento em comissão de “Assessor Estratégico I, II, III e IV”, “Assessor Especial I, II, III e IV”, “Diretor I, II e III”, “Diretor Médico I, II e III” e “Médico Regulador”, é inconstitucional por violação dos arts. 111, 115, incisos I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.

2.     DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO IMPUGNADOS

As atribuições dos cargos de provimento em comissão de Assessor Estratégico, Assessor Especial, Procurador Geral do Município, Diretor, Diretor Médico e Médico Regulador foram previstas no Anexo III, da Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, nos termos abaixo (fls. 94/143):

                                            “(...)

ANEXO III

ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS EM COMISSÃO

 

Cargo: Assessor Estratégico

Atribuições: Prestar assistência e assessoramento direto ao Chefe do Poder Executivo Municipal e a seus Secretários Municipais e demais órgãos afins, no planejamento, monitoramento e avaliação e tomada de decisões relacionadas com assuntos e atividades estratégicas que permitam o cumprimento das respectivas atribuições e responsabilidades na execução de programas, ações de Governo e projetos do Plano de Governo.

 

Cargo: Assessor Especial

Atribuições: Prestar assistência e assessoramento direto e imediato ao Chefe do Poder Executivo Municipal, aos Secretários Municipais e demais órgãos de direção estratégica na programação, acompanhamento, avaliação e verificação de atividades e tarefas de caráter especial para o cumprimento das respectivas atribuições e dos programas de governo e projetos institucionais.

 

Cargo: Procurador Geral do Município

Atribuições: Planejar, gerenciar, coordenar e executar as atividades da Advocacia Geral do Município relacionadas com a defesa e representação do Município em juízo ou fora dele, os direitos e interesses da administração direta, Sempre que necessário, dentro das orientações e comandos fixados pelo Advogado Geral do Município, e demais normas superiores de delegações de competências.

 

Cargo: Diretor

Atribuições: Prestar assistência a seu chefe de imediato na tomada de decisões e na formulação de programas, projetos relacionados com a área de sua competência; organizar, administrar e dirigir a unidade organizativa sob sua responsabilidade dentro das normas e diretrizes superiores da Administração Municipal; dirigir, planejar, coordenar e avaliar a programação e execução de programas, projetos, atividades e atribuições de responsabilidade das respectivas secretarias municipais e órgãos afins, dentro das orientações gerais de seu chefe imediato e demais normas superiores de delegações de competências e prestar contas por resultados sobre o cumprimento das metas e objetivos do Plano de Governo sob sua responsabilidade.

 

Cargo: Diretor Médico

Atribuições: Prestar assistência a seu chefe imediato na tomada de decisões e na formulação de programas, projetos relacionados com a área de sua competência; organizar, administrar e dirigir as unidades de saúde sob sua responsabilidade dentro das normas e diretrizes superiores da Administração Municipal; dirigir, planejar, coordenar e avaliar a programação e execução dos programas, projetos, atividades e atribuições de responsabilidade das respectivas da Secretaria Municipal de Saúde, dentro das orientações gerais de seu chefe imediato e demais normas superiores de delegações de competências e prestar contas por resultados sobre o cumprimento das metas e objetivos do planejamento desta secretaria, sob sua responsabilidade.

 

Cargo: Médico Regulador

Atribuições: Planejar, coordenar, executar, monitorar e avaliar as atividades previstas no plano municipal de regulação médica e atividades correlatas, em coordenação com o sistema de saúde estadual e federal, que visem a otimização do sistema municipal de saúde.

 

 (...)”

 

3.     DA NATUREZA TÉCNICA, BUROCRÁTICA, PROFISSIONAL E OPERACIONAL DAS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELOS OCUPANTES DOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSOR ESTRATÉGICO, ASSESSOR ESPECIAL, DIRETOR, DIRETOR MÉDICO E MÉDICO REGULADOR

As atribuições dos cargos de Assessor Estratégico, Assessor Especial, Diretor, Diretor Médico e Médico Regulador, têm natureza meramente técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais.

Os cargos de Assessor Estratégico I, II, III e IV realizam atividades de assessoria e assistência no planejamento, monitoramento, avaliação e tomada de decisões relacionadas com assuntos e atividades estratégicas, as quais são genéricas e meramente técnica, não exigindo para o seu bom desempenho relação de especial confiança com o Chefe do Poder Executivo.

 Os cargos de Assessor Especial I, II, III e IV realizam atribuições genéricas de assessoramento direto e imediato ao Chefe do Poder Executivo Municipal e a seus Secretários Municipais e demais órgãos de direção estratégica na programação, acompanhamento, avaliação e verificação de atividades e tarefas de caráter especial, portanto, atribuições distantes dos encargos de comando superior no qual se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.

Ao Diretor I, II e III são conferidas atribuições genéricas de prestação de assistência a seu chefe imediato na tomada de decisões e na formulação de programas, projetos, bem como organiza, administra e dirige a unidade organizativa sob sua responsabilidade dentro das normas e diretrizes superiores da Administração Municipal etc.

Por sua vez, o Diretor Médico I, II e III possuem atribuições também genéricas de assessoramento a seu chefe imediato na tomada de decisões e na formulação de programas, bem como organiza, administra e dirige as unidades de saúde e dirige, planeja, coordena e avalia a programação e execução de programas, projetos, atividades e atribuições de responsabilidade das respectivas da Secretária Municipal de Saúde.

Por fim, os cargos de Médico Regulador realizam atribuições técnicas consistentes em planejar, coordenar, executar, monitorar e avaliar as atividades previstas no plano municipal de regulação médica e atividades correlatas, em coordenação com o sistema de saúde estadual e federal, que visem a otimização do sistema municipal de saúde.

Verifica-se, portanto, que as atribuições previstas para os cargos mencionados, relacionadas a planejamento, coordenação, direção, assistência, avaliação, organização, monitoração, são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou dar suporte a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior onde se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.

Embora na descrição das atribuições dos cargos mencionados haja referência genérica a atividade de programar, monitorar, assistir, avaliar, dirigir, organizar, a análise das características de cada unidade indica que são destinadas a atender necessidades executórias ou a dar suporte subalterno a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de chefia, direção, assessoramento e comando superior em que se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.

Dessa forma, os cargos comissionados anteriormente destacados são incompatíveis com a ordem constitucional vigente, em especial com o art. 115 incisos I, II e V, e art. 144, todos da Constituição do Estado de São Paulo.

Essa incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela Constituição quanto ao provimento no serviço público sem concurso.

Embora o Município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da Constituição Federal), esta autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita ao âmbito pré-fixado pela Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 459).

A autonomia municipal deve ser exercida com a observância dos princípios contidos na Constituição Federal e na Constituição Estadual (cf. Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de direito constitucional, 9. ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 285).

No exercício de sua autonomia administrativa, o Município cria cargos, empregos e funções, mediante atos normativos, instituindo carreiras, vencimentos, entre outras questões, bem como se estruturando adequadamente.

Todavia, a possibilidade de que o Município organize seus próprios serviços encontra balizamento na própria ordem constitucional, sendo necessário que o faça através de lei, respeitando normas constitucionais federais e estaduais relativas ao regime jurídico do serviço público.

A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos através de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no art. 37, I da Constituição Federal; bem como no art. 115, I da Constituição do Estado de São Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e empregos de natureza técnica ou burocrática.

A criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor, para que adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente política.

Há implícitos limites à sua criação, visto que assim não fosse, estaria na prática aniquilada a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço público.

A propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em precedente do E. STF, que “a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes com as praxes do nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional do concurso (STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito administrativo brasileiro, 33. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).

Podem ser de livre nomeação e exoneração apenas aqueles cargos ou empregos que, pela própria natureza das atividades desempenhadas, exijam excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor.

É esse o fundamento da argumentação no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Por essas razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito administrativo, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).

Daí a afirmação de que “é inconstitucional a lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).

São a natureza do cargo e as funções a ele cometidas pela lei que estabelecem o imprescindível “vínculo de confiança” (cf. Alexandre de Moraes, Direito constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam ser destinados “apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317).

Essa também é a posição do E. STF (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT VOL-01765-01 PP-00169).

Não é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza o provimento em comissão, a atribuição do cargo deve reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das diretrizes políticas do governo.

Pela análise da natureza e atribuições dos cargos impugnados não se identifica os elementos que justificam o provimento em comissão.

Escrevendo na vigência da ordem constitucional anterior, mas em lição plenamente aplicável ao caso em exame, anotava Márcio Cammarosano a existência de limites à criação de postos comissionados pelo legislador. A Constituição objetiva, com a permissão para tal criação, “propiciar ao Chefe de Governo o seu real controle mediante o concurso, para o exercício de certas funções, de pessoas de sua absoluta confiança, afinadas com as diretrizes políticas que devem pautar a atividade governamental. Não é, portanto, qualquer plexo unitário de competências que reclama seja confiado o seu exercício a esta ou aquela pessoa, a dedo escolhida, merecedora da absoluta confiança da autoridade superior, mas apenas aquelas que, dada a natureza das atribuições a serem exercidas pelos seus titulares, justificam exigir-se deles não apenas o dever elementar de lealdade às instituições constitucionais e administrativas a que servirem, comum a todos os funcionários, como também um comprometimento político, uma fidelidade às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, uma lealdade pessoal à autoridade superior (...). Admite-se que a lei declare de livre provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria superior, mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre provimento e exoneração cargos como os de auxiliar administrativo, fiscal de obras, enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador, e outros mais, de cujos titulares nada mais se pode exigir senão o escorreito exercício de suas atribuições, em caráter estritamente profissional, técnico, livres de quaisquer preocupações e considerações de outra natureza” (Provimento de cargos públicos no direito brasileiro, São Paulo, RT, 1984, p. 95/96).

No caso em exame, evidencia-se claramente que os cargos de provimento em comissão, antes referidos, destinam-se ao desempenho de atividades meramente burocráticas ou técnicas, que não exigem, para seu adequado desempenho, relação de especial confiança.

É necessário ressaltar que a posição aqui sustentada encontra esteio em julgados desse E. Tribunal de Justiça (ADI 111.387-0/0-00, j. em 11.05.2005, rel. des. Munhoz Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de janeiro de 2005, rel. des. Barbosa Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30 de janeiro de 2008, rel. des. Elliot Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des. Armando Toledo, j. 16.07.2008, v.u.).

Cabe também registrar que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência ao art. 115, incisos I, II e V da Constituição Estadual, bem como ao art. 37 incisos I, II e V da Constituição Federal, cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art. 144 da Carta Estadual.

4.       EXCESSO DE CARGOS COM IDÊNTICAS ATRIBUIÇÕES E REMUNERAÇÃO DIFERENCIADA: ASSESSOR ESTRATÉGICO I, II, III, IV; ASSESSOR ESPECIAL I, II, III E IV; DIRETOR I, II E III; E DIRETOR MÉDICO I, II E III

No tocante aos cargos de Assessor Estratégico I, II, III e IV; Assessor I, II, III, IV; Diretor I, II e III; Diretor Médico I, II e III, constata-se haver estruturação em classes com diferentes níveis remuneratórios, porém com identidade de atribuição entre eles, fornecendo ideia de carreira que não se coaduna com sua natureza de comissionada. Constitui “figura estranha ao Direito Administrativo brasileiro, qual seja, a de carreira formada de cargos em comissão, por natureza, isolados”, porquanto “a própria organização, em carreira, dos cargos em apreço (ressaltada no parecer), pela ideia de permanência que traduz não se mostra compatível com a índole de comissão” (STF, Rp 1.282-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 12-12-1985, v.u., DJ 28-02-1986, p. 2345, RTJ 116/887).

Além disso, proporciona ao administrador público uma grande margem de liberdade, inspirada por motivos secretos, subjetivos e pessoais, na medida em que lhe faculta a escolha casuística do nível do assessor e diretor na admissão (ou durante o exercício do cargo) para efeito remuneratório, distanciando-se dos princípios de moralidade e impessoalidade.

Ademais, há excesso destes cargos comissionados criados pela lei ora impugnada. Ao todo são 163 (cento e sessenta e três) cargos de Assessor Estratégico, 262 (duzentos e sessenta e dois) cargos de Assessor Especial e 91 (noventa e um) cargos de Diretor, conforme previsão no Anexo II da lei impugnada, nos seguintes termos:

Assessor Estratégico I

7 cargos

Assessor Estratégico II

14 cargos

Assessor Estratégico III

13 cargos

Assessor Estratégico IV

129 cargos

Total

163 cargos de Assessor Estratégico

 

 

Assessor Especial I

8 cargos

Assessor Especial II

105 cargos

Assessor Especial III

122 cargos

Assessor Especial IV

27 cargos

Total

262 cargos de Assessor Especial

 

 

Diretor I

62 cargos

Diretor II

14 cargos

Diretor III

15 cargos

Total

91 cargos de Diretor

 

 

 

A quantidade e remuneração dos cargos de Assessor Estratégico, Assessor Especial, Diretor e Diretor Médico se dá da seguinte forma:

Assessor Estratégico I – 7 cargos (R$ 8.050,00)

Assessor Estratégico II – 14 cargos (R$ 7.475,00)

Assessor Estratégico III – 13 cargos (R$ 6.900,00)

Assessor Estratégico IV – 129 cargos (R$ 4.000,00)

Assessor Especial I – 8 cargos (R$ 3.300,00)

Assessor Especial II – 105 cargos (R$ 2.415,00)

Assessor Especial III – 122 cargos (R$ 1.250,00)

Assessor Especial IV – 27 cargos (R$ 1.050,00)

Diretor I – 62 cargos (R$ 7.475,00)

Diretor II – 14 cargos (R$ 5.750,00)

Diretor III – 15 cargos (R$ 5.175,00)

Diretor Médico I – 1 cargo (R$ 13.1000,00)

Diretor Médico II – 1 cargo (R$ 7.500,00)

Diretor Médico III – SAMU (R$ 4.500,00)

Por fim, os cargos de Assessor Estratégico I, II, III, IV; Assessor Especial I, II, III, IV; Diretor I, II e III; e Diretor Médico I, II e III, todos comissionados e criados pela Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, são inconstitucionais porque, além das razões já expostas, guardam desarrazoada diferença remuneratória entre cargos cujas atribuições são idênticas, afrontando o art. 39, §1º, da Constituição Federal, cuja redação foi dada pela EC n. 19/98, à qual a produção normativa do ente municipal está vinculada por força dos artigos 144 e 297 da Constituição Bandeirante.

 “Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Artigo 297 – São também aplicáveis no Estado, no que couber, os artigos das Emendas à Constituição Federal que não integram o corpo do texto constitucional, bem como as alterações efetuadas no texto da Constituição Federal que causem implicações no âmbito estadual, ainda que não contempladas expressamente pela Constituição do Estado”.

Os autores da Constituição do Estado, no exercício do Poder Constituinte Decorrente, poderiam repetir, enfadonhamente, as normas de reprodução obrigatória da Constituição da República, mas preferiram eles, acertadamente, diga-se, fórmula sintética do art. 144, determinando, como não poderia deixar de ser, que os princípios estabelecidos na Constituição Federal (somente princípios, não regras) devessem ser observados obrigatoriamente pelos Municípios. 

Não foi outra a saída encontrada pelos Constituintes nacionais, por exemplo, com o art. 25 da Constituição da República, a determinar que os Estados se organizem segundo os princípios da Constituição da República, sem explicitá-los, também enfadonhamente. Tal dispositivo guarda correspondência com o art. 144 da Constituição do Estado de São Paulo.

A doutrina já resolveu a questão dos princípios que devem os Estados observar (o que, obviamente, aplica-se aos Municípios, já agora por força do art. 144 da Constituição do Estado). Ao comentar sobre o conteúdo do art. 25 da Constituição da República, a direcionar as competências dos Estados (como o art. 144 da Constituição do Estado condiciona as competências  dos Municípios), Manoel Gonçalves Ferreira  Filho refere-se à existência das  “regras de preordenação  institucional”, “regras de extensão normativa” e “regras de subordinação normativa”, inseridas na Constituição da República, vinculantes para os demais entes políticos, pronunciando que “ainda cerceiam a autonomia dos Estados  regras de subordinação normativa”. São estas as que, presentes  na  própria  Constituição Federal e direcionadas por ela a todos os entes federativos (União, Estados, Municípios), predefinem o conteúdo da legislação que será editada por eles. E isto, ou orientando positivamente tal conteúdo (mandando que siga determinada linha), ou negativamente (proibindo que adote certas normas ou soluções).

Exemplo de tais regras de subordinação normativa é o que decorre do art. 37 da Constituição brasileira, que preside à atuação da administração pública direta ou indireta.  Da mesma forma, o art. 39 da Constituição direciona diretamente a legislação dos Estados (bem como do Distrito Federal e dos Municípios) quanto aos servidores públicos.

Observe-se que esta subordinação normativa pode ser direta ou indireta. Ela é direta (e imediata) quando deflui, sem intermediário, da Constituição Federal e obriga desde logo o legislador. É indireta (e mediata) quando se faz por meio da legislação federal obrigatória para os Estados.

A norma da Constituição da República já predefiniu a legislação municipal negativamente proibindo que adote certas normas ou soluções. Claro que, apenas por não repetir explicitamente os princípios da Constituição da República, não significa que os Municípios fiquem livres para (em uma curiosa situação então) dispor de mais poderes constituintes que o Estado (já que não se discute que, quanto a este, seu Poder Constituinte Decorrente é limitado). Trata-se do artigo 144 da Constituição do Estado de norma de repetição obrigatória.

Neste sentido, coleta-se que as normas centrais” da Constituição Federal, tenham elas natureza de princípios constitucionais, de princípios estabelecidos ou de normas de preordenação, afetam a liberdade criadora do Poder Constituinte Estadual e acentuam o caráter derivado desse poder.

A norma de reprodução não é, para os fins da autonomia do Estado-membro, simples norma de imitação, frequentemente encontrada na elaboração constitucional. As normas de imitação exprimem a cópia de técnicas ou de institutos, por influência da sugestão exercida pelo modelo superior. As normas de reprodução decorrem do caráter compulsório da norma constitucional superior, enquanto a norma de imitação traduz a adesão voluntária do constituinte a uma determinada disposição constitucional (Raul Machado Horta. Poder constituinte do estado-membro, RDP, 88/5).

Nesse sentido, por força do artigo 144 da Constituição do Estado de São Paulo, o ente municipal não pode se desviar do comando do artigo 39, §1º, da Constituição Federal, sob pena de inconstitucionalidade.

Assim, ao fixar o sistema de remuneração de servidores públicos, o Município de Guarujá deveria ter observado: (i) “a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira”, (ii) “os requisitos para a investidura”, e (iii) “as peculiaridades dos cargos”. Dessa forma, seguramente, evitar-se-ia a criação de diferentes patamares de remuneração para cargos cujas funções e requisitos de preenchimento fossem semelhantes, como ocorreu in casu. Confira-se.  

Todos os cargos de Assessores Estratégicos I, II, III e IV e Assessor Especial I, II, III e IV assessoram o Chefe do Poder Executivo e Secretários Municipais e os Diretores assessoram o chefe imediato e demais superiores.

Não bastando, todos os cargos de Assessores Estratégicos I, II, III e IV traz as mesmas atribuições. Assim, como todos os cargos de Assessor Especial I, II, III e IV têm idênticas atribuições. Por fim, verifica-se as mesmas atribuições dos Diretores I, II e III e Diretor Médico I, II e III.

À vista disso, o sistema de remuneração instituído pela Lei n. 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, aos Assessores Estratégicos I, II, III e IV; Assessor Especial I, II, III e IV; Diretor I, II e III; Diretor Médico I, II e III, são inconstitucionais, ao passo que não subsiste nenhum fator de discrímen (natureza, grau de responsabilidade, complexidade, peculiaridade do cargo, requisitos de investidura) apto a amparar a diferença de remuneração.

Nesse diapasão, a Lei 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, no tocante aos cargos mencionados, desrespeitou o comando constitucional do art. 39, §1º, da CF e, por conseguinte, violou o princípio da igualdade jurídica, ao conferir tratamento diferenciado a situações congêneres, valendo-se para tanto de critérios injustificáveis.

Conclui-se, portanto, que dois vícios fulminam os cargos instituídos pela Lei nº 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá, quais sejam, (i) implementação de cargos comissionados para desempenho de funções distintas de direção, chefia e assessoramento, e (ii) criação de um sistema de remuneração avesso à ordem constitucional vigente. 

Cumpre registrar que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência aos arts. 111 e 115, incisos II e V, da Constituição Estadual, bem como aos arts. 37, incisos II e V, e 39, §1º, da Constituição Federal, cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art. 144 e 297 da Carta Estadual.

        A propósito da matéria específica em análise, esse colendo Órgão Especial já se pronunciou. Senão vejamos:

                          “(...)

Não bastasse, importa ainda anotar que a norma guerreada padece também de inconstitucionalidade por traçar desarrazoada diferença remuneratória entre cargos com semelhantes atribuições.

Como registrado na inicial da presente ação, “(...) As funções conferidas ao Assessor de Gabinete I, pelos incisos I, II, VI, IX do art. 168, são igualmente atribuídas ao Assessor de Gabinete II e III, pelos incisos I, II, III e V do art. 169 e I, II, III, V do art. 170.  De igual modo, as atribuições do Assessor de Gestão I, elencadas nos incisos I, II, V e VI do art. 171, são as mesmas instituídas ao Assessor de Gestão II e III, pelos incisos I, II, III e V do art. 172 e incisos I, II, III e IV do art. 173, respectivamente. O mesmo ocorre com as incumbências legais do Assessor Especial de Gestão II, III e IV – incisos I, II, III, VII do art. 175, incisos I, II, VI do art. 176, e incisos I, III, VI e V do art. 177- que são análogas ao do Assessor Especial de Gestão I, conforme incisos I, II, III, VI do art. 174. Ressalta-se, ainda, a semelhança entre as atividades do Assessor Especial de Gestão II e III.

Efetivamente, uma análise comparativa das atribuições dos cargos em menção evidencia que as respectivas atividades são, de fato, similares. Apesar da utilização de expressões genéricas e imprecisas no rol de atribuições, a identidade dos cargos, para os quais não se exige qualquer requisito de investidura, é patente. Diante disso, não havendo qualquer fator de distinção que se preste a justificar, minimamente, a diferença de remuneração estabelecida – natureza, grau de responsabilidade, complexidade, peculiaridade do cargo, requisitos de investidura, etc. – importa reconhecer que o sistema de remuneração instituído é inconstitucional. (...)” (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2101546-79.2014.8.26.0000, Rel. Des. Roberto Mortari, v.u, julgado em 15 de outubro de 2014).

5.     IMPOSSIBILIDADE DE PROVIMENTO COMISSIONADO PARA CARGO OU EMPREGO DA ADVOCACIA PÚBLICA.

         Convém adicionar a incompatibilidade do cargo público de   Procurador Geral do Município, pois as atividades inerentes à advocacia pública como assessoramento, consultoria e representação jurídica de entidades ou órgãos públicos são atribuições de natureza profissional e técnica e exclusivamente reservadas a profissionais investidos em cargos de provimento efetivo da respectiva carreira mediante aprovação prévia em concurso público, como revela a remissão ao art. 132 da Constituição Federal contida no § 1º do art. 98 da Constituição Estadual. Cediça jurisprudência assim pronuncia:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

 “ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

         Portanto, é incompatível o provimento comissionado com a advocacia pública, de modo a revelar a inconstitucionalidade do cargo público de Procurador Geral do Município, constantes dos Anexos II e III, da Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá.

6.     DOS PEDIDOS

a.    Do pedido liminar

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Guarujá apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a consequente oneração financeira do erário.

Está claramente demonstrado que os cargos de provimento em comissão impugnados não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo.

O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.

Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para ocuparem tais cargos, certamente, não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.

Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.

Assim, a imediata suspensão da eficácia da norma impugnada evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.

Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para a suspensão das expressões “Assessor Estratégico I”, “Assessor Estratégico II”, “Assessor Estratégico III”, “Assessor Estratégico IV”, “Assessor Especial I”, “Assessor Especial II”, “Assessor Especial III”, “Assessor Especial IV”, “Procurador Geral do Município”, “Diretor I”, “Diretor II”, “Diretor III”, “Diretor Médico I”, “Diretor Médico II”, “Diretor Médico III” e “Médico Regulador”, constantes dos Anexos II e III, da Lei nº 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá.

b.     Do pedido principal

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade das expressões das expressões “Assessor Estratégico I”, “Assessor Estratégico II”, “Assessor Estratégico III”, “Assessor Estratégico IV”, “Assessor Especial I”, “Assessor Especial II”, “Assessor Especial III”, “Assessor Especial IV”, “Procurador Geral do Município”, “Diretor I”, “Diretor II”, “Diretor III”, “Diretor Médico I”, “Diretor Médico II”, “Diretor Médico III” e “Médico Regulador”, constantes dos Anexos II e III, da Lei nº 4.040, de 28 de fevereiro de 2013, do Município de Guarujá.

Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Guarujá, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

 

São Paulo, 17 de junho de 2013.

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

 

aca/mi

 

 

 


Protocolado nº 19.411/2015

Assunto: Inconstitucionalidade de alguns cargos de provimento em comissão previstos nos Anexos II e III, da Lei nº 4.004, de 28 de fevereiro de 2013, do Município do Guarujá.

 

 

 

1.     Distribua-se eletronicamente a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.

2.     Providenciem-se as anotações e comunicações de praxe.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 17 de junho de 2015.

 

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

 

aca/mi