EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado nº 46.753/15
Ementa:
Constitucional.
Tributário. Ação Direta Inconstitucionalidade. Artigos 216, 218 e 219 da Lei n.
950/89, do Município de Monte Azul Paulista. Taxas Administrativas. Inexistência
de especificidade e divisibilidade para instituição. Ofensa à legalidade
tributária, ao direito constitucional de petição, ao direito de obter informações
junto à administração. 1. Para atender ao princípio da legalidade
tributária, cabe ao legislador infraconstitucional prever no respectivo diploma
todos os elementos estruturantes essenciais ao surgimento do tributo
(tipicidade cerrada). 2. A emissão
de guias ou de documentos fiscais é despesa inerente à atividade arrecadatória
da Administração, que não pode ser repassada ao contribuinte. 3. Impossibilidade de cobrança de
tributo para a obtenção de certidões em repartições para esclarecimentos de
interesse pessoal. 4. A apresentação
de petição ou documento a ser apreciado pela Administração não pode estar
sujeita à cobrança de exação (direito de petição). 5. Procedência da ação.
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista
no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro
de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com
o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV, da Constituição Federal, e
ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de
São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 46.753/15),
vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE em face dos
incisos I, II, III, IV, V, VII, VIII do art. 216, do parágrafo único do art.
218 e dos incisos I, II, III, IV, VII, VIII do art. 219 da Lei n. 950, de 29 de
dezembro de 1989, do Município de Monte Azul Paulista, pelos seguintes
fundamentos:
I - DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
Prevê
a Lei n. 950, de 29 de dezembro de 1989, a qual consolidou a legislação
tributária do Município de Monte Azul Paulista, na Seção X do Capítulo II - que
contempla as “Taxas de Poder de Polícia” - as denominadas “Taxas
Administrativas”, vejamos:
“(...)
Art. 216 – As Taxas Administrativas
são exigíveis dos interessados pela prestação do poder de polícia do Município
relativo ao seguinte:
I – emissão e expedição de Alvarás
diversos;
II - emissão de atestados e
certidões diversos;
III – emissão de guias e de
documentos fiscais;
IV – emissão de despachos, termos,
registros e averbações para autorizações, permissões e concessões;
V – protocolamento de papéis,
petições requerimentos, abaixo-assinados e similares;
VI - emissão de títulos de perpetuidade
de sepulcros, jazigos, carneiros, mausoléus ou ossuários;
VII – averbações para efeitos de
registro e cadastro;
VIII - outros atos administrativos a
cargo de autoridades administrativas fora dos acima especificados;
Parágrafo Único – são isentos das
taxas administrativas os requerimentos e certidões de servidores municipais
ativos e inativos, do quadro ou contratados, sobre assunto de natureza
funcional.
(...)
Art. 218 A cobrança das Taxas
Administrativas far-se-á por processo mecânico ou mediante a extração de guia
ou conhecimento, quanto ao ato praticado, assinado, emitido ou visado.
Parágrafo Único – Aplicar-se o
disposto no artigo toda vez que instrumento qualquer for protocolado, expedido,
anexado, desentranhado, fornecido, emitido ou devolvido.
Art. 219 – A Arrecadação das Taxas
Administrativas será feita observado o seguinte esquema:
I – emissão e expedição de Alvarás
diversos e de qualquer natureza: 0,5 (zero vírgula cinco) da UFMAP;
II – emissão de atestados e
certidões diversas e de qualquer natureza: 0,1 (zero vírgula um) da UFMAP;
III – emissão de segundas vias de
documentos fiscais, inclusive avisos de lançamentos de impostos, taxas ou de
contribuição de melhoria: 10% (dez por cento) da UFMAP, por documento ou aviso;
IV – protocolamento de papéis,
petições, requerimentos, abaixo-assinados e similares: 5% (cinco por cento) da
UFMAP por cada protocolamento;
V – Emissão de títulos de
perpetuidade de sepulcros, jazigos, carneiros, mausoléus ou ossuários: 50%
(cinquenta por cento) da UFMAP por título;
VI – busca, por ano: 5% (cinco por
cento) da UFMAP,
VII – averbações e cadastro:
a – de lote vago, independentemente
de sua área, por lote 20 % (vinte por cento) da UFMAP;
b – de lote, independente de sua
área, na qual exista edificação:
b. 1 – pelo lote 20 % (vinte por
cento) da UFMAP;
b. 2 – por unidade edificada: 10 %
(dez por cento) da UFMAP,
VIII – outros atos administrativos a
cargo de autoridades administrativas municipais, fora dos acima especificados:
10% (dez por cento) da UFMAP.
(...) ”
Conforme
será explanado no curso desta exordial, as taxas em epígrafe não se coadunam
com diversos preceitos insertos na Carta Bandeirante, sendo imperiosa a
declaração de inconstitucionalidade de tais exações por este Colendo Órgão
Especial, ante os seguintes argumentos.
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de
constitucionalidade
Os dispositivos
indicados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual
está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º,
18, 29 e 31 da Constituição Federal.
Os preceitos da Constituição Federal e da
Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29
daquela e do art. 144 desta.
Os dispositivos ora vergastados são incompatíveis
com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo 144 - Os Municípios, com
autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se
auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos
na Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)
Artigo 160 - Compete ao
Estado instituir:
(...)
II - taxas em razão do exercício
do poder de polícia, ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços
públicos de sua atribuição, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte
ou postos a sua disposição;
(...)
SEÇÃO II
Das Limitações do Poder de Tributar
Artigo 163 - Sem prejuízo
de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado:
I - exigir ou aumentar tributo
sem lei que o estabeleça;
(...)
Artigo 164 - É vedada a
cobrança de taxas:
I - pelo exercício do direito de
petição ao Poder Público em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso
de poder;
II - para a obtenção de
certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimentos de
interesse pessoal.
(...)”.
III – Da inconstitucionalidade dAS TAXAS ADMINISTRATIVAS
ante a edição da lei nº 950/89.
Como se sabe, os
Municípios integram a federação e têm assegurada sua autonomia, atendidos os
princípios estabelecidos na Carta Magna e na Constituição do respectivo Estado
(CF, art. 29).
Essa autonomia se manifesta pela competência outorgada às indigitadas entidades de direito público, para legislarem sobre assuntos de interesse local; suplementarem a legislação federal e a estadual no que couber; instituírem e arrecadarem os tributos que lhes são próprios (CF., art. 30, III), a par de outras.
Entretanto, a competência tributária dos Municípios - consubstanciada na capacidade de instituir tributos - encontra limites nas normas da Constituição Estadual e da Federal atinentes ao Sistema Tributário Nacional (CF, art. 145 e seguintes), que envolvem princípios incontornáveis, dentre os quais as regras matrizes dos tributos.
Com efeito, mesmo reconhecendo que a Constituição Federal não criou tributos, é certo que, além de discriminar competências, ela traçou a “norma padrão de incidência” de cada um dos tributos que podem ser instituídos pelas entidades estatais.
Ou seja, a Constituição Federal, no seu art. 145, ao conferir às pessoas políticas competência para a instituição de impostos, taxas e contribuições de melhoria, classifica juridicamente os tributos, traçando o modelo de cada um deles e vinculando ao legislador ordinário.
A Constituição Federal, no seu art. 145, prescreve que:
“Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(....)
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela
utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”
Essa regra foi reproduzida no art.
160, inciso II, da Constituição do Estado de São Paulo, sendo de observância
obrigatória pelos Municípios, por força do disposto no artigo 144, dessa mesma
Carta, que impõe limites à autonomia municipal nos princípios estabelecidos na
Constituição da República e nela própria.
Para
JOSÉ AFONSO DA SILVA, “o fato
gerador da taxa é uma situação dependente de atividade estatal: o exercício do
poder de polícia ou a oferta de serviço público ao contribuinte.”[1]
Daí que a atuação estatal, hipótese de incidência das taxas, pode consistir
tanto num serviço público como num ato de polícia, inferindo-se que o nosso
sistema constitucional prevê taxas de serviço e taxas de polícia.
As taxas de serviço, por expressa definição constitucional, são aquelas cobradas pelo Poder Público, “pela utilização, efetiva ou potencial de serviços públicos de sua atribuição, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.”
Serviço público, na lição de CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, “é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público”.[2]
Feitas essas considerações, passa-se, então, para análise das “Taxas Administrativas” previstas na Lei n 950/89.
DA
INCONSTITUCIONALIDADE DOS INCISOS I, II E VIII DO ART. 216, BEM COMO DOS
INCISOS I, II E VIII DO ART. 219 DA LEI N. 950/89.
Sabe-se que, em qualquer seara da ciência jurídica, sempre houve a preocupação por parte dos teóricos em se buscar um ideal de justiça nas relações por eles disciplinadas, sendo que no Direito Tributário tal desiderato não poderia ser outro.
Se de um lado o Estado necessita de receitas voltadas à mantença de sua complexa máquina, não menos relevante é o interesse do contribuinte em defender seu patrimônio da iminente atividade predatória desempenhada pelos entes quando do exercício de seu poder de tributar, de sorte que a bem de um sistema arrecadatório equilibrado caberia ao próprio ordenamento estabelecer balizas voltadas a compatibilizar intentos deveras antagônicos.
Nesse contexto e tendo em vista sua natureza garantista por excelência, a Constituição Federal de 1988 instituiu no decorrer de seu texto inúmeros direitos e garantias na órbita tributária à defesa do cidadão, plasmando em seu Título VI, Capítulo I, Seção I, limites expressos e implícitos à efetivação da capacidade tributária ativa pelos entes, dentre os quais destaca-se, em função de sua relevância à presente inicial, o princípio da legalidade tributária (art. 150, I, CF; art. 163, I, CE).
Segundo a Carta Maior, o princípio da legalidade tributária veda a exigência ou majoração de tributo sem lei que o estabeleça (art. 150, I, CF), impondo ao legislador infraconstitucional, portanto, o dever de observância à estrita legalidade quando da produção normativa tributária atinente a certos institutos.
No que tange à compreensão da estrita legalidade em matéria tributária, pontuais são os apontamentos de José Maria Arruda Andrade. Vejamos:
“Sobre a
legalidade, no plano constitucional, ela aparece como norteadora de toda a
estrutura do Estado de direito e da repartição das funções públicas. No âmbito
do direito tributário, a legalidade atua de forma mais específica e
determinante, configurando o que a doutrina e a jurisprudência costumam chamar
de estrita legalidade, reserva absoluta de lei ou tipicidade fechada
tributária, de acordo com a orientação teórica adotada. Para o devido
entendimento acerca da legalidade no direito tributário, deve-se analisá-lo
inserido na ideia de Estado de direito e em sua feição liberal. A legalidade
surge justamente diante do esforço de ascensão política por parte da burguesia,
no contexto do século XVIII, e de sua necessidade de impor maior controle à
atuação estatal, para permitir a livre fruição de bens e a segurança das
relações jurídicas privadas.
(...)
No que tange
à legalidade, ela surge como instrumento, nesse contexto, limitador,
justamente, da atividade estatal. A legalidade não será vista como um conteúdo
de atuação, mas como um limitador na relação Estado e cidadão, uma proteção
deste último. Outro elemento relevante, decorrente da separação dos poderes, é
a reserva da lei (muitas vezes alegadamente absoluta), já que qualquer ato
estatal que invada a esfera da liberdade individual, e aqui se tem o tributo
como figura-chave dessa invasão, somente pode ser autorizado pelos
representantes do povo (da burguesia, no caso), no Poder Legislativo (no taxation without representation). Tem-se,
assim, as duas chaves principais do Estado de direito: a legalidade/limite e a
separação de poderes.” (Andrade, José Maria Arruda. Interpretação da Norma
Tributária, São Paulo: MP Editora, 2006, p. 169/170).
Fazendo uso das lições esposadas, em conjunto com a regra inserta no art. 150, I da CF, reproduzida no art. 163, I da CE, percebe-se a clara intenção do Constituinte em conferir aos administrados uma garantia/limite em face do ius imperium estatal quando da consecução de seu poder de tributar, porquanto a ausência de balizas à tributação poderia trazer efeitos indesejados a toda coletividade, o que não se consente desde a instituição do Estado de Direito, cujo surgimento se deve justamente ao desígnio de se limitar a atuação estatal que outrora restava desenfreada sob o manto do absolutismo.
E nem poderia ser diferente, porquanto em um Estado de Direito estruturado sob o império da lei, qualquer atividade tributária descompassada da estrita legalidade revela-se abusiva e arbitrária, dissonante do almejado controle ao poder de tributar preconizado no Título VI, Capítulo I, Seção I da CF/88.
Assim, para a legitimidade da edição de qualquer exação cabe ao legislador infraconstitucional prever no respectivo diploma todos os elementos estruturantes essenciais ao surgimento do tributo (tipicidade cerrada), sob pena de se arredar da garantia supramencionada e, consequentemente, se distanciar de um sistema tributário coerente, cuja essência reside na tributação razoável e controlada de seus contribuintes em prol da existência digna destes, e que, ao mesmo tempo, permite a concretização do objetivo constitucional voltando à garantia do desenvolvimento nacional, seja no âmbito econômico, social ou em outros.
Pois bem.
No caso, à margem do referido princípio constitucional, o legislador municipal instituiu a “Taxa Administrativa” cujos fatos gerados são a “emissão e expedição de Alvarás diversos”, a “emissão de atestados e certidões diversos” e “outros atos administrativos a cargo de autoridades administrativas fora dos acima especificados”, previstos respectivamente nos incisos I, II e VIII do art. 216 da lei impugnada.
Nas duas primeiras hipóteses legislativas, ao introduzir as locuções “alvarás diversos” e “atestados e certidões diversos”, o ente municipal lançou mão de vocábulos imprecisos e com amplo espectro de incidência, pois a definição de sua significância restaria na competência discricionária do ente, o que não se permite à luz da tipicidade cerrada em matéria tributária.
Do mesmo modo, no tocante á ultima hipótese, a discricionariedade do ente para determinar outras hipóteses de incidência sem respeito à tipicidade cerrada ficou evidenciada.
Conforme exaustivamente explanado nos parágrafos anteriores, não basta a edição de lei stricto sensu para legitimar a cobrança de tributo, porquanto a imposição de exação requer não só a sua previsão em diploma legal, mas também o detalhamento em lei de seus elementos estruturantes essenciais, a fim de ser passível a aferição da presença destes e, por conseguinte, viabilizar sua exigência pelo ente tributante, que somente pode arrecadá-lo, frise-se, quando todos os elementos do tributo se fazem presentes no mundo fenomênico e estão, outrossim, em conformidade com o ordenamento (tipicidade cerrada).
Ademais, se faz relevante pontuar que acaso fosse possível uma tributação a esmo, sem que houvesse uma delimitação fechada pelo legislador quando da instituição de espécies tributárias, tal atividade administrativa se encontraria em oposição à segurança almejada pelo Constituinte Originário, que na Lei Fundamental obrigou os entes políticos a respeitar a legalidade asseguradora das liberdades individuais, assim como a própria atividade administrativa, porquanto somente cabe ao Poder Público atuar quando houver previsão legal neste sentido, e dentro de seus limites (art. 37, caput, CF; art. 111, caput, CE).
Destarte, à luz dos argumentos apresentados, os incisos I, II e VIII do art. 216, bem como os incisos I, II e VIII do art. 219 da lei impugnada encontram-se eivados de manifesta inconstitucionalidade material por ofensa à legalidade tributária insculpida no art. 163, I, da Carta Paulista.
DA INCONSTITUCIONALIDADE
DO INCISO III DO ART. 216 E DO INCISO III DO ART. 219 DA LEI N. 950/89.
Como bem pontuado anteriormente, o inciso II do art. 160 prevê que as taxas serão devidas em virtude do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.
O fato gerador ora analisado não se enquadra em ambas as hipóteses, pois inexiste contraprestação em favor do administrado – o que afasta a caracterização de serviço público especifico e divisível – e também porque a emissão não constitui exercício do poder de polícia.
Esta hipótese de incidência nada mais é do que um mecanismo de arrecadação claramente ilegítimo, uma vez que não há previsão constitucional que o permita, além de cuidar de interesse exclusivo da Administração.
Ressalte-se que a emissão de guias ou de documentos fiscais, na verdade, é despesa inerente à atividade arrecadatória da Administração, que não pode ser repassada ao contribuinte.
Ademais, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 789.218 MG, reconheceu a repercussão geral da matéria e reafirmou a jurisprudência dominante da Corte no sentido da inconstitucionalidade da cobrança, vejamos:
TRIBUTÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RATIFICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA.
TAXA DE EXPEDIENTE. FATO GERADOR. EMISSÃO DE GUIA PARA PAGAMENTO DE TRIBUTO.
AUSÊNCIA DOS CRITÉRIOS EXIGIDOS PELO ART. 145, II, CF/88. INCONSTITUCIONALIDADE.
1.
A emissão de guia de recolhimento de tributos é de interesse exclusivo da
Administração, sendo mero instrumento de arrecadação, não envolvendo a
prestação de um serviço público ao contribuinte.
2.
Possui repercussão geral a questão constitucional suscitada no apelo extremo.
Ratifica-se, no caso, a jurisprudência da Corte consolidada no sentido de ser inconstitucional a instituição e a cobrança
de taxas por emissão ou remessa de carnês/guias de recolhimento de tributos.
Precedente do Plenário da Corte: Rp nº 903, Rel. Min. Thompson Flores, DJ de
28/6/74. 3. Recurso extraordinário do qual se conhece, mas ao qual, no mérito,
se nega provimento.
Posto isto, patente a inconstitucionalidade da taxa administrativa prevista no inciso III do art. 216 e no inciso III do art. 219 da Lei n. 950/89, por afronta ao inciso II do art. 160 da CE.
DA INCONSTITUCIONALIDADE DOS INCISOS
IV E VII DO ART. 216 E DO INCISO VII DO ART. 219 DA LEI N. 950/89.
No exercício de sua competência tributária, o ente municipal em apreço estabeleceu mais duas taxas a serem cobradas de seus munícipes quando da suposta realização de atividade estatal.
No caso, trata-se da “Taxa Administrativa” aduzida no inciso IV do art. 216, cujo fato gerador se evidencia quando da “emissão de despachos, termos, registros e averbações para autorizações, permissões e concessões”, e da prevista no inciso VII do mesmo artigo e no inciso VII do art. 219, cuja hipótese de incidência é “averbações para efeitos de registro e cadastro”.
Em que pese a tortuosa redação dos dispositivos em comento, haja vista a impossibilidade de se precisar qual seria a atividade ensejadora da espécie tributária examinada, ou seja, se a “Taxa Administrativa” estaria sendo cobrada em razão de atividade notarial desempenhada pelo próprio Município ou se a aludida espécie decorreria do simples fato do particular contratar junto à Administração, de qualquer forma a imposição da exação trazida a lume em quaisquer das hipóteses ventiladas seria flagrantemente inconstitucional, ante os argumentos a seguir expostos.
Preliminarmente, necessário pontuar que não cabe ao ente federativo desempenhar diretamente as atividades de natureza notarial, ante previsão expressa na Constituição Federal de 1988, em seu art. 236:
“Art. 236. Os
serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por
delegação do Poder Público.
§ 1º - Lei regulará as atividades, disciplinará a
responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de
seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º - Lei federal estabelecerá normas
gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços
notariais e de registro.
§ 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso
público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique
vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.”
Da leitura do dispositivo supra percebe-se que a atividade em epígrafe deverá ser desempenhada em regime privado por particulares aprovados em concurso público, embora sofra o influxo de regras de direito público em face do interesse estatal na sua consecução.
Tanto que o diploma regulamentador da atividade em questão, no caso a Lei Federal nº 8.935/94, é clara ao estabelecer em vários de seus dispositivos a citada natureza quando do exercício da função notarial, conforme se abstrai dos enunciados infra:
“Art. 3º
Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais
do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade
notarial e de registro.
(...)
Art. 14. A
delegação para o exercício da atividade notarial e de registro depende dos
seguintes requisitos:
I -
habilitação em concurso público de provas e títulos;
II -
nacionalidade brasileira;
III -
capacidade civil;
IV - quitação
com as obrigações eleitorais e militares;
V - diploma
de bacharel em direito;
VI -
verificação de conduta condigna para o exercício da profissão.
(...)
Art. 21. O
gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro
é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz
respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe
estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e
de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na
prestação dos serviços.
Art. 22. Os
notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus
prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia,
assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos
prepostos.”
Aliás, sobre o tema, confira-se o entendimento da E. Corte Suprema sobre a natureza e contornos da atividade notarial:
“(...) o STF
possui entendimento consolidado de que a atividade notarial e de registro é
essencialmente distinta da atividade exercida pelos poderes de Estado, de modo
que o titular da serventia extrajudicial não é servidor e com este não se
confunde (...). Os serviços notariais e de registro possuem regime jurídico de
caráter privado, enquanto as serventias do foro judiciais fazem parte do quadro
único de servidores do Poder Judiciário local. (...)”. (MS
28.440-ED-AgR, voto do rel. min. Teori
Zavascki, julgamento em 19-6-2013, Plenário, DJE de
7-2-2014.)
“Regime
jurídico dos servidores notariais e de registro. Trata-se de atividades
jurídicas que são próprias do Estado, porém exercidas por particulares mediante
delegação. Exercidas ou traspassadas, mas não por conduto da concessão ou da
permissão, normadas pelo caput do
art. 175 da Constituição como instrumentos contratuais de privatização do
exercício dessa atividade material (não jurídica) em que se constituem os
serviços públicos. A delegação que lhes timbra a funcionalidade não se traduz,
por nenhuma forma, em cláusulas contratuais. A sua delegação somente pode
recair sobre pessoa natural, e não sobre uma empresa ou pessoa mercantil, visto
que de empresa ou pessoa mercantil é que versa a Magna Carta Federal em tema de
concessão ou permissão de serviço público. Para se tornar delegatária do Poder
Público, tal pessoa natural há de ganhar habilitação em concurso público de
provas e títulos, e não por adjudicação em processo licitatório, regrado, este,
pela Constituição como antecedente necessário do contrato de concessão ou de
permissão para o desempenho de serviço público. (...)”. (ADI 2.415, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 10-11-2011, Plenário, DJE de
9-2-2012).
Desse modo, na esteira dos entendimentos apresentados, se não compete ao ente municipal o desempenho da função notarial, não poderia este, por conseguinte, cobrar tributo sobre as referidas funções desempenhadas por particulares em razão de mandamento constitucional, vez que, reitera-se, não há qualquer serviço prestado pelo Município no caso em tela, de sorte que a exigência da “Taxa Administrativa”, em razão de “averbações para efeitos de registro e cadastro”, resta eivada de inconstitucionalidade ante sua ofensa ao art. 160, II da CE/89.
No entanto, como a redação do comando reveste-se de ambiguidade e imprecisão no tocante aos elementos essenciais da exação, atributos esses, frise-se, que não deveriam estar presentes quando da instituição de quaisquer diplomas normativos, ainda mais na seara fiscal, é possível que o legislador municipal estivesse almejando tributar a lavratura de termo firmado pelo particular junto à Administração, o que, outrossim, evidencia situação incompatível com a Carta Bandeirante, pelos motivos que se seguem.
Conforme estabelece a Constituição Paulista, somente é conferida ao ente tributante a competência para instituir taxas em razão do poder de polícia ou pela oferta de serviços públicos. Vejamos:
“Artigo 160 - Compete ao Estado instituir:
(...)
II - taxas em razão do exercício do poder
de polícia, ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos de
sua atribuição, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a
sua disposição;”
A despeito de mencionar apenas a competência do Estado-membro à edição da aludida espécie tributária, cumpre ressaltar que as disposições da Constituição Estadual se aplicam aos Municípios circunscritos em seus limites territoriais, vide o disposto no art. 144 da Carta Paulista:
“Artigo
144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e
financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios
estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”
Pois bem.
Afastando a natureza de poder de polícia das “Taxas Administrativas” ora vergastadas, ante a ausência desse atributo em seu fato gerador, compete perquirir se a taxa em comento poderia ser editada sob a alegação da existência de serviço público na situação, a fim de ser possível sua exigência.
À luz do comando constitucional disciplinador da matéria, as
taxas cobradas em razão de serviços públicos fruídos ou postos à disposição do
contribuinte devem respeitar três critérios essenciais e cumulativos para sua
legitimidade, sendo estes: (a) Existência
de serviço público; (b) Especificidade
do serviço; e (c) Divisibilidade do
serviço em relação a seus usuários.
Dentre os requisitos mencionados, perceba-se que o Constituinte Derivado, reproduzindo a mens legis da Carta Republicana Federal, impõe como critério primordial à edição desta espécie de taxa a existência de serviço público, de sorte que sua definição, portanto, é o ponto fulcral ao deslinde da questão.
Ante conceito perfilado por doutrina balizada, o instituto em comento possui os seguintes contornos:
“Toda
atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de
direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e
secundárias da coletividade” (Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, p. 350).
Do exame da definição supramencionada, é possível concluir que a existência de serviço público requer a prestação de atividade voltada à satisfação de necessidades individuais dos membros da coletividade, sejam de caráter essencial ou secundário.
Aliás, se analisada a fundo, a própria locução examinada evidencia uma carga semântica que de per si revela seu animus existencial, posto que outra interpretação não poderia ser extraída de “serviço público” senão a de que esta atividade é ofertada ao público no seu interesse individualizado, ou seja, disposta em prol da coletividade, embora seja fruída por cada um dos contribuintes.
Todavia, em flagrante oposição à ideia apresentada, não é o que se percebe no caso em apreço.
Quando o legislador municipal estabelece como fatos geradores as ações de “emissão de despachos, termos, registros e averbações para autorizações, permissões e concessões”, como também “averbações para efeitos de registro e cadastro”, é visível que as atividades em questão não possuem qualquer traço de serviço público, haja vista não estarem direcionadas à oferta de serviços à coletividade.
Em verdade, as ações descritas como hipóteses de incidência da “Taxa Administrativa” nada mais são que atividades realizadas no interesse da Administração em descentralizar a execução de serviços públicos de sua titularidade, não havendo na hipótese qualquer serviço a ensejar a cobrança da aludida exação.
Quando o Poder Público despacha ou lavra termo com particulares para autorizações, permissões ou concessões o faz no seu próprio interesse imediato, buscando descentralizar a execução de serviços que prima facie deveriam ser por ele efetivados, mas que acabam sendo delegados a entidades da Administração indireta (delegação legal) ou a particulares (delegação negocial), após procedimento licitatório, a fim de potencializar a sua prestação e permitir ao Estado a racionalização de sua atuação, pois é notória a sua incapacidade para atuar em todos os espectros comunitários, de modo que a partir do fenômeno da “desestatização”, termo este cunhado na Lei Federal 9.491/97, restou clara a opção do Estado de se afastar da posição de executor de certas atividades e serviços, delegando-as a terceiros.
Em face da clareza solar no tocante à inexistência de serviço público na hipótese de incidência da “Taxa Administrativa” prevista nos incisos IV e VII do art. 216, porquanto, repise-se, a emissão de termos, despachos, averbações para autorizações, permissões ou concessões, é de interesse imediato da Administração, não se podendo em hipótese alguma falar em serviço estatal na problemática trazida a lume, é patente a inconstitucionalidade da referida exação.
Assim, no esteio das considerações tecidas no decorrer deste
tópico, resta clara a incompatibilidade da “Taxa administrativa” prevista nos incisos IV e VII do
art. 216, bem como do inciso VII do art. 219 da Lei n. 950/89, com o disposto
no inciso II do art. 160 da Carta Paulista.
DA
INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO II DO ART. 216 E DO INCISO II DO ART. 219 DA
LEI N. 950/89, POR IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE
TRIBUTO PARA A OBTENÇÃO DE CERTIDÕES DESTINADAS A ESCLARECIMENTOS PESSOAIS.
Anote-se, inicialmente, que em tópico anterior restou demonstrada a inconstitucionalidade desde dispositivo por afronta ao princípio da legalidade tributária.
Como consequência do desrespeito ao referido princípio, diante da generalidade dos dispositivos, a inconstitucionalidade também deverá ser analisada por outro fundamento.
Conforme estabelece o Constituinte Derivado, na Carta Bandeirante de 1989, é defeso ao ente político tributante instituir taxa sobre a obtenção de certidões em repartições públicas, ex vi do disposto no art. 164, II, da Lei Fundamental Paulista, lembrando que tal preceito normativo apenas reproduz garantia individual anteriormente estabelecida na Constituição Federal (art. 5º, XXXIV, alínea “b”):
“Artigo 164 –
É vedada a cobrança de taxas:
(...)
II - para a obtenção de certidões em repartições públicas,
para defesa de direitos e esclarecimentos de interesse pessoal.”
“Artigo 5º
(...)
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do
pagamento de taxas:
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para
defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;”
Ou seja, no dispositivo supramencionado a Carta Bandeirante, em estrita simetria com o enunciado inserto na Lei Fundamental de 1988, estabeleceu uma limitação ao poder de tributar, via imunidade tributária, sobre as taxas de obtenção de certidões em repartições públicas à defesa de direitos e esclarecimentos pessoais, visando garantir aos administrados a efetivação de certos direitos fundamentais, como ampla defesa e devido processo legal, posto que ao retirar do âmbito da competência tributária dos entes a edição de exação desse jaez o legislador constitucional preserva o acesso do cidadão a documentos públicos que lhe permitem a sua defesa em face de ilegalidades e abusos cometidos tanto pelos poderes públicos como por particulares em colaboração, construindo, assim, a tão almejada sociedade justa, objetivada pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 3º, inciso I.
Sobre o tema das imunidades tributárias, relevante colacionar o entendimento arquitetado no seio do E. Supremo Tribunal Federal acerca da importância do aludido instituto, que se reveste de verdadeira garantia constitucional em defesa de liberdades públicas consagradas na Lex Fundamentalis de 1988, tais como a liberdade de culto, liberdade sindical, liberdade de organização partidária, dentre outros. Ante a precisão do voto proferido na ADI 939, pede-se vênia à transcrição de excerto da r. decisão:
“A imunidade
tributária não constitui um fim em si mesma. Antes, representa um poderoso fato
de contensão do arbítrio do estado na medida que esse postulado da
constituição, inibindo o exercício da competência impositiva pelo Poder
Público, prestigia, favorece e tutela o espaço em que florescem aquela
liberdades públicas. (...)” (ADI
939/DF. Min. Sydney Sanches. Tribunal Pleno. Julgamento: 15/12/1993).
Aliás, na esteira das considerações apresentadas, invoca-se novamente o entendimento da Corte Suprema para demonstrar a envergadura constitucional do presente direito resguardado pela imunidade prevista nas Cartas Federal e Estadual, cujo desígnio releva, de per si, a importância em se afastar da tributação a exação em comento:
“O direito à
certidão traduz prerrogativa jurídica, de extração constitucional, destinada a
viabilizar, em favor do indivíduo ou de uma determinada coletividade (como a
dos segurados do sistema de previdência social), a defesa (individual ou
coletiva) de direitos ou o esclarecimento de situações. (...).” (RE 472.489-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 29-4-2008, 2ª Turma, DJE de 29/08/2008).
Assim, resta clara a incompatibilidade dos
enunciados ora impugnados com o art. 164, II da CE/89, sendo imperiosa,
portanto, a declaração de inconstitucionalidade do inciso II do art. 216 e do
inciso II do art. 219 da Lei n. 950/89.
DA
INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO V DO ART 216, DO INCISO IV DO ART. 219 E DO
PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 218.
De início, cumpre mencionar ser inconstitucional a instituição de exação
tributária que cria óbice ao direito fundamental de petição, cuja previsão
encontra-se plasmada na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, XXXIV, alínea
“a”) e resta protegida na Carta Bandeirante, especificamente em seu art. 164,
inciso I.
No caso, prevê a lei municipal no inciso V do art. 216 uma “Taxa Administrativa”,
cujo fato gerador se manifesta quando do “protocolamento de papéis, petições
requerimentos, abaixo-assinados e similares”.
Além disso, dispõe no paragrafo único do art. 218 que será devida a
cobrança de “Taxa Administrativa” sempre “que instrumento qualquer for
protocolado, expedido, anexado, desentranhado, fornecido emitido ou devolvido”.
Ou seja, no uso de sua competência tributária para a instituição do
tributo em comento, entendeu o legislador municipal ser cabível a taxação de
atividade estatal desempenhada quando do recebimento de documento da lavra de
particular, independente da natureza do peticionamento ou do animus de seu autor.
Ocorre que a instituição de taxa voltada ao custeio de tal peticionamento
resta eivada de patente inconstitucionalidade material, porquanto o art. 164,
inciso I, da Carta Bandeirante é expresso ao vedar qualquer tributação
incidente sobre o exercício do consagrado direito de petição, destinado à
defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. Vejamos:
“Artigo 164 -
É vedada a cobrança de taxas:
I - pelo
exercício do direito de petição ao Poder Público em defesa de direitos ou
contra ilegalidade ou abuso de poder;”
E nem poderia ser diferente, vez que o direito de petição aduzido no
texto magno de 1988 configura-se mecanismo assaz relevante ao controle
administrativo, não podendo o legislador infraconstitucional, muito menos o
Constituinte Derivado Reformador ou Decorrente, tolher tal instrumento dos
detentores do poder constituinte, sob pena de afronta a diversos preceitos
constitucionais, em especial à cidadania, prevista como um dos fundamentos da
República Federativa do Brasil (art. 1º, II, CF/88).
Acerca dos contornos do direito de petição, confira-se o entendimento
sedimentado no seio da jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal. In verbis:
“O direito de
petição, presente em todas as Constituições brasileiras, qualifica-se como
importante prerrogativa de caráter democrático. Trata-se de instrumento
jurídico-constitucional posto à disposição de qualquer interessado – mesmo
daqueles destituídos de personalidade jurídica –, com a explícita finalidade de
viabilizar a defesa, perante as instituições estatais, de direitos ou valores
revestidos tanto de natureza pessoal quanto de significação coletiva. (...).” (ADI 1.247-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17-8-1995, Plenário, DJ de 8-9-1995.)
Portanto, dada a envergadura constitucional do instrumento em apreço,
haja vista ser espécie de direito subjetivo do administrado voltado não somente
a sua defesa em face de atuações abusivas e/ou ilegais do Poder Público, mas
também à higidez da atuação administrativa, que apenas é legitimamente desenvolvida
quando esteja sob a égide de preceitos constitucionais impostos pela Carta
Maior, em especial a legalidade, é defeso qualquer ato estatal destinado a
impedir seu exercício, de sorte que, nesse diapasão, não outro entendimento pode
ser patrocinado senão o da flagrante inconstitucionalidade do inciso V do art.
216, do paragrafo único do art. 218 e do inciso IV do art. 219 da Lei n. 950/89.
III – Pedido
Face ao exposto, requerendo o recebimento e o
processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para
declarar a inconstitucionalidade dos incisos I, II, III, IV, V, VII, VIII do art. 216, do
parágrafo único do art. 218 e dos incisos I, II, III, IV, VII, VIII do art. 219
da Lei n. 950, de 29 de dezembro de 1989, do Município de Monte Azul Paulista.
Requer-se ainda
sejam requisitadas informações ao Prefeito e à Câmara Municipal de Monte Azul
Paulista, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se
manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista,
posteriormente, para manifestação final.
Termos em
que, pede deferimento.
São Paulo, 14 de julho de
2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de
Justiça
wpmj/acssp
Protocolado n. 46.753/15
Objeto: representação para controle de constitucionalidade
da criação das taxas municipais constantes na Lei n. 950, de 29 de dezembro de
1989, do Município de Monte Azul Paulista.
1. Promova-se a distribuição de ação
direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado incluso, em face dos
incisos I, II, III, IV, V, VII, VIII do art. 216, do parágrafo único do art.
218 e dos incisos I, II, III, IV, VII, VIII do art. 219 da Lei n. 950, de 29 de
dezembro de 1989, do Município de Monte Azul Paulista, junto ao Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 14 de julho de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de
Justiça
wpmj/acssp