EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado n. 11.148/15
Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Leis do Município de Presidente Prudente. Denominação de logradouros e próprios públicos. Iniciativa parlamentar. Reserva da Administração. Separação de Poderes. Nome de pessoa viva. Violação aos princípios da moralidade e da impessoalidade. 1. A denominação de bens, prédios, logradouros e vias do patrimônio público é ato privativo da gestão administrativa reservada ao Chefe do Poder Executivo. 2. Leis municipais de iniciativa parlamentar que usurpam a reserva da Administração, com ofensa ao princípio da separação dos poderes (art. 5º, art. 47, II e XIV, e art. 144 da Constituição do Estado). 3. Atribuir nome de pessoa viva a próprios públicos viola os princípios da moralidade e da impessoalidade (art. 111, art. 115, § 1º, e art. 144 da Constituição do Estado).
O PROCURADOR-GERAL
DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no
art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de
1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso
IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90,
inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações
colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 11.148/15), vem perante esse Egrégio
Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da expressão “ou com mais de 65
(sessenta e cinco) anos de idade” constante na alínea “b” do inciso I do art.
1° e do art. 3- A da Lei n. 5.609, de 5 de julho de 2001, das Leis n. 5.651/01,
n. 5.716/02, n. 5.845/02, n. 5.887/03, n. 5.888/03, n. 5.893/03, n. 5.931/03,
n. 6.070/03, n. 6.105/03, n. 6.107/03, n. 6.115/03, n. 6.121/03, n. 6.160/04,
n. 6.261/04, n. 6.165/04, n. 6.176/04, n. 6.201/04, n. 6.202/04, n. 6.203/04,
n. 6.210/04, n. 6.211/04, n. 6.229/04, n. 6.230/04, n. 6.235/04, n. 6.241/04,
n. 6.276/04, n. 6.299/04, n. 6.317/04, n. 6.354/05, n. 6.415/05, n. 6.434/06,
n. 6.549/06, n. 6.631/07, n. 6.714/08, n. 6.756/08, n. 6.870/08, n. 6.871/08,
n. 6.874/08, n. 7.027/09, n. 7.037/09, n. 7.038/09, n. 7.111/09, n. 7.157/10, n.
7.267/10, n. 7.268/10, n. 7.327/10, n. 7.360/10, n. 7.407/10, n. 7.437/10, n. 7.513/11,
n. 7.531/11, n. 7.532/11, n. 7.533/11, n. 7.550/11, n. 7.568/11, n. 7.569/11,
n. 7.633/11, n. 7.854/12, n. 7.859/12, n. 7.866/12, n. 7.874/12, n. 7.890/12,
n. 7.892/12, n. 7.939/12, n. 7.955/12, n. 7.962/12, n. 7.963/12, n. 7.964/12,
n. 7.965/12, n. 7.966/12, n. 7.967/12, n. 7.968/12, n. 7.969/12, n. 7.970/12,
n. 7.971/12, n. 7.972/12, n. 7.973/12, n. 7.974/12, n. 7.975/12, n. 7.976/12,
n. 7.977/12, n. 8.134/13, n. 8.205/13, n. 8.218/13, n. 8.435/14, n. 8.456/14,
n. 8.548/14, n. 8.620/14, n. 8.629/14, n. 8.650/14, n. 8.667/14, n. 8.670/14,
n. 8.671/14, n. 8.676/14, n. 8.689/14, n. 8.698/14, n. 8.704/14, n. 8.708/14,
n. 8.774/15, n. 8.780/15, do Município de Presidente Prudente, pelos fundamentos expostos a seguir.
I.
ATO
NORMATIVO IMPUGNADO
A
Lei n. 5.609, de 05 de julho de 2001, que “dispõe sobre a denominação de
prédios, logradouros e repartições públicas e dá outras providências.”, do
Município de Presidente Prudente, no que interessa dispõe:
“Art. 1° A prédios, logradouros e
repartições públicas municipais poderão ser atribuídos nomes de personalidades
nacionais ou estrangeiras, desde que:
I – A proposta seja acompanhada:
(...)
b) de documentos que comprove ser o
homenageado pessoa falecida ou com mais
de 65 (sessenta e cinco) anos de idade,
(...)
Art. 3 – A Em havendo prédios,
logradouros, repartições públicas liberados para atribuição de nomes, o
Presidente da Câmara Municipal de Presidente Prudente determinará a convocação
de todos os Vereadores pessoalmente ou, não sendo encontrados, através de seu
assessor, para a realização de sorteio, devendo ser sempre respeitada a ordem
de sorteio até que todos sejam contemplados de forma igualitária.
Parágrafo único. As atribuições de nomes
destinados aos Vereadores de que trata este artigo, terão sua validade dentro
do período legislativo.
(...)”
Por
sua vez, foram editadas leis, de iniciativa parlamentar, que alteram a denominação
de prédios, de logradouros e de repartições públicas do Município de Presidente
Prudente, são elas:
L
E I Nº 6.299/2004
Inclui na Lei
n.º 5.001, de 17 de dezembro de 1997, (Lei das Denominações), mais um item, nos
seguintes termos: a "CIDADE DA CRIANÇA" passa a
denominar-se "CIDADE DA CRIANÇA - AGRIPINO DE OLIVEIRA
LIMA FILHO"
Autor: Vereador OSWALDO JOSÉ VITÓRIO
ALFREDO JOSÉ
PENHA, Presidente da Câmara Municipal de Presidente Prudente, Estado de São
Paulo, nos termos do parágrafo 3º do artigo 47 da Lei Orgânica do Município de
Presidente Prudente e conforme parágrafo 2º do artigo 158 do Regimento Interno:
FAÇO SABER QUE A CÂMARA MUNICIPAL DECRETA E EU PROMULGO A SEGUINTE LEI:
Art. 1º - O
art. 1.º da Lei n° 5.001/97 (Lei das Denominações) passa a vigorar acrescido de
mais um item, nos seguintes termos:
"CIDADE DA CRIANÇA" para "CIDADE DA CRIANÇA - AGRIPINO DE
OLIVEIRA LIMA FILHO".
Art. 2º - Esta Lei entra em vigor na data de sua
publicação.
(...)
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
A lei municipal impugnada contraria frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição
Federal.
Os preceitos da Constituição
do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144, que assim
estabelece:
“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa,
administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os
princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
As leis municipais
são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre
si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar
atribuições.
§ 2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá
exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.
(...)
Artigo 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras
atribuições previstas nesta Constituição:
(...)
II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção
superior da administração estadual;
(...)
XIV - praticar os demais atos de administração, nos limites da
competência do Executivo;
(...)
Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional,
de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação,
interesse público e eficiência.
(...)”
III
- DA INCONSTITUCIONALIDADE
A –
DA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E DA IMPESSOALIDADE
A expressão “ou com mais de 65 (sessenta e cinco) anos de idade”
constante na alínea “b” do inciso I do art. 1° da Lei n. 5.609, de 5 de julho
de 2001, do Município de Presidente Prudente, é inconstitucional por violação
aos princípios constitucionais da moralidade administrativa e da impessoalidade
insculpidos no art. 111 e 115, § 1º, da Carta
Paulista, aplicável aos municípios por força do art. 144 do mesmo diploma.
Ao autorizar que seja conferido a bens públicos o nome de pessoa viva, a lei permite que tal medida seja utilizada com a finalidade de promover a imagem pessoal do homenageado perante a opinião pública, trazendo potencial de aproveitamento político, estritamente pessoal, por parte do beneficiado, em decorrência dessa situação.
Nada impedirá, entretanto, que após a realização da homenagem, com a denominação do próprio municipal ou de via pública, venha o homenageado a candidatar-se a algum cargo eletivo.
Nessa hipótese, aqui deduzida exemplificativamente, estará nitidamente caracterizada a situação de benefício pessoal do homenageado, cuja imagem terá sido, evidentemente, “alavancada” perante a opinião pública através da “propaganda” realizada pela homenagem, consistente na denominação do bem público.
Ora, utilizar a concessão de nomes a bens públicos contraria, de forma veemente, a moralidade administrativa, bem como o princípio da impessoalidade. A prática dos atos autorizados na lei, inevitavelmente, significará utilização da atividade administrativa e dos bens públicos para benefício pessoal e exclusivo da imagem dos homenageados.
A inconstitucionalidade, em situações análogas, já foi assentada na jurisprudência do Col. STF, como se infere dos julgados a seguir transcritos, aplicáveis à hipótese mutatis mutandis:
“(...)
O inciso V do art. 20 da CE veda ao Estado e aos Municípios atribuir nome
de pessoa viva a avenida, praça, rua, logradouro, ponte, reservatório de água,
viaduto, praça de esporte, biblioteca, hospital, maternidade, edifício público,
auditórios, cidades e salas de aula. Não me parece inconstitucional. O preceito
visa a impedir o culto e a promoção pessoal de pessoas vivas, tenham ou não
passagem pela Administração. Cabe ressaltar, que Proibição similar é
estipulada, no âmbito federal, pela Lei 6.454/1977. (ADI 307, voto do Rel. Min.
Eros Grau, julgamento em 13-2-2008, Plenário, DJE de 1º-7-2009.)
(...)
Publicidade de atos governamentais. Princípio da impessoalidade. (...)
O caput e o parágrafo 1º do art. 37 da CF impedem que haja qualquer tipo de
identificação entre a publicidade e os titulares dos cargos alcançando os partidos
políticos a que pertençam. O rigor do dispositivo constitucional que assegura o
princípio da impessoalidade vincula a publicidade ao caráter educativo,
informativo ou de orientação social é incompatível com a menção de nomes,
símbolos ou imagens, aí incluídos slogans, que caracterizem promoção pessoal ou
de servidores públicos. A possibilidade de vinculação do conteúdo da divulgação
com o partido político a que pertença o titular do cargo público mancha o
princípio da impessoalidade e desnatura o caráter educativo, informativo ou de
orientação que constam do comando posto pelo constituinte dos oitenta. (RE
191.668, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 15-4-2008, Primeira Turma,
DJE de 30-5-2008.)
(...)
Recorde-se, com MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO (“Direito Administrativo”, 19. Ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 94), que “sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da Administração ou do administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa”.
Parece não haver espaço para dúvida quanto à afirmação de que permitir-se a utilização de nomes de pessoas vivas para próprios municipais, ruas ou logradouros, contribuindo com isso exclusivamente para a projeção pessoal do homenageado, significa contrariar a moralidade administrativa.
De outro lado, recorda CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (“Curso de Direito Administrativo”, 25. Ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 114), ao tratar do princípio da impessoalidade, que “nele se traduz a ideia de que a Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis.”
Não resta qualquer incerteza de que a concessão de nome de pessoa viva a bens públicos a favorecerá substancialmente, em função da promoção pessoal que desse ato decorre, em futuras disputas eleitorais.
A
respeito do tema, manifestou-se esse Colendo Órgão Especial:
“DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei
Municipal nº 967 de 20 de setembro de 2002 de Caraguatatuba que altera a
redação da lei Municipal nº 739/99 para permitir a denominação de vias,
logradouros e de próprios municipais com nome de pessoa viva. Vicio formal de
inconstitucionalidade, por desvio do Poder Legislativo. Violação aos princípios
da moralidade e da impessoalidade, permitindo a prática de atos com finalidade
de promoção pessoal. Ofensa aos artigos 5°: 47, II e XIV; 111, 115 § 1º e 144
da Constituição Paulista. Inconstitucionalidade configurada. Ação procedente.
(ADI n. 0176537-94.2013.8.265.0000, Rel. Des. Péricles Piza, j. em 12/02/2014,
v.u.)
B - DA USURPAÇÃO DA RESERVA DA
ADMINISTRAÇÃO E VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES
Indubitavelmente, a denominação de logradouros e de próprios públicos trata-se de matéria de interesse local (CF, art. 30, I), dispondo, assim, os Municípios de ampla competência para regulamentá-la, pois foram dotados de autonomia administrativa e legislativa. E, vale acrescentar, não há na Constituição em vigor reserva dessa matéria em favor de qualquer dos Poderes, donde se conclui que a iniciativa das leis que dela se ocupem só pode ser geral ou concorrente.
Contudo, afigura-se necessário distinguir as seguintes
situações:
(a) a edição de regras que disponham genérica e abstratamente sobre a denominação de
logradouros e de próprios públicos, caso em que a iniciativa é concorrente;
(b) o ato de atribuir nomes a logradouros e próprios públicos, segundo as
regras legais que disciplinam essa atividade, que é da competência privativa do Executivo.
No Município, à Câmara Municipal incumbem as funções legislativas e ao Prefeito as executivas. Entre esses Poderes locais não existe subordinação administrativa ou política, mas simples entrosamento de funções e de atividades político-administrativas. “Nessa sinergia de funções é que residem a independência e a harmonia dos poderes, princípio constitucional extensivo ao governo municipal.” (Cf. HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Municipal Brasileiro”, Malheiros, São Paulo, 8.ª ed., pp. 427 e 508.)
Em sua função normal e predominante sobre as outras, a
Câmara elabora leis, isto é, normas abstratas, gerais e obrigatórias de
conduta. Esta é sua atribuição específica, bem diferente daquela outorgada ao
Poder Executivo, que consiste na prática de atos concretos de administração. Ou
seja, a Câmara edita normas gerais,
enquanto que o Prefeito as aplica aos casos particulares ocorrentes. (ob. cit.,
p. 429).
Assim, no exercício de sua função normativa, a Câmara
está habilitada a editar normas gerais, abstratas e coativas a serem observadas
pelo Prefeito, para a denominação das vias, logradouros e prédios públicos,
como, por exemplo: proibir que se atribua o nome de pessoa viva, determinar que
nenhum nome poderá ser composto por mais de três palavras, exigir o uso de
vocábulos da língua portuguesa, etc. (Cf. ADILSON DE ABREU DALLARI,
“Boletim do Interior”, Secretaria do Interior do Governo do Estado de São
Paulo, 2/103).
Ressalte-se que a nomenclatura de logradouros
públicos, que constitui elemento de sinalização
urbana, tem por finalidade precípua a orientação da população (Cf. JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Direito
Urbanístico Brasileiro”, Malheiros, São Paulo, 2.ª ed., p. 285). De fato, se
não houvesse sinalização, a identificação e a localização dos logradouros
públicos seria tarefa quase impossível, principalmente nos grandes aglomerados
urbanos.
Diverso, porém, é o ato de denominar os próprios
públicos, inclusive nos casos em que não se busca apenas permitir a orientação
da população, mas sim homenagear determinadas pessoas ou fatos históricos.
Note-se: nada obsta que o nome dado a determinado
logradouro público cumpra não só a função de permitir sua identificação e exata
localização, mas sirva também para homenagear pessoas ou fatos históricos,
segundo os critérios previamente estabelecidos em lei editada para regulamentar
essa matéria.
Definidas essas premissas básicas, entretanto, é
imperativo o reconhecimento da inconstitucionalidade dos atos normativos
impugnados nesta inicial.
Leis que conferem nomes a bens integrantes do
patrimônio público municipal não encerram o conteúdo de normas abstratas ou
teóricas, instituídas em caráter permanente e de generalidade.
Ou seja, a Câmara não pode, em nosso regime
constitucional, invadir a esfera da gestão administrativa, que cabe ao Poder
Executivo, atribuindo, especificamente e de modo individualizado, a
determinados próprios integrantes do Município, denominação concreta.
As leis formais não se mostram regras jurídicas, mas
simples atos administrativos do
Poder Legislativo, que invadem a esfera de competência constitucional do Poder
Executivo.
Na ordem constitucional vigente, que incorporou o
postulado da separação de funções, a fim de limitar o poder estatal, na
consagrada fórmula de Montesquieu, não existe a menor possibilidade de a
Administração municipal ser exercida pela Câmara, por meio de leis (Estado
legal), pois a Constituição é clara ao atribuir ao Prefeito a competência
privativa para exercer, com o auxílio dos Secretários Municipais, a direção
superior da administração municipal (CE, art. 47, II) e praticar os atos de
administração, nos limites de sua competência (CE, art. 47, XIV).
Bem por isso, aliás, ELIVAL DA SILVA RAMOS
adverte que:
“(...)
Sob a vigência de Constituições que agasalham o princípio da separação
de Poderes (...) não é lícito ao Parlamento editar, ao seu bel-prazer, leis de
conteúdo concreto e individualizante. A regra é a de que as leis devem
corresponder ao exercício da função legislativa. A edição de leis meramente
formais, ou seja, ‘aquelas que, embora fluindo das fontes legiferantes normais,
não apresentam os caracteres de generalidade e abstração, fixando, ao revés,
uma regra dirigida, de forma direta, a uma ou várias pessoas ou a determinada
circunstância’, apresenta caráter excepcional. Destarte, deve vir expressamente
autorizada no Texto Constitucional, sob pena de inconstitucionalidade
substancial. (“A Inconstitucionalidade das Leis - Vício e Sanção”, Saraiva,
1994, p. 194.)
(...)”
Nesse contexto, a aprovação de lei, de iniciativa parlamentar, que atribui nome a logradouro ou prédio público só pode ser interpretada como atentatória ao postulado constitucional da independência e harmonia entre os poderes (CE, art. 5.º).
Ao examinar assunto correlato, no julgamento da Repr.
n.º 1.117-SP, o insigne Ministro FRANCISCO REZEK consignou no seu
respeitável voto que:
“(...)
No contexto dos debates que esta matéria provocou na origem, e que
envolveram os três poderes do Estado, vez por outra afloram equívocos
conceituais de certa monta, qual o entendimento da prerrogativa de dar nome à
sede forense como atributo da propriedade imobiliária, ou a visão do Poder
Executivo como titular do domínio dos bens públicos afetos a seus próprios serviços,
tanto quanto aos da Legislatura e aos da Justiça.
Tudo isso posto de lado, porque desnecessário ao completo esquema da
questão de inconstitucionalidade que aqui se discute, reponta claro o argumento
do Presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo: parece-lhe que a
competência para dar nome a logradouros públicos, porque não disciplinada na
lei fundamental, há de sê-lo em lei ordinária; e que entre aqueles não há por
que distinguir os de uso especial da Justiça dos vinculados aos demais poderes,
ou entregues ao uso comum do povo. Aquela primeira ideia se viu desenvolver com
esmero pelos fundadores da federação norte-americana, e, dessa e de outras
fontes, foi sabidamente assimilada pelo direito público brasileiro: tudo quanto
a Carta não diz por si mesma, di-lo-á não o Governo, nem tampouco a Justiça,
mas o Congresso, compositor, por excelência, da ordem jurídica que a lei
fundamental encabeça, sem poder exaurir.
Essa regra eminente traz, porém, consigo, duas presunções tácitas, a
ditar-lhe o exato contorno. A primeira é a de que esse espaço a ser preenchido
pela produção congressional reclame substância normativa, vestida da abstração
e da generalidade que lhe são próprias. A segunda, indissociável da precedente,
é a de que o vasto domínio dos poderes implícitos do Congresso não pretenda
estender-se sobre área reservada pela lei fundamental às prerrogativas do
Executivo e do Judiciário, com todos os desdobramentos necessários a que se não
lhes afronta a independência.
(...)”
Em suma, a concessão de denominação a determinado bem municipal é ato concreto de administração, parte integrante do serviço público de sinalização urbana, cujo único responsável é o Prefeito.
Não há como aceitar a interpretação que inclui no rol
dos poderes implícitos da Câmara a competência para editar leis formais,
desvestidas dos atributos de generalidade e abstração, tampouco estender esses
poderes sobre área de atuação exclusiva do Poder Executivo, a quem compete
administrar os bens públicos e prestar os serviços públicos municipais. O ato
de atribuir nomes a logradouros ou prédios públicos é mero corolário do poder
de administrar.
Bem a propósito, ao examinar leis de conteúdo
semelhante, esse egrégio Tribunal de Justiça decidiu que:
“AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS Nº 10.222/2012, 10.296/2012 E
10.367/2012, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE ATRIBUEM NOME A LOGRADOUROS E
ESCOLA DO MUNICÍPIO DE SOROCABA. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA AÇÃO PARA
CONTROLE CONCENTRADO DE NORMA DE CARÁTER CONCRETO. AÇÃO ADEQUADA. POSSIBILIDADE
DE SUBMISSÃO DE NORMAS SEM CARÁTER DE GENERALIDADE A CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE. ATOS EDITADOS SOB A FORMA DE LEI. AUSÊNCIA DE DISTINÇÃO
PELO CONSTITUINTE ENTRE LEIS DOTADAS DE GENERALIDADE E AQUELOUTRAS, CONFIRMADAS
SEM O ATRIBUTO DA GENERALIDADE E ABSTRAÇÃO. INADMISSIBILIDADE DA ISENÇÃO DE
ATOS APROVADOS SOB A FORMA DE LEI DO CONTROLE ABSTRATO DE NORMAS. PRECEDENTES
DA CORTE SUPREMA. PRELIMINAR AFASTADA.
AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS Nº 10.222/2012, 10.296/2012 E
10.367/2012, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE ATRIBUEM NOME A LOGRADOUROS E
ESCOLA DO MUNICÍPIO DE SOROCABA. VÍCIO DE INICIATIVA. AFRONTA AO PRINCIPIO DA
SEPARAÇÃO DOS PODERES. ATRIBUIÇÃO DE NOMES AOS BENS, PRÉDIOS, LOGRADOUROS E
VIAS QUE É ATO DE ORGANIZAÇÃO DE SINALIZAÇÃO MUNICIPAL, DE INICIATIVA EXCLUSIVA
DO CHEFE DO EXECUTIVO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 5º, 47, II E XIV E 144 DA CARTA
BANDEIRANTE. AÇÃO PROCEDENTE.” (ADI nº 2032984-81.2015.8.26.0000, Rel. Des. Xavier
de Aquino, j. em 29/07/2015, v.u).
Em suma, a Câmara não pode arrogar a si a competência para autorizar a prática de atos concretos de administração. E a nomenclatura de logradouros e próprios públicos - que constitui atividade relacionada ao serviço público municipal de sinalização e identificação - enquadra-se exatamente nessa hipótese, resultando, daí, a conclusão inafastável de que as leis em epígrafe são manifestamente incompatíveis com o princípio da separação dos poderes.
Estas são as razões para o
reconhecimento da inconstitucionalidade
formal dos atos normativos impugnados, por afronta aos arts. 5º e 47, II e XIV,
da Constituição Paulista, cuja observância é obrigatória pelos municípios por força do art. 144 do mesmo diploma.
Por fim, também sob a ótica da reserva da
Administração e do princípio da separação de poderes, forçoso o
reconhecimento da inconstitucionalidade material do disposto no art. 3- A da Lei n. 5.609,
de 5 de julho de 2001, do Município de Presidente Prudente, cujo conteúdo refere-se a eventual “sorteio”
dentre os parlamentares no caso de haver prédios, logradouros ou repartições
públicas disponíveis para denominação.
IV)
CONCLUSÃO E PEDIDO
Diante de todo o
exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação
declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a
inconstitucionalidade da expressão “ou com mais de 65 (sessenta e cinco) anos
de idade” constante na alínea “b” do
inciso I do art. 1° e do art. 3- A da Lei n. 5.609, de 5 de julho de 2001,
das Leis n. 5.651/01, n. 5.716/02, n. 5.845/02, n. 5.887/03, n. 5.888/03, n.
5.893/03, n. 5.931/03, n. 6.070/03, n. 6.105/03, n. 6.107/03, n. 6.115/03, n.
6.121/03, n. 6.160/04, n. 6.261/04, n. 6.165/04, n. 6.176/04, n. 6.201/04, n.
6.202/04, n. 6.203/04, n. 6.210/04, n. 6.211/04, n. 6.229/04, n. 6.230/04, n.
6.235/04, n. 6.241/04, n. 6.276/04, n. 6.299/04, n. 6.317/04, n. 6.354/05, n.
6.415/05, n. 6.434/06, n. 6.549/06, n. 6.631/07, n. 6.714/08, n. 6.756/08, n.
6.870/08, n. 6.871/08, n. 6.874/08, n. 7.027/09, n. 7.037/09, n. 7.038/09, n.
7.111/09, n. 7.157/10, n. 7.267/10, n. 7.268/10, n. 7.327/10, n. 7.360/10, n.
7.407/10, n. 7.437/10, n. 7.513/11, n. 7.531/11, n. 7.532/11, n. 7.533/11, n.
7.550/11, n. 7.568/11, n. 7.569/11, n. 7.633/11, n. 7.854/12, n. 7.859/12, n.
7.866/12, n. 7.874/12, n. 7.890/12, n. 7.892/12, n. 7.939/12, n. 7.955/12, n.
7.962/12, n. 7.963/12, n. 7.964/12, n. 7.965/12, n. 7.966/12, n. 7.967/12, n.
7.968/12, n. 7.969/12, n. 7.970/12, n. 7.971/12, n. 7.972/12, n. 7.973/12, n.
7.974/12, n. 7.975/12, n. 7.976/12, n. 7.977/12, n. 8.134/13, n. 8.205/13, n.
8.218/13, n. 8.435/14, n. 8.456/14, n. 8.548/14, n. 8.620/14, n. 8.629/14, n.
8.650/14, n. 8.667/14, n. 8.670/14, n. 8.671/14, n. 8.676/14, n. 8.689/14, n.
8.698/14, n. 8.704/14, n. 8.708/14, n. 8.774/15, n. 8.780/15, do Município de
Presidente Prudente.
Requer-se,
ainda, que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor
Prefeito Municipal de Presidente Prudente, bem como posteriormente citado o
Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se deferimento.
São Paulo, 31 de agosto de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
aaamj/acssp
Protocolado nº 11.148/15
Assunto: Inconstitucionalidade de Leis do Município de Presidente Prudente.
1.
Distribua-se a inicial da ação direta de
inconstitucionalidade.
2.
Oficie-se ao interessado, com o envio de cópias,
comunicando-se a propositura da ação.
3.
Cumpra-se.
São
Paulo, 31 de agosto de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça