EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

 

Protocolado nº 55.379/15

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, do Município de Castilho. Inexistência do direito à revisão geral anual aos agentes políticos municipais. Inadmissibilidade da revisão do subsídio de agentes políticos (art. 115, XI e XV, CE). Princípios da moralidade e da anterioridade. 1. Não gozam os agentes políticos municipais dos direitos à revisão geral anual (art. 115, XI, Constituição Estadual), em obséquio às regras de anterioridade da legislatura e da inalterabilidade do subsídio durante esse período (art. 29, VI, da Constituição Federal), iluminadas pelos princípios da moralidade administrativa (CE, art. 111) e atraídas pela remissão do art. 144 da Constituição Estadual aos princípios da Constituição Federal. 2.  A revisão dos subsídios dos cargos de Prefeito, Vice-Prefeito, Vereadores e Presidente da Câmara Municipal deverá ocorrer em cada legislatura para subsequente. Violação aos arts. 5°, 111, 115, XI e XV, e 144, da Constituição Estadual. 3. Descabe o controle abstrato de constitucionalidade de lei revogada (Lei nº 1.900, de 29 de setembro de 2008, Lei nº 1.901, de 29 de setembro de 2008, Lei nº 2.026, de 18 de maio de 2010, Lei nº 2.117, de 24 de maio de 2011 e Lei nº 2.189, de 18 de abril de 2012), sem prejuízo da fiscalização difusa por via de ação ou exceção (PGJ, Enunciado nº 37).

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, da Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e da Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, todas do Município de Castilho, pelos fundamentos a seguir expostos.

I – OS AtoS NormativoS ImpugnadoS

A propositura da presente ação direta decorre de representação endereçada a esta Procuradoria-Geral de Justiça pela DD. 2ª Promotora de Justiça de Andradina, Doutora Regislaine Topassi (fls. 02/03).

As leis ora impugnadas assim dispõem:

Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013:

"Dispõe sobre a revisão anual de subsídios"

[...]

"Art. 1º. Ficam os subsídios dos Vereadores da Câmara Municipal de Castilho, do Prefeito e Vice-Prefeito do município, atualizados mediante a aplicação do percentual de 5,46% (cinco vírgula quarenta e seis por cento).

Art. 2º. As despesas decorrentes da presente Lei correrão por conta de dotações orçamentárias constantes do orçamento vigente, suplementadas se necessário.

Art. 3º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a partir de 1ª de abril de 2013, revogadas as disposições em contrário."

Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014:

"Dispõe sobre a concessão de revisão anual dos subsídios."

[...]

"Art. 1º. Ficam os subsídios dos Vereadores da Câmara Municipal de Castilho, do Prefeito e Vice-Prefeito do município, atualizados mediante a aplicação do percentual de 6,15% (seis vírgula quinze por cento).

Art. 2º. As despesas decorrentes da presente Lei correrão por conta de dotações orçamentárias constantes do orçamento vigente, suplementadas se necessário.

Art. 3º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a partir de 1ª de abril de 2014, revogadas as disposições em contrário."

         Além disso, a Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do Município de Castilho, dispõe:

“Art. 1º. O subsídio dos Vereadores e do Presidente da Câmara Municipal de Castilho-SP, para a legislatura 2013/2016, ficam fixados em R$ 4.883,37 (quatro mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta e sete centavos).

Art. 2º. As faltas injustificáveis de Vereadores às sessões ordinárias importarão em um desconto da importância de R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta reais).

Parágrafo único. Os descontos de que trata o presente artigo poderão ser compensados à razão de R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta reais), para cada sessão extraordinária, durante o respectivo mês, que o Vereador tenha comparecido ou justificado a sua ausência.

Art. 3º. Os presentes subsídios poderão ser revistos, para fins de atualização anual.

Art. 4º. Esta Lei, após sua publicação, entrará em vigor em primeiro de janeiro de 2013, revogadas as disposições em contrário." (grifou-se)

Por fim, a Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, do Município de Castilho, dispõe:

“Art. 1º. O subsídio do Prefeito Municipal de Castilho/SP, para o mandato de 2013/2016, fica fixado em R$ 16.590,93 (dezesseis mil quinhentos e noventa reais e noventa e três centavos).

Art. 2º. Será atribuído ao Vice-Prefeito Municipal um subsídio mensal no valor de R$ 4.883,37 (quatro mil oitocentos e oitenta e três reais e trinta e sete centavos).

Art. 3º. Os presentes subsídios poderão ser revistos, para fins de atualização anual.

Art. 4º. O Prefeito Municipal licenciado por motivo de moléstia, devidamente comprovada, fará jus ao subsídio integral ora fixado.

Art. 5º. Esta Lei, após sua publicação, entrará em vigor em primeiro de janeiro de 2013, revogadas as disposições em contrário." (grifou-se)

         As leis impugnadas, sobre concederem revisão geral anual do subsídio aos Vereadores, ao Prefeito e ao Vice-Prefeito de Castilho, violam a "regra da legislatura".

A inconstitucionalidade dos diplomas legais decorre: i) de terem estabelecido a revisão geral anual dos subsídios aos agentes políticos, violando, assim, o art. 115, XI, da CE, parâmetro de controle de constitucionalidade na esfera estadual e cuja inconstitucionalidade, à luz do art. 37, X, da CF, jamais foi declarada; ii) de sua vigência a partir da publicação da lei, com efeitos retroativos inclusive, ferindo, assim, a "regra da legislatura" prevista no art. 29, VI, c.c. o art. 37, ambos da CF e os princípios da moralidade (CE, art. 111) e da anterioridade (CF, art. 29 c.c. o art. 144 da CE).

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

         Os atos normativos impugnados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31, da Constituição Federal.  Os atos normativos objurgados violam os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

XI – a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data e por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso;

(...)

 

 

 

(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

Também violam frontalmente o próprio art. 144 da Constituição Estadual e o art. 29, VI, da Constituição Federal, que assim dispõe:

“Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

(...)

VI – o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subsequente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos:

(...)”.

É que o art. 144 da Constituição Estadual, que determina a observância na esfera municipal, além das regras da Constituição Estadual, dos princípios da Constituição Federal, é denominado “norma estadual de caráter remissivo, na medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia municipal, remete para as disposições constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello, 18-10-2010, DJe 26-10-2010).

A – DA INEXISTÊNCIA DE REVISÃO GERAL ANUAL AOS AGENTES POLÍTICOS

O art. 115, XI, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, X, da Constituição Federal, não ampara aos agentes políticos municipais a revisão geral anual do subsídio à vista do art. 29, VI, da Constituição Federal.

Embora não estejam necessariamente atreladas revisão geral anual, resulta do ordenamento jurídico positivo que tais direitos são circunscritos aos servidores públicos e agentes políticos vitalícios por ocuparem cargos profissionais, cujo regime jurídico é marcadamente distinto daqueles que transitoriamente são investidos em cargos públicos de natureza política.

Acrescenta-se a isso o próprio impedimento gerado pela regra da anterioridade da legislatura que compreende a inalterabilidade do subsídio dos edis durante a legislatura.

Neste sentido, colaciona-se julgados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negando aos agentes políticos a revisão geral anual:

“Ação direta de inconstitucionalidade - sustentada inconstitucionalidade dos artigos 4º e 5º, caput, §§ 1º, 4º e 5º, da Lei nº 11.600, de 09 de abril de 2008, em sua redação original e na que foi dada pelo artigo 1º, I e II, da Lei nº 11.622, de 05 de maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto, que ‘Fixa os subsídios do Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários e Vereadores para a legislatura a iniciar-se em 1º de janeiro de 2009 e dá outras providências’, e ‘Dá nova redação ao parágrafo 4º e acrescenta o parágrafo 5º ao artigo 5º da Lei n° 11.600, de 09/04/08’, respectivamente - vedada é a vinculação do reajuste dos subsídios do Chefe do Poder Executivo, do Vice, e de seus auxiliares diretos à revisão geral anual do funcionalismo público municipal - é vedada a fixação dos subsídios dos Vereadores em percentual dos subsídios dos Deputados Estaduais - é vedada, ainda, a vinculação do reajuste dos subsídios dos Vereadores à revisão geral anual do funcionalismo público municipal ou à alteração dos subsídios dos Deputados Estaduais, eis que inalterável o valor daqueles durante a legislatura, por força da reintrodução pela EC 23/2000, da chamada ‘regra da legislatura’ aos parlamentares municipais - vedada é a instituição de décimo terceiro subsídio a quem tem vínculo não profissional com a Administração Pública - é vedada a expansão do subsídio como parcela única concebido, para abranger valores excedentes à remuneração do mandato parlamentar estadual (ajuda de custo, jeton, verba de gabinete e outras) violação dos artigos 1º, 111, 115, XI, XII e XV, 124, § 2º, 144 e 297, da CE - ação procedente, assentando-se, ademais, a fim de que os Vereadores da atual Legislatura de Ribeirão Preto não fiquem sem remuneração, que, a este título, na corrente receberão o subsídio que vigorou na Legislatura anterior, obviamente que sem a revisão anual e observados os limites estabelecidos no inciso VI, do art. 29 da Constituição Federal.” (TJSP, ADI 994.09.002644-6, Órgão Especial, Rel. Des. Palma Bisson, 10-02-2010, v.u.).

“O Colendo Supremo Tribunal Federal já assentou ser inconstitucional dispositivo de lei estadual vinculando a alteração do subsídio do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado ao reajuste dos vencimentos dos servidores públicos. (...)

Mutatis mutantis’ a situação é a mesma em se tratando de lei municipal que vincula a alteração do subsídio de vereador ao reajuste do funcionário público municipal. Evidente a inconstitucionalidade de dispositivo que prevê tal vinculação para o reajuste dos vereadores, porquanto também nessa hipótese ocorre violação à ‘regra da legislatura’, estatuída no artigo 29, VI, da Constituição da República. É o caso dos autos, em que a edição de lei atrelando a revisão do subsídio dos vereadores ao reajuste dos servidores municipais, ensejou alteração daquele na mesma legislatura, pelos próprios parlamentares, que assim acabaram por legislar em causa própria, em clara e inequívoca transgressão ao princípio da moralidade administrativa, que a Constituição Federal consagra (artigo 37) e protege (art. 5º, LXXIII).

Em suma, como bem anotou o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, ‘Sendo que a remuneração deve ser fixada em cada legislatura para a subsequente, não é tolerável a 'revisão anual dos subsídios',’ mesmo porque ‘Não faria sentido que, de um lado, a Carta Magna condicionasse a fixação dos subsídios dos Vereadores a legislatura e, de outro lado, mantivesse para os parlamentares, sem mais, a aplicação da regra geral do art. 37, X’ (fl. 501).

Por derradeiro, é oportuna trazer à baila vetusta decisão da Suprema Corte, da lavra do Ministro Mário Guimarães, ao julgar o RE nº 25.793/SP, em 1º de agosto de 1955, quando se decidiu que ‘Não podem as Câmaras Municipais alterar durante o período do mandato, o subsídio de seus vereadores (...), colhendo-se desse venerando acórdão citação sobre a matéria, que nos dias atuais tem inteira aplicabilidade e está assim redigida: ‘João Barbalho, comentando o art. 46, da Constituição de 91, achava que deveria a fixação do subsidio ser antes da eleição, de modo que se não soubesse quem queria o beneficiado - cautela que hoje consta da Constituição de 46, e terminava suas considerações com a citação destas palavras de Aristóteles, sempre oportuna entre nós - 'Combinai de tal forma vossas leis e vossas instituições, que os empregos não possam ser objeto de um cálculo interessado’ (V. Comentários à Constituição Federal Brasileira, pg. 235)’ (...).” (TJSP, II 161.056-0/0-00, Órgão Especial, Rel. Des. Mário Devienne Ferraz, 13-08-2008, v.u.).

Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 2º da Resolução 03/12, da Câmara Municipal de Tupã. Vinculação da revisão dos subsídios dos vereadores à dos demais servidores. Inadmissibilidade. Vinculação que ofende o art. 115, XV, da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade. Precedentes deste Órgão Especial. Ação julgada procedente. (TJSP, ADIN 0078162-58.2013.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Des. Ferreira Rodrigues, 28-05-2014, v.u.).

No mesmo sentido, é a manifestação doutrinária:

“A garantia da irredutibilidade não se estende aos agentes políticos investidos em mandatos e que não integram carreiras. Com efeito, diferentemente dos servidores públicos, esses agentes políticos não gozam da garantia, uma vez que a fixação de seus subsídios situa-se no plano das conveniências políticas. Tampouco há legitimidade na vinculação da revisão geral do funcionalismo público para fins da concessão de reajuste dos agentes políticos. A fixação dos subsídios dessa espécie de agentes políticos atende ao seu específico regime jurídico, incomparável com os demais, denotando-se limites e parâmetros diferenciados, razão pela qual não se inserem na revisão geral prevista no art. 37, X, da Constituição.

(...)

É importante ressaltar que a evolução histórico-constitucional brasileira da irredutibilidade ressalta aspectos subjetivos (de exceção passou a regra) e objetivos (enumeração taxativa da limitação de seu alcance e de sua extensão, ainda que, atualmente, pela adoção da técnica normativa da remissão a preceitos constitucionais). Se ela não é absoluta, como revelam as remissões normativas daquilo que pode decrescer a remuneração (arts. 37, XI, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I), constata-se que, a par da irredutibilidade em favor dos vencimentos dos servidores públicos estar ligada indissociavelmente ao direito de revisão geral anual (art. 37, X e XV) - porque esta poderia implicar aumento ou diminuição conforme a valorização ou não da moeda, e tendo a remuneração natureza de dívida de valor, se impede a redução - quando a Constituição Federal quis estabelecer irredutibilidade de subsídio e direito à revisão geral anual a outras espécies de agentes públicos políticos o fez expressamente, como se percebe dos citados arts. 95, III, e 128, § 5º, I, c.

Poder-se-ia afirmar que essa impressão é falsa porque nos art. 37, X e XV, há remissão explícita ao subsídio e aos vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos, mormente porque se referem ao art. 39, § 4º, cuja redação daria a impressão de abranger os agentes políticos no raio de ação do direito à revisão geral anual contido no art. 37, X. Entretanto, tal argumento despreza a obviedade: o regime remuneratório (por subsídio) de agentes políticos temporariamente investidos em mandato eletivo ou na administração superior (Ministros de Estado e Secretários de Estados e Municípios) é diferenciado do regime daqueles vitalícios em cargos isolados ou de carreira técnico-científica, e que possuem com explícita referência à irredutibilidade e a revisão geral anual (arts. 95, III, e 128, § 5º, I, c). Além disso, se essa fosse a concepção constituinte, haveria previsão expressa, nesse sentido, nos arts. 27, § 1º, 28, § 2º, 29, V e VI, 49, VII e VIII, e que, se houvesse, seria absolutamente contraditória à regra da anterioridade da legislatura (art. 29, VI), pela qual durante esse período os subsídios são inalteráveis” (Wallace Paiva Martins Junior. Remuneração dos agentes públicos, São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 166-167, 222-224).

No esteio das considerações esposadas, resta visível a ofensa dos atos normativos vergastados ao art. 115, XI, da Constituição Estadual.

B – DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NA FIXAÇÃO DO SUBSÍDIO DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO, DE SEU VICE E DOS VEREADORES

Como demonstrado, à luz do art. 29, VI, da Constituição Federal, soa descabida aos parlamentares municipais a reivindicação de revisão geral anual porque domina seu regime remuneratório a regra da anterioridade da legislatura para fixação de seu subsídio, o que impõe a conclusão de sua inalterabilidade durante esse período, como decorrência do princípio da moralidade administrativa (art. 111, Constituição Paulista).

Esta regra, por sua vez, é igualmente aplicável na fixação do valor dos subsídios do Prefeito e do Vice-Prefeito.

                  Neste sentido, estão os pronunciamentos da Suprema Corte:

“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. VEREADORES. SUBSÍDIO. AUMENTO, DE FORMA RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 29, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento no sentido de que a remuneração de Prefeito, de Vice-Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal para a legislatura subsequente, em conformidade com o art. 29, V, da Constituição Federal. 2. Caso em que inobservado o art. 29, V, da Carta Magna, pois os vereadores majoraram, de forma retroativa, sua remuneração. 3. Agravo regimental desprovido” (STF, AgR-RE 458.413-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, 06-08-2013, v.u., DJe 22-08-2013).

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SUBSÍDIOS DE PREFEITO E VEREADORES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Fixação para legislatura subsequente. Princípio da anterioridade. Precedentes. 2. O Tribunal a quo não julgou válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição da República. Inadmissibilidade do recurso pela alínea c do art. 102, inc. III, da Constituição da República. Precedente” (STF, AgR-RE 484.307-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, 23-03-2011, v.u., DJe 08-04-2011).

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREFEITO, VICE-PREFEITO E VEREADORES. REMUNERAÇÃO. MAJORAÇÃO. FIXAÇÃO. LEGISLATURA SUBSEQUENTE. ART. 29, V, DA CONSTITUIÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. I – O Tribunal de origem, ao constatar que os Atos 3 e 4/97 da Mesa da Câmara Municipal de Arapongas traduziram majoração de remuneração, agiram em conformidade com o entendimento pacífico desta Suprema Corte no sentido de que a remuneração de Prefeito, Vice-Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal, para a legislatura subsequente, de acordo com o disposto no art. 29, V, da Constituição Federal. Precedentes. III – Agravo regimental improvido” (STF, AgR-AI 776.230-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 09-11-2010, v.u., DJe 26-11-2010).

         Anote-se que a legislatura compõe-se por quatro sessões legislativas.  Ainda, de acordo com o art. 57 da Constituição Federal, cada sessão legislativa compreende o período de 2 de fevereiro a 17 de julho e o de 1° de agosto a 22 de dezembro.

         Como anteriormente demonstrado, para atender ao princípio da anterioridade a fixação dos subsídios dos cargos de Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores deverá ocorrer em cada legislatura para subsequente. 

Feitas estas considerações, a última eleição para os referidos cargos municipais ocorreu no ano de 2012. Com efeito, os subsídios para a legislatura de 2013 a 2016 deveriam ser fixados até 22 de dezembro de 2012.

Entretanto, no Município de Castilho, em 2013 foi editada a Lei nº 2.300, e no ano de 2014, a Lei nº 2.444, as quais, ao concederem revisão anual dos subsídios, terminaram por fixar novo subsídio, a vigorar no mesmo mandato e na mesma legislatura, com flagrante desrespeito ao princípio da anterioridade.

         Portanto, resta caracterizada a inconstitucionalidade dos diplomas normativos analisados por afronta ao princípio da anterioridade (inciso IV do art. 29 da Carta Federal por força do art. 144 da CE) e, consequentemente, ao princípio da moralidade insculpido no art. 111 da Carta Paulista.

III – Pedido liminar

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora, visível na quaestio iuris pelo efeito nocivo do comprometimento do erário. A atual tessitura dos atos normativos impugnados apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação.

         À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, da Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e da Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, todas do Município de Castilho.

IV – Pedido

         Ante o exposto, requer-se o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, da Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e da Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, todas do Município de Castilho.

Requer-se que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito do Município de Castilho, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 18 de agosto de 2015.

 

 

 

     Márcio Fenando Elias Rosa

     Procurador-Geral de Justiça

 

lfmm

Protocolado nº 55.379/15

Interessado: Doutora Regislaine Topassi (DDª 2ª Promotora de Justiça de Andradina)      

Assunto: inconstitucionalidade do art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, da Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e da Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, todas do Município de Castilho

 

1.      Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face do art. 3º da Lei nº 2.209, de 26 de junho de 2012, do art. 3º da Lei nº 2.210, de 26 de junho de 2012, da Lei nº 2.300, de 31 de maio de 2013 e da Lei nº 2.444, de 23 de abril de 2014, todas do Município de Castilho, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.      Arquivo o protocolado no tocante à Lei nº 1.900, de 29 de setembro de 2008, à Lei nº 1.901, de 29 de setembro de 2008, à Lei nº 2.026, de 18 de maio de 2010, à Lei nº 2.117, de 24 de maio de 2011 e à Lei nº 2.189, de 18 de abril de 2012, porquanto descabe o controle abstrato de constitucionalidade sobre diplomas revogados, sem prejuízo, no entanto, da fiscalização difusa por via de ação ou exceção (PGJ, Enunciado nº 37).

3.      Oficie-se à 2ª Promotoria de Justiça de Andradina, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 18 de agosto de 2015.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

lfmm