Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 103.814/15

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta Inconstitucionalidade. Resolução nº 02/11, da Câmara Municipal de Itariri. cargo em comissão de Assessor Jurídico da Presidência. descrição de atribuições que não representam funções de assessoramento, chefia e direção, mas de natureza meramente técnica e profissional. Exigibilidade de provimento efetivo para postos inerentes à Advocacia Pública. 1. É inconstitucional a criação de cargos de provimento em comissão cujas atribuições, ainda que descritas, não evidenciam funções de assessoramento, chefia e direção, mas, funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo, inclusive as da advocacia pública, cujo provimento deve se dar mediante aprovação em concurso público (arts. 30, 98, §§ 1º a 3º, 111, 115, II e V, CE/89). 2. Incompossível a sujeição de cargos de provimento em comissão ao regime celetista (CLT), contrariando a exigência do regime administrativo. Violação dos princípios da razoabilidade e da moralidade (art. 111, da CE/89).   

 

 

 

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (103.814/15), vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face das expressões “Regidos pela CLT” e “Assessor Jurídico da Presidência” constantes do Anexo I, e da expressão “em comissão” constante do Anexo III, todas da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – O Ato Normativo Impugnado

         A Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri, previu o cargo comissionado de Assessor Jurídico da Presidência, senão vejamos:

“(...)

ANEXO I

CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO

Regidos pela CLT

Nº DE ORDEM

QUANTIDADE

EMPREGO

PADRÃO

1

01

Assessor de Gabinete da Presidência

05

2

01

Assessor Jurídico da Presidência

13

3

01

Assessor Legislativo da Presidência

08

4

01

Assessor Parlamentar

02

5

01

Diretor de Finanças e Orçamento

08

 

(...)” (grifo nosso)

         Por sua vez, o Anexo III, da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri, assim dispõe:

“(...)

ANEXO III

DESCRIÇÃO E DETALHAMENTO DOS CARGOS E EMPREGOS

(...)

Assessor Jurídico da Presidência:

Subordinação: direta à Presidência da Câmara

Forma de Provimento: em comissão

Pré-requsito: inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil -OAB-

Descrição detalhada:

(...)” (grifo nosso)

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

         As expressões “Regidos pela CLT” e “Assessor Jurídico da Presidência” do Anexo I, e a expressão “em comissão” do Anexo III, todas constantes da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri, contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta.

Tais expressões são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Artigo 30 - À Procuradoria da Assembleia Legislativa compete exercer a representação judicial, a consultoria e o assessoramento técnico-jurídico do Poder Legislativo.

Parágrafo único - Lei de iniciativa da Mesa da Assembleia Legislativa organizará a Procuradoria da Assembleia Legislativa, observados os princípios e regras pertinentes da Constituição Federal e desta Constituição, disciplinará sua competência e disporá sobre o ingresso na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos.

(...)

Art. 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. 

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal. 

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

(...)

Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;

(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

III - DA NATUREZA ORDINÁRIA DO CARGO DE “ASSESSOR JURÍDICO DA PRESIDÊNCIA” E SUA INDEVIDA CONSTITUIÇÃO PELA VIA COMISSIONADA

Da leitura do ato normativo impugnado supra, percebe-se a tentativa do legislador municipal em discriminar as atribuições dos cargos comissionados de “Assessor Jurídico da Presidência”, criados no modelo de livre nomeação a fim de assessorar na consultoria legislativa da Câmara Municipal de Itariri, em virtude da suposta natureza fiduciária exigida dos ocupantes de cargos desse jaez.

No entanto, embora a edição do referido cargo tenha se alicerçado na forma de provimento em comissão, cujo plexo de atribuições reclama atribuições de direção, chefia e assessoramento, não se exige árdua ginástica hermenêutica para se concluir que o referido cargo revela plexo de caráter estritamente ordinário, de sorte a restar patente a inconstitucionalidade da edição dos aludidos postos nos moldes em que foram editados, pelos seguintes fundamentos.

A instituição de cargos em comissão, à luz da Carta Republicana de 1988, não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional.

Em respeito ao art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, reproduzido no art. 115, II e V, da Constituição Estadual, sua edição impõe a presença das atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo defesa, portanto, ao exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em certame de provas ou de provas e títulos (art. 115, II e V, CE).

Conforme balizada jurisprudência, não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, mas tão somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção.

Ou seja, a instituição de cargo desse jaez somente encontra fundamento legítimo quando alicerçada em atribuições de natureza especial (assessoramento, chefia e direção em nível superior), às quais se exige relação de confiança, pouco importando a denominação ou forma de provimento atribuídas, pois, verba non mutant substantiam rei.

Destarte, em obediência aos imperativos da Carta Maior, na edição de cargos comissionados se faz necessária a perquirição de sua natureza excepcional amparada no elemento fiduciário, não satisfeito pela mera declaração do legislador quando da atribuição do nome in iuris ao cargo, sendo assaz relevante uma análise do plexo de atribuições das funções públicas, que reclama as conhecidas atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes político-governamentais.

Impende consignar que remansosa é a jurisprudência neste sentido, a qual proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão dotados de atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, exigindo delas, ao revés, a demonstração efetiva da presença de funções concernentes a assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008).

Entretanto, na contramão dos entendimentos perfilhados no curso desta inicial, a Resolução nº 02/11, da Câmara Municipal de Itariri, editou os cargos vergastados em contrariedade aos mandamentos constitucionais incidentes sobre a temática.

A partir da análise das funções desempenhadas pelos ocupantes dos referidos postos, é cristalino o vício na forma elegida pelo legislador para a instituição do cargo em epígrafe, posto que suas atribuições arroladas no Anexo III do aludido diploma evidenciam funções meramente burocráticas e ordinárias, a ponto de não se permitir a excepcional via do provimento em comissão, senão vejamos:

“(...)

Assessor Jurídico da Presidência:

Subordinação: direta à Presidência da Câmara

Forma de Provimento: em comissão

Pré-requsito: inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil -OAB-

Descrição detalhada: Estuda ou examina documentos, em tramitação na Câmara, analisando seu conteúdo, com base nos Códigos e Leis, jurisprudências e outros documentos, para orientar a emissão de pareceres, nas questões legislativas, constitucionais, Orçamentárias e financeiras.

- Emite pareceres por escrito, aos projetos em tramite quando solicitado pela Presidência e a Mesa da Câmara em assuntos de natureza jurídica.

- Assessora, orienta às unidades administrativas em assuntos de natureza jurídica elaborando e/ou emitindo pareceres em processos administrativos, tais como licitações, contratos, distratos, convênios, questões trabalhistas dentre outros, visando assegurar o cumprimento das leis e regulamentos.

- Apura ou completa informações levantadas, acompanhando o processo em todas as suas fases e representando a parte que é mandatário em juízo, para obter os elementos necessários à defesa ou acusação, redigindo petições, para assegurar os direitos pertinentes ou defender interesses, colhendo informações sobre os assuntos para a tomada de decisão, apontando a melhor solução para os problemas apresentados.

- Executa outras tarefas correlatas determinadas pelo superior imediato.   

(...)” (grifo nosso)

Ora, as atividades acima grifadas não exigem de seu ocupante especial relação de confiança para com o agente político que o nomeou, porquanto não se encontram em espectro voltado à articulação, à coordenação, à supervisão e ao controle de diretrizes político-governamentais.

Em verdade, as funções descritas no acostado dispositivo revelam, isso sim, o caráter ordinário do cargo de “Assessor Jurídico da Presidência”, vez que podem ser desempenhadas por qualquer agente dotado de conhecimentos técnicos na respectiva área de atuação, não se fazendo razoável, portanto, a burla à regra de provimento erigida pelo Constituinte Originário, que se funda na escolha de agentes via concurso público, sob pena de afronta direta ao texto constitucional.

Ante os argumentos expostos, é clara a inconstitucionalidade do cargo de provimento em comissão de “Assessor Jurídico da Presidência”, previsto na Resolução nº 02/11, da Câmara Municipal de Itariri, devendo este E. Tribunal de Justiça, em prol da coesão do sistema jurídico municipal e em defesa do patrimônio público, reconhecer o vício ora apontando, afastando, por conseguinte, servidores lotados irregularmente em tais postos no âmbito municipal.

IV – IMPOSSIBILIDADE DE PROVIMENTO COMISSIONADO PARA CARGO OU EMPREGO DA ADVOCACIA PÚBLICA

         Conforme demonstrado anteriormente, a Resolução nº 02/11, da Câmara Municipal de Itariri, permitiu que o cargo de Assessor Jurídico da Presidência (previsto no Anexo I) fosse de provimento comissionado, nos termos de seu Anexo III.

         Todavia, as atividades inerentes à advocacia pública como assessoramento, consultoria e representação jurídica de entidades ou órgãos públicos são atribuições de natureza profissional e técnica e exclusivamente reservadas a profissionais investidos em cargos de provimento efetivo da respectiva carreira mediante aprovação prévia em concurso público.

         É o que se infere dos arts. 30, e 98 a 100 da Constituição Estadual que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual.

         Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público, inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes, o que é reverberado pela jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

         Portanto, é incompatível o provimento comissionado com a advocacia pública, de modo a revelar a inconstitucionalidade da expressão “Assessor Jurídico da Presidência” constante do Anexo I, e da expressão “em comissão” constante do Anexo III, da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri.

V - DO REGIME CELETISTA AOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO – VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA MORALIDADE

Finalmente, cerifica-se que os cargos de provimento em comissão, na Câmara Municipal de Itariri, nos termos da Resolução nº 02/2011, estão submetidos ao regime celetista, senão vejamos:

“(...)

ANEXO I

CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO

Regidos pela CLT

 

(...)” (grifo nosso)

A subordinação dos empregos de provimento em comissão ao regime celetista importa em franca violação aos princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade, previstos no art. 37 da Constituição Federal e no art. 111 da Constituição Estadual.

Enquanto a razoabilidade serve como parâmetro no controle da legitimidade substancial dos atos normativos, requerente de compatibilidade aos conceitos de racionalidade, justiça, bom senso, proporcionalidade etc., interditando discriminações injustificáveis e, por isso, desarrazoadas, a moralidade se presta à mensuração da conformidade do ato estatal com valores superiores (ética, boa-fé, finalidade, boa administração etc.), vedando atuação da Administração Pública pautada por móveis ou desideratos alheios ao interesse público (primário) – ou seja, censura o desvio de poder que também tem a potencialidade de incidência nos atos normativos.

Na espécie, a Resolução da Câmara Municipal infringe ambos os princípios. Como o provimento comissionado constitui exceção à regra constitucional do acesso à função pública (lato sensu) mediante concurso público, possibilitando a investidura por critérios pessoais e subjetivos, sob o pálio da instabilidade e da transitoriedade do vínculo como elementos essenciais de sua duração, é desarrazoada e imoral a outorga de prerrogativas próprias do regime contratual a seus ocupantes, tendo em conta que este sanciona a dispensa imotivada com a indenização compensatória (e outros consectários). Trata-se da atribuição de uma garantia absolutamente imprópria a uma relação jurídica precária e instável.

O padrão ordinário, normal e regular, advindo da Constituição, não admite a oneração dos cofres públicos para o custeio da exoneração de emprego comissionado, à luz da conformação constitucional que realça a liberdade de seu provimento - orientada por força de ingredientes puramente políticos. Em suma, a sujeição do emprego comissionado ao regime celetista implica intolerável outorga de uma série de vantagens caracterizadoras de privilégio inadmissível à vista da natureza do provimento em comissão cuja marca eloquente é a instabilidade ditada pela relação de confiança.

Dessa forma, inconstitucional tal previsão, por violar o art. 111 e os incisos II e V do art. 115 da Constituição Estadual ao subordinar todos os empregos de provimento em comissão criados ao regime de contratação da CLT.

VI – Pedido liminar

         À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais da Câmara Municipal de Itariri apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, de maneira a evitar oneração do erário irreparável ou de difícil reparação.

         À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação das expressões “Regidos pela CLT” e “Assessor Jurídico da Presidência” constantes do Anexo I, e da expressão “em comissão” constante do Anexo III, todas da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri.

VII – Pedido

         Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade das expressões “Regidos pela CLT” e “Assessor Jurídico da Presidência” constantes do Anexo I, e da expressão “em comissão” constante do Anexo III, todas da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri.

         Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Itariri, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

         Termos em que, pede deferimento.

                         São Paulo, 07 de outubro de 2015.

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

lfmm/dcm

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 103.814/15

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face das expressões “Regidos pela CLT” e “Assessor Jurídico da Presidência” constantes do Anexo I, e da expressão “em comissão” constante do Anexo III, todas da Resolução nº 02, de 17 de agosto de 2011, da Câmara Municipal de Itariri, junto ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.      Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 07 de outubro de 2015.

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

lfmm/dcm