EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado n. 75.229/15
Ementa:
1) Ação direta de inconstitucionalidade. Cargos de provimento em comissão criados pelo art. 7º da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela, que não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança. Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art. 144).
2) Sujeição de emprego público comissionado ao regime celetista, contrariando a exigência do regime administrativo (art. 111, art. 115, II e V, e art. 144).
O Procurador-Geral de Justiça do Estado de
São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da
Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, e em conformidade
com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da
República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da
Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no
incluso protocolado (PGJ nº 75.229/2015), vem perante esse Egrégio Tribunal de
Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE em face dos
incisos I, II, III e IV do § 2º do art. 5º; dos incisos II, III, IV e V do art.
7º; bem ainda para que haja a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem
redução de texto, da expressão “regido pela C.L.T.”, constante do art. 1º, caput, a fim de excluir o regime
celetista dos cargos de provimento em comissão, (e, por dependência, das
alíneas “b”, “c”, “d”, e “e” do inciso II do art. 4º; dos itens 2, 3, 4 e 5 do
inciso IV do art. 5º, dos incisos V, VI, VII e IX do art. 9º) todos da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela; e,
por fim, a declaração de inconstitucionalidade do Anexo II da Lei Complementar
nº 84, de 09 de dezembro de 2009, com a redação dada pela Lei Complementar nº
96, de 02 de maio de 2013, do Município de Pedra Bela, nas partes referentes
aos cargos de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola, Vice-Diretor e
Coordenador Pedagógico, pelos fundamentos expostos a seguir:
1. DOS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS
A Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, de Pedra Bela, que “Dispõe sobre o Plano de Carreira, Empregos e Remuneração do Magistério Público Municipal de Pedra Bela”, no que interessa, tem a seguinte redação (fls. 03/28):
“(...)
Art. 1º - Esta Lei estrutura e reorganiza o
Plano de Carreira e empregos do Magistério Público Municipal de Pedra Bela,
constituído do Ensino de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Educação de
Jovens e Adultos, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
nº 9.394 de 26 de dezembro de 1996, especialmente o disposto no artigo 6º da
Lei Federal 11.738/08 e na Resolução 02 de 29/05/09, da Câmara de Educação
Básica do Conselho Nacional de Educação, denominando-se Plano de Carreira e
Remuneração do Magistério, regido pela
C.L.T., tendo como princípios fundamentais:
(...)
Art. 4º - O Quadro do Magistério Municipal é
constituído de série de classes de docentes e de especialista de educação, denominados
como profissionais do ensino, integrados nos empregos públicos, na seguinte
conformidade:
(...)
II – Série de Classes de
Especialistas de Educação:
a) DIRETOR DO SERVIÇO MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO;
b) SUPERVISOR DE ENSINO;
c) DIRETOR DE ESCOLA;
d) VICE-DIRETOR DE ESCOLA;
e) COORDENADOR PEDAGÓGICO;
f) PSICOPEDAGOGO;
g) ASSESSOR TÉCNICO PEDAGÓGICO
Art. 5º - Os ocupantes de empregos públicos
de docentes e de especialistas de educação, que desenvolvem atividades de
ministrar, planejar, executar, dirigir, avaliar, orientar, coordenar e
supervisionar o ensino a nível municipal, atuarão:
(...)
IV – ESPECIALISTAS DE EDUCAÇÃO:
1. Diretor do Serviço Municipal de
Educação;
2.
Supervisor de Ensino;
3.
Diretor de Escola;
4.
Vice-Diretor de Escola;
5.
Coordenador Pedagógico;
6. Psicopedagogo;
7. Assessor Técnico Pedagógico
§ 2º - Os integrantes dos cargos de
Suporte Pedagógico exercerão suas atividades na seguinte conformidade:
I – Supervisor de
Ensino – desempenharão suas funções junto ao órgão responsável pela Educação
Municipal e exercerão as atividades de:
a)
orientação, apoio, acompanhamento e
avaliação de todas as Escolas Municipais de Pedra Bela, no processo de
planejamento escolar, elaboração, execução e avaliação da Proposta pedagógica.
b)
orientação para abertura,
acompanhamento e fiscalização das escolas infantis particulares, de acordo com
as normas emanadas do Municipal de Educação;
c)
orientação, acompanhamento e
fiscalização dos procedimentos administrativos de toda a rede de escolas
municipais e das escolas infantis particulares do município;
d)
análise e parecer de processo para
autorização de funcionamento das escolas particulares de educação infantil;
e)
representação junto ao Conselho
Municipal de Educação, quando eleito para essa função.
II – Diretor de Escola
– responsável pela Direção da Escola Municipal, deverá zelar pelo funcionamento
pedagógico e administrativo adequado e voltado para o atendimento das
necessidades da população escolar, em consonância com as diretrizes emanadas do
órgão responsável pela Educação Municipal,
III – Vice-Diretor –
co-responsável pela direção das escolas municipais, deverá assumir as funções a
ele delegadas e responder pelas atribuições de direção nas ausências e
impedimentos legais do Diretor da Escola, zelando pelo cumprimento das
diretrizes emanadas do órgão responsável pela Educação Municipal.
IV –
Professor-Coordenador – deverá desempenhar a Coordenação Pedagógica nas
unidades de ensino da rede municipal, coordenando as atividades pedagógicas,
orientando e participando, com os docentes, das ações de planejar, executar, avaliar
e reformular, se necessário, a Proposta Pedagógica da Escola;
V – Assistente Técnico Pedagógico –
deverá desempenhar a função de Assistente Técnico Pedagógico junto a Secretaria
Municipal de Ensino de Pedra Bela, coordenando e assessorando as atividades
relacionadas ao planejamento técnico da Secretaria Municipal de Ensino.
(...)
Art. 7º - Far-se-á por provimento em
comissão, de livre nomeação e exoneração pelo Prefeito Municipal, na forma da
lei, os empregos de suporte pedagógico, a saber:
I – Diretor do Serviço Municipal de
Educação;
II – Supervisor de
Ensino;
III – Diretor de
Escola;
IV – Vice-Diretor de
Escola;
V – Coordenador
Pedagógico;
VI – Assessor Técnico Pedagógico.
(...)
Art. 9º - Para o provimento dos empregos
públicos, bem como o preenchimento de funções decorrentes de serviços
transitórios na área da educação, a que se refere o artigo anterior, são
exigidos os seguintes requisitos mínimos:
(...)
V – SUPERVISOR DE
ENSINO: licenciatura plena em pedagogia e experiência mínima de 05 anos no magistério;
VI – DIRETOR DE ESCOLA:
licenciatura plena em pedagogia e experiência mínima de 4 anos no magistério;
VII – VICE-DIRETOR DE
ESCOLA: licenciatura plena em pedagogia e experiência mínima de 3 anos no
magistério;
IX – COORDENADOR
PEDAGÓGICO: preferencialmente com licenciatura plena em pedagogia e experiência
mínima de 3 anos no magistério.
(...)
Art. 15 – O quadro do Magistério Municipal,
previsto pelo artigo 4º desta lei, privativo do Serviço Municipal de Educação,
compreende empregos de provimento efetivo e em comissão, identificados pela
denominação e pela referência de salários e/ou vencimentos, na conformidade dos
anexos I, II e III desta lei.
Art. 16 – Para
provimento dos empregos do Magistério Municipal, mediante concurso de ingresso
ou em comissão, será exigida habilitação profissional específica, na forma
estabelecida no artigo 9º desta lei.” (sic)
(grifo nosso)
Por
sua vez, o Anexo II da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município
de Pedra Bela, regulamentou o quadro dos servidores municipais em comissão, nos
termos abaixo (fl. 25):
“ANEXO II
QUADRO DOS SERVIDORES MUNICIPAIS DA
EDUCAÇÃO
(EMPREGOS EM COMISSÃO)
DIRETOR DO SERVIÇO MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO 01
SUPERVISOR DE ENSINO 01
DIRETOR DE ESCOLA 03
VICE-DIRETOR DE ESCOLA 03
COORDENADOR PEDAGÓGICO I 01
COORDENADOR PEDAGÓGICO II 02
COORDENADOR PEDAGÓGICO III 02
ASSESSOR TÉCNICO PEDAGÓGICO 01
Já
o Anexo III, da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município
de Pedra Bela, estabeleceu (fl. 26):
“ANEXO III
VENCIMENTOS
Ref. novembro de 2009
(...)
SUPORTE PEDAGÓGICO
DIRETOR DO SERV. MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO R$ 2.055,00
SUPERVISOR DE ENSINO R$ 2.008,00
DIRETOR DE ESCOLA R$ 1.890,00
VICE-DIRETOR DE ESCOLA R$ 1.775,00
COORDENADOR PEDAGÓGICO I R$ 1.373,00
COORDENADOR PEDAGÓGICO II R$ 1.603,00
COORDENADOR PEDAGÓGICO III R$ 1.718,00
PSICOPEDAGOGO R$ 1.010,00
ASSESSOR TÉCNICO PEDAGÓGICO R$ 1.031,00
Posteriormente, houve a edição da Lei Complementar nº 99, de 27 de novembro de 2.013, que promoveu alterações na Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, ambas do Município de Pedra Bela, sem alterar os dispositivos ora impugnados (fls. 38/43).
Não é só. Houve, também, a promulgação da Lei Complementar nº 96, de 02 de maio de 2013, do Município de Pedra Bela, nos seguintes termos (fls. 44/45):
“Lei Complementar nº 96, de 02 de maio de 2013
Dispõe sobre a
extinção, criação e modificação de cargos em comissão constante do anexo II da
Lei Complementar 84 de 09 de dezembro
de 2009 e dá outras providências que especifica.
(...)
Art. 1º - O anexo II da Lei Complementar nº 84 de 09 de dezembro de 2009, que contempla o quadro de Servidores Municipais da Educação, de livre nomeação, em caráter de comissão, passa a vigorar com a redação em anexo.
Art. 2º - Ficam extintos pela presente lei os cargos de Diretor do Serviço Municipal de Educação e de Assessor Técnico Pedagógico.
Art. 3º - Esta Lei entra em vigor na data de sua aprovação, revogadas as disposições em contrário.” (sic) (grifo nosso)
O Anexo II da
Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela,
passou, com a redação dada pela Lei Complementar nº 96, de 02 de maio de 2013,
do mesmo Município, a ter a seguinte redação:
Cargo |
Quantidade |
Carga Horária |
Vencimentos |
Secretário Municipal de Educação |
01 |
40 h |
R$ 2.760,00 |
Supervisor de Ensino |
01 |
40 h |
R$ 2.740,00 |
Diretor de Escola PIII |
01 |
40 h |
R$ 2.600,00 |
Diretor de Escola PII |
01 |
40 h |
R$ 2.600,00 |
Diretor de Escola – PI |
01 |
40 h |
R$ 2.600,00 |
Vice-Diretor |
01 |
40 h |
R$ 2.200,00 |
Coordenador Pedagógico III |
02 |
40 h |
R$ 2.690,00 |
Coordenador Pedagógico II |
02 |
40 h |
R$ 2.300,00 |
Coordenador Pedagógico I |
01 |
40 h |
R$ 1.700,00 |
Por derradeiro, foi editada a Lei Complementar nº 101, de 11 de março de 2015, do Município de Pedra Bela, que “altera dispositivo na Lei Complementar Municipal nº 84, de 09 de dezembro de 2009”, nos seguintes termos (fl. 46):
“Art. 1º - Fica acrescido o parágrafo único no artigo 7º da Lei Complementar nº 84/2009, com a seguinte redação:
“Art. 7º - (...)
(...)
Parágrafo único – O preenchimento das vagas dos empregos de provimento em comissão de Coordenador Pedagógico e Assessor Técnico Pedagógico será obrigatoriamente realizado com servidores de carreira da Prefeitura de Pedra Bela e admitidos através de concurso público.
Art. 2º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.”
As normas, entretanto, são verticalmente incompatíveis com a Constituição do Estado de São Paulo.
2.
O
parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta.
As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Art. 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preenchem os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissões, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
(...)
Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)”.
Isso
porque é inconstitucional a criação de unidades de provimento em comissão cujas
atribuições são de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e
profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que
devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento
efetivo mediante aprovação em concurso público.
Ademais, o provimento em comissão é incompatível com o
regime celetista na Administração Pública porque configura limite à liberdade de provimento e exoneração
do posto a dispensa imotivada onerosa.
De antemão, cumpre registrar que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência aos arts. 111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, bem como aos arts. 37, incisos II e V, da Constituição Federal – como será adiante corroborado - cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art. 144 da Carta Estadual.
3. CRIAÇÃO ABUSIVA E ARTIFICIAL DE POSTOS COMISSIONADOS DE SUPERVISOR DE ENSINO, DIRETOR DE ESCOLA, VICE-DIRETOR DE ESCOLA E COORDENADOR PEDAGÓGICO
O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade - a cujas folhas reportar-nos-emos - foi instaurado de ofício por esta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 03/28), em virtude da necessidade de análise de eventual inconstitucionalidade da instituição de cargos de provimento em comissão pelo art. 7º e pelo Anexo II da Lei Complementa nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela.
Da análise do mencionado ato normativo, bem como das alterações posteriores promovidas pelas Leis Complementares nº 99, de 27 de novembro de 2013, nº 96, de 02 de maio de 2013, e nº 101, de 11 de março de 2015, do Município de Pedra Bela, constata-se a existência das unidades comissionadas de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola, Vice-Diretor de Escola e Coordenador Pedagógico, os quais não retratam funções de direção, chefia e assessoramento.
Com efeito, a descrição e nomenclatura dos empregos de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola, Vice-Diretor de Escola e Coordenador Pedagógico não revelam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas e profissionais.
A título exemplificativo, nos termos do inciso I do § 2º do art. 5º da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela, compete
ao Supervisor de Ensino, entre
outros, a “avaliação de todas as Escolas Municipais de Pedra Bela, no processo
de planejamento escolar, elaboração, execução e avaliação da Proposta
pedagógica”; a “orientação para abertura, acompanhamento e fiscalização de
escolas infantis particulares”; o “acompanhamento e fiscalização dos
procedimentos administrativos de toda a rede de escolas municipais e das
escolas infantis particulares do município”, a “análise e parecer de processo
para autorização de funcionamento das escolas particulares de educação
infantil” (...) - configurando, pois, atividades técnicas e burocráticas,
distantes dos encargos de comando superior no qual se exige especial confiança
(fl. 07).
A unidade
Diretor de Escola, por sua vez, tem
como incumbência, nos termos do inciso II do § 2º do art. 5º do ato normativo
supramencionado (fl. 07), zelar pelo funcionamento pedagógico e administrativo
adequado, em consonância com as diretrizes emanadas do órgão responsável pela
Educação Municipal.
Também de natureza técnica são as atividades relativas aos empregos
de Vice-Diretor, “co-responsável
pela direção das escolas municipais” (sic),
devendo assumir funções a ele delegadas e responder pelas atribuições nas
ausências e impedimentos legais do Diretor de Escola (art. 5º, § 2º, III, Lei
Complementar nº 84/2009 – fl. 07).
O Professor-Coordenador (Coordenador
Pedagógico), nos termos do inciso IV do § 2º do art. 5º, da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, de Pedra Bela, deverá,
genericamente, desempenhar a Coordenação Pedagógica nas unidades de ensino da
rede municipal.
A análise das características destacadas indica que as unidades
impugnadas essencialmente são destinadas a atender necessidades executórias ou
a dar suporte subalterno a decisões e execução.
Além destes aspectos indicativos de que os empregos impugnados
desempenham funções
de pouca complexidade, exigindo-se tão somente o dever comum de lealdade às
instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor, a descrição genérica de suas atribuições
evidencia a natureza puramente
profissional, técnica, burocrática ou operacional, fora dos níveis de direção,
chefia e assessoramento superior.
Por
outras palavras, os empregos de provimento comissionado destacados são incompatíveis
com a ordem constitucional vigente, em especial, com o art. 115, incisos I, II e V, e art. 144, da Constituição do
Estado de São Paulo.
Essa
incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela
Constituição quanto ao ingresso no serviço público sem concurso.
Embora
o município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do
sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da Constituição Federal), esta
autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita ao âmbito pré-fixado pela
Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. Ed., São Paulo, Malheiros,
1997, p. 459).
A
autonomia municipal deve ser exercida com a observância dos princípios contidos
na Constituição Federal e na Constituição Estadual (cf. Luiz Alberto David
Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso
de direito constitucional, 9ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 285).
No
exercício de sua autonomia administrativa, o município cria cargos, empregos e
funções, mediante atos normativos, instituindo carreiras, vencimentos, entre
outras questões, de modo a se estruturar adequadamente.
Não
obstante isso, a possibilidade de o município organizar seus próprios serviços
encontra balizamento na ordem constitucional, sendo necessário que o faça por
meio de lei, respeitando normas constitucionais federais e estaduais relativas
ao regime jurídico do serviço público.
A
regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos
através de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se
garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no art. 37, I, da
Constituição Federal; bem como no art. 115, I, da Constituição do Estado de São
Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e empregos de
natureza técnica, burocrática, operacional e profissional.
A
criação de cargos de provimento em comissão ou funções de confiança deve ser
limitada aos casos em que seja exigível especial
relação de confiança entre o governante e o servidor, para que
adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente
política.
Há
implícitos limites à sua criação, visto que assim não fosse, estaria aniquilada
na prática a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço
público.
É
dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições
de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja
presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o
desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de
diretrizes político-governamentais. Não coaduna a criação de cargos deste jaez
– cuja qualificação é matéria de reserva legal absoluta – com funções
profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas e
rotineiras.
A
propósito, anota José Afonso da Silva que “Prevê-se,
agora, por força da EC – 19/98, que as funções de confiança serão exercidas
exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em
confiança serão preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e
percentuais mínimos previstos em lei (art. 37, V). Ambos se destinam, como
vimos, às atribuições de direção, chefia e assessoramento.” (Curso de Direito Constitucional positivo, 34.
Ed., São Paulo, Malheiros, 2011, p. 681).
É
esse o fundamento da argumentação no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de
certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da
autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover
a direção superior da Administração. Por essas razões percebe-se quão
necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se
desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não
poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua
confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito
Administrativo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).
Daí
a afirmação de que “é inconstitucional a
lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas,
burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos
níveis de direção, chefia e
assessoramento superior” (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores
públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).
São
a natureza do cargo e as funções a ele cometidas pela lei que estabelecem o
imprescindível “vínculo de confiança” (cf.
Alexandre de Moraes, Direito
constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que
justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam
ser destinados “apenas às atribuições de
direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317).
Essa
também é a posição do E. Supremo Tribunal Federal (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT
VOL-01765-01 PP-00169).
Podem
ser criados cargos de provimento comissionado, quando a natureza das atividades
desempenhadas exijam excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro
comprometimento político e fidelidade
com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão
bem além do dever comum de lealdade às instituições públicas, exigível de todo
e qualquer servidor.
Não é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza a criação de cargo em comissão. A atribuição do cargo deve reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das diretrizes políticas do governo.
Observa-se que as unidades mencionadas não refletem a
imprescindibilidade do elemento fiduciário em concurso às atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior.
No caso, não há, evidentemente, nenhum componente nos postos de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola, Vice-Diretor de Escola e Coordenador Pedagógico a exigir o controle de execução das diretrizes políticas do governante por alguém que detenha absoluta fidelidade a orientações traçadas, sendo, por isso, ofensivos aos princípios de moralidade e impessoalidade (art. 111, Constituição Estadual) que orientam os incisos II e V do art. 115 da Constituição Estadual.
A
propósito do tema, esse Colendo Órgão Superior decidiu recentemente que:
“No que se refere aos cargos de Diretor de
Escola, Vice-Diretor de Escola, Coordenador Pedagógico e Professor Coordenador,
notoriamente, os ocupantes desses cargos desempenham atividades
técnico-profissionais, porquanto vinculados e sujeitos às normas do sistema
nacional de educação. Por conta disso, suas funções são técnicas, burocráticas
e operacionais, não demandando especial relação de confiança.” (ADI nº
2088000-54.2014.8.26.0000, Rel. Des. Roberto Mortari, j. 17 de setembro de
2014).
É necessário ressaltar que a posição aqui sustentada encontra esteio em julgados desse E. Tribunal de Justiça (ADI 111.387-0/0-00, j. em 11.05.2005, rel. des. Munhoz Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de janeiro de 2005, rel. des. Barbosa Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30 de janeiro de 2008, rel. des. Elliot Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des. Armando Toledo, j. 16.07.2008, v.u.).
Por conseguinte, justificável que se reconheça, igualmente,
a inconstitucionalidade
das alíneas “b”, “c”, “d”, e “e”, do inciso II do art. 4º; dos itens 2, 3, 4 e
5 do inciso IV do art. 5º, dos incisos V, VI, VII e IX do art. 9º, todos da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela,
acima transcritos, pois, em decorrência
da inconstitucionalidade dos incisos II, III, IV e V do art. 7º, da referida
lei municipal, estarão estes, também, despidos de qualquer eficácia, posto que
há entre esses preceitos relação de dependência.
4 – INADMISSIBILIDADE DA ADOÇÃO DO
REGIME CELETISTA PARA CARGOS OU
EMPREGOS COMISSIONADOS
O art. 1º da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela, dispõe, entre outros, que o plano de cargos e empregos do magistério público municipal será regido pelo Decreto Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943 (CLT).
Ocorre
que o provimento em comissão é incompatível com o regime celetista na Administração
Pública porque configura limite à liberdade de provimento e exoneração do cargo a dispensa
imotivada onerosa (art. 115, II e V, Constituição Estadual).
A inserção do emprego comissionado no regime celetista é
incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além,
fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do cargo,
na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do
empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso
prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar
natureza).
O
desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária orientada pelos
critérios de oportunidade e conveniência da Administração Pública, e a sua sujeição
ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador
público.
A jurisprudência respalda a declaração
de inconstitucionalidade:
“4. Além dessa inconstitucionalidade formal, ocorre, também, no caso, a material, pois, impondo uma indenização em favor do exonerado, a norma estadual condiciona, ou ao menos restringe, a liberdade de exoneração, a que se refere o inc. II do art. 37 da C.F.” (STF, ADI 182-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 05-11-1997, v.u., DJ 05-12-1997, p. 63.902).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA PAGA PELOS COFRES PÚBLICOS POR OCASIÃO DA EXONERAÇÃO OU DISPENSA DE QUEM, SEM OUTRO VÍNCULO COM O SERVIÇO PÚBLICO, SEJA OCUPANTE DE FUNÇÃO OU CARGO EM COMISSÃO DE LIVRE EXONERAÇÃO, ART. 287 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A nomeação para os cargos em comissão é feita sob a cláusula expressa de livre exoneração. A disposição que prevê o pagamento pelos cofres públicos de indenização compensatória aos ocupantes de cargos em comissão, sem outro vínculo com o serviço público, por ocasião da exoneração ou dispensa, restringe a possibilidade de livre exoneração, tal como prevista no art. 37, II, combinado com o art. 25 da Constituição Federal. 2. Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade e a conseqüente ineficácia do art. 287 da Constituição do Estado de São Paulo, desde a sua promulgação” (STF, ADI 326-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Paulo Brossard, 13-10-1994, m.v., DJ 19-09-1997, p. 45.526).
Inegável
a violação aos princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade (art. 111,
Constituição Estadual) e à regra da liberdade de exoneração que domina o
provimento em comissão (art. 115, II e V, Constituição Estadual), no tocante apenas
aos servidores públicos de provimento comissionado, conforme a redação do art. 1º da Lei Complementar
nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela.
Diante
de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação
declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente para:
a)
declarar a inconstitucionalidade dos incisos I, II, III e IV
do § 2º do art. 5º, bem ainda dos incisos II, III, IV e V do art. 7º, da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela;
b)
declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de
texto, da expressão “regido pela C.L.T.”, constante do art. 1º, caput, da Lei Complementar nº 84, de 09
de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela, a fim de excluir o regime
celetista dos cargos de provimento em comissão;
c)
por dependência,
declarar a inconstitucionalidade das alíneas “b”, “c”, “d”, e “e” do inciso II
do art. 4º, dos itens 2, 3, 4 e 5 do inciso IV do art. 5º, e dos incisos V, VI,
VII e IX do art. 9º, da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do
Município de Pedra Bela.
d)
declarar a inconstitucionalidade do Anexo II da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, com a redação dada pela Lei
Complementar nº 96, de 02 de maio de 2013, do Município de Pedra Bela, nas
partes referentes aos cargos de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola,
Vice-Diretor e Coordenador Pedagógico.
Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Pedra Bela, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre os atos normativos impugnados.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
Termos
em que,
Aguarda-se
deferimento.
São Paulo, 26 de outubro de
2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
ms/mjap
Protocolado n.
075.229/2015
Interessado: Subprocuradoria-Geral de Justiça
Assunto: Inconstitucionalidade
de cargos de provimento em comissão previstos no art. 7º e no Anexo II da Lei
Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela.
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face dos incisos I, II, III e IV do § 2º do art. 5º; dos incisos II, III, IV e V do art. 7º; bem ainda para que haja a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, da expressão “regido pela C.L.T.”, constante do art. 1º, caput, a fim de excluir o regime celetista dos cargos de provimento em comissão, (e, por dependência, das alíneas “b”, “c”, “d”, e “e” do inciso II do art. 4º; dos itens 2, 3, 4 e 5 do inciso IV do art. 5º, dos incisos V, VI, VII e IX do art. 9º) todos da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, do Município de Pedra Bela; e, por fim, a declaração de inconstitucionalidade do Anexo II da Lei Complementar nº 84, de 09 de dezembro de 2009, com a redação dada pela Lei Complementar nº 96, de 02 de maio de 2013, do Município de Pedra Bela, nas partes referentes aos cargos de Supervisor de Ensino, Diretor de Escola, Vice-Diretor e Coordenador Pedagógico.
São Paulo, 26 de outubro de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
ms/mjap