EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado nº 86.703/15
Constitucional. Administrativo.
Ação Direta de Inconstitucionalidade. Cargos comissionados de “Diretor
Ferroviário”, “Diretor de Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Assistente
Técnico Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de Serviço”,
“Assistente Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado de
Serviço” e “Assistente Ferroviário”, sob o regime celetista (CLT), previstos
nos arts. 4º, 6º, II, 9º, 31, II, e Anexo II da Lei Complementar nº 1.211, de
27 de setembro de 2013, do Estado de São Paulo. Ausência de disposição legal estabelecendo
as atribuições dos cargos comissionados editados no âmbito da Estrada de Ferro
Campos do Jordão - EFCI. Sujeição dos agentes comissionados ao regime da clt -
consolidação das leis reclamando-se uma interpretação conforme a Constituição
do art. 4º, buscando afastar qualquer interpretação no sentido de aplicar tal
regime aos servidores comissionados. Violação aos arts. 111; 115,
I, II e V;144 da CE.
1. A ausência de fixação legal das atribuições dos cargos de provimento em comissão constitui ofensa à reserva legal e burla à exigência de concurso público ao preenchimento de cargos no âmbito da Administração (115, II e V, CE/89). A edição de postos pela via comissionada revela-se excepcional, somente autorizada pela Carta Bandeirante quando da presença de funções de assessoramento, chefia e direção, as quais devem restar descritas em atos legislativos, a fim de ser possível sindicar sua compatibilidade com o provimento em comissão (arts. 111; 115, I, II e V, CE/89).
2. A aplicação do regime celetista (CLT) aos servidores comissionados viola os princípios da razoabilidade e moralidade (arts. 111; 115, II e V, da Constituição Estadual). Destarte, a fim de preservar o art. 4º da lei em comento, requer-se sua interpretação conforme a Constituição, declarando a inconstitucionalidade de toda exegese autorizando a aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aos servidores de cargo de provimento em comissão.
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista
no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro
de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com
o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV, da Constituição Federal, e
ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de
São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 86.703/15),
vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE em face dos cargos comissionados de “Diretor
Ferroviário”, “Diretor de Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”,
“Assistente Técnico Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de
Serviço”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado
de Serviço” e “Assistente Ferroviário”, e em relação ao regime celetista
imposto a estes, previstos nos arts. 4º, 6º, II, 9º, 31, II, e Anexo II da Lei
Complementar nº 1.211, de 27 de setembro de 2013, do Estado de São Paulo, pelos
motivos a seguir expostos:
1.
DO
ATO NORMATIVO IMPUGNADO
Editada
em 27 de setembro de 2013, pelo Estado de São Paulo, a Lei Complementar nº 1.211
instituiu o “Plano de Carreiras, de Empregos Públicos e Sistema Retribuitório
para os servidores ferroviários da Estrada de Ferro de Campos do Jordão – EFCJ
e dá outros providências correlatas”.
Dentre
as disposições contempladas na lei em epígrafe, são relevantes à presente
exordial seus arts. 4º, 6º, II, 9º, 31, II, bem como seu Anexo II, os quais disciplinam
os cargos de provimento em comissão na estrutura da Estrada de Ferro de Campos
do Jordão – EFCJ. Vejamos:
“Lei Complementar nº 1.211/13
Artigo 4º - O regime jurídico dos servidores
ferroviários da EFCJ é o da Consolidação das Leis do Trabalho.
(...)
Seção II
Da Instituição de Classes e Carreiras
Artigo 6º - Para fins de implantação do Plano de
Carreiras, de Empregos Públicos e Sistema Retribuitório de que trata esta lei
complementar, ficam instituídas, no Quadro de Pessoal da EFCJ, as classes e
carreiras a seguir mencionadas:
(...)
II - no Subquadro de Empregos Públicos em
Confiança (SQEP-C):
a) Assistente Ferroviário;
b) Assistente Técnico Ferroviário I;
c) Assistente Técnico Ferroviário II;
d) Diretor de Departamento;
e) Diretor de Divisão;
f) Chefe de Operação;
g) Encarregado de Serviço.
(...)
Artigo 9º - As atribuições dos empregos públicos
em confiança de que trata esta lei complementar serão estabelecidas no decreto
que aprovará a reorganização.
(...)
Artigo 31 - Ficam criados, no Quadro de Pessoal
da EFCJ, os seguintes empregos públicos:
(...)
II - no Subquadro de Empregos Públicos em Confiança (SQEP-C), a
que se refere o inciso II do artigo 3º desta lei complementar, enquadrados na
Escala de Salários - Empregos Públicos em Confiança:
a) 2 (dois) de Assistente Ferroviário,
Referência C1;
b) 5 (cinco) de Assistente Técnico
Ferroviário I, Referência C5;
c) 1 (um) de
Diretor de Serviço, Referência C4;
d) 12 (doze)
de Diretor de Divisão, Referência C5;
e) 3 (três)
de Assistente Técnico Ferroviário II, Referência C6;
f) 4 (quatro)
de Diretor de Departamento, Referência C7.
(...)”
Conforme
será demonstrado, os postos comissionados de “Diretor Ferroviário”, “Diretor de
Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Assistente Técnico
Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de Serviço”, “Assistente
Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado de Serviço” e
“Assistente Ferroviário”, plasmados nos referidos dispositivos, estão eivados
de inconstitucionalidade, ante a violação aos arts. 111; 115, I, II e V; e 144
da Constituição Estadual.
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de
constitucionalidade
Os enunciados
transcritos do ato normativo impugnado contrariam frontalmente a Constituição
do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal
ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.
Os preceitos da Constituição Federal e da
Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29
daquela e do art. 144 desta.
Os cargos comissionados de “Diretor
Ferroviário”, “Diretor de Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”,
“Assistente Técnico Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de
Serviço”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado
de Serviço” e “Assistente Ferroviário” previstos nos arts. 4º, 6º, II, 9º, 31,
II, e Anexo II da Lei Complementar nº 1.211, de 27 de setembro de 2013, do
Estado de São Paulo, são incompatíveis
com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo 111 –
A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos
Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse
público e eficiência.
(...)
Artigo 115 – Para a organização da
administração pública direta ou indireta, inclusive as fundações instituídas ou
mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das
seguintes normas:
(...)
II - a investidura em cargo ou
emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou
de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado
em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V - as funções de confiança,
exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos
em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos,
condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às
atribuições de direção, chefia e assessoramento;
(...)
Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia
política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os
princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
III – Da inconstitucionalidade dos cargos
comissionados instituídos NOS ARTS. 6º, II, 31, II, E ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR Nº 1.211,
DE 27 DE SETEMBRO DE 2013, DO ESTADO DE SÃO PAULO
a. DA FALTA DA DESCRIÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS
DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE “DIRETOR FERROVIÁRIO”, “DIRETOR DE DEPARTAMENTO”,
“ASSISTENTE TÉCNICO FERROVIÁRIO I”, “ASSISTENTE TÉCNICO FERROVIÁRIO II”,
“DIRETOR DE DIVISÃO”, “DIRETOR DE SERVIÇO”, “ASSISTENTE TÉCNICO FERROVIÁRIO I”,
“CHEFE DE OPERAÇÃO”, “ENCARREGADO DE SERVIÇO” E “ASSISTENTE FERROVIÁRIO”
PREVISTOS NOS ARTS. 6º, II, 31, II, E ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR nº 1.211, DE
27 DE SETEMBRO DE 2013, DO ESTADO DE SÃO PAULO
De início, cumpre mencionar ser inconstitucional a ausência de disciplina
legal das atribuições de cargos em comissão editados na estrutura da Estrada de
Ferro de Campos Jordão - EFCJ, pelo Estado de São Paulo.
Na presente situação, a Lei Complementar nº 1.211, de 27 de setembro de 2013
não tratou de especificar as atribuições de assessoramento, chefia ou direção
dos cargos comissionados insertos em seus arts. 6º, II, 31, II, e Anexo II, as
quais não foram, outrossim, detalhadas em legislações supervenientes, fato este
que implica violação aos arts. 111 e 115, I, II e V, da Constituição Estadual.
Não
basta a lei instituir o cargo ou dar-lhe uma denominação de assessoramento,
chefia ou direção, ou, ainda, reputar-lhe exigência de confiança, se não
discriminar minimamente em seu bojo suas atribuições, a fim de viabilizar
controle de sua conformidade com as prescrições constitucionais que evidenciam
a natureza excepcional do provimento em comissão.
Tendo
em vista que a edição do cargo e seu respectivo detalhamento encontram-se
adstritos à reserva legal absoluta ou formal, a fim de se permitir a aferição
dos requisitos impostos pelo texto constitucional quando da sua instituição, a
invalidade da disciplina de cargos comissionados resta presente em razão da
omissão legislativa atinente à descrição de atribuições de assessoramento,
chefia e direção, porquanto conforme explica a doutrina:
“somente a
lei pode criar esse conjunto inter-relacionado de competências, direitos e
deveres que é o cargo público. Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X,
da Constituição, que comporta uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse
dispositivo permite ao Chefe do Executivo promover a extinção de cargo público,
por meio de ato administrativo. A criação e a disciplina do cargo público
faz-se necessariamente por lei no sentido de que a lei deverá contemplar a
disciplina essencial e indispensável. Isso significa estabelecer o núcleo das
competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e
das condições do exercício das atividades. Portanto, não basta uma lei
estabelecer, de modo simplista, que ‘fica criado o cargo de servidor público’.
Exige-se que a lei promova a discriminação das competências e a inserção dessa
posição jurídica no âmbito da organização administrativa, determinando as
regras que dão identidade e diferenciam a referida posição jurídica” (Marçal
Justen Filho. Curso de Direito
Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 581).
Nesse sentido, confira-se o posicionamento deste E. Tribunal de Justiça:
“(...) Por esse motivo é que a jurisprudência sedimentou que
a criação, por lei, de cargos de provimento em comissão (na dicção
constitucional, "de livre nomeação e exoneração") deve vir
acompanhada da descrição das atribuições destes mesmos cargos, também por meio
de lei em sentido estrito. A propósito, este Colendo Órgão Especial já decidiu
que a descrição das atribuições e responsabilidades do cargo criado é
necessária "para que se possa analisar e concluir que foram criados
exclusivamente para os casos constitucionalmente permitidos. Não basta
denominar os cargos como sendo de diretor, chefe ou assessor para que se abra
uma exceção à regra do concurso público e se justifique seu provimento em
comissão, pois o que importa não é o rótulo, mas a substância deles, fazendo-se
necessário examinar as atribuições a serem exercidas por seus titulares e tais
atribuições devem estar definidas na lei (Ação Direta de Inconstitucionalidade
n° 152.958-0/6, rei. Des. Debatin Cardoso, j. 04.03.2009) (...)”. (TJSP, ADI 0391344-43.2010.8.26.0000,
Órgão Especial, Rel. Des. Arthur Marques, 20.04.2011, v.u., Data de registro 02.05.2011).
Cumpre rememorar que a edição dos cargos em comissão, à luz de preceitos
insculpidos na Carta Republicana de 1988, não pode ser desarrazoada,
artificial, abusiva ou desproporcional. Deve, em respeito ao art. 37, II e V,
da Constituição Federal de 1988, reproduzido no art. 115, II e V, da
Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e
direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada ao
exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento
efetivo precedido de aprovação em certame de provas ou de provas e títulos,
como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.
Conforme
doutrina e jurisprudência majoritárias, não é lícito à lei declarar a liberdade
de provimento de qualquer cargo ou emprego público, mas tão somente àqueles que
requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de
assessoramento, chefia e direção.
Ou seja, a instituição de cargos desse jaez somente encontra fundamento
legítimo quando alicerçada em atribuições de natureza especial (assessoramento,
chefia e direção em nível superior), às quais se exige relação de confiança,
pouco importando a denominação ou forma de provimento atribuídas, pois,
Portanto, em obediência aos imperativos da Carta Maior, na edição de
cargos comissionados se faz necessária a perquirição de sua natureza
excepcional amparada no elemento fiduciário, não satisfeito pela mera
declaração do legislador quando da atribuição do nome in iuris ao cargo, sendo assaz relevante uma análise do plexo de
atribuições das funções públicas.
É dizer: os cargos de provimento em comissão são restritos às atribuições
de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja
presente a necessidade de relação de confiança para com os agentes políticos ao
desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de
diretrizes político-governamentais. Não se coaduna a edição de cargos dessa
natureza – cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com
atribuições ou funções profissionais ordinárias, passíveis de desempenho por
quaisquer agentes.
Nesse sentido, remansosa é a jurisprudência que proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, exigindo que elas demonstrem, de forma efetiva, a presença de funções concernentes a assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. LuizFux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008). Vejamos:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
LEIS 6.600/1998 (ART. 1º, CAPUT E INCISOS I E II), 7.679/2004 E 7.696/2004 E
LEI COMPLEMENTAR 57/2003 (ART. 5º), DO ESTADO DA PARAÍBA. CRIAÇÃO DE CARGOS EM
COMISSÃO. I - Admissibilidade de aditamento do pedido na ação direta de
inconstitucionalidade para declarar inconstitucional norma editada durante o
curso da ação. Circunstância em que se constata a alteração da norma impugnada
por outra apenas para alterar a denominação de cargos na administração judicial
estadual; alteração legislativa que não torna prejudicado o pedido na ação
direta. II - Ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal norma
que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio
da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão.
Necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da
norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso
público para a investidura em cargo público. Precedentes. Ação julgada
procedente” (STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa,
10-05-2007, v.u., DJe 13-09-2007, RTJ 202/553).
“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2.
Direito administrativo. 3. Criação de cargos em comissão por leis municipais.
Declaração de inconstitucionalidade pelo TJRS por violação à disposição da
Constituição estadual em simetria com a Constituição Federal. 3. É necessário
que a legislação demonstre, de forma efetiva, que as atribuições dos cargos a
serem criados se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração.
Caráter de direção, chefia e assessoramento. Precedentes do STF. 4. Ausência de
argumentos suficientes para infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a
que se nega provimento” (STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar
Mendes, 14-02-2012, v.u., DJe 05-03-2012).
Pois bem.
No caso em apreço, da simples análise da legislação correlata aos cargos
comissionados editados na estrutura da Estrada de Ferro de Campos do Jordão –
EFCJ, percebe-se que inexiste diploma estabelecendo as atribuições dos
referidos postos, em afronta aos ditames constitucionais impostos à criação de
cargos desta natureza.
Quando
da edição de posto comissionado, cumpre ao legislador traçar em seu texto cada
uma das atribuições conferidas ao servidor ocupante de tal cargo, vez que a
omissão de mandamento neste sentido impossibilita a aferição da presença dos
critérios de assessoramento, chefia e direção exigidos pelo Constituinte,
conduta esta que não pode ser tolerada em um Estado Democrático de Direito,
cuja essência resta alicerçada na ampla publicidade de informação, sendo
contrário ao seu espírito atos velados, obscuros, sobre os quais resta
impossibilitada qualquer espécie de controle:
“(...) 2.
Princípio constitucional de maior densidade axiológica e mais elevada estatura
sistêmica, a Democracia avulta como síntese dos fundamentos da República
Federativa brasileira. Democracia que, segundo a Constituição Federal, se apóia
em dois dos mais vistosos pilares: a) o da informação em plenitude e de máxima
qualidade; b) o da transparência ou visibilidade do Poder, seja ele político,
seja econômico, seja religioso (art. 220 da CF/88). (...)” (ADPF-MC 130. Relator Min. Carlos
Britto. Pleno. Julgamento: 27.02.2008)”
Ou
seja, a exigência de reserva legal se faz imperiosa em se tratando de cargos ou
empregos de provimento em comissão, posto que serve à mensuração da perfeita
subsunção da hipótese normativa concreta ao comando constitucional excepcional
que restringe o comissionamento às funções de assessoramento, chefia e direção.
É por isso que esse Sodalício exige que a lei descreva as atribuições de cada um dos cargos, pois, do contrário, não é possível ao Poder Judiciário e demais legitimados a tal controle sindicar se foram criados, efetivamente, para as situações constitucionalmente permitidas:
Sobre
o tema esse Colendo Órgão Especial já teve a oportunidade de se pronunciar em
idêntico sentido, conforme se verifica nas seguintes ementas:
“Ação direta
de inconstitucionalidade – LCM N. 113/07do Município de Peruíbe, que alterando
o quadro geral dos servidores municipais de que trata o art. 210 da Lei n°
1.330/90 e suas modificações posteriores criou os cargos de provimento em
comissão de assessor de setor, chefe de setor, assessor de serviço, chefe de
serviço, assessor de comunicação, coordenador geral, diretor de divisão,
diretor de trânsito, assessor de departamento, diretor musical, diretor de
departamento e procurador geral, constantes de seu anexo II, sem, todavia, lhes
descrever as atribuições. Violação do princípio da reserva legal. (ADIN Rel.
Des. Alves Bevilacqua, j. 22.08.2012)
Ação direta de inconstitucionalidade – Lei Complementar n°
1.800, de 8 de março de 2005 – Criação de cargos de provimento em comissão,
destinados, muitos deles, a funções burocráticas ou técnicas de caráter
permanente - Inadmissibilidade - Dispositivo, ademais, que deixou de descrever
as atribuições e responsabilidades de cada um dos cargos, impossibilitando a
verificação de que foram criados exclusivamente para os casos
constitucionalmente permitidos (direção, chefia e assessoramento) – Violação
dos artigos 5°, § 1º, 111, 115, I e II e 144 da Constituição do Estado de São
Paulo - Ação procedente” (ADIN nº 152.958-0/6, j. 04/03/2009, rel. Des. Debatin
Cardoso, g.n.).
Desse último julgado, aliás, extrai-se preciosa lição
que fundamenta esta propositura:
“(...) o dispositivo deixou de descrever as atribuições e
responsabilidades de cada um dos cargos criados, necessários para que se possa
analisar e concluir que foram criados exclusivamente para os casos
constitucionalmente permitidos.
Não basta denominar os cargos como sendo de diretor, chefe ou
assessor para que se abra uma exceção à regra do concurso público e se
justifique seu provimento em comissão, pois o que importa não é o rótulo, mas a
substância deles, fazendo-se necessário examinar as atribuições a serem
exercidas por seus titulares e tais atribuições devem estar definidas na lei.”
Aliás, também é a orientação da Corte Constitucional, segundo a qual a norma que institui cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão, ofende o disposto no art. 37, II, da CF. Para o Supremo Tribunal Federal, há “necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público" (ADI 3.233, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 10-5-2007, Plenário, DJ de 14-9-2007, com citação de precedentes).
Nem se alegue, por oportuno, que ao Chefe do Poder Executivo remanesceria eventual competência para descrição das atribuições dos empregos públicos, sob pena de convalidar a invasão de matéria sujeita exclusivamente à reserva legal.
A
possibilidade de regulamento autônomo para disciplina da organização
administrativa não significa a outorga de competência para o Chefe do Poder
Executivo fixar atribuições de cargo público e dispor sobre seus requisitos de
habilitação e forma de provimento. A alegação cede à vista do art. 61, § 1°,
II, a, da Constituição Federal, e do art. 24, § 2º, 1, da Constituição Estadual
que, em coro, exigem lei em sentido formal. Regulamento administrativo (ou de
organização) contém normas sobre a organização administrativa, isto é, a
disciplina do modo de prestação do serviço e das relações intercorrentes entre
órgãos, entidades e agentes, e de seu funcionamento, sendo-lhe vedado criar
cargos públicos, somente extingui-los desde que vagos (arts. 48, X, 61, § 1°,
II, a, 84, VI, b, Constituição Federal; art. 47, XIX, a, Constituição Estadual)
ou para os fins de contenção de despesas (art. 169, § 4°, Constituição
Federal).
Nesse passo, cabe gizar que, apreciando lei estadual, o Supremo Tribunal Federal reafirmou, em recente oportunidade, que “a delegação de poderes ao Governador para, mediante decreto, dispor sobre ‘as competências, as atribuições, as denominações das unidades setoriais e as especificações dos cargos, bem como a organização e reorganização administrativa do Estado’, é inconstitucional porque permite, em última análise, sejam criados novos cargos sem a aprovação de lei” (ADI 4125, Relator (a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 10/06/2010, DJe-030 DIVULG 14-02-2011 PUBLIC 15-02-2011 EMENT VOL-02464-01 PP-00068).
Todavia, na contramão dos entendimentos
supramencionados, a boa técnica legislativa não fora observada quando da
instituição dos cargos vergastados.
Ante
a inexistente de qualquer parâmetro destinado a averiguar a legitimidade de sua
instituição, posto que não há ato normativo contemplando quais seriam as
atribuições dos citados “Diretores”, “Assistentes”,
“Chefes” e “Encarregados”, e se estariam consonantes aos preceitos exigidos
pelo Constituinte Originário, que impõe a presença de atribuições de direção,
chefia e assessoramento aos postos comissionados, ex vi do disposto no art. 115, V da Carta Paulista, a fim de
autorizar eventual burla à regra do concurso público (art. 115, II), não outro
entendimento pode ser patrocinado senão o da flagrante inconstitucionalidade dos
cargos ora impugnados.
Deste modo, é patente a inconstitucionalidade dos cargos em comissão de “Diretor
Ferroviário”, “Diretor de Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”,
“Assistente Técnico Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de
Serviço”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado
de Serviço” e “Assistente Ferroviário” previstos na Lei Complementar nº
1.211/13, ante a ausência de disciplina legal concernente às atribuições dos
referidos postos.
B. Da previsão
dO REGIME CELETISTA (CLT) AOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO, EM OFENSA AOS
PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E MORALIDADE, RECLAMANDO-SE INTERPRETAÇÃO CONFORME À
CONSTITUIÇÃO do ART. 4º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 1.211/13, visando AFASTAR A
APLICAÇÃO DO REGIME CELETISTA (CLT) AOs servidores COMISSIONADOs da EFCJ.
Ao instituir
cargos em comissão na estrutura da Estrada de Ferro de Campos do Jordão - EFCJ,
o legislador estadual optou pela eleição do regime celetista para disciplinar
as relações jurídicas entre o ente e os servidores ocupantes de tais postos.
Ante o disposto
no art. 4º da Lei Complementar nº 1.211, de 27 de setembro de 2013, é expressa
a opção do Estado pelo regime celetista (CLT) aos servidores comissionados da EFCJ.
Vejamos:
“Artigo 4º
- O regime
jurídico dos servidores ferroviários da EFCJ é o da Consolidação das Leis do
Trabalho.”
Não obstante a
autonomia administrativa estadual para estruturar e disciplinar os cargos de
servidores em seus limites territoriais, cumpre pontuar que a sujeição dos
ocupantes de cargos comissionados ao regime celetista não encontra respaldo
constitucional, devendo ser afastada por este E. Tribunal de Justiça, portanto,
disposição legal nesse sentido, conforme se passa a expor.
O cargo
comissionado é de livre instituição e, por natureza, de provimento instável e
precário, porque se liga à concepção de execução de diretrizes políticas
superiores lastreadas na relação de confiança.
É por essa razão
que a Constituição Federal prevê liberdade no provimento e na exoneração
(dispensando qualquer motivação, assim como a exigência constitucional de
certame público) dos cargos desse jaez, pois, do contrário, restaria inócua sua
existência, tendo em vista sua natural preleção a funções de execução cujo
elemento fiduciário se faz imperioso.
Não por outro
motivo, portanto, é que a inserção desses cargos no regime celetista é
incompatível com a estrutura normativo-constitucional, porquanto este regime
fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do posto
comissionado, na medida em que a disciplina celetista reprime a dispensa
imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços
(aviso prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar
natureza).
De fato, o
desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária orientada pelos
critérios de oportunidade e conveniência da Administração Pública, e a sua
sujeição ao regime celetista tolhe em absoluto a liberdade de exoneração
reservada ao administrador público.
Na esteira desse
raciocínio, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“4. A
nomeação para cargo em comissão, por se tratar de relação jurídica própria de
direito público estabelecida entre a Administração e o comissionado, é regulada
pelo regime estatutário, ou seja, essa relação não tem natureza contratual, mas
institucional, de modo que não se lhe aplicam as disposições pertinentes ao
emprego público, subordinado, basicamente, ao regime celetista” (STJ, REsp
621.647-DF, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, 21-03-2006, v.u., DJ 10-04-2006,
p. 130).
Aliás, é
remansosa a jurisprudência no sentido da inconstitucionalidade de previsão
desta natureza aos cargos comissionados editados na estrutura administrativa
dos entes federativos.
A título de
exemplo, estimou o Supremo Tribunal Federal ao examinar preceito da
Constituição do Estado do Rio Grande do Sul que assegurava “aos ocupantes de
cargos de que trata este artigo será assegurado, quando exonerados, o direito a
um vencimento integral por ano continuado na função, desde que não titulem
outro cargo ou função pública” (art. 32, § 3º):
“4. Além dessa inconstitucionalidade formal, ocorre, também,
no caso, a material, pois, impondo uma indenização em favor do exonerado, a
norma estadual condiciona, ou ao menos restringe, a liberdade de exoneração, a
que se refere o inc. II do art. 37 da C.F.” (STF, ADI 182-RS, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Sydney Sanches, 05-11-1997, v.u., DJ 05-12-1997, p. 63.902).
Desse julgamento
merece destaque o seguinte excerto:
“9. Se, por
força da cláusula constitucional explícita, a exoneração do cargo em comissão é
livre, não pode estar subordinada a nenhuma condição. A exigência do pagamento
de indenização equivalente a um mês de vencimentos, por ano de exercício de
cargo em comissão, restringe o poder discricionário da Administração de
livremente nomear e exonerar o ocupante do cargo, por considerações ligadas aos
encargos financeiros decorrentes, tudo de forma a inibir essas prerrogativas da
Administração, emanadas da Constituição.
10. A
indenização prevista nas normas impugnadas, dessa forma, é inconciliável com a
regra contida na segunda parte do inciso II do art. 37 da Constituição
Federal”.
Outro precedente
da Suprema Corte é ainda mais expressivo ao instituir normas tendentes a obstar
a livre nomeação e exoneração dos ocupantes de cargos em comissão:
“AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE, INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA PAGA PELOS COFRES PÚBLICOS
POR OCASIÃO DA EXONERAÇÃO OU DISPENSA DE QUEM, SEM OUTRO VÍNCULO COM O SERVIÇO
PÚBLICO, SEJA OCUPANTE DE FUNÇÃO OU CARGO EM COMISSÃO DE LIVRE EXONERAÇÃO, ART.
287 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A nomeação para os cargos em
comissão é feita sob a cláusula expressa de livre exoneração. A disposição que
prevê o pagamento pelos cofres públicos de indenização compensatória aos
ocupantes de cargos em comissão, sem outro vínculo com o serviço público, por
ocasião da exoneração ou dispensa, restringe a possibilidade de livre
exoneração, tal como prevista no art. 37, II, combinado com o art. 25 da
Constituição Federal. 2. Ação direta julgada procedente para declarar a
inconstitucionalidade e a consequente ineficácia do art. 287 da Constituição do
Estado de São Paulo, desde a sua promulgação” (STF, ADI 326-SP, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Paulo Brossard, 13-10-1994, m.v., DJ 19-09-1997, p. 45.526).
Nesse julgamento,
assinalou o eminente Ministro Paulo Brossard que:
“Os titulares
dos cargos ou das funções sujeitos à investidura por concurso público gozam de
garantias previstas na Constituição: são garantias inerentes ao exercício do
cargo, que não são concedidas às pessoas como privilégio, mas para garantir o
exercício das funções dentro dos estritos limites da lei, a salvo de pressões e
injunções de toda ordem; para estes o ordenamento jurídico entende que é
necessária alguma garantia.
Ao contrário,
os que ascendem a cargos não sujeitos à investidura por concurso, ficando à
mercê da dispensa ou exoneração ad nutum, convivem a todo instante com o dever
de fidelidade para com a execução da diretriz política que lhe foi confiada e
com o caráter transitório da sua presença na administração pública; para estes
não é desejável nenhuma garantia além daquela que advém do correto e eficiente
desempenho das tarefas que lhe foram confiadas, e que aceitaram delas
desincumbir-se.
5. Concluo
entendendo que a relevância da matéria está posta no interesse da
Administração, e não do servidor, e que a manutenção da disposição impugnada é
desaconselhada pelo art. 37, II, combinado com o art. 25 da Constituição
Federal, porque se a nomeação é feita sob a cláusula expressa de livre
exoneração, o dever de indenizar restringe essa liberdade”.
Além dos julgados
supramencionados da lavra do Excelso Pretório, imperioso destacar que o mesmo
entendimento encontra-se enraizado na jurisprudência desta Corte Estadual,
conforme se observa a partir da leitura do v. acórdão ora reproduzido:
“Como já
afirmado, os cargos em comissão ostentam em sua natureza o elemento fiduciário
que vincula o profissional nomeado às diretrizes políticas traçadas pelo
nomeante, sendo verdadeira exceção à regra do concurso público. Consequência
desta mesma natureza é a inexistência de estabilidade aos seus ocupantes, cuja
permanência no cargo está ligada à discricionariedade da autoridade nomeante,
viável a exoneração sem maiores formalidades.
Evidente
incompatibilidade na adoção do regime celetista geral para os cargos em
comissão é sedimentada, via de regra, no âmbito deste C. Órgão Especial.
Afinal, dentre outras garantias trabalhistas, mostram-se incongruentes o
direito à estabilidade, indenizações por dispensa imotivada, recolhimento de
FGTS etc., às características próprias dos cargos comissionados, que pela
eminente relação de confiança existente entre autoridade nomeante e servidor
nomeado, ostenta nítida precariedade e estão sujeitos a exoneração ad nutum. (...)” (TJSP, ADIN
2124630-12.2014.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Des. Francisco Casconi, 10-12-2014
v.u., DJ 11-12-2014).
Complementando
esta digressão, a doutrina pondera que “o servidor que exercer cargo público em
comissão poderá ser demitido ad nutum,
não ficando sujeito às formas demissionárias dos servidores públicos
efetivados” [Claudionor Duarte Neto. O Estatuto do Servidor Público (Lei n°
8.112/90) à luz da Constituição e da Jurisprudência, São Paulo: Atlas, 2007, p.
51], e, por isso, se na Administração Pública direta é admissível a sujeição
dos servidores públicos lato sensu ao
regime celetista como empregados públicos, a Lei nº 9.962/00, de âmbito
federal, exclui dessa possibilidade os cargos de provimento em comissão (art. 1°,
§ 2°, b).
Sob outro prisma,
é inegável o reconhecimento de franca violação aos princípios jurídicos da
moralidade e da razoabilidade, previstos no art. 37 da Constituição Federal e
no art. 111 da Constituição Estadual.
Enquanto a
razoabilidade serve como parâmetro no controle da legitimidade substancial dos
atos normativos, requerente de compatibilidade aos conceitos de racionalidade,
justiça, bom senso, proporcionalidade etc., interditando discriminações
injustificáveis e, por isso, desarrazoadas, a moralidade se presta à mensuração
da conformidade do ato estatal com valores superiores (ética, boa-fé,
finalidade, boa administração etc.), vedando atuação da Administração Pública
pautada desideratos alheios ao interesse público (primário) – ou seja, censura
o desvio de poder que também tem a potencialidade de incidência nos atos
normativos.
Como os cargos
comissionados constituem exceção à regra constitucional do acesso à função
pública (lato sensu) mediante
concurso público, possibilitando a investidura por critérios pessoais e
subjetivos, sob o pálio da instabilidade e da transitoriedade do vínculo como
elementos essenciais de sua duração, é desarrazoada e imoral a outorga de
prerrogativas próprias do regime contratual a seus ocupantes.
Em suma, a sujeição
de cargos comissionados ao regime celetista implica intolerável outorga de uma
série de vantagens caracterizadoras de privilégio inadmissível à vista da
natureza do cargo público cuja marca eloquente é a instabilidade do provimento
ditada pela relação de confiança.
Dessa forma, é
evidente a inconstitucionalidade da aplicação do art. 4º da Lei Complementar nº
1.211, de 27 de setembro de 2013, do Estado de São Paulo, aos servidores
comissionados da Estrada de Ferro de Campos do Jordão – EFCJ, vez que subordina
todos os empregos de provimento em comissão dos quadros da EFCJ ao regime de
contratação da CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas, em oposição aos
ditames insertos nos arts. 111 e 115, incisos II e V da Constituição Estadual.
Cabe registrar
que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência ao art. 115, incisos
I, II e V, da Constituição Estadual, bem como ao art. 37 incisos I, II e V, da
Constituição Federal, cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art. 144 da
Carta Estadual.
Por fim, oportuno invocar no caso
em exame a utilização da técnica de declaração da inconstitucionalidade sem
redução de texto e interpretação conforme, prevista no art. 28 parágrafo único
da Lei nº 9.868/99, pois isso permitirá a preservação do ato normativo, e a exclusão
de interpretação que se mostre inconstitucional.
A doutrina e a jurisprudência evoluíram, no sentido de admitir novas técnicas para o controle de constitucionalidade das leis. Atualmente, a própria legislação admite métodos alternativos, e, entre eles, a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto, bem como a interpretação conforme a Constituição.
O parágrafo único do art. 28 da Lei 9.868/99 prevê expressamente que “a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal”.
O reconhecimento da inconstitucionalidade sem redução de texto significa, em outras palavras, espécie de redução teleológica na eficácia da norma, enquanto a interpretação conforme tem o condão de destacar qual a única interpretação válida a ser conferida a determinado texto legislativo, compatibilizando-o com a Constituição (na doutrina, por todos, v. Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins, Controle concentrado de constitucionalidade – comentários à Lei 9868, de 10-11-1999, 2ªed., 2ª tir., São Paulo, Saraiva, 2007, p.407/419; e ainda Oswaldo Luiz Palu, Controle de constitucionalidade, 2ªed., São Paulo, RT, 2001, p.188/191).
O E. STF, ademais, há muito, mesmo antes da expressa previsão em lei, já vinha admitindo a utilização destas técnicas de decisão: ADI, 393 (DJ de 18-3-94, p. 5.165-6); ADI 111 (DJ de 6-5-94, p. 10.485); ADI 1.089; ADI 1.600-MC, Rel. Min. Sydney Sanches, julgamento em 27-8-97, DJ de 6-2-98; ADI 491-MC, voto do Min. Moreira Alves, julgamento em 13-6-91, DJ de 25-10-91; ADI 221-MC, voto do Min. Moreira Alves, julgamento em 29-3-90, DJ de 22-10-93.
Nesse E. Tribunal de Justiça de São Paulo, no julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade nº 150.402.0/5-00, rel. des. Boris Kaufmann, j. 19.12.2007, v.u., foi acolhida a manifestação desta Procuradoria-Geral de Justiça, e aplicada a técnica alternativa de decisão, conforme ementa a seguir transcrita:
“Processual
civil. Incidente de inconstitucionalidade. Possibilidade de reconhecimento da
inconstitucionalidade sem redução do texto, dando-lhe interpretação conforme a
Constituição Federal.
Constitucional.
Inconstitucionalidade da interpretação da expressão "integralidade da
dívida pendente" do § 2º do art. 3º do DL 911/64, significando a
integralidade da dívida. Interpretação que afasta a garantia do contraditório e
da ampla defesa (CF, art. 5º, LV) e a defesa do consumidor (CF, art. 5º,
XXXII). Interpretação conforme que se restringe às prestações vencidas e seus
acréscimos.
A
exigência de pagamento da integralidade da dívida pendente, para purgação da
mora na ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente (DL 911/64,
art. 3º, § 2º) deve ser interpretada como sendo a totalidade das prestações
vencidas do financiamento quando, sob pena de violação da garantia da ampla
defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LV) e da defesa do consumidor (CF, art.
5º, XXXII).”
Na hipótese em exame, afigura-se suficiente apenas reconhecer a inconstitucionalidade de toda interpretação no sentido de ser permitida a aplicação do regime celetista aos servidores comissionados da Estrada de Ferro de Campos do Jordão - EFCJ.
Portanto, a interpretação do disposto no art. 4º deve ser feita no sentido de que a aplicação da CLT aos servidores comissionados revela-se inconstitucional, apenas sendo permitida a imposição de tal regime aos servidores efetivos da EFCJ.
IV – DO Pedido
Face ao exposto, requerer-se o recebimento e o
processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para
declarar a inconstitucionalidade dos cargos comissionados de “Diretor Ferroviário”, “Diretor
de Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Assistente Técnico
Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de Serviço”, “Assistente
Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado de Serviço” e
“Assistente Ferroviário”, e da aplicação do regime celetista a estes, previstos
nos arts. 4º, 6º, II, 9º, 31, II, e Anexo II da Lei Complementar nº 1.211, de
27 de setembro de 2013, do Estado de São Paulo, invocando, em relação ao art.
4º do citado diploma, interpretação conforme a Constituição para reconhecer a
inconstitucionalidade de toda interpretação no sentido de ser permitida a
aplicação do regime celetista aos servidores comissionados da Estrada de Ferro
de Campos do Jordão – EFCJ.
Requer-se ainda
sejam requisitadas informações ao Governador e ao Presidente da Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo, bem como posteriormente citado o
Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos
impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação
final.
Termos em que, pede
deferimento.
São Paulo, 06 de novembro de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de
Justiça
ef
bfs
Protocolado nº 86.703/15
Interessado: Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital
Objeto: representação para controle de constitucionalidade da
criação de cargos de provimento em comissão na Estrada de Ferro de Campos do
Jordão – EFCJ.
1. Promova-se a distribuição de ação
direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado incluso, em face
dos cargos de provimento em comissão de “Diretor Ferroviário”, “Diretor de
Departamento”, “Assistente Técnico Ferroviário I”, “Assistente Técnico
Ferroviário II”, “Diretor de Divisão”, “Diretor de Serviço”, “Assistente
Técnico Ferroviário I”, “Chefe de Operação”, “Encarregado de Serviço” e
“Assistente Ferroviário”, e da aplicação do regime celetista a estes, previstos
nos arts. 4º, 6º, II, 9º, 31, II, e Anexo II da Lei Complementar nº 1.211, de
27 de setembro de 2013, do Estado de São Paulo, invocando, em relação ao art.
4º do citado diploma, interpretação conforme a Constituição para reconhecer a
inconstitucionalidade de toda interpretação no sentido de ser permitida a
aplicação do regime celetista aos servidores comissionados da Estrada de Ferro
de Campos do Jordão – EFCJ.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 06 de novembro de 2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de
Justiça
ef/bfs