Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 123.515/2015

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Trabalho. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão. Invasão da competência normativa federal. Inconstitucionalidade material por violação dos princípios da razoabilidade, igualdade, isonomia, Livre concorrência e livre iniciativa. 1. Lei municipal que versa sobre normas de natureza trabalhista. Violação da esfera de competência do legislador federal (arts. 1º, 18 e 22, I, da CF/88), que viola o art. 144 da Constituição Estadual, norma que incorpora o princípio federativo e o esquema de repartição de competências. 2. Qualquer restrição demanda a existência de relação entre o fator ou elemento discriminante, o discrímen e a finalidade da discriminação.  Considerando o atual estágio social quanto ao tema da inserção da mulher no mercado de trabalho, a distinção contida na norma mostra-se absolutamente desarrazoada e discriminatória, agravando-se a situação quando se exige percentual de mão-de-obra residente no Município (art. 111, da CE/89, e arts. 3º, inciso IV, e 5º, caput, e inciso I, da CF/88, aplicáveis aos Municípios por obra do art. 144, da Carta Paulista). 3. O fomento da atividade econômica incumbe ao Poder Público, na forma da Constituição, mas sob esse pretexto não é possível a edição de normas arbitrárias e desarrazoadas, em flagrante violação aos princípios da livre concorrência e livre iniciativa (arts. 1º, IV, e 170, caput e IV, da CF/88, aplicáveis aos Municípios por força do art. 144, da CE/89).

 

 

 

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em face da Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão, pelos fundamentos a seguir expostos:

 

I – O ATO NORMATIVO IMPUGNADO

          A Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão, prevê in verbis:

“(...)

Art. 1º - Ficam as empresas prestadoras de serviço no Pólo Industrial de Cubatão obrigadas a contratarem e manterem empregados prioritariamente trabalhadores domiciliados neste Município, na proporção de 70% (setenta por cento) do seu quadro efetivo de funcionários.
Parágrafo único. As contratações previstas no caput deste artigo são para as novas vagas que forem criadas na vigência desta Lei.

Art. 2º - Não se aplica a determinação prevista no artigo anterior mediante as seguintes hipóteses:
1. para contratações de trabalhadores cuja mão-de-obra exija especialização ou habilitação específica, oriunda de qualificação em curso técnico, graduação em curso superior ou pós graduação; e
2. admissão de empregado para ocupar cargo de chefia e direção de equipes.

Art. 3º - As empresas prestadoras de serviços no Pólo Industrial de Cubatão serão obrigadas a destinar 15% (quinze por cento) da reserva percentual determinada no artigo 1° desta Lei, para mão-de-obra exclusivamente feminina.
§ 1º Na hipótese de não haver candidata para preenchimento da vaga destinada à mão-de-obra feminina em 15 dias após a publicação de sua abertura, a empresa poderá destiná-la a trabalhador do sexo masculino para ocupá-la.
§ 2º As frações decorrentes do cálculo do percentual de que trata esta Lei quando menores ou iguais a 0,99 (noventa e nove décimos) serão arredondadas para o número inteiro diretamente superior.

Art. 4º - Constatado o descumprimento desta Lei, a empresa será notificada pelo Poder Público Municipal e poderá apresentar a sua defesa no prazo improrrogável de 15 (quinze) dias.

Art. 5º - Caso não seja apresentada a defesa prevista no artigo anterior ou se as mesmas não forem acatadas, o descumprimento implicará na aplicação das seguintes penalidades:
I - Primeira infração: advertência e suspensão de atividades por 24 horas a contar a partir da autuação;
II - Segunda infração: suspensão das atividades no período de dez dias;
III - Terceira infração: suspensão temporária do Alvará de Funcionamento; e
IV - Quarta infração: cassação definitiva do Alvará de funcionamento.

Art. 6º - A abertura das vagas reservadas previstas na Lei será publicada em veículo de comunicação de massa e no Posto de Atendimento ao Trabalhador - PAT, do Município de Cubatão.

Art. 7º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

(...)”

 

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

O ato normativo impugnado é verticalmente incompatível com nosso ordenamento constitucional por violar de um lado o princípio federativo e a competência normativa da União, e de outro os princípios da razoabilidade, igualdade, livre concorrência e livre iniciativa, previstos nos seguintes dispositivos da Constituição da República (aplicáveis aos municípios por força do art. 144 da Carta Paulista):

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

(...)

Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

(...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

(...)

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

(...)

Art. 22 - Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

(...)

Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

IV - livre concorrência;” (g.n.)

De proêmio, verifica-se a existência de vício material, na medida em que a lei trata de questões afetas à competência do legislador federal.

Isto porque a lei local cuida de norma de direito do trabalho, a qual se insere na competência privativa do legislador federal, nos termos do art. 22, inciso I, da Constituição Federal.

Note-se: não se trata de invocar parâmetro contido na Constituição da República para fins de declaração de inconstitucionalidade de lei municipal. A impugnada lei viola o disposto no art. 144 da Constituição Paulista, que tem a seguinte redação:

“(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)”

Um dos princípios constitucionais estabelecidos é o denominado princípio federativo, que está assentado nos arts. 1º e 18 da Constituição da República, bem como no art. 1º da Constituição Paulista.

Como é cediço, a Constituição da República estabelece a repartição constitucional de competências entre as diversas esferas da federação brasileira. E a repartição de competências entre os entes federados é o corolário mais evidente do princípio federativo.

Referindo-se aos princípios fundamentais da Constituição, que revelam as opções políticas essenciais do Estado, José Afonso da Silva aponta que entre eles podem ser inseridos, entre outros, “os princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania, Estado Democrático de Direito (art. 1º)” (Curso de direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 96, g.n.).

Um dos aspectos de maior relevo, e que representa a dimensão e alcance do princípio do pacto federativo, adotado pelo Constituinte em 1988, é justamente o que se assenta nos critérios adotados pela Constituição Federal para a repartição de competências entre os entes federativos, bem como a fixação da autonomia e dos respectivos limites, dos Estados, Distrito Federal, e Municípios, em relação à União.

Anota a propósito Fernanda Dias Menezes de Almeida que “avulta, portanto, sob esse ângulo, a importância da repartição de competências, já que a decisão tomada a respeito é que condiciona a feição do Estado Federal, determinando maior ou menor grau de descentralização.” Daí a afirmação de doutrinadores no sentido de que a repartição de competências é “‘a chave da estrutura do poder federal’, ‘o elemento essencial da construção federal’, ‘a grande questão do federalismo’, ‘o problema típico do Estado Federal” (Competências na Constituição Federal de 1988, 4. ed., São Paulo, Atlas, 2007, p. 19/20).

Não pairaria qualquer dúvida a respeito da inconstitucionalidade de proposta de emenda constitucional ou de lei que sugerisse, por exemplo, a extinção da própria Federação: a Constituição veda proposta de emenda “tendente a abolir”, entre outros, “a forma federativa de Estado” (art. 60, § 4º, I, da CR/88).

A preservação do princípio federativo tem contado com a anuência do C. Supremo Tribunal Federal, como destacado em julgado relatado pelo Min. Celso de Mello:

"(...) a idéia de Federação — que tem, na autonomia dos Estados-membros, um de seus cornerstones — revela-se elemento cujo sentido de fundamentalidade a torna imune, em sede de revisão constitucional, à própria ação reformadora do Congresso Nacional, por representar categoria política inalcançável, até mesmo, pelo exercício do poder constituinte derivado (CF, art. 60, § 4º, I)." (HC 80.511, voto do Min. Celso de Mello, julgamento em 21-8-01, DJ de 14-9-01).

Por essa linha de raciocínio, pode-se também afirmar que a lei municipal que regula matéria cuja competência é do legislador federal e do estadual está, ao desrespeitar a repartição constitucional de competências, a violar o princípio federativo.

A prescrição de que os Municípios devem observar os princípios constitucionais estabelecidos não se encontra apenas no art. 144 da Constituição Paulista. O art. 29, caput, da Constituição Federal prevê que “O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado, e os seguintes preceitos (g.n.).”

Relevante anotar que quando do julgamento da ADI 130.227.0/0-00 em 21.08.07, rel. des. Renato Nalini, esse E. Tribunal de Justiça acolheu a tese no sentido da possibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei municipal por violação do princípio da repartição de competências estabelecido pela Constituição Federal. É relevante trazer excerto de voto do i. Desembargador Walter de Almeida Guilherme, imprescindível para a elucidação da questão:

“(...)

 Ora, um dos princípios da Constituição Federal – e de capital importância – é o princípio federativo, que se expressa, no Título I, denominado ‘Dos Princípios Fundamentais’, logo no art.1º: ‘A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito...’.

Sendo a organização federativa do Estado brasileiro um princípio fundamental da República do Brasil, e constituindo elemento essencial dessa forma de estado a distribuição de competência legislativa dos entes federados, inescapável a conclusão de ser essa discriminação de competência um princípio estabelecido na Constituição Federal.

Assim, quando o referido art. 144 ordena que os Municípios, ao se organizarem, devem atender os princípios da Constituição Federal, fica claro que se estes editam lei municipal fora dos parâmetros de sua competência legislativa, invadindo a esfera de competência legislativa da União, não estão obedecendo ao princípio federativo, e, pois, afrontando estão o art. 144 da Constituição do Estado (...) (trecho do voto do i. des. Walter de Almeida Guilherme, no julgamento da ADI 130.227.0/0-00).

(...)”

Não pode o legislador municipal, a pretexto de legislar concorrentemente ou suplementar a legislação federal, invadir a competência legislativa deste ente federativo superior (RE 313.060, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 29-11-2005, Segunda Turma, DJ de 24-2-2006).

         E nem cabe alegar que a lei municipal ora tratada encontra fundamento na competência prevista no art. 30, I e II, da Constituição Federal, pois a matéria foi elencada pela Carta Magna como de competência exclusiva da União.

         Neste sentido, o Supremo já explicitou que:

 

“(...) 2. A competência constitucional dos Municípios de legislar sobre interesse local não tem o alcance de estabelecer normas que a própria Constituição, na repartição das competências, atribui à União ou aos Estados. (...)” (RE 313060/SP - Relatora:  Min. Ellen Gracie – J. 29/11/2005 - Órgão Julgador:  Segunda Turma)

 

         Analisando tal argumento jurídico, o ilustre desembargador Sousa Lima, desse E. Tribunal de Justiça, decidiu que:

 

"(...) salienta-se que a Constituição Federal, em seu artigo 22, incisos I, atribuiu competência à União para legislar, dentre outros temas, sobre direito comercial e trabalhista. Pela técnica de repartição de competências adotada na Lei Maior, aos Municípios somente cumpre regular tais matérias de modo específico, atendendo às suas particularidades locais, através da competência suplementar. Assim, quando definiu as competências dos entes municipais houve por deferir-lhes de modo suplementar relativamente a legislação federal e estadual, sempre para a disciplina de assuntos de interesse meramente local, ou seja, que se circunscrevam aos limites do território." (Incidente de inconstitucionalidade n° 990.10.329220-0, j. em 17.11.2010)

Em suma, mostra-se flagrante a inconstitucionalidade por invasão da competência exclusiva da União.

A lei local viola, ainda, os princípios da igualdade e da isonomia (arts. 3º, inciso IV, e 5º, caput, e inciso I, da CF/88), senão vejamos.

O ato normativo impugnado obriga (i) que as empresas prestadoras de serviço no polo industrial de Cubatão contratem e mantenham empregados domiciliados no Município, na proporção de 70% (setenta por cento) do seu quadro efetivo de funcionários, e (ii) que 15% (quinze por cento) desse quadro de trabalhadores seja reservado para mão-de-obra exclusivamente feminina (arts. 1º e 3º, da Lei nº 3.717/15, do Município de Cubatão).

Vale lembrar que qualquer restrição demanda a existência de relação entre o fator ou elemento discriminante, o discrímen e a finalidade da discriminação, ou seja, impende que exista uma adequação racional entre o tratamento diferençado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo” (Celso Antonio Bandeira de Mello. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 49).

Além disso, a diferenciação feita pelo legislador só será possível quando, objetivamente, constatar-se um fator de discrímen que dê razoabilidade à diferenciação de tratamento contida na lei, pois a igualdade pressupõe um juízo de valor e um critério justo de valoração, proibindo o arbítrio, que ocorrerá “quando a disciplina legal não se basear num: (i) fundamento sério; (ii) não tiver um sentido legítimo; (iii) estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável” (J. J. Gomes Canotilho. Direito constitucional e teoria da constituição, Coimbra: Almedina, 3ª ed., 1998, pp. 400-401).

Partindo dessas premissas, e considerando o atual estágio social quanto ao tema da inserção da mulher no mercado de trabalho, referida disposição mostra-se absolutamente desarrazoada e extremamente discriminatória.

De acordo com as regras constitucionais, tal distinção por gênero seria possível única e tão somente em casos excepcionais com fundamentação irrefutável, o que não ocorre neste caso.

Inexiste razão que leve a conclusão de que mulheres são incapazes exerce-las em igualdade de condições.

Agrava-se a situação quando se exige percentual de mão-de-obra residente no Município, critério discriminante e desarrazoado que, cria preferência em razão do domicílio – o que é vedado (art. 19, III, da CF/88) – e cuja relação de pertinência com a finalidade perseguida pela norma é inexistente, supérflua e alija outros que não preencham tais condições.

É visível a afronta à razoabilidade (prevista no art. 111, da CE/89). A jurisprudência é fértil na aplicação do princípio, salientando o Supremo Tribunal Federal que “cabe ao Poder Judiciário verificar a regularidade dos atos normativos e de administração do Poder Público em relação às causas, aos motivos e à finalidade que os ensejam” (RTJ 204/385). A Suprema Corte censura a irrazoabilidade das normas, limitando o poder de legislar ao enunciar que:

“(...) O Estado não pode legislar abusivamente. A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público. O princípio da proporcionalidade - que extrai a sua justificação dogmática de diversas cláusulas constitucionais, notadamente daquela que veicula a garantia do substantive due process of law - acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais. A norma estatal, que não veicula qualquer conteúdo de irrazoabilidade, presta obséquio ao postulado da proporcionalidade, ajustando-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do substantive due process of law (CF, art. 5º, LIV). Essa cláusula tutelar, ao inibir os efeitos prejudiciais decorrentes do abuso de poder legislativo, enfatiza a noção de que a prerrogativa de legislar outorgada ao Estado constitui atribuição jurídica essencialmente limitada, ainda que o momento de abstrata instauração normativa possa repousar em juízo meramente político ou discricionário do legislador” (STF, ADI-MC 1.407-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-03-1996, DJ 24-11-2000, m.v., p. 86).

Como anota Diogo de Figueiredo Moreira Neto, o princípio da razoabilidade “visa a afastar o arbítrio que decorrerá da desadequação entre meios e fins, tendo importância tanto quando da criação da norma, como quando de sua aplicação (Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p. 101). Também nesse sentido Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 95).

Gilmar Ferreira Mendes examinando a aplicação do princípio da proporcionalidade, anotou “de maneira inequívoca a possibilidade de se declarar a inconstitucionalidade da lei em caso de sua dispensabilidade (inexigibilidade), inadequação (falta de utilidade para o fim perseguido) ou de ausência de razoabilidade em sentido estrito (desproporção entre o objetivo perseguido e o ônus imposto ao atingido)” (A proporcionalidade na jurisprudência do STF, publicado em Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos Editor, 1998, p. 83).

Baseado nessa premissa, o ato normativo impugnado contrasta, por fim, com os princípios da livre concorrência e da livre iniciativa (previstos nos arts. 1º, IV, e 170, caput e IV, da CF/88). O fomento da atividade econômica incumbe ao Poder Público, na forma da Constituição, mas sob esse pretexto não é possível a edição de normas arbitrárias, desarrazoadas, como essa editada pelo Município de Cubatão.

A legislação em comento, dessa forma, ofende a ordem constitucional estadual vigente (art. 144, da Constituição Bandeirante), especialmente o princípio federativo e a competência normativa da União, os princípios da razoabilidade, igualdade, livre concorrência e livre iniciativa, impondo-se a exclusão definitiva da ordem jurídico-constitucional em vigor.

 

III – Pedido liminar

         À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Cubatão apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, de maneira a evitar oneração do erário irreparável ou de difícil reparação.

         À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação da Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão.

 

IV – Pedido

         Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão.

         Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Cubatão, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

 

Termos em que, pede deferimento.

 

São Paulo, 30 de novembro de 2015.

 

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 123.515/2015

Assunto: Encaminha representação para propositura de ação direta de inconstitucionalidade com pedido de liminar face a Lei nº 3.717/2015, do Município de Cubatão

 

 

 

 

1.                Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade da Lei nº 3.717, de 30 de março de 2015, do Município de Cubatão junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.                Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 30 de novembro de 2015.

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

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