Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 31.408/15

 

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta Inconstitucionalidade. Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, Resoluções n. 900, n. 887 e n. 886, de Campinas. Criação abusiva e artificial de cargos de provimento em comissão. Advocacia Pública. Vantagem pecuniária. Gratificação. 1. É inconstitucional a criação de cargo de provimento em comissão que não retrata atribuições de assessoramento, chefia e direção senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem exercidas por servidor público investido em cargo de provimento efetivo. 2. As atribuições não revestem a excepcionalidade exigível no nível superior de assessoramento, chefia e direção como funções inerentes ao respectivo cargo de provimento em comissão. 3. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito. 4. A gratificação para os cargos de provimento em comissão contraria o princípio da razoabilidade, da moralidade e da isonomia. 5. Constituição Estadual: artigos 98, 99, 111 e 115, II e V.

 

 

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do parágrafo único do art. 10 e dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Gabinete I”, “Assessor de Gabinete II”, “Assessor de Gabinete III”, “Assessor de Base I”, “Assessor de Base II”, “Assessor de Base III”, “Oficial de Gabinete”, Assessor Especial Parlamentar I”, “Assessor Especial Parlamentar II, “Assessor Parlamentar III”, “Assessor Técnico de Gabinete I”, “Assessor Técnico de Gabinete II”, “Chefe de Gabinete de Vereador” constantes no Anexo I da Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, de Campinas, e no art. 1° da Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015; dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Comunicação Auxiliar A”, “Assessor de Comunicação Auxiliar B”, “Assessor Funcional Auxiliar”, “Assessor de Segurança”, “Assessor Técnico da Presidência”, “Diretor da Escola do Legislativo de Campinas”, “Chefe da Central de Comunicação Institucional”, “Consultor Jurídico da Presidência”, “Procurador Chefe da Câmara Municipal” constantes no Anexo I e no Anexo II da Resolução n. 886, de 17 de fevereiro de 2014, e na Resolução n. 887, de 10 de abril de 2014;  dos cargos de provimento em comissão de “Assessor Especial Parlamentar”, “Assessor Estratégico”, “Assessor Legislativo” e “Assessor de Base” previstos na Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015, da Câmara de Campinas, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – O Ato Normativo Impugnado

Ao dispor sobre o quadro de servidores de gabinete de vereador, revogar dispositivos, dentre outras providências, a Lei n. 12.170 de 27 de dezembro de 2004, trouxe em seu Anexo I cargos de provimento em comissão e em seu art. 10 suas atribuições, vejamos:

(...)

Art. 10° Os cargos de que trata o Anexo I desta lei serão exercidos em treze níveis diferentes de remuneração, complexidade e responsabilidade, com as seguintes atribuições básicas: assessoramento técnico e político ao edil; redação de ofícios, discursos, projetos e pareceres; execução de serviços de secretaria e digitação; pesquisas; acompanhamento interno e externo de assuntos de interesse do parlamentar; condução de veículo à disposição do gabinete; atendimento às pessoas encaminhadas ao gabinete; recebimento, entrega e remessa de correspondência; outras atividades afins inerentes ao respectivo gabinete

Parágrafo único É facultado ao vereador conceder ao servidor em comissão de seu gabinete, a título de Representação de Gabinete, gratificação de até cem por cento dos níveis salariais constantes no Anexo I observada a regulamentação e respeitado o limite de dotação de gabinete.”

(...)

ANEXO I

GABINETE DE VEREADOR

QUANT.

DENOMINAÇÃO

REF.

VENCIM.S (R$)

ESCOLARIDADE

05

ASSESSOR DE GABINETE I

CC1

780,00

 

05

ASSESSOR DE GABINETE II

CC2

1.040,00

 

03

ASSESSOR DE GABINETE III

CC3

1.300,00

 

05

ASSESSOR DE BASE I

CC4

1.560,00

NÍVEL FUNDAMENTAL

05

ASSESSOR DE BASE II

CC5

1.820,00

NÍVEL FUNDAMENTAL

05

ASSESSOR DE BASE III

CC6

2.080,00

NÍVEL FUNDAMENTAL

04

OFICIAL DE GABINETE

CC7

2.340,00

NÍVEL MÉDIO

04

ASSESSOR ESPECIAL PARLAMENTAR I

CC8

2.600,00

NÍVEL MÉDIO

05

ASSESSOR ESPECIAL PARLAMENTAR II

CC9

2.860,00

NÍVEL MÉDIO

03

ASSESSOR ESPECIAL PARLAMENTAR III

CC10

3.120,00

NÍVEL MÉDIO

05

ASSESSOR TÉCNICO DE GABINETE I

CC11

3.380,00

NÍVEL MÉDIO

03

ASSESSOR TÉCNICO DE GABINETE II

CC12

3.640,00

NÍVEL MÉDIO

01

CHEFE DE GABINETE DE VEREADOR

CC13

3.900,00

NÍVEL MÉDIO

 

Por sua vez, a Resolução n. 886, de 17 de fevereiro de 2014, que “dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Campinas e dá outras providências, no que interessa prevê:

 

   (...)

 

  (...)

(...)

(...)

   (...)

(...)

   

Posteriormente, a Resolução n. 887, de 10 de abril de 2014, alterou os Anexos acima expostos, vejamos:

Art. 1°. O Anexo I da Resolução n° 886, de 17 de fevereiro de 2014, fica alterado, com a seguinte redação:

ANEXO I

  CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO ORDENADOS POR SÍMBOLOS

 

Art. 2° - o Anexo II da Resolução n° 886, de 17 de fevereiro de 2014, fica alterado, com a seguinte redação:

 

ANEXO I

                CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO  -     REQUISITOS

 

Por fim, a Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015, que também altera o quadro de servidores de gabinete de vereador, prevê:

“Art. 1º - Dos atuais 1.749 (mil, setecentos e quarenta e nove) cargos em comissão previstos no Anexo I da Lei no 12.170, de 27 de dezembro de 2004, ficam imediatamente extintos 1.181 (mil, cento e oitenta e um), conforme abaixo discriminados, remanescendo até 31 de dezembro de 2016 o número de 568 (quinhentos e sessenta e oito) cargos:

I - 85 cargos de Assessor de Gabinete I, ref. CC1;

II - 85 cargos de Assessor de Gabinete II, ref. CC2;

III - 34 cargos de Assessor de Gabinete III, ref. CC3;

IV - 115 cargos de Assessor de Base I, ref. CC4;

V - 125 cargos de Assessor de Base II, ref. CC5;

VI - 115 cargos de Assessor de Base III, ref. CC6;

VII - 92 cargos de Oficial de Gabinete, ref. CC7;

VIII - 102 cargos de Assessor Especial Parlamentar I, ref. CC8;

IX - 140 cargos de Assessor Especial Parlamentar II, ref. CC9;

X - 74 cargos de Assessor Especial Parlamentar III, ref. CC10;

XI - 145 cargos de Assessor Técnico de Gabinete I, ref. CC11;

XII - 69 cargos de Assessor Técnico de Gabinete II, ref. CC12.

Art. 2º - Após a extinção de que trata o art. 1o desta Resolução, os cargos que remanescerem vagos poderão ser ocupados de acordo com a necessidade dos Gabinetes de Vereadores.

Art. 3º - A partir de 1º de janeiro de 2017, a estrutura do quadro de servidores em comissão lotados nos Gabinetes de Vereadores da Câmara Municipal de Campinas será composta, exclusivamente, pelos seguintes cargos:

I - 33 (trinta e três) cargos de Chefe de Gabinete de Vereador;

II - 33 (trinta e três) cargos de Assessor Especial Parlamentar;

III - 33 (trinta e três) cargos de Assessor Estratégico;

IV - 33 (trinta e três) cargos de Assessor Legislativo;

V - 99 (noventa e nove) cargos de Assessor de Gabinete;

VI - 99 (noventa e nove) cargos de Assessor de Base.

§ 1º - Os cargos de que trata este artigo serão distribuídos proporcional e igualitariamente entre os 33 (trinta e três) gabinetes de Vereadores.

§ 2º - Para a investidura nos cargos em comissão de que tratam os incisos I a IV deste artigo é exigido, como escolaridade mínima, o ensino médio completo, e, para a investidura nos cargos em comissão de que tratam os incisos V e VI, a escolaridade mínima será o ensino fundamental.

Art. 4º - São atribuições dos cargos previstos no artigo anterior:

I - Chefe de Gabinete de Vereador: coordenar e supervisionar as atividades do Gabinete, orientando e distribuindo as tarefas à equipe; verificar e acompanhar a elaboração e digitação de expedientes e correspondências em geral, mantendo o Vereador informado a respeito; estabelecer rotinas internas para operacionalizar os trabalhos; realizar, a pedido do Vereador, estudos e pesquisas sobre assuntos abrangidos pela área de competência legislativa do Município; articular, junto à Administração da Câmara, em nome do Vereador, toda e qualquer demanda para atendimento de necessidades do Gabinete, bem como o material necessário ao seu funcionamento; cumprir e fazer cumprir as determinações e as normas e procedimentos disciplinares da Câmara; indicar períodos de férias dos servidores e assessores do Gabinete, bem como realizar o controle da frequência e das atividades desenvolvidas por cada um; zelar pela constante atualização dos registros e controles pertinentes ao Gabinete; estabelecer o controle de tramitação de documentos e processos de interesse do Vereador; e exercer outras atribuições afins;

II - Assessor Especial Parlamentar: Empregar seu conhecimento no desenvolvimento de pesquisas, levantamento de informações e dados; analisar proposições legislativas, planilhas, cálculos, imagens e outros, podendo elaborar e criar documentos diversos como subsídio para a tomada de decisão do Vereador, dentro de sua área de conhecimento, especialmente em relação à participação do Parlamentar em diversas Comissões Permanentes e

Temporárias, Reuniões Plenárias, de lideranças e afins; elaborar pronunciamentos, quando solicitado; representar o Vereador em reuniões internas;

III - Assessor Estratégico: Assessorar no levantamento temático, teórico e prático das matérias e demandas que sejam levadas ao conhecimento do Vereador, ou a seu pedido, subsidiando ações e proposições de interesse do Mandato Parlamentar, podendo se valer dos meios de comunicação disponíveis, visitas a órgãos públicos e outros elementos que sejam pertinentes ao aperfeiçoamento e conteúdo das propostas a serem apresentadas pelo Parlamentar;

IV - Assessor Legislativo: Acompanhar o desenvolvimento das atividades do Gabinete em relação à Câmara Municipal, elaborando documentos diversos de interesse do Mandato do Vereador, sua tramitação no âmbito da Câmara Municipal e demais órgãos públicos, em especial as proposições previstas no Regimento Interno, podendo também acompanhar o desenvolvimento das atividades das Reuniões Plenárias, das Comissões Permanentes e Temporárias, prestando apoio e assessoria nos trabalhos do Vereador durante tal mister; assessorar o Vereador na análise de proposições, tanto de origem legislativa

quanto executiva, bem como no exame de proposições submetidas à relatoria do Vereador;

V - Assessor de Gabinete: Assessorar o Vereador no atendimento à população, entes organizados, empresariado, instituições e demais representados em geral e na organização e manutenção das demandas, registros e controles do Gabinete, utilizando os meios de comunicação, informação, pesquisa e armazenamento disponíveis, de modo que o Vereador tenha conhecimento de todas as atividades desenvolvidas no âmbito do Gabinete;

VI - Assessor de Base: Trabalhar na identificação de demandas diversas de interesse da cidade, dos cidadãos e da comunidade em geral, podendo realizar atividades preparatórias e de levantamento de dados e informações, necessárias às atividades parlamentares e fiscalizatórias, utilizando-se dos meios de comunicação, informação e pesquisa que lhe sejam disponibilizados; assessorar o Vereador na interlocução junto aos cidadãos, empresas, sociedades organizadas e outros, a partir de sua atuação no âmbito do Gabinete ou externamente, quando necessário, gerando expedientes próprios das atividades de fiscalização e atuação parlamentar.

Parágrafo único - São atribuições comuns a todos os cargos: cumprir e fazer cumprir as obrigações de servidor público, respondendo pelos prejuízos que vier a causar, nos termos do Estatuto dos Servidores do Município de Campinas e legislação correlata; utilizar-se de veículo que seja colocado à disposição do Gabinete para o exercício das atividades inerentes ao Poder Legislativo, cumpridas as exigências estabelecidas pela Câmara Municipal; colaborar para o bom andamento dos trabalhos do Gabinete e da Instituição em geral, imprimindo eficiência e celeridade em todas as condutas.

Art. 5º - A fixação da remuneração dos cargos previstos no artigo 3º desta Resolução será feita através de Lei própria.

Art. 6º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.”

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

           As leis impugnadas contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

           Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144, que assim estabelece:

“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

           As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Artigo 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. 

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal. 

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

(...)

Artigo 99 - São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado: 

I - representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais; 

II - exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior;

(...)

Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 – Para a organização da administração pública direta ou indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento; (...)”.

CRIAÇÃO ABUSIVA E ARTIFICIAL DE CARGOS OU EMPREGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO

         Dos dispositivos constitucionais que servem como parâmetro capta-se ser inconstitucional a criação de cargos de provimento em comissão cujas atribuições são de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento efetivo mediante aprovação em concurso público.

         Embora seja razoável a criação de cargos de provimento em comissão para prestação de assessoramento aos parlamentares ou aos dirigentes da corporação legislativa, a descrição das atribuições levada a efeito não revela essa natureza exigente da confiança senão plexo de competências comuns, técnicas, profissionais.

         Ponto pacífico é que a criação de cargos de provimento em comissão não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional, devendo, nos termos do art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, e do art. 115, II e V, da Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada para o exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.

         Não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção, e não nos meramente burocráticos, definitivos, operacionais, técnicos, de natureza profissional e permanente.

         Portanto, têm a ver com essas atribuições de natureza especial (assessoramento, chefia e direção em nível superior), para as quais se exige relação de confiança, pouco importando a denominação e a forma de provimento atribuídas, pois, verba non mutant substantiam rei. Necessária é a análise de sua natureza excepcional, a qual não se satisfaz com a mera declaração do legislador. O essencial é análise do plexo de atribuições das funções públicas.

         É dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes político-governamentais. Não coaduna a criação de cargos desse jaez – cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou funções profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas, rotineiras.

         Neste sentido:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL QUE CRIA CARGOS EM COMISSÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 37, INCISOS II E V, DA CONSTITUIÇÃO. 2. Os cargos em comissão criados pela Lei nº 1.939/1998, do Estado de Mato Grosso do Sul, possuem atribuições meramente técnicas e que, portanto, não possuem o caráter de assessoramento, chefia ou direção exigido para tais cargos, nos termos do art. 37, V, da Constituição Federal. 3. Ação julgada procedente" (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007).

“Ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão. Necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público” (STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel., Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJ 14-09-2007, p. 30).

“Os dispositivos em questão, ao criarem cargos em comissão para oficial de justiça e possibilitarem a substituição provisória de um oficial de justiça por outro servidor escolhido pelo diretor do foro ou um particular credenciado pelo Presidente do Tribunal, afrontaram diretamente o art. 37, II da Constituição, na medida em que se buscava contornar a exigência de concurso público para a investidura em cargo ou emprego público, princípio previsto expressamente nesta norma constitucional” (STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16).

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. LEI MUNICIPAL. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÕES NÃO INERENTES A NATUREZA DAS FUNÇÕES DE CHEFIA, ASSESSORAMENTO E DIREÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 280 DESTA CORTE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. NÃO OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS. SÚMULAS 282 E 356 DESTA CORTE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 279 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A ofensa a direito local não viabiliza o apelo extremo, consoante enunciado da Súmula 280 do STF. 2. O requisito do prequestionamento é indispensável, por isso que inviável a apreciação, em sede de recurso extraordinário, de matéria sobre a qual não se pronunciou o Tribunal de origem, incidindo o óbice das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal, verbis: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada’ e ‘O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.’ 3. A Súmula 279/STF dispõe, in verbis: ‘Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.’ 4. O recurso extraordinário não se presta ao exame de questões que demandam revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, adstringindo-se à análise da violação direta da ordem constitucional. 5. In casu, o acórdão recorrido assim assentou: ‘Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n.º 360, de 20 de janeiro de 2010 e Lei n.º 11/2000. Município de Tucunduva. Criação de cargos em comissão que não se revestem das características e exigências constitucionais. A faculdade de que dispõe a administração pública de criar cargos de livre nomeação e exoneração deve observar, além do princípio da legalidade, a disposição constitucional que determina a realização de concurso público de provas ou de provas e títulos para a investidura em cargos públicos, reservando-se a possibilidade de contratação pela via comissionada somente a determinadas exceções constitucionais, a fim de garantir o amplo acesso da comunidade aos cargos públicos, corolário que é do princípio da impessoalidade. Afronta aos artigos 8º, 19, caput e inciso I, caput, 20, caput e parágrafo 4º, e 32, caput, todos da Constituição Estadual, combinados com o artigo 37, incisos II e V, da Constituição Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade Julgada Procedente. Unânime.’ 6. Agravo regimental desprovido” (STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012).

“Agravo regimental no agravo de instrumento. Lei municipal que criou cargos em comissão referentes a funções que não dependem de vínculo de confiança pessoal. Inadmissibilidade. Precedentes.

1. A criação de cargos em comissão referentes a funções para cujo desempenho não é necessária a confiança pessoal viola o disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal.

2. Jurisprudência pacífica desta Suprema Corte nesse sentido.

3. Agravo regimental não provido” (STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663).

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LEIS MUNICIPAIS QUE CRIAM CARGOS EM COMISSÃO SEM CARÁTER DE CHEFIA, ASSESSORAMENTO E DIREÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE. ANÁLISE DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS EM COMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 323 DO RISTF C.C. ART. 102, III, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REEXAME DA MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA E DA LEGISLAÇÃO LOCAL. VEDAÇÃO. SÚMULAS N. 279 E 280 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A repercussão geral pressupõe recurso admissível sob o crivo dos demais requisitos constitucionais e processuais de admissibilidade (art. 323 do RISTF). 2. Consectariamente, quando a ofensa for reflexa ou mesmo quando a violação for constitucional, mas necessária a análise de fatos e provas, não há como se pretender seja reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso (art. 102, III, § 3º, da CF). 3. ‘É inconstitucional a criação de cargos em comissão que não possuem caráter de assessoramento, chefia ou direção e que não demandam relação de confiança entre o servidor nomeado e o seu superior hierárquico’ (ADI 3.602, Pleno, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 7.6.11). No mesmo sentido: AI 656.666-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJ de 5.3.2012 e ADI 3.233, Pleno, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJe 14.9.2007. 4. Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo Tribunal de origem quanto à natureza das atribuições relacionadas aos cargos em comissão, necessário seria o reexame da matéria fático-probatória e da legislação local que o orientou (Leis Municipais 14.375/04, 14.840/05, 14.841/05, 14.842/05, 14.843/05, 14.845/05), o que inviabiliza o extraordinário, a teor dos Enunciados das Súmulas ns. 279 e 280 do Supremo Tribunal Federal, verbis: ‘Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário’ e ‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’. 5. In casu, o acórdão originalmente recorrido assentou: ‘AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Expressões e dispositivos das Leis Municipais nº 14.375, de 27 de dezembro de 2007 e nºs 14.840, 14.841, 14.842, 14.843, 14.845m, de 18 dezembro de 2008, e seus anexos, que tratam da criação de cargos em comissão de assessoria na Prefeitura Municipal de São Carlos e em sua Administração Indireta, como fundações, PROHAB e Serviço Autônomo de Água e Esgoto – Atribuições que não exigem necessidade de vínculo especial de confiança e lealdade, a justificar a criação de cargo em comissão – Funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais, típicas de cargos de provimento efetivo, a ser preenchido por servidor concursado – Violação dos arts. 111, 115, II e V, e 144 da CE – Procedência da ação.’ 6. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012).

“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito administrativo. 3. Criação de cargos em comissão por leis municipais. Declaração de inconstitucionalidade pelo TJRS por violação à disposição da Constituição estadual em simetria com a Constituição Federal. 3. É necessário que a legislação demonstre, de forma efetiva, que as atribuições dos cargos a serem criados se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração. Caráter de direção, chefia e assessoramento. Precedentes do STF. 4. Ausência de argumentos suficientes para infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-02-2012, v.u., DJe 05-03-2012).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXPRESSÃO ‘CARGOS EM COMISSÃO’ CONSTANTE DO CAPUT DO ART. 5º, DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º E DO CAPUT DO ART. 6º; DAS TABELAS II E III DO ANEXO II E DAS TABELAS I, II E III DO ANEXO III À LEI N. 1.950/08; E DAS EXPRESSÕES ‘ATRIBUIÇÕES’, ‘DENOMINAÇÕES’ E ‘ESPECIFICAÇÕES’ DE CARGOS CONTIDAS NO ART. 8º DA LEI N. 1.950/2008. CRIAÇÃO DE MILHARES DE CARGOS EM COMISSÃO. DESCUMPRIMENTO DOS ARTS. 37, INC. II E V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. (...) 4. A obrigatoriedade de concurso público, com as exceções constitucionais, é instrumento de efetivação dos princípios da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, garantidores do acesso aos cargos públicos aos cidadãos. A não submissão ao concurso público fez-se regra no Estado do Tocantins: afronta ao art. 37, inc. II, da Constituição da República. Precedentes. 5. A criação de 28.177 cargos, sendo 79 de natureza especial e 28.098 em comissão, não tem respaldo no princípio da moralidade administrativa, pressuposto de legitimação e validade constitucional dos atos estatais. 6. A criação de cargos em comissão para o exercício de atribuições técnicas e operacionais, que dispensam a confiança pessoal da autoridade pública no servidor nomeado, contraria o art. 37, inc. V, da Constituição da República. Precedentes. (...)” (STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI MUNICIPAL N. 099, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2005, DO MUNICÍPIO DE ILHA SOLTEIRA. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO, DE LIVRE PROVIMENTO E EXONERAÇÃO – NATUREZA SOMENTE TÉCNICA OU BUROCRÁTICA DOS CARGOS CRIADOS, MUITOS DE CARÁTER PERMANENTE, NÃO EXIGINDO DE SEUS OCUPANTES NENHUM VÍNCULO ESPECIAL DE CONFIANÇA OU FIDELIDADE COM O PREFEITO MUNICIPAL – OFENSA AO DISPOSTO NO ART. 111 E NO ART. 115, INCISOS I, II E V, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO – AÇÃO DIRETA PROCEDENTE” (TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008).

Feitas essas considerações, os cargos de Assessor de Gabinete I, de Assessor de Gabinete II, de Assessor de Gabinete III, de Assessor de Base I, de Assessor de Base II, de Assessor de Base III, de Oficial de Gabinete, de Assessor Especial Parlamentar I, de Assessor Especial Parlamentar II, de Assessor Especial Parlamentar III, de Assessor Técnico de Gabinete I, de Assessor de Gabinete II, de Chefe de Gabinete de Vereador previstos na Lei n. 12.170/04, bem como no art. 1° da Resolução n. 900/15, são claramente inconstitucionais, pois o legislador municipal, além de limitar-se a descrever as atribuições para todos esses cargos em um único artigo - no art. 10 da Lei n. 12.170/04 –, o fez com elevado grau de generalidade, imprecisão e indeterminação e, ao mesmo tempo, expressou atribuições que, em realidade, são técnicas, profissionais e ordinárias e que, portanto, não revestem a excepcionalidade exigível no nível superior de assessoramento, chefia e direção como funções inerentes aos respectivos cargos de provimento em comissão.

Ainda, a previsão das atribuições em um único artigo demonstra que o próprio legislador não os reconheceu como casos individualizáveis e merecedores da excepcionalidade da não observância do princípio do concurso público. Ora, “execução de serviços de secretaria e digitação; pesquisas e recebimento, entrega e remessa de correspondência” não são algo que revele a necessidade de confiança.

 Observa-se, ainda, que as referências dos vencimentos variam conforme o cargo, classificado em I, II ou III, sem justificativa plausível para tanto.

Do mesmo modo, são inconstitucionais os cargos de provimento em comissão de Assessor de Comunicação Auxiliar A e de Assessor de Comunicação Auxiliar B que possuem as mesmas atribuições técnicas e burocráticas de “acompanhar e orientar as transmissões da TV Câmara, a inserções de rádio, e as publicações do Portal da Internet, em sintonia com a Central de Comunicação Institucional, sugerindo alterações ou inclusões quando necessário.” previstas no art. 17 da Resolução 886/14.

Ademais, as atribuições dos cargos de Assessor Funcional Auxiliar, de Assessor de Segurança e de Assessor Técnico da Presidência, respectivamente, a título de exemplo, de “orientar e acompanhar a execução dos trabalhos de natureza burocrática, administrativa e de serviços auxiliares desenvolvidos no Gabinete da Presidência”, de “estabelecer contatos com órgãos públicos da área da segurança, visando prevenir e atuar em manifestações públicas ou eventos promovidos pela Câmara;”, de realizar estudos técnicos, administrativos e legislativos; bem como pesquisas e missões técnicas especiais;” também revelam desempenho de função de natureza técnica e não evidenciam o elemento fiduciário necessário para autorizar a contratação sem concurso público.

Quanto aos cargos de Chefe da Central de Comunicação Institucional e de Diretor da Escola do Legislativo de Campinas, as atribuições também revelam funções de natureza técnica com ausência de elemento fiduciário, cite-se, respectivamente, a de “dirigir e orientar a cobertura jornalística de atividades e atos de caráter público da Câmara e fazer noticiar as atividades de interesse público por ela realizadas;” e a de “oferecer aos parlamentares e aos servidores da Câmara Municipal de Campinas suporte conceitual e treinamento para a elaboração de normas legais e para o exercício do poder de fiscalização”.

Da leitura das atribuições dos cargos de Assessor Especial Parlamentar, de Assessor Estratégico, de Assessor Legislativo e de Assessor de Base previstos na Resolução n. 900/15 extrai-se que são funções de natureza puramente profissional, técnica, burocrática ou operacional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior. Ainda, foram as atribuições descritas de maneira sucinta, genérica e imprecisa.

Ressalte-se, por fim, que a quantidade dos cargos de provimento em comissão existentes no quadro de pessoal da Câmara Municipal de Campinas fere a proporcionalidade e a razoabilidade exigidas.

 

DO CARGO DE CONSULTOR JURÍDICO DA PRESIDÊNCIA E DE PROCURADOR CHEFE DA CÂMARA MUNICIPAL

        Conforme demonstrado anteriormente, há no quadro de cargos de provimento em comissão os cargos de Consultor Jurídico da Presidência e de Procurador Chefe da Câmara Municipal. Todavia, as atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais investidos mediante aprovação em concurso público.

        É o que se infere dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual.

        Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público, inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes, o que é reverberado pela jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

DA GRATIFICAÇÃO PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 10 DA LEI N. 12.170/04

As vantagens pecuniárias são acréscimos permanentes ou efêmeros ao vencimento dos servidores públicos, compreendendo adicionais e gratificações.

Enquanto o adicional significa recompensa ao tempo de serviço (ex facto temporis) ou retribuição pelo desempenho de atribuições especiais ou condições inerentes ao cargo (ex facto officii), a gratificação constitui recompensa pelo desempenho de serviços comuns em condições anormais ou adversas (condições diferenciadas do desempenho da atividade – propter laborem) ou retribuição em face de condições pessoais ou situações onerosas do servidor (propter personam) [Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2001, 26ª ed., p. 449; Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., p. 233; Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 3ª ed., p. 760].

 Se tradicional ensinança assinala que “o que caracteriza o adicional e o distingue da gratificação é o ser aquele uma recompensa ao tempo do serviço do servidor, ou uma retribuição pelo desempenho de funções especiais que refogem da rotina burocrática, e esta, uma compensação por serviços comuns executados em condições anormais para o servidor, ou uma ajuda pessoal em face de certas situações que agravam o orçamento do servidor” (Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2001, 26ª ed., p. 452), agrega-se a partir de uma distinção mais aprofundada que “a gratificação é uma vantagem relacionada a circunstâncias subjetivas do servidor, enquanto o adicional se vincula a circunstâncias objetivas. (...) dois servidores que desempenhem um mesmo cargo farão jus a adicionais idênticos. Já as gratificações serão a eles concedidas em vista das características individuais de cada um. No entanto, é evidente que tais gratificações se sujeitam ao princípio da isonomia, de modo a que dois servidores que apresentem idênticas circunstâncias objetivas farão jus a benefícios iguais” (Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 3ª ed., p. 761).

Ou seja, os adicionais são compensatórios dos encargos decorrentes de funções especiais apartadas da atividade administrativa ordinária e as gratificações dos riscos ou ônus de serviços comuns realizados em condições extraordinárias. Com efeito, “se o adicional de função (ex facto officii) tem em mira a retribuição de uma função especial exercida em condições comuns, a gratificação de serviço (propter laborem) colima a retribuição do serviço comum prestado em condições especiais” (Wallace Paiva Martins Junior. Remuneração dos agentes públicos, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 85). 

Ademais, oportuno admoestar que “as vantagens pecuniárias, sejam adicionais, sejam gratificações, não são meios para majorar a remuneração dos servidores, nem são meras liberalidades da Administração Pública. São acréscimos remuneratórios que se justificam nos fatos e situações de interesse da Administração Pública” (Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., p. 233).  

Os adicionais são devidos em razão do tempo de serviço (adicionais de vencimento ou por tempo de serviço) ou do exercício de cargo (condições inerentes ao cargo) que exige conhecimentos especializados ou regime especial de trabalho (adicionais de função) como melhora de retribuição. O adicional de função (ex facto officii) repousa no trabalho que está sendo feito (pro labore faciendo), razão pela qual cessado seu motivo, elide-se o respectivo pagamento, e compreende as seguintes espécies: “de tempo integral (regime em que o servidor fica inteiramente à disposição da pessoa a que se liga e proibido de exercer qualquer outra atividade pública ou privada), de dedicação plena (regime em que o servidor desempenha suas atribuições exclusivamente à pessoa pública a que se vincula, sem estar impedido de desempenhar outras em entidade pública ou privada, diversas das que desempenha para a pessoa pública em regime de dedicação plena) e de nível universitário (desempenho de atribuições que exige um conhecimento especializado, só alcançado pelos detentores de títulos universitários)” (Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., pp. 230-231).

As gratificações são precária e contingentemente instituídas para o desempenho de serviços comuns em condições anormais de segurança, salubridade ou onerosidade (gratificações de serviço) ou a título de ajuda em face de certos encargos pessoais (gratificações pessoais). A gratificação de serviço é “propter laborem” e “é outorgada ao servidor a título de recompensa pelos ônus decorrentes do desempenho de serviços comuns em condições incomuns de segurança ou salubridade, ou concedida para compensar despesas extraordinárias realizadas no desempenho de serviços normais prestados em condições anormais” (Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., p. 232), albergando, por exemplo, situações como risco de vida ou saúde, serviços extraordinários (prestação fora da jornada de trabalho), local de exercício ou da prestação do serviço, razão do trabalho (bancas, comissões).

É assaz relevante destacar que “o que caracteriza essa modalidade de gratificação é sua vinculação a um serviço comum, executado em condições excepcionais para o funcionário, ou a uma situação normal do serviço mas que acarreta despesas extraordinárias para o servidor”, razão pela qual “essas gratificações só devem ser percebidas enquanto o servidor está prestando o serviço que as enseja, porque são retribuições pecuniárias pro labore faciendo e propter laborem. Cessado o trabalho que lhes dá causa ou desaparecidos os motivos excepcionais e transitórios que as justificam, extingue-se a razão de seu pagamento” (Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2001, 26ª ed., pp. 457-458).

              Partindo dessa conceituação, patente a inconstitucionalidade da gratificação, a título de Representação de Gabinete, de até 100%, prevista no parágrafo único do art. 10 da Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, de Campinas.

           Ademais, os cargos de provimento em comissão são considerados especiais por natureza, sendo exceções à regra do concurso público.  Mostra-se, assim, injustificada a concessão de referida gratificação.

              Por esta razão, a gratificação para os cargos de provimento em comissão contraria o princípio da razoabilidade, da moralidade e da isonomia, que devem nortear a Administração Pública e a atividade legislativa, previstos no art. 111 da Constituição do Estado.

III – Pedido liminar

           À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos normativos municipais apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se atuação desconforme o ordenamento jurídico, criadora de lesão irreparável ou de difícil reparação, consistente na admissão ilegítima de servidores públicos e correlata percepção de remuneração à custa do erário.

           À luz desta contextura, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do parágrafo único do art. 10 e dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Gabinete I”, “Assessor de Gabinete II”, “Assessor de Gabinete III”, “Assessor de Base I”, “Assessor de Base II”, “Assessor de Base III”, “Oficial de Gabinete”, Assessor Especial Parlamentar I”, “Assessor Especial Parlamentar II, “Assessor Parlamentar III”, “Assessor Técnico de Gabinete I”, “Assessor Técnico de Gabinete II”, “Chefe de Gabinete de Vereador” constantes no Anexo I da Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, de Campinas, e no art. 1° da Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015; dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Comunicação Auxiliar A”, “Assessor de Comunicação Auxiliar B”, “Assessor Funcional Auxiliar”, “Assessor de Segurança”, “Assessor Técnico da Presidência”, “Diretor da Escola do Legislativo de Campinas”, “Chefe da Central de Comunicação Institucional”, “Consultor Jurídico da Presidência”, “Procurador Chefe da Câmara Municipal” constantes no Anexo I e no Anexo II da Resolução n. 886, de 17 de fevereiro de 2014, e na Resolução n. 887, de 10 de abril de 2014;  e dos cargos de provimento em comissão de “Assessor Especial Parlamentar”, “Assessor Estratégico”, “Assessor Legislativo” e “Assessor de Base” previstos na Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015, da Câmara de Campinas.

IV – Pedido

           Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 10 e dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Gabinete I”, “Assessor de Gabinete II”, “Assessor de Gabinete III”, “Assessor de Base I”, “Assessor de Base II”, “Assessor de Base III”, “Oficial de Gabinete”, Assessor Especial Parlamentar I”, “Assessor Especial Parlamentar II, “Assessor Parlamentar III”, “Assessor Técnico de Gabinete I”, “Assessor Técnico de Gabinete II”, “Chefe de Gabinete de Vereador” constantes no Anexo I da Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, de Campinas, e no art. 1° da Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015; dos cargos de provimento em comissão de “Assessor de Comunicação Auxiliar A”, “Assessor de Comunicação Auxiliar B”, “Assessor Funcional Auxiliar”, “Assessor de Segurança”, “Assessor Técnico da Presidência”, “Diretor da Escola do Legislativo de Campinas”, “Chefe da Central de Comunicação Institucional”, “Consultor Jurídico da Presidência”, “Procurador Chefe da Câmara Municipal” constantes no Anexo I e no Anexo II da Resolução n. 886, de 17 de fevereiro de 2014, e na Resolução n. 887, de 10 de abril de 2014;  e dos cargos de provimento em comissão de “Assessor Especial Parlamentar”, “Assessor Estratégico”, “Assessor Legislativo” e “Assessor de Base” previstos na Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015, da Câmara de Campinas.

           Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Campinas, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                  

                   Termos em que, pede deferimento.

                                

                                São Paulo, 12 de janeiro de 2016.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

ms/acssp

 

 

 

 

 

Protocolado n. 31.408/15

Interessado: Promotoria de Justiça de Campinas

 

 

 

 

 

 

                   Promova-se a distribuição no egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo desta ação direta de inconstitucionalidade impugnando o parágrafo único do art. 10 e os cargos de provimento em comissão de “Assessor de Gabinete I”, “Assessor de Gabinete II”, “Assessor de Gabinete III”, “Assessor de Base I”, “Assessor de Base II”, “Assessor de Base III”, “Oficial de Gabinete”, Assessor Especial Parlamentar I”, “Assessor Especial Parlamentar II, “Assessor Parlamentar III”, “Assessor Técnico de Gabinete I”, “Assessor Técnico de Gabinete II”, “Chefe de Gabinete de Vereador” constantes no Anexo I da Lei n. 12.170, de 27 de dezembro de 2004, de Campinas, e no art. 1° da Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015; os cargos de provimento em comissão de “Assessor de Comunicação Auxiliar A”, “Assessor de Comunicação Auxiliar B”, “Assessor Funcional Auxiliar”, “Assessor de Segurança”, “Assessor Técnico da Presidência”, “Diretor da Escola do Legislativo de Campinas”, “Chefe da Central de Comunicação Institucional”, “Consultor Jurídico da Presidência”, “Procurador Chefe da Câmara Municipal” constantes no Anexo I e no Anexo II da Resolução n. 886, de 17 de fevereiro de 2014, e na Resolução n. 887, de 10 de abril de 2014; e os cargos de provimento em comissão de “Assessor Especial Parlamentar”, “Assessor Estratégico”, “Assessor Legislativo” e “Assessor de Base” previstos na Resolução n. 900, de 03 de junho de 2015, da Câmara de Campinas, instruída com o protocolado em epígrafe referido.

                            São Paulo, 12 de janeiro de 2016.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

ms/acssp