Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 150.879/13

 

 

 

 

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013 (art. 1º), e Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007 (Arts. 3º, I e 4º), do Município de Palestina. Ação Direta Inconstitucionalidade. Criação de cargos ou empregos de provimento em comissão. Ausência de descrição de atribuições de assessoramento, chefia e direção. Adoção incompossível do regime celetista. Exigibilidade de provimento efetivo para postos inerentes à Advocacia Pública. É inconstitucional a criação de cargos ou empregos de provimento em comissão cujas atribuições não estão descritas a evidenciar funções de assessoramento, chefia e direção, inclusive as da advocacia pública, e cujo regime celetista adotado cerceia a liberdade de exoneração (arts. 98, §§ 1º a 3º, 111, 115, II e V, CE/89).

 

 

 

 

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 1º da Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013, e do inciso I do art. 3º e do art. 4º da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, e, por arrastamento, do art. 1º da Lei n. 1.787, de 31 de março de 2009, do art. 1º da Lei n. 1.825, de 30 de dezembro de 2009, do art. 2º da Lei n. 1.849, de 29 de dezembro de 2010, do art. 1º da Lei n. 1.863, de 06 de outubro de 2011, e do § 1º do art. 5º e do Anexo I, da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, do Município de Palestina, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – Os Atos Normativos Impugnados

1.                O Município de Palestina editou leis que criam postos de provimento em comissão de Assessor de Assuntos Jurídicos, Assessor de Gabinete, Assessor Jurídico, Assessor Jurídico do Gabinete, Chefe de Departamento, Chefe de Divisão, Chefe de Expediente, Chefe de Setor, Chefe de Gabinete, Diretor de Planejamento, Assessor de Contratos e Convênios, Chefe de Protocolo, Chefe de Atendimento, Chefe de Transporte, Chefe da Divisão de Transporte Médico de Urgência, Chefe de Divisão de Vigilância Sanitária, Diretor de Planejamento de Saúde e de Diretor de Gabinete, cujas atribuições não foram descritas em lei.

2.                 O art. 1º da Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013 (fls. 41/42), assim dispõe:

“Art. 1º. O Anexo I – Quadro de Empregos em Comissão da Lei Complementar nº 1766, de 20 de dezembro de 2007, passa a vigorar com a seguinte redação:

QUADRO DE EMPREGOS EM COMISSÃO (Q.E.C.)

EMPREGO

REFERÊNCIA SALARIAL

QUANTIDADE

Assessor de Assuntos Jurídicos

35

01

Assessor de Gabinete

29

01

Assessor Jurídico

35

01

Assessor Jurídico de Gabinete

35

01

Chefe de Departamento

29

05

Chefe de Divisão

29

05

Chefe de Expediente

20

02

Chefe de Setor

29

03

Chefe de Gabinete

34

01

Diretor de Planejamento

29

01

Assessor de Contratos e Convênios

34

01

Chefe de Protocolo

20

01

Chefe de Atendimento

20

01

Chefe de Transporte

29

01

Chefe da Divisão de Transporte Médico e de Urgência

29

01

Chefe de Divisão de Vigilância Sanitária

23

01

Diretor de Planejamento de Saúde

35

01

Diretor de Gabinete

35

01

 

3.                Referida lei enuncia em seu art. 6º que:

“Ficam revogados todos os dispositivos que contrariem a presente Lei e ratificadas as demais normas não alteradas da Lei Municipal nº 1.766, de 20 de maio de 2.007, dispondo sobre o Quadro Geral dos Servidores Públicos da Prefeitura Municipal de Palestina”.

4.                Anteriormente, a Lei n. 1.787, de 31 de março de 2009 (fls. 19/20), cujo art. 1º alterou o Anexo I da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, dispondo sobre os empregos em comissão, havia estabelecido os empregos comissionados de Assessor de Assuntos Jurídicos, Chefe de Gabinete, Chefe de Departamento, Chefe de Divisão, Chefe de Expediente, Coordenador dos Serviços de Água e Esgoto, Coordenador de Transportes de Estudantes, Coordenador da Unidade de Saúde, Diretor de Planejamento, Coordenador de Vigilância Sanitária, Assessor Jurídico de Gabinete e Chefe de Setor, também sem descrever suas atribuições.

5.                A Lei n. 1.825, de 30 de dezembro de 2009 (fl. 24), criou o cargo de provimento em comissão de Gerente de Contratos e Convênios em seu art. 1º.

6.                A Lei n. 1.849, de 29 de dezembro de 2010 (fl. 25), criou o cargo de provimento em comissão de Assessor de Gabinete em seu art. 2º.

7.                A Lei n. 1.863, de 06 de outubro de 2011 (fl. 26), criou o cargo de provimento em comissão de Assessor Jurídico “Advogado” em seu art. 1º.

8.                 Por sua vez, a Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, que estabelece o Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Palestina tem os seguintes dispositivos de relevo para a presente ação:

“ARTIGO 3º - O quadro de pessoal compõe-se de:

I – empregos em comissão;

(...)

PARÁGRAFO ÚNICO: O regime jurídico de contratação adotado aos servidores públicos é o da Consolidação das Leis do Trabalho.

(...)

ARTIGO 4º - Os empregos em comissão são de confiança e de livre admissão e demissão pelo Prefeito Municipal.

ARTIGO 5º - Os empregos em comissão regulam-se pelas disposições da Lei n. 1.503/99, que dispõe sobre a Organização Administrativa da Prefeitura Municipal.

PARÁGRAFO PRIMEIRO – O Quadro de Empregos em Comissão é consolidado e alterado na forma do Anexo I, desta Lei” (fls. 53/79).

9.                Esse Anexo I prevê os empregos comissionados de Assessor de Assuntos Jurídicos, Chefe de Gabinete, Chefe de Departamento, Chefe de Divisão, Chefe de Expediente, Coordenador dos Serviços de Água e Esgoto, Coordenador de Transportes de Estudantes, Coordenador da Unidade de Saúde, Diretor de Planejamento, Coordenador de Vigilância Sanitária, Assessor Jurídico de Gabinete e Chefe de Setor.

10.              Todos esses diplomas legais não descrevem as atribuições dos cargos ou empregos de provimento em comissão criados, conforme certidão de sua respectiva vigência (fls. 51/91).

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

11.              Os dispositivos acima transcritos dos atos normativos impugnados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

12.              Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta.

13.              As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Artigo 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. 

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal. 

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

(...)

Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 – Para a organização da administração pública direta ou indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

A – CRIAÇÃO ABUSIVA E ARTIFICIAL DE CARGOS OU EMPREGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO

14.              É inconstitucional a criação de cargos ou empregos de provimento em comissão cujas atribuições são de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento efetivo mediante aprovação em concurso público.

15.              A criação de cargos de provimento em comissão não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional, devendo, nos termos do art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, e do art. 115, II e V, da Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada para o exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.

16.              Não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção, e não nos meramente burocráticos, definitivos, operacionais, técnicos, de natureza profissional e permanente.

17.              Portanto, têm a ver com essas atribuições de natureza especial (assessoramento, chefia e direção em nível superior), para as quais se exige relação de confiança, pouco importando a denominação e a forma de provimento atribuídas, pois, verba non mutant substantiam rei. Necessária é a análise de sua natureza excepcional, a qual não se satisfaz com a mera declaração do legislador. O essencial é análise do plexo de atribuições das funções públicas.

18.              É dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes político-governamentais. Não coaduna a criação de cargos desse jaez – cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou funções profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas, rotineiras.

19.              A jurisprudência proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, ao exigir que elas demonstrem, de forma efetiva, que eles tenham funções de assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008). Neste sentido:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS 6.600/1998 (ART. 1º, CAPUT E INCISOS I E II), 7.679/2004 E 7.696/2004 E LEI COMPLEMENTAR 57/2003 (ART. 5º), DO ESTADO DA PARAÍBA. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. I - Admissibilidade de aditamento do pedido na ação direta de inconstitucionalidade para declarar inconstitucional norma editada durante o curso da ação. Circunstância em que se constata a alteração da norma impugnada por outra apenas para alterar a denominação de cargos na administração judicial estadual; alteração legislativa que não torna prejudicado o pedido na ação direta. II - Ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão. Necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público. Precedentes. Ação julgada procedente” (STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJe 13-09-2007, RTJ 202/553).

“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito administrativo. 3. Criação de cargos em comissão por leis municipais. Declaração de inconstitucionalidade pelo TJRS por violação à disposição da Constituição estadual em simetria com a Constituição Federal. 3. É necessário que a legislação demonstre, de forma efetiva, que as atribuições dos cargos a serem criados se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração. Caráter de direção, chefia e assessoramento. Precedentes do STF. 4. Ausência de argumentos suficientes para infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-02-2012, v.u., DJe 05-03-2012).

20.              No caso, para agravar, as leis locais não cuidaram de especificar nem descrever as atribuições de assessoramento, chefia ou direção dos empregos comissionados criados, o que também implica violação aos arts. 111 e 115, II e V, da Constituição Estadual, da mesma maneira que se houvesse delegação a ato normativo do Chefe do Poder Executivo para tanto, pois, não observada a reserva legal.

21.              Neste sentido, pronuncia a jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXPRESSÃO ‘CARGOS EM COMISSÃO’ CONSTANTE DO CAPUT DO ART. 5º, DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º E DO CAPUT DO ART. 6º; DAS TABELAS II E III DO ANEXO II E DAS TABELAS I, II E III DO ANEXO III À LEI N. 1.950/08; E DAS EXPRESSÕES ‘ATRIBUIÇÕES’, ‘DENOMINAÇÕES’ E ‘ESPECIFICAÇÕES’ DE CARGOS CONTIDAS NO ART. 8º DA LEI N. 1.950/2008. CRIAÇÃO DE MILHARES DE CARGOS EM COMISSÃO. DESCUMPRIMENTO DOS ARTS. 37, INC. II E V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. A legislação brasileira não admite desistência de ação direta de inconstitucionalidade (art. 5º da Lei n. 9.868/99). Princípio da Indisponibilidade. Precedentes. 2. A ausência de aditamento da inicial noticiando as alterações promovidas pelas Leis tocantinenses ns. 2.142/2009 e 2.145/2009 não importa em prejuízo da Ação, pela ausência de comprometimento da essência das normas impugnadas. 3. O número de cargos efetivos (providos e vagos) existentes nos quadros do Poder Executivo tocantinense e o de cargos de provimento em comissão criados pela Lei n. 1.950/2008 evidencia a inobservância do princípio da proporcionalidade. 4. A obrigatoriedade de concurso público, com as exceções constitucionais, é instrumento de efetivação dos princípios da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, garantidores do acesso aos cargos públicos aos cidadãos. A não submissão ao concurso público fez-se regra no Estado do Tocantins: afronta ao art. 37, inc. II, da Constituição da República. Precedentes. 5. A criação de 28.177 cargos, sendo 79 de natureza especial e 28.098 em comissão, não tem respaldo no princípio da moralidade administrativa, pressuposto de legitimação e validade constitucional dos atos estatais. 6. A criação de cargos em comissão para o exercício de atribuições técnicas e operacionais, que dispensam a confiança pessoal da autoridade pública no servidor nomeado, contraria o art. 37, inc. V, da Constituição da República. Precedentes. 7. A delegação de poderes ao Governador para, mediante decreto, dispor sobre ‘as competências, as atribuições, as denominações das unidades setoriais e as especificações dos cargos, bem como a organização e reorganização administrativa do Estado’, é inconstitucional porque permite, em última análise, sejam criados novos cargos sem a aprovação de lei. 8. Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do art. 5º, caput, e parágrafo único; art. 6º; das Tabelas II e III do Anexo II e das Tabelas I, II e III do Anexo III; e das expressões ‘atribuições’, ‘denominações’ e ‘especificações’ de cargos contidas no art. 8º da Lei n. 1.950/2008. 9. Definição do prazo máximo de 12 (doze) meses, contados da data de julgamento da presente ação direta de inconstitucionalidade, para que o Estado faça a substituição de todos os servidores nomeados ou designados para ocupação dos cargos criados na forma da Lei tocantinense n. 1.950” (STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011).

“1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Condição. Objeto. Decreto que cria cargos públicos remunerados e estabelece as respectivas denominações, competências e remunerações. Execução de lei inconstitucional. Caráter residual de decreto autônomo. Possibilidade jurídica do pedido. Precedentes. É admissível controle concentrado de constitucionalidade de decreto que, dando execução a lei inconstitucional, crie cargos públicos remunerados e estabeleça as respectivas denominações, competências, atribuições e remunerações. 2. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Art. 5° da Lei n° 1.124/2000, do Estado do Tocantins. Administração pública. Criação de cargos e funções. Fixação de atribuições e remuneração dos servidores. Efeitos jurídicos delegados a decretos do Chefe do Executivo. Aumento de despesas. Inadmissibilidade. Necessidade de lei em sentido formal, de iniciativa privativa daquele. Ofensa aos arts. 61, § 1°, inc. II, ‘a’, e 84, inc. VI, ‘a’, da CF. Precedentes. Ações julgadas procedentes. São inconstitucionais a lei que autorize o Chefe do Poder Executivo a dispor, mediante decreto, sobre criação de cargos públicos remunerados, bem como os decretos que lhe dêem execução” (STF, ADI 3.232-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, 14-08-2008, v.u., DJe 03-10-2008).

22.              Não basta a lei criar o cargo ou dar-lhe uma denominação de assessoramento, chefia ou direção, ou, ainda, reputar exigência de confiança, se não discriminar primariamente suas atribuições para viabilizar o controle de sua conformidade com as prescrições constitucionais que evidenciam a natureza excepcional do provimento em comissão.

23.              Inserida a criação do cargo público com descrição de suas atribuições na reserva legal absoluta ou formal é inválida a criação de cargos de provimento em comissão tanto pela omissão da lei em relação à descrição de atribuições de assessoramento, chefia e direção, quanto pela delegação da fixação dessas atribuições a ato de natureza infralegal da alçada do Poder Executivo, por que conforme explica a doutrina:

“somente a lei pode criar esse conjunto inter-relacionado de competências, direitos e deveres que é o cargo público. Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X, da Constituição, que comporta uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse dispositivo permite ao Chefe do Executivo promover a extinção de cargo público, por meio de ato administrativo. A criação e a disciplina do cargo público faz-se necessariamente por lei no sentido de que a lei deverá contemplar a disciplina essencial e indispensável. Isso significa estabelecer o núcleo das competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e das condições do exercício das atividades. Portanto, não basta uma lei estabelecer, de modo simplista, que ‘fica criado o cargo de servidor público’. Exige-se que a lei promova a discriminação das competências e a inserção dessa posição jurídica no âmbito da organização administrativa, determinando as regras que dão identidade e diferenciam a referida posição jurídica” (Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 581).

B – IMPOSSIBILIDADE DE PROVIMENTO COMISSIONADO PARA CARGO OU EMPREGO DA ADVOCACIA PÚBLICA

24.              Com relação aos empregos inerentes à advocacia pública (Assessor de Assuntos Jurídicos, Assessor Jurídico, Assessor Jurídico de Gabinete) convém adicionar a incompatibilidade com o art. 98 da Constituição Estadual, pois, não bastassem as ponderações anteriores, atividades inerentes à advocacia pública como assessoramento, consultoria e representação jurídica, inclusive nas autarquias, são exclusivamente reservadas a profissionais investidos em cargos de provimento efetivo da respectiva carreira mediante aprovação prévia em concurso público, como revela a remissão ao art. 132 da Constituição Federal contida no § 1º do art. 98 da Constituição Estadual. Cediça jurisprudência assim pronuncia:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

C – INADMISSIBILIDADE DA ADOÇÃO DO REGIME CELETISTA PARA CARGOS OU EMPREGOS COMISSIONADOS

25.              O provimento em comissão é incompatível com o regime celetista na Administração Pública porque configura limite à liberdade de provimento e exoneração do cargo a dispensa imotivada onerosa (art. 115, II e V, Constituição Estadual).

26.              A inserção do emprego comissionado no regime celetista é incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além, fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do cargo, na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar natureza).

27.              O desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária orientada pelos critérios de oportunidade e conveniência da Administração Pública, e a sua sujeição ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador público.

28.              A jurisprudência respalda a declaração de inconstitucionalidade:

“4. Além dessa inconstitucionalidade formal, ocorre, também, no caso, a material, pois, impondo uma indenização em favor do exonerado, a norma estadual condiciona, ou ao menos restringe, a liberdade de exoneração, a que se refere o inc. II do art. 37 da C.F.” (STF, ADI 182-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 05-11-1997, v.u., DJ 05-12-1997, p. 63.902).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA PAGA PELOS COFRES PÚBLICOS POR OCASIÃO DA EXONERAÇÃO OU DISPENSA DE QUEM, SEM OUTRO VÍNCULO COM O SERVIÇO PÚBLICO, SEJA OCUPANTE DE FUNÇÃO OU CARGO EM COMISSÃO DE LIVRE EXONERAÇÃO, ART. 287 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A nomeação para os cargos em comissão é feita sob a cláusula expressa de livre exoneração. A disposição que prevê o pagamento pelos cofres públicos de indenização compensatória aos ocupantes de cargos em comissão, sem outro vínculo com o serviço público, por ocasião da exoneração ou dispensa, restringe a possibilidade de livre exoneração, tal como prevista no art. 37, II, combinado com o art. 25 da Constituição Federal. 2. Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade e a conseqüente ineficácia do art. 287 da Constituição do Estado de São Paulo, desde a sua promulgação” (STF, ADI 326-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Paulo Brossard, 13-10-1994, m.v., DJ 19-09-1997, p. 45.526).

29.              Inegável a violação aos princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade (art. 111, Constituição Estadual) e à regra da liberdade de exoneração que domina o provimento em comissão (art. 115, II e V, Constituição Estadual), no tocante ao inciso I do art. 3º, ao art. 4º e ao § 1º do art. 5º e seu Anexo I da Lei n. 1.766/07.

D - INCONSTITUCIONALIDADE POR ARRASTAMENTO

30.             Impõe-se a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento das normas que criaram cargos ou empregos comissionados que continham idênticos vícios aos debitados ao art. 1º da Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013, e ao inciso I do art. 3º e do art. 4º da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, do Município de Palestina, a fim de impedir sua repristinação.

31.              Por essa razão, a procedência da ação deve abranger o art. 1º da Lei n. 1.787, de 31 de março de 2009, o art. 1º da Lei n. 1.825, de 30 de dezembro de 2009, o art. 2º da Lei n. 1.849, de 29 de dezembro de 2010, o art. 1º da Lei n. 1.863, de 06 de outubro de 2011, e o § 1º do art. 5º e do Anexo I, da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, do Município de Palestina.

III – Pedido liminar

32.              À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos normativos municipais apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se atuação desconforme o ordenamento jurídico, criadora de lesão irreparável ou de difícil reparação, sobretudo às finanças públicas e à legitimidade do exercício de cargos ou empregos públicos.

33.              À luz desta contextura, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 1º da Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013, e do inciso I do art. 3º e do art. 4º da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, do Município de Palestina.

IV – Pedido

34.              Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar n. 02, de 02 de fevereiro de 2013, e do inciso I do art. 3º e do art. 4º da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, e, por arrastamento, do art. 1º da Lei n. 1.787, de 31 de março de 2009, do art. 1º da Lei n. 1.825, de 30 de dezembro de 2009, do art. 2º da Lei n. 1.849, de 29 de dezembro de 2010, do art. 1º da Lei n. 1.863, de 06 de outubro de 2011, e do § 1º do art. 5º e do Anexo I, da Lei n. 1.766, de 20 de dezembro de 2007, do Município de Palestina.

35.              Requer-se ainda sejam requisitadas informações ao Prefeito e à Câmara Municipal de Palestina, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 26 de fevereiro de 2014.

 

 

 

 

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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