EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

 

Protocolado nº 176.430/2015

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade de cargos de provimento em comissão criados pelo Anexo I da Lei 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira.

2)      Cargos de provimento em comissão que não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança.

3)      Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art. 144).

 

 

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art.90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 176.430/15, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei Municipal nº. 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, que criou os cargos de provimento em comissão de “Assessor de Secretário”,Assessor de Governo”, “Assessor de Divisão I”, “Assessor de Divisão II”, “Assessor de Divisão III”, “Assessor de Divisão IV”, “Assessor de Divisão V” e “Assessor de Divisão IV”, pelos fundamentos expostos a seguir:

1.     DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade foi instaurado a partir de representação encaminhada pela Promotora de Justiça de Louveira (fls. 02/11).

Consta de referida representação que, em 22 de janeiro de janeiro de 2015, foi ajuizada perante este Egrégio Tribunal de Justiça ação direta de inconstitucionalidade de cargos de provimento em comissão constantes dos Anexos I, II e VI, da Lei nº 2.377, de 30 de junho de 2014, do Município de Louveira (ADIN nº 2006867-53.2015.8.26.0000), a qual foi julgada procedente, transitando em julgado em 18 de novembro de 2015.

Não obstante, remodelando a nomenclatura dos cargos declarados inconstitucionais, tornando mais genéricas as atribuições dos cargos extintos, foi editada a Lei Municipal nº 2.472/15.

O art. 1º da Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, dispõe o seguinte:

Art. 1º. Ficam criados os seguintes cargos de provimento em comissão na Prefeitura Municipal de Louveira, com atribuições, requisitos para provimento e referência de vencimentos, descritos no Anexo I na quantidade que segue:

ANEXO I

            QUADRO DE CARGOS EM COMISSÃO

Secretaria Municipal de Governo e Comunicação Social

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

02

Assessor de Secretário

04

Assessor de Divisão I

03

Assessor de Divisão II

02

Assessor de Divisão III

01

Assessor de Divisão IV

04

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico

Cargo

Quantitativo

Assessor de Divisão III

01

Assessor de Divisão IV

01

Assessor de Divisão V

03

Secretaria Municipal de Assistência Social

Assessor de Governo

02

Assessor de Secretário

01

Assessor de Divisão V

04

Assessor de Divisão VI

05

Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

04

Assessor de Divisão V

03

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano

Cargo

Quantitativo

Assessor de Secretário

05

Assessor de Governo

06

Assessor de Divisão III

02

Assessor de Divisão V

02

Secretaria Municipal de Esportes, Lazer e Juventude

Cargo

Quantitativo

Assessor de Secretário

02

Assessor de Divisão III

03

Assessor de Divisão V

06

Assessor de Divisão VI

10

Secretaria Municipal de Finanças e Economia

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

01

Assessor de Divisão V

03

Assessor de Divisão VI

02

Secretaria Municipal de Saúde

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

04

Assessor de Divisão III

03

Assessor de Divisão V

10

Assessor de Divisão VI

01

Secretaria Municipal de Educação

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

02

Assessor de Divisão IV

02

Assessor de Divisão V

02

Secretaria Municipal de Administração

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

03

Assessor de Secretário

02

Assessor de Divisão I

02

Assessor de Divisão V

07

Assessor de Divisão VI

04

Secretaria Municipal de Serviços Públicos

Cargo

Quantitativo

Assessor de Secretário

03

Assessor de Divisão I

02

Assessor de Divisão IV

05

Assessor de Divisão VI

02

Secretaria Municipal de Segurança

Cargo

Quantitativo

Assessor de Divisão III

02

Assessor de Divisão V

02

Ouvidor Geral da Guarda Municipal de Louveira

01

Corregedor Geral da Guarda Municipal de Louveira

01

Secretaria Municipal de Culturas e Eventos

Cargo

Quantitativo

Assessor de Divisão II

03

Assessor de Divisão IV

02

Assessor de Divisão V

04

Assessor de Divisão VI

03

Secretaria Municipal de Água e Esgoto

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

01

Assessor de Divisão II

02

Assessor de Divisão V

05

Secretaria Municipal de Gestão Ambiental

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

02

Assessor de Secretário

02

Assessor de Divisão V

03

Secretaria Municipal de Gestão de Projetos e Programas

Cargo

Quantitativo

Assessor de Governo

03

Assessor de Secretário

02

Assessor de Divisão V

01

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2.     DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO

A Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, traz a seguinte descrição das atribuições dos cargos de Assessor de Secretário, Assessor de Governo, Assessor de Divisão I, Assessor de Divisão II, Assessor de Divisão III, Assessor de Divisão IV, Assessor de Divisão V e Assessor de Divisão IV:

“... (art.1º):

 Das Atribuições e Referências de Vencimentos dos Cargos de Provimento em Comissão

Cargo: Assessor de Governo:

 Referência: CC-2

Atribuições: Assessorar diretamente o Chefe do Poder Executivo, no acompanhamento dos programas de governo junto as Secretarias, auxiliando-o nas relações oficiais, sociais e políticas no âmbito do Município e fora dele. Executar outras funções inerentes ao seu cargo, de acordo com seu superior imediato.

 Cargo: Assessor de Secretário: 

Referência: CC-4

 Atribuições: Assessorar o Secretário nas relações com os servidores da Secretaria. Executar outras funções inerentes ao seu cargo, de acordo com seu superior imediato. Manter sigilo das decisões políticas administrativas dos Secretários até sua devida publicação nos órgãos oficiais.

 Cargo: Assessor de Divisão I:

 Referência: CC-6 

Atribuições:

a) pesquisar, analisar, planejar e propor a implantação de serviços de interesse da Administração;

 b) prestar assistência técnica, específica e especializada, aos seus superiores e demais autoridades;

 c) orientar Secretários no desempenho de suas atividades;

 d) manter sigilo das decisões políticas administrativas do Prefeito Municipal até sua devida publicação nos órgãos oficiais.

Cargo: Assessor de Divisão II:

 Referência: CC-7

 Atribuições: 

a) pesquisar, analisar, planejar e propor a implantação de serviços dentro da sua área de atuação; 

b) prestar assistência técnica a Diretores, Secretários; 

c) orientar e acompanhar os servidores municipais no desempenho de suas atividades;

 d) manter sigilo das decisões políticas administrativas dos Secretários até sua devida publicação nos órgãos oficiais. 

Cargo: Assessor de Divisão III: 

Referência: CC-8 

Atribuições:

 a) pesquisar, analisar, planejar e propor a implantação de serviços dentro da sua área de atuação; 

b) prestar assistência técnica especializada aos seus superiores; 

c) orientar os Diretores no desempenho de suas atividades. 

Cargo: Assessor de Divisão IV:

Referência: CC-9 

Atribuições: 

a) pesquisar, analisar, planejar e propor a implantação de serviços dentro da sua área de atuação; 

b) prestar assistência técnica, específica e especializada, aos seus superiores e demais autoridades; 

c) orientar os Secretários no desempenho de suas atividades; 

d) coordenar os trabalhos da sua área administrativa. 

Cargo: Assessor de Divisão V:

 Referência: CC-10 

Atribuições: Planejar, organizar, coordenar, dirigir e controlar as ações necessárias à consecução dos objetivos da unidade de acordo com as políticas e diretrizes da Administração Municipal; realizar pesquisas necessárias para as políticas públicas do Município. 

Cargo: Assessor de Divisão VI: 

Referência: CC-11 

Atribuições: Promover, coordenar e controlar as ações e recursos necessários à execução das atribuições do Município; estabelecer, observar e orientar o cumprimento de metas e prioridades, em conformidade com orientação superior e com as estratégias do Município; acompanhar e analisar os indicadores de desempenho das Secretarias, definindo planos, em conjunto com as pessoas envolvidas, para promover a melhoria contínua dos serviços municipais; manter o Prefeito Municipal informado sobre o andamento dos trabalhos, assessorando-o. 

(...)”.

O ato normativo transcrito, com exceção dos cargos de Corregedor Geral da Guarda Municipal e de Ouvidor Geral da Guarda Municipal (cargos em comissão reservados a servidores de carreira) é inconstitucional por violação dos arts. 111, 115, incisos I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.

3.     A NATUREZA TÉCNICA OU BUROCRÁTICA DAS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELOS OCUPANTES DOS CARGOS COMISSIONADOS

Os cargos de provimento em comissão de Assessor de Secretário, Assessor de Governo, Assessor de Divisão I, Assessor de Divisão II, Assessor de Divisão III, Assessor de Divisão IV, Assessor de Divisão V e Assessor de Divisão IV, têm natureza meramente técnica, burocrática, operacional e profissional.

As atribuições previstas para os referidos cargos são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou a dar suporte a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior em que se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.

Tanto é assim que a Lei nº 2.377, de 30 de junho de 2014, do Município de Louveira (ADIN nº 2006867-53.2015.8.26.0000), que criava cargos semelhantes aos presentes e que eram ocupados exatamente pelos mesmos funcionários designados para os cargos descritos na Lei 2.472/15, foi julgada inconstitucional (vide quadro comparativo a fls. 06/11 do anexo).

Da análise das funções desempenhadas, constata-se que o Assessor de Secretário desenvolve atividade burocrática tratando de assuntos relacionados aos demais servidores, sem posição de direção superior.

O Assessor de Governo desempenha atividades técnicas burocráticas relacionadas ao acompanhamento dos programas de governo, distante dos encargos de comando superior no qual se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas de governo.

Aos Assessores Técnicos de Divisão I, II, III, IV, V e VI são previstas atribuições técnico-profissionais executivas relacionadas à implantação de serviços dentro de sua área de atuação, prescindindo do elemento fiduciário para o bom desempenho das funções.

Ressalta-se, neste contexto, a inadmissibilidade de escalonamento de cargos de provimento em comissão, conforme constante no mencionado ato normativo, quanto aos cargos de Assessores Técnicos de Divisão I, II, III, IV, V e VI.

Com efeito. A jurisprudência anulou a criação de cargos comissionados em carreira, como reverberado em decisão do Supremo Tribunal que, acolhendo parecer da Procuradoria-Geral da República, obtemperou constituir ‘figura estranha ao Direito Administrativo brasileiro, qual seja, a de carreira formada de cargos em comissão, por natureza, isolados’ e que ‘a própria organização, em carreira, dos cargos em apreço, pela ideia de permanência que traduz não se mostra compatível com a índole da comissão’ (STF, Rp 1.282-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 12-12-1985, v.u., DJ 28-02-1986, p. 2.345, RTJ 116/887)” .

Evidencie-se ainda que embora na descrição das atribuições dos cargos mencionados haja referência genérica a atividade de planejar, coordenar, controlar e orientar, a análise das características de cada unidade indica que são destinadas a atender necessidades executórias ou a dar suporte subalterno a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior.

Além destes aspectos indicativos de que os cargos impugnados desempenham funções subalternas, de pouca complexidade, exigindo-se tão somente o dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor, a descrição genérica de suas atribuições evidenciam a natureza puramente profissional, técnica, burocrática ou operacional.

Dessa forma, os cargos comissionados anteriormente destacados são incompatíveis com a ordem constitucional vigente, em especial com o art. 111, 115, incisos I, II e V, e art. 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

Essa incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela Constituição quanto ao provimento no serviço público sem concurso.

Embora o Município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da Constituição Federal), esta autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita ao âmbito pré-fixado pela Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 459).

A autonomia municipal deve ser exercida com a observância dos princípios contidos na Constituição Federal e na Constituição Estadual (cf. Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de direito constitucional, 9ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 285).

No exercício de sua autonomia administrativa, o Município cria cargos, empregos e funções, mediante atos normativos, instituindo carreiras, vencimentos, entre outras questões, bem como se estruturando adequadamente.

Todavia, a possibilidade de que o Município organize seus próprios serviços encontra balizamento na própria ordem constitucional, sendo necessário que o faça através de lei, respeitando normas constitucionais federais e estaduais relativas ao regime jurídico do serviço público.

A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos através de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no art. 37, I, da Constituição Federal; bem como no art. 115, I, da Constituição do Estado de São Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e cargos de natureza técnica ou burocrática.

A criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor, para que adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente política.

Há implícitos limites à sua criação, visto que, assim não fosse, estaria na prática aniquilada a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço público.

A propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em precedente do E. Supremo Tribunal Federal, que “a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes com as praxes do nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional do concurso (STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito administrativo brasileiro, 33. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).

Podem ser de livre nomeação e exoneração apenas aqueles cargos que, pela própria natureza das atividades desempenhadas, exijam excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor.

É esse o fundamento da argumentação no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Por essas razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).

Daí a afirmação de que “é inconstitucional a lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).

São a natureza do cargo e as funções a ele cometidas pela lei que estabelecem o imprescindível “vínculo de confiança” (cf. Alexandre de Moraes, Direito constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam ser destinados “apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317).

Essa também é a posição do E. Supremo Tribunal Federal (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT VOL-01765-01 PP-00169).

Não é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza o provimento em comissão, a atribuição do cargo deve reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das diretrizes políticas do governo.

Pela análise da natureza e das atribuições dos cargos impugnados não se identificam os elementos que justificam o provimento em comissão.

Escrevendo na vigência da ordem constitucional anterior, mas em lição plenamente aplicável ao caso em exame, anotava Márcio Cammarosano a existência de limites à criação de postos comissionados pelo legislador. A Constituição objetiva, com a permissão para tal criação, “propiciar ao Chefe de Governo o seu real controle mediante o concurso, para o exercício de certas funções, de pessoas de sua absoluta confiança, afinadas com as diretrizes políticas que devem pautar a atividade governamental. Não é, portanto, qualquer plexo unitário de competências que reclama seja confiado o seu exercício a esta ou aquela pessoa, a dedo escolhida, merecedora da absoluta confiança da autoridade superior, mas apenas aquelas que, dada a natureza das atribuições a serem exercidas pelos seus titulares, justificam exigir-se deles não apenas o dever elementar de lealdade às instituições constitucionais e administrativas a que servirem, comum a todos os funcionários, como também um comprometimento político, uma fidelidade às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, uma lealdade pessoal à autoridade superior (...). Admite-se que a lei declare de livre provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria superior, mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre provimento e exoneração cargos como os de auxiliar administrativo, fiscal de obras, enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador, e outros mais, de cujos titulares nada mais se pode exigir senão o escorreito exercício de suas atribuições, em caráter estritamente profissional, técnico, livres de quaisquer preocupações e considerações de outra natureza” (Provimento de cargos públicos no direito brasileiro, São Paulo, RT, 1984, p. 95/96).

No caso em exame, evidencia-se claramente que os cargos de provimento em comissão, antes referidos, destinam-se ao desempenho de atividades meramente burocráticas ou técnicas, que não exigem, para seu adequado desempenho, relação de especial confiança.

É necessário ressaltar que a posição aqui sustentada encontra esteio em julgados desse E. Tribunal de Justiça (ADI 111.387-0/0-00, j. em 11.05.2005, rel. des. Munhoz Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de janeiro de 2005, rel. des. Barbosa Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30 de janeiro de 2008, rel. des. Elliot Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des. Armando Toledo, j. 16.07.2008, v.u.).

4.     DOS PEDIDOS

a)    Do Pedido Liminar

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Louveira apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a consequente oneração financeira do erário.

Ademais, percebe-se que os cargos de provimento em comissão de Assessor de Secretário, Assessor de Governo, Assessor de Divisão I, Assessor de Divisão II, Assessor de Divisão III, Assessor de Divisão IV, Assessor de Divisão V e Assessor de Divisão IV, não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo.

O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.

Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para ocuparem tais cargos, certamente, não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.

Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.

Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.

Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADI-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADI-MC 568, RTJ 138/64; ADI-MC 493, RTJ 142/52; ADI-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

À luz deste perfil, requer-se a concessão de liminar para a suspensão da Lei nº Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, no que se refere aos cargos impugnados.

b)    Do Pedido Principal

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, quanto aos cargos ora impugnados, por ofensa aos arts. 111, 115, incisos I, II e V, e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

Requer-se ainda que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Louveira, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que, aguarda-se deferimento.

 

São Paulo, 26 de abril de 2016.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

                                                                                        

 

aca/sf

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado nº 176.430/2015

Assunto: inconstitucionalidade da Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira.

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face da Lei nº 2.472, de 16 de outubro de 2015, do Município de Louveira, junto ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 26 de abril de 2016.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

aca/sf