EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 053.035/15
Ementa:
1)
Ação
direta de inconstitucionalidade. Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de
2015, que “Dispõe sobre o Programa de
Regularização Ambiental - PRA das propriedades e imóveis rurais, criado pela
Lei Federal nº 12.651, de 2012 e sobre a aplicação da Lei Complementar Federal
nº 140, de 2011, no âmbito do Estado de São Paulo”.
2)
Ausência de participação popular. Revela-se inconstitucional a
ausência de participação comunitária no estabelecimento de diretrizes e normas
relativas ao desenvolvimento de políticas ambientais, pois tal mandamento deve
ser considerado em conjunto com os dispositivos relativos ao ordenamento
urbano, segundo preconiza a Constituição Estadual na interpretação conjunta dos
arts. 180, II, e 191.
3)
Ofensa
ao princípio da vedação ao retrocesso ambiental. Ao suplementar a legislação
federal cabe aos Estados e ao Distrito Federal conferir uma maior proteção ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, não podendo o ente estadual arrefecer
a normativa federal, pois assim procedendo estará atentando contra o princípio
constitucional da vedação ao retrocesso sócio ambiental, bem como ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, insculpido
no art. 191 da Constituição Estadual.
4)
Lei estadual que, a pretexto de regulamentar lei federal,
invade a esfera normativa da União em matéria ambiental. Ofensa ao artigo 1º da
CE/89 (artigo 24, VI, §§ 1º e 2º, da CF).
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da
Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, e em conformidade
com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da
República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da
Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no
incluso protocolado (PGJ nº 053.035/2015), vem perante esse Egrégio Tribunal de
Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei
Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015, pelos
fundamentos expostos a seguir:
1.
DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
O
protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade
foi instaurado par apurar eventual inconstitucionalidade dos artigos 9º, § 1º,
12, §§ 1º, 2º, 3º, 8º, 17, “caput” e § 2º, 27, § 1º, 35, § 1º, e 40, parágrafo
único, da Lei Estadual nº 15.684/15, pois, em síntese, teriam violado o
princípio da vedação do retrocesso ambiental, bem como invadido a esfera de
competência legislativa da União (fls. 02/42).
A Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015, que “Dispõe sobre o Programa de Regularização Ambiental - PRA das propriedades e imóveis rurais, criado pela Lei Federal nº 12.651, de 2012 e sobre a aplicação da Lei Complementar Federal nº 140, de 2011, no âmbito do Estado de São Paulo”, tem a seguinte redação:
“CAPÍTULO I
Disposições
Gerais
Artigo 1º - Esta lei regula, nos termos dos
artigos 23, III, VI e VII, e 24 da Constituição Federal, o detalhamento
de caráter específico e suplementar do Programa de
Regularização Ambiental - PRA das propriedades e imóveis rurais, criado
pela Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, dispondo ainda sobre
a aplicação da Lei Complementar Federal nº 140, de 8 de dezembro de 2011,
no âmbito do Estado de São Paulo.
Seção I
Do Cadastro
Ambiental Rural - CAR
Artigo 2º - O Sistema de Cadastro Ambiental Rural
do Estado de São Paulo - SICAR-SP é adotado como instrumento da política
estadual de meio ambiente.
§ 1º - A inscrição da propriedade ou posse
rural no Cadastro Ambiental Rural - CAR, criado por força da Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012, deverá ser feita,
preferencialmente, no órgão ambiental municipal ou estadual, indicado
no site da Secretaria do Meio Ambiente e integrado com o Sistema de
Cadastro Ambiental Rural - SICAR, ficando no Estado de São Paulo
denominado SICAR-SP, o qual, nos termos do regulamento, exigirá do
proprietário ou possuidor rural:
1 - identificação do proprietário ou
possuidor rural;
2 - comprovação da propriedade ou posse;
3 - identificação do imóvel por meio de
planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas
geográficas com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do
imóvel rural, informando a localização dos remanescentes de
vegetação nativa, das Áreas de Preservação Permanente, das Áreas de
Uso Restrito, das áreas consolidadas e, caso existente, também
da localização da Reserva Legal.
§ 2º - O órgão ambiental competente deverá
monitorar, permanentemente, por meio de sensoriamento remoto, a
veracidade das informações declaradas e o cumprimento dos
compromissos assumidos pelo proprietário ou possuidor do imóvel
rural cadastrado, sendo-lhe facultado realizar vistorias de
campo, sempre que julgar necessário, com notificação do
interessado para acompanhar a vistoria.
§ 3º - Os proprietários ou possuidores de
imóveis rurais que disponham de mais de uma propriedade ou posse, em
área contínua, deverão efetuar única inscrição para esses imóveis.
§ 4º - Para o cumprimento dos percentuais
da Reserva Legal, bem como para a definição da faixa de recomposição de
Áreas de Preservação Permanente, previstos nos artigos 12 e 61-A
da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, o proprietário
ou possuidor deverá inscrever a totalidade das áreas do imóvel.
Artigo 3º - Detectadas pendências ou
inconsistências nas informações ou nos documentos apresentados para
cadastro no CAR, o órgão responsável notificará o requerente ou
seu representante legal, por aviso de recebimento AR, de uma
única vez, para que preste informações complementares ou promova a
correção e adequação das informações prestadas, com prazo mínimo de 90
(noventa) dias.
§ 1º - Havendo notificação ao proprietário
ou possuidor rural com base em imagens de geosensoriamento, a
mesma deverá acompanhar o documento, contendo a identificação da cena
pela data de captura da imagem, a indicação do satélite utilizado, a sua
compatibilidade com as imagens georeferenciadas utilizadas no CAR, bem
como a sua disponibilização em arquivo digital durante todo o prazo para
atendimento das informações solicitadas na notificação.
§ 2º - As informações constantes do CAR,
salvo aquelas relativas aos dados pessoais do titular do imóvel
cadastrado, nos termos da Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro
de 2011, são consideradas de interesse público, devendo
ser permanentemente atualizadas e estar acessíveis a qualquer cidadão
por meio da “internet”, com consulta pelo número de registro no CAR e
fornecimento de certidão numerada, devendo o interessado preencher
requerimento com, no mínimo, as seguintes informações:
1 - qualificação pessoal do requerente;
2 - assunção da obrigação de não utilizar
as informações colhidas para fins comerciais, sob as penas da lei civil,
penal, de direito autoral e de propriedade industrial, assim como
de citar as fontes, caso, por qualquer meio, venha a divulgar
os aludidos dados.
CAPÍTULO II
Do Programa
de Regularização Ambiental
Seção I
Disposições
Gerais
Artigo 4º - É instituído, no âmbito do Estado de
São Paulo, Programa de Regularização Ambiental - PRA das
propriedades e posses rurais, que compreende o conjunto de ações ou
iniciativas a serem desenvolvidas por proprietários e possuidores
de imóveis rurais, com o objetivo de adequar e promover a
regularização ambiental nos termos do Capítulo XIII da Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Parágrafo único - São instrumentos do Programa de
Regularização Ambiental:
1 - o Cadastro Ambiental Rural - CAR;
2 - o Termo de Compromisso;
3 - o Projeto de Recomposição de Áreas
Degradadas e Alteradas.
Artigo 5º - O Programa de Regularização Ambiental
- PRA deve ter sua implantação iniciada no prazo de até 1 (um)
ano contado da data da publicação desta lei, prazo este prorrogável por
uma vez e pelo mesmo período, por ato do Chefe do Poder Executivo, cuja
execução se dará da seguinte forma:
I - inscrição no CAR;
II - requerimento de inclusão no PRA
contendo Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas;
III - homologação do Projeto de
Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas, no prazo de 12 (doze) meses,
a partir do término do inciso II deste artigo;
IV - individualização e formalização das
responsabilidades em Termo de Compromisso do PRA - TC, devidamente
homologadas no Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas
e Alteradas, a ser assinado no prazo de até 90 (noventa) dias após a
notificação da homologação prevista no inciso III deste artigo;
V - execução do Projeto de Recomposição
de Áreas Degradadas e Alteradas, nas fases e prazos estabelecidos no Termo
de Compromisso do PRA - TC;
VI - acompanhamento da execução do
Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas, a cada 2 (dois)
anos, com a imediata certificação do cumprimento de cada
fase constante do cronograma da execução do projeto, garantidos
a ampla defesa e o contraditório em caso de divergências;
VII - homologação final da regularização,
convertendo definitivamente as multas suspensas em serviços de
preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio
ambiente, regularizando o uso de áreas rurais consolidadas
conforme identificadas no PRA.
§ 1º - Os prazos previstos no cronograma
de execução do PRA poderão ser revistos mediante requerimento motivado
do interessado, respeitado o prazo previsto no artigo 9º desta lei.
§ 2º - Será aberto processo administrativo
para cada requerimento de inclusão no PRA protocolado, no qual serão
arquivados todos os documentos do PRA, em páginas sequenciais
e numeradas, nele sendo registrados todos os atos da regularização, em
especial os mencionados no “caput” deste artigo, com fornecimento de
comprovantes ao interessado.
Artigo 6º - Vetado.
§ 1º - Vetado.
§ 2º - Vetado.
§ 3º - Vetado.
Seção II
Do Projeto de
Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas
Artigo 7º - O requerimento de inclusão no PRA
deverá conter Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e
Alteradas contendo a individualização das áreas rurais consolidadas e
das obrigações de regularização, com a descrição detalhada de
seu objeto, o cronograma de execução e de implantação das obras
e serviços exigidos, com metas bianuais a serem atingidas,
considerando os parâmetros da Seção II deste Capítulo.
Artigo 8º - No prazo de até 12 (doze) meses
contados do protocolo do Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas
e Alteradas, haverá análise do mesmo para homologação.
§ 1º - Havendo omissão ou falta de
qualquer documento ou esclarecimento necessário, o interessado será
notificado, por Aviso de Recebimento - AR, dentro do período
previsto no “caput” deste artigo e com prazo mínimo de 90
(noventa) dias, para complementar o Projeto de Recomposição de
Áreas Degradadas e Alteradas, no prazo indicado pela
autoridade competente.
§ 2º - Indeferido total ou parcialmente o
Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas, será o
interessado notificado para correção ou interposição de recurso
administrativo, com efeito suspensivo, garantidos a ampla defesa e
o contraditório.
§ 3º - O despacho que indeferir total ou
parcialmente o Projeto de Recomposição de áreas Degradadas e
Alteradas deverá ser fundamentado, informando específica e
tecnicamente o motivo de fato e a respectiva indicação do artigo do
Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, e desta
lei que não foram atendidos.
§ 4º - Do mesmo despacho do § 3º deste
artigo constará a indicação da forma que a autoridade competente
entender correta para a execução do Projeto de Recomposição de
Áreas Degradadas e Alteradas, com finalidade de, tornada definitiva
a decisão, ser o interessado notificado para seu cumprimento
ou providências do § 5º deste artigo.
§ 5º - O Projeto de Recomposição de Áreas
Degradadas e Alteradas do PRA é ato de confissão irrevogável e
irretratável dos fatos e situações nele contidos, podendo, no caso de
inadimplência e não havendo possibilidade de regularização,
acarretar o ajuizamento de ação judicial cabível, com finalidade de
se ver cumprida a obrigação de fazer, individualizada no
processo administrativo mencionado no § 2º do artigo 5º desta lei.
§ 6º - A execução do projeto previsto no
artigo 9º desta lei deverá ser iniciada após a homologação e assinatura do
Termo de Compromisso do PRA - TC.
§ 7º - Não sendo encontrado o proprietário
ou possuidor para os atos previstos no § 6º deste artigo, transcorridos os
prazos de editais, será tomada a providência do § 5º deste artigo.
Artigo 9º - A execução do Projeto de Recomposição
de Áreas Degradadas e Alteradas deverá ser concluída em até
20 (vinte) anos, abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo,
1/10 (um décimo) da área total necessária à sua
complementação, quando será apresentado relatório da execução do período.
§ 1º - O projeto deverá contemplar,
alternativa ou conjuntamente, as seguintes modalidades:
1 - regeneração;
2 - recomposição;
3 - compensação.
§ 2º - A autoridade competente pela
análise do PRA poderá realizar vistorias em qualquer época, caso em que
emitirá relatório que, certificando a regularidade, substituirá o
documento do “caput” deste artigo e, em sendo certificada a
inadimplência total ou parcial, da mesma será notificado o interessado
para apresentação de razões, documentos, relatórios e estudos,
dentro do prazo conferido, que justifiquem a situação, garantidos
a ampla defesa e o contraditório.
§ 3º - Certificada a regularidade do PRA
pela vistoria da autoridade competente ou pela concordância com o
relatório apresentado, será considerada cumprida essa fase do PRA
para todos os fins, sendo esse fato certificado nos autos do
processo administrativo e emitida certidão ao interessado.
§ 4º - Certificada a inadimplência do PRA,
tornada definitiva a decisão, será adotada a providência do § 5º do artigo
8º.
§ 5º - Durante todo o trâmite da
regularização, o interessado poderá requerer certidão para demonstrar
estar adimplente com as obrigações assumidas, devendo conter em seu
texto informação objetiva se o imóvel está regular, regular com
ativos, regular com projeto de recomposição/compensação em
andamento ou irregular no cumprimento das determinações da Lei
Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
§ 6º - O proprietário ou possuidor rural
que desejar regularizar sua propriedade ou posse rural em prazo inferior
aos 20 (vinte) anos previsto no “caput” deste artigo deverá indicar
essa opção expressamente no Projeto de Recomposição de
Áreas Degradadas e Alteradas ou, caso faça essa opção
posteriormente, informar a antecipação no relatório de execução.
Seção III
Do Termo de
Compromisso do PRA
Artigo 10 - O termo de compromisso firmado poderá
ser alterado em comum acordo, em razão de evolução tecnológica, caso
fortuito ou força maior.
Parágrafo único - Quando houver necessidade de alteração das obrigações
pactuadas ou das especificações técnicas, deverá ser encaminhada
solicitação, com justificativa, ao órgão competente
para análise e deliberação, não se aplicando às hipóteses de regularização
da Reserva Legal por meio da compensação.
Artigo 11 - O Termo de Compromisso do PRA destina-se a promover as
necessárias correções da propriedade ou posse rural para o atendimento das
exigências impostas pelo Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de
maio de 2012, sendo obrigatório que o respectivo instrumento contenha:
I - o nome, a qualificação e o endereço
das partes compromissadas e dos respectivos representantes legais;
II - a descrição detalhada de seu objeto
e seu cronograma físico de implantação, com metas bianuais a serem
atingidas;
III - as multas aplicáveis à pessoa
física ou jurídica compromissada, em decorrência do não cumprimento das
obrigações nele pactuadas;
IV - o foro competente para dirimir
litígios entre as partes.
§ 1º - A celebração do Termo de
Compromisso de que trata este artigo não impede a execução de eventuais
multas relativas a infrações não previstas no TC.
§ 2º - Nas hipóteses de caso fortuito ou
de força maior, poderão ser analisados requerimentos de prorrogação da
regularização ambiental para o remanescente do cronograma
físicofinanceiro do Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas
e Alteradas ainda não executadas.
§ 3º - O Termo de Compromisso deverá ser
firmado em até 90 (noventa) dias contados da homologação do Projeto
de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas.
§ 4º - Descumprida qualquer cláusula do
Termo de Compromisso será adotada a providência do § 5º do artigo 8º desta
lei, ressalvada a hipótese do § 2º deste artigo.
Artigo 12 - Os termos de compromissos ou instrumentos similares para
a regularização ambiental do imóvel rural referentes às Áreas de
Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito, firmados sob a
vigência da legislação anterior, deverão ser revistos para se adequarem ao
disposto na Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
§ 1º - O disposto no “caput” deste artigo
aplica-se exclusivamente aos casos em que o proprietário ou o possuidor
do imóvel rural requerer a revisão.
§ 2º - Realizadas as adequações requeridas
pelo proprietário ou possuidor, o termo de compromisso revisto deverá
ser inscrito no SICAR.
§ 3º - Caso não haja pedido de revisão, os
termos ou instrumentos de que trata o “caput” deste artigo serão
respeitados.
§ 4º - Os documentos e atos preparatórios
produzidos para subsidiar termo já firmado com a autoridade competente
serão aproveitados para a instrução do PRA, cabendo ao
proprietário ou possuidor rural apenas complementar os necessários para
a análise do PRA.
§ 5º - Caso a autoridade responsável
pela análise do PRA conclua pela total adequação aos termos do Capítulo
XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, e desta lei, o PRA
será homologado no mesmo ato.
§ 6º - Ocorrendo a situação prevista no §
5º deste artigo e havendo vegetação nativa excedente ao limite previsto
no Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, a
diferença positiva será convertida em servidão ambiental ou CRA pela mesma
autoridade.
§ 7º - Caso a autoridade responsável pela
análise do PRA conclua que as obrigações já cumpridas, conforme o
anterior instrumento de ajustamento de conduta ou assunção de
responsabilidade, não sejam suficientes para a adequação do imóvel
às regras do Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de
2012, e desta lei, será emitido Termo de Compromisso do PRA com as
obrigações ainda necessárias para a regularização.
§ 8º - Na hipótese do “caput” deste
artigo, o Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas deverá:
1 - mencionar as obrigações já cumpridas
nos termos do anterior instrumento de ajustamento de conduta ou de
assunção de responsabilidade;
2 - mencionar as obrigações ainda
pendentes na forma do Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de
maio de 2012, e desta lei.
Seção IV
Dos
Parâmetros de Regularização do Capítulo XIII da Lei Federal n.º 12.651, de
25 de maio de 2012
Artigo 13 - A regularização ambiental das
propriedades e posses rurais do Estado de São Paulo obedecerá aos
parâmetros materiais constantes do Capítulo XIII da Lei Federal nº
12.651, de 25 de maio de 2012, e o detalhamento de caráter
específico das Subseções I a V desta Seção.
Subseção I
Da
Regularização da Área de Preservação Permanente
Artigo 14 - A recomposição das Áreas de
Preservação Permanente poderá ser feita, isolada ou conjuntamente, nos
prazos do PRA, pelos seguintes métodos:
I - condução de regeneração natural de
espécies nativas;
II - plantio de espécies nativas
conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas;
III - plantio de espécies nativas; ou
IV - plantio intercalado de espécies
lenhosas, perenes ou de ciclo longo, com nativas de ocorrência regional
com exótica, exceto pinus e eucaliptos, em até 50% (cinquenta por cento)
da área total a ser recomposta, no caso das propriedades ou posses rurais
a que se refere o inciso V do artigo 3º da Lei Federal nº 12.651, de 25 de
maio de 2012.
§ 1º - Para os imóveis com área de até um
módulo fiscal que possuam áreas rurais consolidadas em Áreas de
Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a
recomposição das respectivas faixas marginais em 5 (cinco) metros,
contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura
do curso d´água.
§ 2º - Para os imóveis com área superior a
1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais que possuam áreas
rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de
cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas
faixas marginais em 8 (oito) metros, contados da borda da calha do leito
regular, independentemente da largura do curso d´água.
§ 3º - Para os imóveis com área superior a
2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais que possuam
áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo
de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas
faixas marginais em 15 (quinze) metros, contados da borda da calha do
leito regular, independentemente da largura do curso d’água.
§ 4º - O plantio e manejo estabelecidos no
inciso IV do “caput” deste artigo são declarados de interesse social,
inclusive os limites previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, e contarão
com o desenvolvimento de sistemas agroflorestais pela Secretaria
de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
§ 5º - Para fins do que dispõe o inciso II
do § 4º deste artigo e do artigo 61-A da Lei Federal nº 12.651, de 25 de
maio de 2012, a recomposição das faixas marginais ao longo dos
cursos d’água naturais será de:
1 - vetado;
2 - para os imóveis rurais com área
superior a 10 (dez) módulos fiscais, a extensão correspondente à metade da
largura do curso d’água, observado o mínimo de 30 (trinta) e o máximo
de 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito regular.
§ 6º - Nos casos de áreas rurais
consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de nascentes e
olhos d’água perenes, será admitida a manutenção de
atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural,
sendo obrigatória a recomposição do raio de 15 (quinze) metros.
§ 7º - Para os imóveis que possuam áreas
rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de
lagos e lagoas naturais, será admitida a manutenção de
atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural,
sendo obrigatória a recomposição de faixa marginal com largura de:
1 - 5 (cinco) metros, para os imóveis
rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal;
2 - 8 (oito) metros, para os imóveis
rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos
fiscais;
3 - 15 (quinze) metros, para os imóveis
rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro)
módulos fiscais;
4 - 30 (trinta) metros, para os imóveis
rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais.
§ 8º - Nos casos de áreas rurais
consolidadas em veredas, será obrigatória a recomposição das faixas
marginais, em projeção horizontal, delimitadas a partir do espaço
permanentemente brejoso e encharcado, de largura mínima de:
1 - 30 (trinta) metros, para os imóveis
rurais com área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2 - 50 (cinquenta) metros, para os
imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais.
§ 9º - A área de várzea fora dos limites
das Áreas de Preservação Permanente - APP somente poderá ser utilizada
conforme recomendação técnica dos órgãos de extensão rural.
§ 10 - Vetado.
§ 11 - Será considerada, para os fins do
disposto neste artigo, a área detida pela propriedade ou posse rural em 22
de julho de 2008.
§ 12 - O Chefe do Poder Executivo poderá,
em ato próprio, estabelecer metas e diretrizes de recuperação ou
conservação da vegetação nativa superiores às definidas neste artigo,
como projeto prioritário, ouvidos o Comitê de Bacia Hidrográfica e
o Conselho Estadual de Meio Ambiente, para fins do artigo 22 da Lei
Federal nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, e artigos 4º, 5º, 6º, 7º e 37
da Lei Estadual nº 7.663, de 30 de
dezembro de 1991.
Artigo 15 - Adota-se como metodologia padrão de
recomposição de vegetação nativa em área de preservação
permanente, para a legislação estadual, a sistemática prevista no
“caput” do artigo 14 desta lei.
Parágrafo único - Utilizar-se-á o procedimento do artigo 6º da Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012, para necessidade de caráter específico
de qualquer tipo de ampliação presente ou futura de área de preservação
permanente prevista na legislação estadual.
Artigo 16 - Nas propriedades e posses rurais com
até 15 (quinze) módulos fiscais, é admitida, nas áreas de que tratam
os incisos I e II do “caput” do artigo 4º da Lei Federal nº 12.651,
de 25 de maio de 2012, a prática da aquicultura e a
infraestrutura física diretamente a ela associada, desde que:
I - sejam adotadas práticas
sustentáveis de manejo de solo e água e de recursos hídricos, garantindo
sua qualidade e quantidade, de acordo com norma do Conselho Estadual
de Meio Ambiente;
II - esteja de acordo com os respectivos
planos de bacia ou planos de gestão de recursos hídricos;
III - seja realizado o licenciamento pelo
órgão ambiental competente;
IV - o imóvel esteja inscrito no
Cadastro Ambiental Rural - CAR;
V - não implique novas supressões de
vegetação nativa.
Artigo 17 - Para a atividade de aquicultura,
quando enquadrada na alínea “e” do inciso IX do artigo 3º da Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012, será permitida a implantação de
instalações necessárias à captação, condução e derivação de água e de
efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes
integrantes e essenciais da atividade.
§ 1º - O entorno dos viveiros de criação
localizados em área diversa da do artigo 4º da Lei Federal nº 12.651, de
25 de maio de 2012, e dos canais de abastecimento e drenagem, fora
da Área de Proteção Permanente e que não se localizem em
barramento ou represamento de cursos d'água naturais, não serão considerados
área de preservação permanente.
§ 2º - A atividade de aquicultura
desenvolvida em propriedade ou posse rural de até 4 (quatro) módulos
fiscais é considerada como sendo de baixo impacto ambiental,
para fins de intervenção em faixa marginal de proteção de cursos d’água,
nos termos do artigo 3º, inciso X, alíneas “b” e “k”, e artigos 8º e 9º da
Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, desde que classificada como
pequena ou de pequeno porte pela legislação específica.
Artigo 18 - Vetado:
I - vetado;
II - vetado;
III - vetado;
IV - vetado.
§ 1º - vetado.
§ 2º - vetado.
Artigo 19 - Será admitida a manutenção de
residências e da infraestrutura associada às atividades
agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural, inclusive o acesso a
essas atividades, desde que não estejam em área que ofereça risco à vida
ou à integridade física das pessoas.
Artigo 20 - É permitido o acesso de pessoas e
animais às Áreas de Preservação Permanente para obtenção de água e
para realização de atividades de baixo impacto ambiental.
§ 1º - Os critérios para tal acesso devem
ser previstos no Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e
Alteradas do PRA, incluindo as medidas para se evitar a degradação
da vegetação nativa existente.
§ 2º - Vetado.
Artigo 21 - A adesão ao PRA e a homologação do
Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas são
provas suficientes de processo de recuperação para o cômputo da
APP no percentual de reserva legal, mencionado no artigo 15,
inciso II, da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Artigo 22 - A medição da metragem de APP
relacionada com os recursos hídricos partirá:
I - nos cursos d’água, a partir da
borda da calha do leito regular;
II - nos reservatórios de água natural
acima de 1 (um) hectare de espelho d’água, a partir do umbral do
reservatório;
III - nos reservatórios de água
artificial acima de 1 (um) hectare de espelho d’água, a partir da cota
operacional do projeto de barramento ou de laudo técnico nesse sentido
para aqueles anteriores a 22 de julho de 2008;
IV - na ocorrência de vereda no cerrado
paulista, o início da medição será em faixa marginal, em projeção
horizontal, com largura de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço
permanentemente brejoso e encharcado, como previsto na Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Parágrafo único - Não se incluem nos cursos d’água com APP, nos termos do
artigo 4º da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, os efêmeros
formados por ocasião das chuvas sazonais ou logo após sua ocorrência, cuja
alimentação se dê pela água de escoamento superficial, acima do nível do
lençol freático, nem as acumulações de água natural ou artificial de
até 1 (um) hectare de superfície.
Artigo 23 - Vetado.
§ 1º - Vetado:
1 - vetado;
2 - vetado.
Artigo 24 - Para os reservatórios artificiais de
água destinados a geração de energia ou abastecimento público
que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão
ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória
nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente
será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima
“maximorum.”
Artigo 25 - Nas áreas rurais consolidadas nos
locais de que tratam os incisos V, VIII, IX e X do artigo 4º da Lei
Federal nº 12.651 de 25 de maio de 2012, serão admitidas a
manutenção de atividades florestais, as culturas de espécies
lenhosas, perenes ou de ciclo longo, bem como da infraestrutura
física associada ao desenvolvimento de atividades
agrossilvipastoris, vedada a conversão de novas áreas para uso alternativo
do solo.
§ 1º - O pastoreio extensivo nos locais
referidos no “caput” deste artigo deverá ficar restrito às áreas de
vegetação campestre natural ou já convertidas para uso alternativo do solo
em vegetação campestre, admitindo-se o consórcio com vegetação lenhosa
perene ou de ciclo longo.
§ 2º - A manutenção das culturas e da
infraestrutura de que trata o “caput” deste artigo é condicionada à adoção
de práticas conservacionistas do solo e de água indicadas pelos órgãos
de assistência técnica rural.
§ 3º - Admite-se, nas Áreas de Preservação
Permanente, previstas no inciso VIII do artigo 4º da Lei Federal nº
12.651, de 25 de maio de 2012, das propriedades e posses rurais
de até 4 (quatro) módulos fiscais, no âmbito do PRA, a partir de boas
práticas agronômicas e de conservação do solo e da água, mediante
deliberação do Conselho Estadual de Meio Ambiente, a consolidação de outras
atividades agrossilvipastoris, ressalvadas as situações de risco de vida
humana.
Subseção II
Da
Regularização da Área de Uso Restrito
Artigo 26 - A identificação de área de uso
restrito, com topografia de inclinação entre 25º (vinte e cinco graus) e
45º (quarenta e cinco graus), terá como base a situação fática de 25
de maio de 2012 e se dará a partir da identificação no plano horizontal
determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos
ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação.
§ 1º - Vetado.
§ 2º - Nas áreas urbanas e de expansão
urbana com inclinação entre 25º (vinte e cinco graus) e 45º (quarenta e cinco graus),
será permitida a supressão de vegetação com o devido licenciamento
ambiental e após o registro do parcelamento do solo para fins urbanos
aprovado segundo a legislação específica, desde que sejam tomadas as
medidas técnicas necessárias para atendimento ao disposto no artigo 3º,
inciso III, da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, após a
realização da supressão.
Subseção III
Da
Regularização das Áreas Consolidadas em Áreas de Reserva Legal
Artigo 27 - Os proprietários ou possuidores de
imóveis rurais que realizaram supressão de vegetação nativa
respeitando os limites impostos pela legislação em vigor à época em
que ocorreu a supressão são dispensados de promover a recomposição,
compensação ou regeneração para os percentuais de Reserva Legal exigidos
pela Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
§ 1º - A dispensa de recomposição,
compensação ou regeneração, para os percentuais da Lei Federal nº 12.651,
de 25 de maio de 2012, de que trata o “caput” deste artigo,
deve observar as seguintes leis e respectivos limites previstos
para manutenção de vegetação nativa:
1 - a partir da vigência do Decreto
Federal nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, 25% (vinte e cinco por cento)
das matas existentes, salvo o disposto nos artigos 24, 31 e 52 do
mesmo decreto;
2 - durante a vigência da Lei Federal nº
4.771, de 15 de setembro de 1965, até a vigência da Lei Federal nº 7.803,
de 18 de julho de 1989, 20% (vinte por cento) da área de
cada propriedade com cobertura de floresta;
3 - durante a vigência da Lei Federal nº
4.771, de 15 de setembro de 1965, com as alterações introduzidas no artigo
16 pela Lei Federal nº 7.803, de 18 de julho de 1989, 20% (vinte por
cento) da área de cada propriedade, para todas as formas de vegetação;
§ 2º - A identificação da forma da
vegetação e da época de abertura das situações consolidadas poderá ser
provada por documentos tais como a descrição de fatos históricos de
ocupação da região, registros de comercialização, dados agropecuários da
atividade, contratos e documentos bancários relativos à produção, e por
todos os outros meios de prova em direito admitidos.
§ 3º - Os atos e documentos oficiais ou
emitidos pela administração pública federal, estadual ou municipal
possuem fé pública, gozando de presunção de veracidade, e tem o
efeito de prova pré-constituída.
§ 4º - O percentual de recomposição de
Reserva Legal em propriedade ou posse rural em área contendo forma
de vegetação de floresta, de cerrado e outras formas de
vegetação será definido considerando separadamente a parcela que
cada uma ocupa na propriedade ou posse rural analisada, bem como o
cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da
Reserva Legal da propriedade ou posse rural, atendidas as determinações do
artigo 15 da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, e as demais
disposições desta lei.
§ 5º - O indeferimento do direito previsto
neste artigo deverá conter despacho fundamentado no processo
administrativo, garantidos a ampla defesa e o contraditório, após
notificação pessoal do proprietário ou possuidor, cabendo recurso
administrativo com efeito suspensivo.
Subseção IV
Da
Recuperação das Áreas de Reserva Legal
Artigo 28 - Identificado percentual do imóvel
necessário para a regularização da Reserva Legal, nos termos do artigo 27
desta lei, o proprietário ou possuidor poderá adotar, isolada ou
conjuntamente, os seguintes métodos:
I - condução de regeneração natural de
espécies nativas;
II - plantio de espécies nativas
conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas;
III - plantio de espécies nativas;
IV - plantio de espécies exóticas
combinado com as espécies nativas de ocorrência regional, conforme
metodologia do artigo 29 desta lei;
V - compensação, nos termos do inciso
III do artigo 66 da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Parágrafo único - A recomposição de que trata o “caput” deste artigo
deverá ser concluída em até 20 (vinte) anos, abrangendo, a cada 2 (dois)
anos, 1/10 (um décimo) da área total necessária à sua complementação,
iniciando necessariamente pelo percentual de APP computado na Reserva
Legal.
Artigo 29 - A recomposição das Áreas de Reserva
Legal poderá ser realizada mediante o plantio intercalado de
espécies nativas e exóticas, em sistema agroflorestal, observados
os seguintes parâmetros:
I - o plantio de espécies exóticas
deverá ser combinado com as espécies nativas de ocorrência regional;
II - a área recomposta com espécies
exóticas não poderá exceder a 50% (cinquenta por cento) da área total a
ser recuperada.
Parágrafo único - O proprietário ou possuidor de
propriedade ou posse rural que optar por recompor a reserva legal
com utilização do plantio combinado de espécies nativas e
exóticas terá direito a sua exploração econômica em caráter
permanente, desde que a exploração econômica seja conduzida sob a
forma de manejo sustentável.
Subseção V
Da Doação de
Área Dentro de Unidade de Conservação
Artigo 30 - A doação de área localizada no
interior de Unidade de Conservação atenderá ao seguinte procedimento:
I - o interessado, sendo o titular de
direitos do imóvel a ser doado, deverá apresentar requerimento para
recebimento da doação, no mesmo ato renunciando o recebimento de
qualquer quantia, a qualquer título, da área apresentada, também
devendo ser anexada procuração pública irretratável e irrevogável em
favor do órgão de representação judicial e extrajudicial da pessoa
jurídica que instituiu a unidade de conservação para fins de confecção da
escritura e seu registro no Registro de Imóveis respectivo;
II - o interessado, caso não seja o
titular do imóvel, deverá protocolar junto ao órgão ambiental responsável
pelo PRA instrumento particular de compra e venda ou cessão de direitos
do imóvel qualificado no inciso I deste artigo, com a comprovação de
que o mesmo instrumento já esteja levado a registro na respectiva
matrícula, onde conste:
a) a compra e venda da área ou de seus
direitos, se já desapropriada, com cláusula de outorga de escritura de
doação exclusivamente em favor da pessoa jurídica de direito
público instituidora da unidade de conservação;
b) a renúncia expressa das partes
contratantes da compra e venda ou cessão de qualquer ato ou ação contrária
à doação da área para a pessoa jurídica de direito público, por
qualquer motivo, inclusive em eventual litígio da compra e venda ou cessão,
bem como de recebimento de qualquer outra quantia a qualquer título;
c) cláusula-mandato em favor do órgão de
representação judicial e extrajudicial da pessoa jurídica de direito
público para todos os atos necessários à confecção de escritura de doação
e respectivo registro em favor da pessoa jurídica de direito
público que instituiu a unidade de conservação;
III - juntamente com os documentos do
inciso II deste artigo, deverá ser anexada procuração pública irretratável
e irrevogável dos vendedores em favor do órgão de representação
judicial e extrajudicial da pessoa jurídica que instituiu a unidade
de conservação, para fins de confecção da escritura e seu registro no
Registro de Imóveis respectivo;
IV - as guias de recolhimento de todas
as custas e emolumentos vinculados à referida escritura de doação.
Parágrafo único - Conferidos os documentos, a autoridade responsável pelo
acompanhamento da execução do PRA certificará a juntada de todos os
documentos indicados nas hipóteses deste artigo, certificando também o
reconhecimento da compensação da reserva legal.
Artigo 31 - Admitir-se-á a instituição de
servidão ambiental ou de CRA nas propriedades rurais com área total ou
parcial dentro de unidades de conservação de domínio público
em território paulista que ainda estejam em regularização
fundiária, devendo o proprietário instruir o seu requerimento com
os seguintes documentos:
I - declaração que pretende gravar a
área para fins do estabelecimento de servidão ambiental ou de CRA;
II - documentação fundiária do imóvel,
demonstrando a propriedade da área;
III - ato de designação de responsável,
quando se tratar de pessoa jurídica;
IV - cédula de identidade, quando se
tratar de pessoa física;
V - documentação de criação da Unidade de
Conservação de Domínio Público.
§ 1º - O detentor da servidão ambiental ou
CRA em unidade de conservação de domínio público poderá cedê-la ou
transferi-la em caráter definitivo, em favor da entidade pública
que tenha instituído a unidade de conservação, indicando no ato
ou posteriormente qual a propriedade ou posse rural, própria ou
de terceiro, a ser beneficiada.
§ 2º - Equipara-se à doação o ato de
cessão ou transferência, previsto no § 1º deste artigo, cujo beneficiário
seja órgão ou entidade do Estado de São Paulo, desde que o proprietário e
titular do direito de indenização firme termo de renúncia que, havendo
processo judicial, seja homologado por sentença que também reconheça os
direitos de compensação da servidão ambiental ou CRA cedida.
§ 3º - Na hipótese do § 2º deste artigo,
ocorrida cessão de servidão ambiental ou CRA de área do imóvel que
esteja fora da unidade de conservação, fica autorizado o órgão
gestor da unidade de conservação a incorporar a área à unidade
de conservação.
§ 4º - A doação de áreas no interior de
unidades de conservação em território paulista integrantes do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação - SNUC dependerá do
reconhecimento da efetiva cessão ou transferência da área conforme
§ 1º deste artigo.
Artigo 32 - Nas propriedades ou posses rurais que
detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro)
módulos fiscais e que possuíam remanescente de vegetação nativa
em percentuais inferiores ao previsto no artigo 12 da Lei Federal
nº 12.651, de 25 de maio de 2012, a Reserva Legal será
constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22
de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do
solo.
§ 1º - No caso em que a vegetação nativa
seja composta por espécimes espalhados na paisagem e que dificulte a
utilização de técnicas agrícolas de uso do solo sem a supressão parcial
dos mesmos, o interessado poderá optar por renunciar ao
direito previsto no “caput” deste artigo, para estabelecer
mosaico compensando a supressão desses espécimes, na proporção
de 1:10 (um para dez) no espaço necessário a acomodar todo o plantio
no espaçamento tecnicamente recomendado para o adensamento florístico, a
ser informado na forma do artigo 9º desta lei, após a aprovação do Projeto
de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas.
§ 2º - A vegetação nativa mencionada no
“caput” deste artigo não possui percentual mínimo de aplicação.
§ 3º - Nos imóveis sem remanescente de
vegetação nativa na data de 22 de julho de 2008, fica o proprietário ou
possuidor desobrigado de recompor.
Artigo 33 - A vegetação nativa das propriedades e
posses rurais de até 4 (quatro) módulos fiscais, desde que superior
a 1(um) hectare, poderá ser utilizada para a criação de
servidão ambiental ou emissão de Cota de Reserva Ambiental - CRA,
na modalidade do § 4º do artigo 44 da Lei Federal nº 12.651, de 25 de
maio de 2012.
Artigo 34 - A instituição de servidão ambiental
ou emissão da CRA será concomitante com a homologação do PRA se
assim requerer o interessado, inclusive para utilização em outro
imóvel, próprio ou de terceiro, também submetido ao PRA.
Artigo 35 - O proprietário ou o possuidor do
imóvel rural poderá alterar a localização da área de Reserva Legal no
PRA, mediante aprovação do órgão ambiental competente.
§ 1º - A nova área de Reserva Legal
proveniente da alteração a que se refere o “caput” deste artigo deverá
localizar-se no imóvel que continha a Reserva Legal de origem, em área
com tipologia vegetacional, solo e recursos hídricos semelhantes ou
em melhores condições ambientais que a área anterior, observados os critérios
técnicos que garantam ganho ambiental, estabelecidos em regulamento.
§ 2º - Vetado:
1 - vetado;
2 - vetado;
3 - vetado.
§ 3º - Vetado:
1 - vetado;
2 - vetado;
3 - vetado.
CAPÍTULO III
Da
Regularização e Continuidade das Atividades Agrossilvipastoris
Seção I
Disposições
Gerais
Artigo 36 - O manejo florestal sustentável ou a
intervenção na cobertura vegetal nativa no Estado para uso alternativo
do solo, tanto de domínio público como de domínio privado,
dependerá do cadastramento do imóvel no CAR e de autorização prévia
do órgão estadual competente, e, havendo necessidade, a apresentação do
PRA do imóvel, ficando dispensadas de autorização do órgão ambiental as
seguintes intervenções sobre a cobertura vegetal nativa:
I - os aceiros para prevenção de incêndios
florestais, seguindo os parâmetros do órgão ambiental competente,
inclusive em áreas de preservação permanente e de Reserva Legal;
II - a extração de lenha em regime
individual ou familiar para o consumo doméstico;
III - a limpeza de área ou roçada, conforme
regulamento;
IV - a construção de bacias para
acumulação de águas pluviais, em áreas antropizadas, para controle da
erosão, melhoria da infiltração das águas no solo, abastecimento humano
e dessedentação de animais, desde que a bacia não esteja situada em
curso d’água perene ou intermitente;
V - o aproveitamento de árvores mortas,
decorrentes de processos naturais, para utilização no próprio imóvel,
não sendo permitida sua comercialização ou transporte, salvo
para beneficiamento;
VI - a abertura de picadas e a
realização de podas que não acarretem a morte do indivíduo;
VII - a instalação de obras públicas que
não impliquem rendimento lenhoso;
VIII - a coleta de produtos florestais não
madeireiros;
IX - a limpeza e manutenção de drenos,
valas ou canais artificiais.
§ 1º - Para os fins desta lei, entende-se
por limpeza de área ou roçada a retirada de espécimes com porte arbustivo
e herbáceo, predominantemente invasoras, em área antropizada.
§ 2º - Os drenos ou valas são canais
artificiais de captação ou derivação que constituem obras de engenharia
integrantes da infraestrutura da atividade agrossilvipastoril e não
se enquadram nos termos do inciso I do artigo 4º da Lei Federal n.º
12.651, de 25 de maio de 2012, mas devem ser indicados no Projeto de Recomposição
de Áreas Degradadas e Alteradas, devendo constar do Termo de Compromisso
as obrigações de manutenção e conservação de solo e água, bem como a
comunicação ao órgão estadual de recursos hídricos para
regularização, por obtenção de dispensa ou outorga d’água da captação
ou derivação.
Seção II
Do Programa
de Apoio e Incentivo à Preservação e Recuperação do Meio Ambiente
Artigo 37 - Respeitadas as obrigações de
reflorestamento assumidas, até o encerramento do Programa de
Regularização Ambiental que dispõe esta lei, o mínimo de 20% (por
cento) das árvores plantadas com recursos da reposição florestal
de que trata a Lei Estadual nº 10.780, de 9 de
março de 2001, serão de essência nativa, visando à
reconstituição de áreas de preservação permanente e de Reserva Legal
inseridas no Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e
Alteradas.
Artigo 38 - Fica o Poder Executivo Estadual
autorizado a instituir, sem prejuízo do cumprimento da legislação ambiental, programa
de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, bem como a adoção de
tecnologias e boas práticas que conciliem a produtividade agropecuária e
florestal, com redução dos impactos ambientais, como forma de promoção do
desenvolvimento ecologicamente sustentável, observados sempre
os critérios de progressividade, abrangendo as seguintes categorias e
linhas de ação, conforme regulamento:
I - pagamento ou incentivo a serviços
ambientais como retribuição, monetária ou não, a atividades de conservação
e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais;
II - compensação pelas medidas de
conservação ambiental necessárias ao cumprimento dos objetivos desta lei,
utilizando-se de instrumentos creditórios, fiscais e tributários;
III - incentivos para comercialização,
inovação e aceleração das ações de recuperação, conservação e uso
sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa.
Parágrafo único - Este programa deve prever as
seguintes diretrizes:
1 - integração com a Política Estadual de
Mudanças Climáticas;
2 - possibilidade de utilização de fundos
públicos para concessão de créditos reembolsáveis e não reembolsáveis
destinados à compensação, recuperação ou recomposição florestal;
3 - integração com os sistemas em âmbitos
nacional, regionais e municipais;
4 - integração com Programa de
Regularização Ambiental - PRA.
Artigo 39 - Para melhor execução do Programa de
Regularização Ambiental - PRA, o Poder Executivo Estadual
fica autorizado a instituir o Pagamento por Serviços Ambientais
para incentivar a recomposição florestal, a proteção dos
mananciais no Estado e a compensação preferencial no Estado de São
Paulo, na forma a ser definida em regulamento.
§ 1º - O Pagamento por Serviços Ambientais
será ação integrante do Programa de Regularização Ambiental -
PRA, devendo perseguir os mesmos objetivos.
§ 2º - A não instituição da ação Pagamento
por Serviços Ambientais não poderá servir de argumento para a não
execução por parte dos proprietários e possuidores das
obrigações manifestas na adesão do PRA.
§ 3º - O Pagamento por Serviços
Ambientais, uma vez instituído, deverá atender preferencialmente aos
proprietários e possuidores de imóveis rurais que:
1 - se enquadrarem na categoria de
agricultores familiares ou de empreendimentos familiares rurais, conforme
Lei Federal n° 11.326, de 24 de julho de 2006;
2 - tenham área inferior a 4 (quatro)
módulos fiscais;
3 - estejam localizados próximos a
regiões de mananciais ou rios cuja capacidade hídrica seja utilizada para
abastecimento público.
§ 4º - Fundos públicos e receitas próprias
da Fazenda do Estado poderão ser utilizados para o pagamento, na
forma monetária direta ou por meio de incentivos decorrentes
de renúncia fiscal de tributos.
CAPÍTULO IV
Disposições
Finais
Artigo 40 - Nas áreas de ocupação antrópica
consolidada em área urbana, fica assegurado o uso alternativo do solo
previsto no inciso VI do artigo 3º da Lei Federal nº 12.651, de 25
de maio de 2012, respeitadas as áreas de preservação
permanente previstas pela legislação em vigor à época da implantação
do empreendimento.
Parágrafo único - Fica assegurado o direito de
construir em lotes oriundos de parcelamento do solo urbano
registrado no Serviço de Registro de Imóveis competente, desde
que respeitadas as Áreas de Preservação Permanente, exigidas
pela legislação vigente na data da implantação do
licenciamento ambiental e do registro do parcelamento do solo para fins
urbanos, aprovado segundo a legislação específica.
Artigo 41 - Aplica-se subsidiariamente a Lei
Estadual nº 10.177, de 30 de dezembro de 1998, nos processos e
procedimentos administrativos e seus trâmites, no que não
dispuser esta lei, sempre garantidos a ampla defesa e o
contraditório, devendo ser fundamentados os motivos de eventual não
deferimento de efeito suspensivo a recurso interposto.
Artigo 42 - Os serviços prestados na prevenção e
no combate a incêndios florestais são considerados de relevante
interesse público, não incidindo qualquer penalidade nessa hipótese.
Artigo 43 - Esta lei entra em vigor na data de
sua publicação, revogadas a Lei nº 9.989, de 22 de maio de
1998 e a Lei nº 12.927, de 23 de
abril de 2008.”
Pelo que se depreende da leitura do artigo 1º, buscou-se por meio do diploma supra estabelecer contornos mais precisos à Lei Federal nº 12.651/12, permitindo, assim, sua aplicabilidade no âmbito estadual.
Todavia, conforme restará
demonstrado no curso desta exordial, o ato normativo impugnado revela-se incompatível
com a Carta Bandeirante, pois, além de reiterar as inconstitucionalidades
daquela normativa federal, invadiu a competência legislativa da União, bem como
propiciou o enfraquecimento do nível de proteção conferida pelo ordenamento ao
meio ambiente no Estado de São Paulo, o que representa afronta ao princípio da
vedação ao retrocesso sócio ambiental, extraído a partir da exegese do Capítulo
IV, Seção I, da CE/89, mais precisamente de seu art. 191.
Por fim, ainda se visualiza transgressão ao art. 180, II, da Carta Paulista, haja vista a falta de participação popular quando da edição da lei impugnada, como será demonstrado a seguir.
2.
DA FUNDAMENTAÇÃO
A Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015, que “Dispõe sobre o Programa de Regularização Ambiental - PRA das propriedades e imóveis rurais, criado pela Lei Federal nº 12.651, de 2012 e sobre a aplicação da Lei Complementar Federal nº 140, de 2011, no âmbito do Estado de São Paulo”, rebaixou a proteção jurídica ao meio ambiente em todo Estado de São Paulo, revelando-se frontalmente contrária à Constituição do Estado de São Paulo.
Os preceitos da Constituição do Estado assim estabelecem:
“Artigo
1º - O Estado de São Paulo, integrante da República Federativa do Brasil,
exerce as competências que não lhe são vedadas pela Constituição Federal.”
(...)
“Artigo 180 - No estabelecimento de
diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os
Municípios assegurarão:
(...)
II - a participação das respectivas
entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas,
planos, programas e projetos que lhes sejam concernentes;
(...)
Art. 191 - O
Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a
preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente
natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e
locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico."
a.
DA
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR
É inegável que a transformação da legislação protetora do meio
ambiente ecologicamente equilibrado afeta a realidade urbana, em especial a
sadia qualidade de vida de seus habitantes.
Nesse contexto, por afetar a legislação urbanística e a qualidade
de vida de seus munícipes, a validade e legitimidade de modificação de norma
ambiental pressupõe participação comunitária em todas as fases de sua produção
(art. 191, caput, CE).
Os planos ambientais devem levar em conta o bem estar do povo,
pois sem o meio ambiente ecologicamente equilibrado não há vida humana, de
sorte que tais normativas cumprem esta premissa quando são sensíveis às
necessidades e aspirações da comunidade.
O planejamento ambiental que acarreta desdobramentos urbanísticos
exige uma participação democrática, pressupondo a possibilidade de efetiva
participação do povo na sua elaboração, haja vista o Constituinte Bandeirante
ter estabelecido no art. 191, caput,
da Carta Paulista, a participação da coletividade na defesa do meio ambiente, o
que abrange a necessidade de participação popular quando da edição ou alteração
de diplomas hábeis a vulnerar o aludido objeto de proteção, principalmente
diante do fato de que esses diplomas, sendo democráticos, se colocam contra
pressões ilegítimas ou equivocadas em relação aos mananciais que interferem na
vida dos administrados, inclusive os residentes nas urbes.
Por esse motivo, o princípio da participação comunitária no estabelecimento
de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento de políticas ambientais
pode e deve ser considerado em conjunto com os dispositivos relativos ao
ordenamento urbano, respeitando para tanto a exigência da participação popular
voltada à deliberação de tais questões, segundo preconiza a Constituição
Estadual na interpretação conjunta dos arts. 180, II, e 191.
Se o entendimento jurisprudencial sufraga a necessidade não só de prévio estudo técnico e planejamento, mas também a participação comunitária na produção de normas atinentes ao ordenamento urbanístico, nada mais coerente aplicar a mesma lógica à edição de normas ambientais, com inegável efeito no meio ambiente natural e artificial, em razão dos motivos já elencados.
Nesse sentido, aliás, já se posicionou este E. Tribunal de Justiça
na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 0168001-94.2013.8.26.0000, no
sentido de ser indispensável a participação comunitária no processo legislativo
destinado à alteração do zoneamento urbano, momento em que este Sodalício se
utilizou de interpretação conjunta dos arts. 180, II, e 191 da Carta Paulista.
Ante a clareza e precisão do voto proferido na aludida demanda, que, mutatis mutandis, pode ser empregado na
resolução da questão ora examinada, pede-se vênia para reproduzir excertos da
r. decisão:
“(...) A lei
nº 6.359, de 7 de junho de 2013, do Município de Bauru, transforma ruas e
quarteirões que especifica em seus arts. 1º, 2º e 3º em corredores comerciais e
de serviços. E não resta dúvida de que, visando a atender interesse público
local, isso é possível, mas com a observância de normas constitucionais (art.
180, II, e 191 da Constituição do Estado) que exigem em tal processo a participação
de entidades comunitárias, da coletividade, em suma, o que, no caso, não
ocorreu, como se depreende do que segue claro nas informações que Município e
Câmara prestaram (fls. 33/36 e 39/40).
O art. 180,
II, da Constituição do Estado prevê que no estabelecimento de diretrizes e
normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios
assegurarão “a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo,
encaminhamento e solução dos problemas, plano, programas e projetos que lhes
sejam concernentes” (inciso II). E o art. 191 da Constituição do Estado diz: “O
Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a
preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente
natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e
locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico”.
O ato
normativo aqui atacado constitui inequívoca alteração do zoneamento, com
transformação de ruas e quarteirões inteiros em corredores comerciais e de
serviços, o que se fez sem a imprescindível participação comunitária.
(...)
Não se trata
de, como quer a Municipalidade, submeter a consulta popular todo e qualquer ato
do poder público municipal, toda e qualquer edição de lei, a acarretar “uma
enorme burocratização da Gestão Pública Municipal.” Trata-se, isto sim, de
cumprir e fazer com que se cumpra a Constituição Estadual que, no que concerne
à matéria em exame, exige, como dito, a participação comunitária, na forma do
que estabelece nos arts. 180, II, e 191, que não abrem exceção para
modificações pontuais ou pequenas alterações de zoneamento. Aliás, observados
os termos da lei 6.359/13, não cabe no caso falar em pequena alteração de
zoneamento. A necessidade de “dinamizar e desenvolver a cidade em conformidade
com o progresso” não justifica o descumprimento de normas constitucionais, das
diretrizes nestas especificadas para alterações urbanísticas e de zoneamento.
(...)”
Ante as considerações supramencionadas, padece de
inconstitucionalidade a Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015, por subtrair a possibilidade e exigência constitucional
da participação popular na instituição de normas ambientais, ofendendo
frontalmente o disposto no arts. 180, II, e 191, da Constituição Estadual.
b.
DA INVASÃO DA ESFERA DE COMPETÊNCIA DA UNIÃO
EM MATÉRIA AMBIENTAL
Nos termos do art. 24, VI, §§ 1º e 2º, da Constituição Federal, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar, de forma concorrente, acerca da proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, lembrando que neste espectro legiferante concorrente cabe ao ente federal editar normas gerais acerca do tema indicado, assim como compete aos Estados e ao Distrito Federal suplementar tal legislação. Vejamos:
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito
Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do
solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
(...)
§ 1º No
âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a
estabelecer normas gerais.
§ 2º A
competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência
suplementar dos Estados.”
A Lei Estadual nº 15.684/15,
ora impugnada, especificamente nos artigos 9º, 17, “caput”, § 2º, 27, § 1º, 1 e
2 e 35, “caput”, e § 1º, ao invadir a seara de competência da União em matéria
ambiental e dispor de forma diversa no tocante às normas gerais inseridas na
Lei Federal nº 12.651/12, acabou por dispor de forma diversa do contido na lei
federal, o que importa ofensa ao artigo 1º da Constituição do Estado de São
Paulo.
c. DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO AMBIENTAL
A própria Lei Federal n.
12.651/12 já é objeto de 03 Ações Diretas de Inconstitucionalidade, ajuizadas
pela Procuradoria-Geral de República perante o STF, em face da vedação ao
princípio do retrocesso em matéria ambiental (fls. 634 e seguintes).
Neste contexto, não bastasse
a Lei Federal n. 12.651/12 ter configurado retrocesso em defesa do meio
ambiente, a Lei Estadual n. 15.684/15, ao dispor de forma diversa da diretriz
geral contida na lei federal e arrefecer a proteção ao meio ambiente conferida
pela já deficiente Lei Federal n. 12.651/12, reforçou e ofendeu em maior grau o
princípio da vedação ao retrocesso em matéria ambiental.
Cabe aos Estados e ao Distrito Federal suplementar a legislação federal sempre buscando conferir uma maior proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois se nessa tarefa de disciplinar amiúde questões ambientais segundo suas peculiaridades locais o ente estadual arrefecesse a normativa federal haveria flagrante retrocesso à proteção do aludido bem difuso, o que é defeso pelo texto constitucional segundo o princípio da proibição ao retrocesso ambiental.
Sobre o tema, manifesta-se o eminente Min. Luis Roberto Barroso:
“Por este princípio, que não é
expresso, mas decorre do sistema jurídico-constitucional, entende-se que se uma
lei, ao regulamentar um mandamento constitucional, instituir determinado
direito, ele se incorpora ao patrimônio jurídico da cidadania e não pode ser
arbitrariamente suprimido. Nessa ordem de ideias, uma lei posterior não pode
extinguir um direito ou garantia especialmente os de cunho social, sob pena de
promover um retrocesso, abolindo um direito fundado na constituição. O que se
veda é o ataque à efetividade da norma, que foi alcançado a partir de sua
regulamentação. Assim, por exemplo, se o legislador infraconstitucional deu
concretude a uma norma programática ou tornou viável o exercício de um direito
que dependia de sua intermediação, não poderá simplesmente revogar o
atolegislativo, fazendo a situação voltar ao estado de omissão legislativa
anterior” (O Direito Constitucional e a Efetividade das Normas, 5ª. Ed., Rio de
Janeiro, Renovar, 2011, pag. 158/159).
Ainda sobre o princípio,
sustenta-se que ele decorre de outros princípios constitucionais de mais alta
importância, ou seja, do princípio do Estado Democrático e Social de Direito,
do princípio da dignidade da pessoa humana, do princípio da máxima eficácia e
efetividade das normas definidoras dos direitos fundamentais, do princípio da
proteção da confiança e da própria noção do mínimo essencial, sendo imperioso
destacar que no campo do Direito Ambiental sua aplicação é amplamente aceita tanto
na doutrina como na jurisprudência pátrias.
Por ser fundamental o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o Princípio da vedação ao retrocesso ambiental constitui um
verdadeiro princípio geral do Direito Ambiental, vez que tem por objetivo
salvaguardar os progressos obtidos para evitar a deterioração do ambiente,
sendo inadmissível condutas retrógradas, pois haveria uma ameaça à sadia
qualidade de vida das presentes e futuras gerações.
Os avanços conquistados na
seara da proteção ambiental não podem ser alvo de alterações que materializam
atraso normativo, sob pena de vulnerar o piso mínimo de proteção ecológica para
a qualidade da vida.
Sobre o tema, nos ensina o
Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Antônio Herman Benjamin, que a
proposição nada tem de recente. Afirma que não é de hoje que se defende
"que a civilização moveu-se, move-se e se movera numa direção
desejável", conforme resume J. B. Bury, em sua clássica obra de início do
Século XX; ou que a humanidade avançou no passado, continua avançando agora, e,
com toda probabilidade, continuará a avançar no futuro próximo". Sob a
cobertura política dessa ideia-chave, surge o princípio jurídico da proibição
de retrocesso, que expressa uma "vedação ao legislador de suprimir, pura e
simplesmente, e concretização da norma", constitucional ou não, "que
trate do núcleo essencial de um direito fundamental" e, ao fazê-Io,
impedir, dificultar ou inviabilizar "a sua fruição, sem que sejam criados
mecanismos equivalentes ou compensatórios". Princípio esse que transborda
da esfera dos direitos humanos e sociais para o Direito Ambiental. (BENJAMIN,
Antônio Herman, Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. In: SENADO
FEDERAL, Comissão De Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e
Controle, Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. Brasília: Senado,
2012. p. 57).
Prossegue o Ministro Herman
Benjamin, exemplificando: "A mais
óbvia é a redução do grau de salvaguarda jurídica ou da superfície de uma área
protegida (Parque Nacional, p. ex.); outra, menos perceptível e por isso mais
insidiosa, e o esvaziamento ou enfraquecimento das normas de previsão de
direitos e obrigações ou, por outro lado, os instrumentos de atuação do Direito
Ambiental (Estudo Prévio de Impacto Ambiental, Áreas de Proteção Permanente,
Reserva Legal, Responsabilidade civil objetiva, p. ex.). Consequentemente,
tirante a redução pura e simples de espaços territoriais protegidos, o
retrocesso pode afetar ora direitos substantivos (= retrocesso substantivo) ora
direitos procedimentais ou o due process ambiental (= retrocesso formal ou
procedimental); ora o marco legislativo em si mesmo (=retrocesso legislativo)
ora a política de implementação (=retrocesso de implementação). (BENJAMIN,
Antônio Herman, Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. In: SENADO
FEDERAL, Comissão De Meio Ambiente, Defesa Do Consumidor e Fiscalização e
Controle, Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. Brasília: Senado,
2012. P.67).
Há, portanto, a necessidade
de se afastar o princípio da mutabilidade do direito na seara de proteção
ambiental, nesse sentido:
"O meio ambiente e o
desenvolvimento sustentável nos obrigam a pensar hoje de maneira diferente,
afastando o princípio da mutabilidade do Direito. Isso porque o meio ambiente,
como os direitos humanos, constituem exceções a essa regra. Nesse sentido, há
que se considerar que, junto com o princípio de desenvolvimento sustentável,
não se pode esquecer dos direitos à vida e à saúde das gerações futuras e,
assim, há que se impedir que se tomem medidas que causariam danos a elas.
Reduzir ou revogar a regras de proteção ambiental teria como efeito impor às
gerações futuras um ambiente mais degradado. Nesse sentido, o artigo 28, acima
mencionado, se interpretado literalmente e combinado com o princípio do
desenvolvimento sustentável, pode ser interpretado, no contexto ambiental e
atual, como advogando em favor do princípio de não regressão, pois veda a
submissão das gerações futuras a normas responsáveis pelo recuo na proteção
jurídica do meio ambiente". (PRIEUR, Michel, Princípio da Proibição de
Retrocesso Ambiental. In: SENADO FEDERAL, Comissão De Meio Ambiente, Defesa Do
Consumidor e Fiscalização e Controle, Princípio da Proibição de Retrocesso
Ambiental. Brasília: Senado, 2012. p.19).
No campo do Direito
Constitucional Brasileiro, o princípio da proibição ao retrocesso surgiu como
um princípio geral de Direito Ambiental, não estando previsto em norma constitucional
explícita.
Na realidade, ele se manifesta
a partir da leitura conjunta das normas que compõem a totalidade do vasto mosaico
do Direito Ambiental, justificando ser invocado para o controle de
constitucionalidade de iniciativas legislativas destinadas a reduzir o patamar
de tutela legal do meio ambiente.
O meio ambiente
ecologicamente equilibrado, portanto, é um direito fundamental, impondo-se ao
Poder Público o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações, sendo por esse motivo que a Constituição Estadual adotou ainda o
"princípio da melhoria ambiental", cuja origem remonta à Lei de
Política Nacional de Meio Ambiente, estabelecendo que o Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da
coletividade, a preservação,
conservação, defesa, recuperação e melhoria
do meio ambiente natural.
Tal princípio é o
ambicionado e informa o princípio da proibição de retrocesso, pois não basta
manter ou conservar o que se tem, impondo-se melhorar, avançar no
terreno daquilo que um dia ecologicamente se teve e desapareceu, ou hoje se
encontra dilapidado, e, se não zelado de maneira correta, mais cedo ou mais
tarde desaparecerá.
Este princípio,
aliás, encontra-se contemplado no art. 191 da Constituição Estadual que
determina ao Estado e aos Municípios, com a
participação da coletividade, a melhoria
do meio ambiente natural, consagrando uma ideia
de avanço em oposição a condutas retrógradas em matéria ambiental.
Portanto, além de invadir a
esfera de competência legislativa da União, ao dispor acerca da matéria de
forma diversa das diretrizes gerais contidas na Lei Federal n. 12.651/12, a Lei
Estadual impugnada também acabou por ofender o princípio da vedação ao
retrocesso em matéria ambiental.
Necessário, portanto,
analisar as disposições que importaram em violação ao citado princípio da
vedação ao retrocesso em matéria ambiental:
I.
O artigo 9º da
Lei Estadual n. 15.684/15 dispõe:
“Artigo 9º – A execução do Projeto de
Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas deverá ser concluído em até 20
(vinte) anos, abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo, 1/10 (um décimo) da
área total necessária à sua complementação, quando será apresentado relatório
da execução do período.
§ 1º – O projeto deverá contemplar,
alternativa ou conjuntamente, as seguintes modalidades:
1. regeneração;
2. recomposição;
3. compensação.
O § 1º do artigo 2.º da Lei Estadual n.º 9.989/1998 - revogada expressamente pelo artigo 43 da Lei Estadual nº 15.684/15 -, estipulava um prazo máximo de 5 (cinco) anos para a execução de projetos de recuperação de áreas de preservação permanente.
A lei estadual impugnada ampliou esse prazo para até 20 anos, o que configura grave retrocesso ambiental, contrariando o supramencionado princípio constitucional da vedação do retrocesso socioambiental.
Ademais, o citado prazo é distinto daquele estipulado na legislação federal, que contempla 20 anos apenas para a reserva legal, excluída a área de preservação permanente, o qual foi adotado por uma razão histórica: a obrigação de recuperar as reservas legais foi instituída pela Lei da Política Nacional Agrícola (Lei nº 8.171/1991), à razão de 1/30 avos por ano, a partir de 1992. Além disso, as áreas de reserva legal são, em regra, muito mais extensas que as de preservação permanente, demandando maior comprometimento econômico para sua recuperação.
Por outro lado, a Lei nº 12.651/2012 somente admite o prazo de 20 anos para um dos métodos de recuperação da reserva legal, a saber, a recomposição (art. 66, I, da Lei 12.651/2012).
Porém, lei estadual impugnada não restringe o prazo de 20 anos à recomposição, dando azo à interpretação de que também seria aplicável às hipóteses de regeneração e compensação de reserva legal.
Evidente que a Lei Estadual nº 15.684/15, além de invadir a esfera de competência da União, dispondo de forma diversa das diretrizes gerais, impôs novo retrocesso ambiental àqueles já inaugurados pela Lei nº 12.651/2012.
Ofende, ainda, o princípio constitucional da proporcionalidade, pois, a um espaço territorial especialmente protegido, mas ambientalmente mais frágil e mais importante que as reservas legais (área de preservação permanente), a Lei Estadual defere uma proteção menos rigorosa.
II. O artigo 12 da lei impugnada dispõe:
Artigo 12 – Os termos de compromissos
ou instrumentos similares para a regularização ambiental do imóvel rural
referentes às Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso
restrito, firmados sob a vigência da legislação anterior, deverão ser revistos
para se adequarem ao disposto na Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
§1º – O disposto no “caput” aplica-se
exclusivamente aos casos em que o proprietário ou o possuidor do imóvel rural
requerer a revisão.
§2º – Realizadas as adequações
requeridas pelo proprietário ou possuidor, o termo de compromisso revisto
deverá ser inscrito no SICAR.
§3º – Caso não haja pedido de
revisão, os termos ou instrumentos de que trata o “caput” serão respeitados.
(...)
§8º – Na hipótese do “caput”, o
Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas deverá:
1. mencionar as obrigações já
cumpridas nos termos do anterior instrumento de ajustamento de conduta ou de
assunção de responsabilidade;
2. mencionar as obrigações ainda
pendentes na forma do Capítulo XIII da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de
2.012 e desta lei.
Aqueles termos de compromisso de recuperação ambiental ou instrumentos similares já celebrados em data anterior à Lei 12.651/2012 são considerados atos jurídicos perfeitos.
Já asseguraram à coletividade o direito à recuperação de determinadas extensões de áreas de preservação permanente ou de reservas legais, e com o reflorestamento de espécies nativas.
A possibilidade de celebração de novos termos com base na lei impugnada, em substituição aos anteriores, contraria o inciso XXXVI do artigo 5.º da Constituição Federal, segundo o qual a lei “não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Neste contexto, a permissão a que Estado celebre novos termos, com condições ambientais menos rigorosas, a Lei Estadual nº 15.684/15 permite que o direito de titularidade da coletividade (ao meio ambiente ecologicamente equilibrado), já assegurado materialmente em um determinado patamar, seja reduzido por quem não é seu titular, mas mero representante adequado, a saber, o Estado de São Paulo. Todavia, o direito ao meio ambiente é um direito fundamental, indisponível.
Do ponto de vista subjetivo, a tutela coletiva do direito ambiental e dos demais direitos difusos é indisponível para os colegitimados: União, Estados, Municípios e Ministério Público não podem abrir mão do conteúdo desses direitos, pois deles não são titulares, mas, como dito, meros representantes adequados.
É por isso que o § 1.º do artigo 6.º do Decreto 2.181/1997, que regulamenta o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, apenas admite a substituição de um termo de ajustamento de conduta anteriormente firmado se o novo termo for “mais vantajoso para o consumidor”. Como o direito difuso ao meio ambiente integra o mesmo microssistema de tutela dos direitos difusos e coletivos, a regra do Decreto 2.181/1997 também lhe é aplicável, o que reforça a evidência de inconstitucionalidade e ilegalidade do artigo caput do art. 12 em análise, e de seus parágrafos 1º, 2º, 3º e 8º.
Além disso, tal disposição ofende o princípio da segurança jurídica, já que o artigo poderá dar ensejo a infindáveis controvérsias judiciais relacionadas a inúmeros termos de compromisso de recuperação ambiental firmados pelos colegitimados, inclusive pelo Ministério Público, para que sejam substituídos por termos de compromisso celebrados pelo órgão ambiental estadual, com cláusulas ambientalmente menos rigorosas.
Portanto, a possibilidade de revisão de termos de compromisso de recuperação ambiental já firmados viola o princípio da vedação ao retrocesso em matéria ambiental.
III. Por sua vez, o artigo 17 da Lei Estadual n. 15.684/15 prevê:
(...)
Artigo 17 – Para a atividade de
aquicultura, quando enquadrada na alínea “e”, do inciso IX, do artigo 3º, da
Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2.012, será permitida a implantação de
instalações necessárias à captação, condução e derivação de água e de efluentes
tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e
essenciais da atividade.
A alínea “e” do inciso XI do art. 3.º da Lei 12.651/2012 veicula a seguinte hipótese de interesse social autorizador de intervenção em APP:
“e) implantação de instalações necessárias à captação e
condução de água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos
são partes integrantes e essenciais da atividade;”
A Lei Federal nº 12.651/12, distintamente do contido no artigo 17 da Lei Estadual, não incluiu as instalações necessárias à derivação de água dentre as modalidades de interesse social.
O artigo 17, portanto, criou nova hipótese de interesse social, que, nos termos da alínea “g” do inciso IX do art. 3.º da Lei 12.651/2012, somente poderia ser introduzida por ato do chefe do Poder Executivo federal. O citado artigo 17, portanto, não se limitou a complementar a legislação federal, vez que dispôs de forma distinta acerca do tema, invadindo a esfera de competência da União e alargando as hipóteses de interesse social, o que ensejará uma menor proteção ao meio ambiente, o que viola o princípio da vedação ao retrocesso ambiental.
IV. O § 2º do artigo 17 dispõe:
Art. 17...
(...)
§2° – A atividade de aquicultura
desenvolvida em propriedade ou posse rural de até 4 (quatro) módulos fiscais é
considerada como sendo de baixo impacto ambiental, para fins de intervenção em
faixa marginal de proteção de cursos d’água, nos termos do artigo 3º inciso X,
alíneas “b” e “k”, e, artigos 8º e 9º da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio
de 2.012, desde que classificada como pequena ou de pequeno porte pela
legislação específica.
Tal dispositivo considera a atividade de aquicultura desenvolvida em propriedade ou posse rural de até 4 módulos fiscais como sendo de “baixo impacto ambiental” para fins de intervenção em APP, com menção às alíneas “b” e “k” do inciso X do artigo 3.º da Lei 12.651/2012.
A referida alínea “b” da lei federal veicula hipótese de baixo impacto consistente em “implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso de água, quando couber”.
A atividade de aquicultura pode requerer esse tipo de implantação, mas não é possível circunscrever toda a infraestrutura necessária à aquicultura pura e simplesmente à hipótese descrita na alínea “b”.
Basta lembrar que a aquicultura, frequentemente, requer a abertura e manutenção de tanques (reservatórios) para criação de peixes e outros animais aquáticos, construções que não podem ser consideradas instalações necessárias à captação ou à condução de água e efluentes tratados.
Já a aludida alínea “k” admite novas hipóteses de baixo impacto, desde que “reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente”.
Portanto, o § 2.º do artigo 17 da Lei Estadual nº 15.684/15, ao considerar a aquicultura uma atividade de baixo impacto ambiental, inova em relação ao disposto na alínea “k” do inciso X do artigo 3.º da Lei Federal 12.651/2012, conferindo menor proteção ao meio ambiente, o que viola a competência normativa da União em matéria ambiental e ofende ao princípio da vedação ao retrocesso em matéria ambiental.
V. O artigo 27, § 1º, da Lei Estadual prevê:
Art. 27...
§1º – A dispensa de recomposição,
compensação ou regeneração, para os percentuais da Lei Federal 12.651, de 25 de
maio de 2012, de que trata o “caput”, deve observar as seguintes leis e
respectivos limites previstos para manutenção de vegetação nativa:
1. a partir da vigência do Decreto
Federal nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934: 25% (vinte e cinco por cento) das
matas existentes, salvo o disposto nos arts. 24, 31 e 52, do mesmo decreto;
2. durante a vigência da Lei Federal
nº 4771, de 15 de setembro de 1965, até a vigência da Lei Federal nº 7803, de
18 de julho de 1989: 20% (vinte por cento) da área de cada propriedade com
cobertura de floresta;
Os dispositivos pretendem dar concretude ao “caput” do artigo 68 da Lei 12.651/2012, in verbis:
“Art. 68. Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais
que realizaram supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais de
Reserva Legal previstos pela legislação em vigor à época em que ocorreu a
supressão são dispensados de promover a recomposição, compensação ou
regeneração para os percentuais exigidos nesta Lei.”
O item 1, do § 1º, do artigo 27, pressupõe que as obrigações previstas no Código Florestal de 1934 (Decreto 23.793/34) fossem aplicadas apenas às “matas”.
Ocorre que o artigo 2º daquele diploma deixava claro que seu objeto eram todas as formas de vegetação:
“Art. 2º Aplicam-se os
dispositivos deste código assim às florestas como às demais formas de
vegetação, reconhecidas de utilidade as terras que revestem”.
O item 2, do § 1º do artigo 27, por sua vez, presume que o art. 16 do Código Florestal de 1965 (Lei 4.771/1965), antes das alterações da Lei Federal nº 7803/1989, apenas exigia a preservação de vinte por cento das florestas existentes nos imóveis rurais, e não de demais formas de vegetação arbórea nativa.
A interpretação harmônica e finalística da citada Lei nº 4.771/1965 era claramente extraída do seu artigo 1º, que dizia que:
“As florestas existentes no
território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade
às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do
País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a
legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem”.
Aliás, a alínea “a” do artigo 16, fixadora do percentual de 20% aplicável ao Sudeste, falava em “cobertura arbórea”, expressão não aplicável apenas a formações florestais.
No Estado de São Paulo sempre se entendeu que a reserva legal do Código Florestal de 1965, na sua redação original, não se limitava à cobertura florestal. Neste sentido, apontamos o artigo 1.º da Portaria DEPRN 03, de 17 de maio de 1986, que em seu artigo 1.º dispunha que:
“As
autorizações para desmatamentos ou qualquer outra forma de exploração da
vegetação arbórea nativa do Estado, só poderão ser expedidas pela DPRN deste
Departamento, mediante manutenção da Reserva Florestal Obrigatória devidamente
averbada à margem da matrícula do imóvel, com cláusulas de uso limitado”.
O entendimento, portanto, era no sentido de que a reserva legal estendia-se a qualquer forma de vegetação arbórea nativa.
O artigo 2.º da mesma Portaria dispunha que a reserva legal seria de, no mínimo, 50% do tamanho do imóvel, quando a cobertura florestal natural existente for considerada primitiva ou em estágio final de desenvolvimento e, de no mínimo 20% do tamanho do imóvel quando a cobertura florestal natural for secundária ou em estágio inicial ou intermediário de desenvolvimento.
Ademais, previu o artigo 67 da Lei Federal nº 12.651/12:
“Art. 67. Nos imóveis rurais que
detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que
possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto
no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação
nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso
alternativo do solo.”
Percebe-se que apenas os imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuíam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 12 – ou seja, 20% para o Estado de São Paulo – estariam autorizados a constituir Reserva Legal com área menor de vegetação ou, então, a não constituir, caso inexistente remanescente florestal aos 22 de julho de 2008. Todas as demais propriedades rurais, porém, devem respeitar o percentual de 20% de Reserva Legal.
Contudo, a lei estadual estende essa concessão para todos os tipos de vegetação, até a data de 1934, de forma diversa do previsto na Lei Federal nº 12.651/12.
Por mais que esse prazo limite seja muito antigo, a maior parte do interior paulista já havia sido desmatada nesse período, como consequência do ciclo do café.
Essa norma, portanto, isenta a maior parte dos proprietários rurais do Estado de São Paulo de recompor ou compensar a área de Reserva Legal.
Para os ecossistemas não florestais (cerrado e campos) esse prazo é ampliado para 1989, fragilizando ainda mais o cerrado, que dos 18% originais resta, hoje, menos de 1% de área remanescente no Estado.
Há, ainda, uma agravante: a inviabilidade de aplicação da lei. Isso porque não havia imagens de satélite no período indicado no dispositivo legal e as estimativas disponíveis são muito grosseiras.
A diretriz adotada no artigo 27 da Lei Estadual nº 15.684/15 resulta de entendimento equivocado e já amplamente afastado pela doutrina e jurisprudência pátrias, no sentido de que as leis florestais e Código Florestal anteriores só seriam aplicáveis às florestas. Neste sentido:
“AMBIENTAL.
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES. DEBATE VIÁVEL EM SEDE DE
RECURSO ESPECIAL NO CASO CONCRETO. QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. PRÁTICA
QUE CAUSA DANOS AO MEIO AMBIENTE. NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS
PÚBLICOS COMPETENTES.
1. O debate
acerca da verossimilhança das alegações, na espécie, envolve questão puramente
de direito (necessidade de prévia autorização de órgãos públicos para fins de
queima de cana-de-açúcar), o que possibilita a abertura da via especial.
2. Segundo o
art. 27, p. único, do Código Florestal, eventual emprego de fogo em práticas
agropastoris ou florestais depende necessariamente de autorização do Poder
Público. Ausência de autorização relatada no acórdão recorrido.
3. Acórdão
que entende pela inaplicabilidade do referido dispositivo ao caso concreto por
acreditar que as plantações de cana-de-açúcar não se enquadram no conceito de
"floresta".
4. A
referência do legislador à expressão "demais formas de vegetação" não
pode ser interpretada restritivamente, mas, ao contrário, deve ser compreendida
de modo a abranger todas as formas de vegetação, sejam elas permanentes ou
renováveis.
5. Inclusive,
a leitura do art. 16 do Decreto n. 2.661/98, ao utilizar a expressão
"método despalhador e facilitador do corte de cana-de-açúcar em áreas
passíveis de mecanização da colheita", deixa evidente que a previsão do
art. 27, p. único, do Código Florestal abrange também as plantações de
cana-de-açúcar.
6. No âmbito
da Segunda Turma desta Corte Superior, no que se refere ao periculum in mora
inerente à espécie, pacificou-se o entendimento segundo o qual a queimada de
palha de cana-de-açúcar causa danos ao meio ambiente, motivo pelo qual sua
realização fica na pendência de autorização dos órgãos ambientais competentes.
Precedentes.
7. Recurso
especial provido.” (REsp 1179156 / PR, Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, 2ª
turma, DJe 27/04/2011)
Inexiste peculiaridade local a autorizar tamanho arrefecimento na proteção ambiental conferida à matéria, de forma que o artigo 27, § 1º, itens 1 e 2 da Lei Estadual n. 15.648/15 ofende o princípio da vedação ao retrocesso ambiental.
VI. O artigo 35 da lei impugnada dispõe que:
(...)
Artigo 35 – O proprietário ou o
possuidor do imóvel rural poderá alterar a localização da área de Reserva Legal
no PRA, mediante aprovação do órgão ambiental competente.
§1º – A nova área de Reserva Legal
proveniente da alteração a que se refere o “caput” deverá localizar-se no
imóvel que continha a Reserva Legal de origem, em área com tipologia vegetacional,
solo e recursos hídricos semelhantes ou em melhores condições ambientais que a
área anterior, observados os critérios técnicos que garantam ganho ambiental,
estabelecidos em regulamento.
A Lei Estadual nº 15.684/15 admite, em seu artigo 35, que reservas legais já especializadas, ou seja, que já tenham sido averbadas no registro imobiliário ou registradas no CAR, possam, em determinadas circunstâncias, ter a sua localização alterada.
A inovação confere tratamento distinto daquele lançado na Lei Federal n. 12.651/12, mais especificamente seu artigo 18, que dispõe:
“Art. 18. A área de Reserva Legal deverá ser registrada no
órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR de que trata o art. 29,
sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.”
Se esse dispositivo não admite, fora das exceções contempladas na própria lei federal (como, por exemplo, a do artigo 19, referente à reserva legal de imóvel posteriormente inserido em área urbana, objeto de parcelamento para fins urbanos com registro aprovado), que a reserva legal especializada tenha sua destinação alterada nem mesmo nas hipóteses de transmissão ou desmembramento, é evidente que, fora dessas hipóteses, com maior razão não se pode tolerar a alteração de destinação.
A alteração da localização da reserva legal nada mais é que uma alteração de sua destinação, mudança vedada pela lei federal, razão pela qual o artigo 35, caput e § 1º, da Lei Estadual nº 15.684/15, nesse particular, extravasa a competência estadual suplementar da legislação federal (art. 24, § 2º, da CF) violando o princípio da vedação ao retrocesso em matéria ambiental.
VII. O artigo 40 da lei impugnada prevê:
Artigo 40 - Nas áreas de ocupação
antrópica consolidada em área urbana, fica assegurado o uso alternativo do solo
previsto no inciso VI do artigo
3º da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de
2012, respeitadas as áreas de preservação permanente previstas pela legislação
em vigor à época da implantação do empreendimento.
Parágrafo único. Fica assegurado o
direito de construir em lotes oriundos de parcelamento do solo urbano
registrado no Serviço de Registro de Imóveis competente, desde que respeitadas
as Áreas de Preservação Permanente, exigidas pela legislação vigente na data da
implantação do licenciamento ambiental e do registro do parcelamento do solo
para fins urbanos, aprovado segundo a legislação específica.
O parágrafo único do artigo 40 da Lei Estadual nº 15.684/15 assegura ao particular o direito de, hoje, construir em lotes oriundos de parcelamento do solo urbano registrado no SRI, respeitando, contudo, as delimitações das Áreas de Preservação Permanente exigidas pela legislação vigente na data da implantação do licenciamento ambiental e do registro do solo para fins urbanos.
Isso significa, na contramão da história legislativa e jurisprudencial, verdadeiro reconhecimento do direito adquirido de degradar o meio ambiente, repristinando o efeito de leis antigas já revogadas.
A Lei Federal nº 4.771/65 (Código Florestal revogado) previu área de preservação permanente em sua redação original que, nos anos de 1986 e 1989, foi bastante ampliada em prol da defesa ambiental. Confira-se:
“Redação original:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só
efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d'água, em
faixa marginal cuja largura mínima será:
1 - de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez)
metros de largura:
2 - igual à metade da largura dos cursos que meçam de 10
(dez) a 200 (duzentos) metros de distancia entre as margens;
3 - de 100 (cem) metros para todos os cursos cuja largura
seja superior a 200 (duzentos) metros.
Redação dada pela Lei Federal nº 7.511, de 07 de julho de
1986:
Art. 2° Consideram-se de preservação
permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação
natural situadas:
1. de 30 (trinta) metros para os rios de menos de 10 (dez)
metros de largura;
2. de 50 (cinquenta) metros para os cursos d’água que tenham
de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
3. de 100 (cem) metros para os cursos d’água que meçam entre
50 (cinquenta) e 100 (cem) metros de largura;
4. de 150 (cento e cinquenta) metros para os cursos d’água
que possuam entre 100 (cem) e 200 (duzentos) metros de largura; igual à
distância entre as margens para os cursos d’água com largura superior a 200
(duzentos) metros;
b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água
naturais ou artificiais;
c) nas nascentes, mesmo nos chamados "olhos
d'água", seja qual for a sua situação topográfica;
d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a
45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras
de mangues;
g) nas bordas dos taboleiros ou chapadas;
h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros,
nos campos naturais ou artificiais, as florestas nativas e as vegetações
campestres.
Redação dada pela Lei Federal nº 7.803, de 18.7.1989:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só
efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer
curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima
será:
1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de
10 (dez) metros de largura;
2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham
de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de
50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham
de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que
tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
b) ao redor das lagoas, lagos ou
reservatórios d'água naturais ou artificiais;
c) nas nascentes, ainda que
intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua
situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura;
d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a
45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras
de mangues;
g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha
de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções
horizontais;
h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros,
qualquer que seja a vegetação.
i) nas áreas metropolitanas definidas
em lei.
Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas
as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e
nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o
território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores
e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este
artigo.”
Portanto, o parágrafo único do artigo 40 da Lei Estadual nº 15.684/15, ao permitir a construção, hoje, em áreas consideradas de preservação permanente pela legislação ambiental em vigor, repristina leis já revogadas e afronta o princípio básico do Direito Ambiental no sentido de que a ninguém é conferido o direito adquirido de degradar o meio ambiente.
De outra parte, afronta o princípio da segurança jurídica resultante da Proteção ao Direito Adquirido (art. 5°, XXXVI, da CF) da sociedade ao patamar mínimo de proteção ao meio ambiente, configurando verdadeiro retrocesso socioambiental (art. 225 da CF).
Ao permitir a intervenção em área de preservação permanente com fundamento em leis revogadas há décadas, a Lei Estadual nº 15.684/2015 atacou direito adquirido difuso à manutenção da área não degradada e/ou à recomposição de suas funções ecológicas primordiais (interesse de toda a sociedade na conservação de parâmetros mínimos de proteção ambiental).
O E. Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre a inconstitucionalidade de intervenções em áreas de preservação permanente que impliquem degradação dos atributos que justificam sua proteção:
“MEIO AMBIENTE – DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA INTEGRIDADE
(CF, ART. 225) – PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER DE
METAINDIVIDUALIDADE – DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO)
QUE CONSAGRA O POSTULADO DA SOLIDARIEDADE – NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A
TRANSGRESSÃO A ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDADE, CONFLITOS
INTERGERACIONAIS – ESPAÇOS TERRITORIALMENTE PROTEGIDOS (CF, ART. 225, § 1º,
III) – ALTERAÇÃO E SUPRESSÃO DO REGIME JURÍDICO A ELES PERTINENTE – MEDIDAS
SUJEITAS AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE LEI – SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO
EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – POSSIBILIDADE DE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA,
CUMPRIDAS AS EXIGÊNCIAS LEGAIS, AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU
ATIVIDADES NOS ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS, DESDE QUE RESPEITADA, QUANTO A
ESTES, A INTEGRIDADE DOS ATRIBUTOS JUSTIFICADORES DO REGIME DE PROTEÇÃO
ESPECIAL – RELAÇÕES ENTRE ECONOMIA (CF, ART. ART. 3º, II, C/C O ART. 170, VI) E
ECOLOGIA (CF, ART. 225) – COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRITÉRIOS DE
SUPERAÇÃO DESSE ESTADO DE TENSÃO ENTRE VALORES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES – OS
DIREITOS BÁSICOS DA PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASE OU DIMENSÕES)
DE DIREITOS (RTJ 164/158, 160-161) – A QUESTÃO DA PRECEDÊNCIA DO DIREITO À
PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE: UMA LIMITAÇÃO EXPLÍCITA À ATIVIDADE ECONÔMICA
(CF, ART. 170, VI) – DECISÃO NÃO REFERENDADA – CONSEQÜENTE INDEFERIMENTO DE
MEDIDA CAUTELAR.” (STF, ADI 3540-1, Rel. Min. Celso de Mello).
Assim, não há como se afastar a incidência da lei vigente à época da construção para determinar as metragens da área de preservação permanente. Em outras palavras: se o pedido de autorização para construção é feito hoje, deve-se considerar as áreas de preservação permanente atualmente vigentes e não as estabelecidas em leis revogadas menos protetivas do meio ambiente, sob pena de ofensa ao princípio da vedação do retrocesso em matéria ambiental.
Existindo alteração legislativa superveniente ao pedido de licença para construção, que dê novos contornos à matéria ambiental, deverá o interessado – se entender conveniente – requerer perante o órgão administrativo responsável, agora sob novo fundamento, a autorização para construir.
Nesse sentido já se posicionou o E. Tribunal de Justiça de São Paulo, o E. Superior Tribunal de Justiça e o E. Supremo Tribunal Federal:
“APELAÇÃO DIREITO AMBIENTAL CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE EM DESACORDO COM NORMAS AMBIENTAIS. Inexistência de direito
adquirido. A localização do imóvel em área urbana não obsta a incidência do
Código Florestal, em certos casos. Obras realizadas com afronta aos termos
constitucionais e legais vigentes à época dos fatos. A regularidade das obras
deve observar as normas incidentes ao tempo de sua realização. Insuficiência e
extemporaneidade das licenças ambientais obtidas pelo recorrente. Legitimidade
dos agentes estatais para a lavratura dos autos de infração ambientais e
embargo de obras em razão do Poder de Polícia Estatal. Descabimento do pleito
indenizatório, pois eventuais prejuízos patrimoniais decorreram exclusivamente
da conduta do apelante. A retirada da construção não foi objeto deste feito.
Sentença mantida. (TJ/SP, 1ª Câmara Extraordinária de Direito
Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação sem revisão nº 0.076.510-26.2001.8.26.0000,
Relator Desembargador José Luiz Germano, Apelante: Renato Monteiro, Apelada: Fazenda do Estado de São
Paulo, Comarca de origem: Santos, julgamento aos 19/08/2014, v.u.)
ADMINISTRATIVO – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA –
REGULARIZAÇÃO DE IMÓVEL URBANO – DIREITO DE PROTOCOLO – ALTERAÇÃO SUPERVENIENTE
DA LEGISLAÇÃO – EFEITOS DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA – INEXISTÊNCIA DE DIREITO
ADQUIRIDO – RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO. 1. CONTROVÉRSIA. Sobre a existência de
direito adquirido a regime jurídico fundado em lei revogada, quando o suposto
titular apresentara mero requerimento administrativo. 2. DIREITO ADQUIRIDO A
REGIME JURÍDICO. O conceito de direito adquirido, instituto sediado na Constituição
Federal (art. 5°, inciso XXXVI, CF⁄1988), encontra densidade discursiva
no direito infraconstitucional, especificamente o art.6º, § 2º, LICC, que assim considera o direito
exercitável sem
limite por termo pré-fixo ou condição pré-estabelecida inalterável ao arbítrio
de outrem. 3. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO DIREITO ADQUIRIDO. Observado o
critério proposto na obra de Francesco Gabba, o recorrente não tem direito
adquirido a regime jurídico, porquanto: a) não possuía, à época do
requerimento, todas as condições necessárias para o implemento do direito à
regularização imobiliária, porque seu requesto demandava, além de outros
aspectos, o placet do órgão administrativo, verdadeiro requisito de eficácia do
direito a que almejava; b) a superveniente alteração legislativa esvaziou sua
pretensão, antes do preenchimento dos requisitos plenos, necessários à
aquisição do direito; c) a nova lei suprimiu a possibilidade de concessão de
eficácia ao que pretendia o requerente, na medida em que impediu seu
reconhecimento jurídico, o que tornou impossível a constituição do próprio
direito. 4. EFEITOS DO "DIREITO DE PROTOCOLO" NO CASO CONCRETO. Nesta
espécie, não há como se resguardar o "direito de protocolo", ou seja,
o direito à aplicação, durante todo o processo administrativo, do regime
jurídico existente no momento do protocolo da petição inicial, na forma como
deseja o recorrente. Precedente do STF. 5. ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. A
legislação originária, sob a qual se fundava o protocolo do recorrente, foi
escoimada de ilegal e inconstitucional. Esses foram os fundamentos da ação
civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo. A severidade dessa
increpação foi tamanha que o Município, ora recorrido, não mais deu sequência
ao procedimento do recorrente e, momentos depois, revogou os atos normativos
impugnados. Recurso ordinário improvido. (STJ, Recurso em Mandado de Segurança
nº 27.641 - SP (2008⁄0186468-4), Relator Ministro Humberto Martins, julgamento aos
02/10/2008)
AMBIENTAL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SUPRESSÃO DE
ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE FORA DAS HIPÓTESES RESTRITIVAMENTE TRAÇADAS NA
LEGISLAÇÃO AMBIENTAL. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE LICENÇA AMBIENTAL PRÉVIA
VÁLIDA. NORMAS AMBIENTAIS. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. NÃO OCORRÊNCIA DE
SUPRESSÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE. DEVER DE REPARAÇÃO DO AGENTE CAUSADOR DO
DANO AMBIENTAL. PRESSUPOSTOS PRESENTES NO CASO EM CONCRETO. RECURSO ESPECIAL
PROVIDO. 1. Na origem, trata-se de ação civil pública ambiental interposta pelo
Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul em face da parte ora recorrida
cujo objeto é a ilegalidade da supressão da área de preservação permanente em
face da construção de imóvel na margem do Rio Ivinhema/MS. Antes de se adentrar
ao mérito, cumpre fazer, então, a análise das questões preliminares suscitadas
em contrarrazões do recurso especial. 2. Preliminares de perda de objeto em
virtude da revogação do antigo Código Florestal e alegação de conexão com outro
processo de relatoria do Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves rejeitadas. 3.
Do mérito: De acordo com o Código Florestal brasileiro (tanto o de 1965, como o
atual, a Lei 12.651, de 25.5.2012) e a Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei 6.938/81), a flora nativa, no caso de supressão, encontra-se
uniformemente protegida pela exigência de prévia e válida autorização do órgão
ambiental competente, qualquer que seja o seu bioma, localização, tipologia ou
estado de conservação (primária ou secundária). Além disso, em se tratando de
área de preservação permanente, a sua supressão deve respeitar as hipóteses
autorizativas taxativamente previstas em Lei, tendo em vista a magnitude dos
interesses envolvidos de proteção do meio ambiente. Precedentes do STF (no
âmbito da ADI nº 3.540/DF - medida cautelar) e do STJ (RESp 176.753/SC, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIM, SEGUNDA TURMA, julgado em 7.2.2008, DJe 11.11.09). 4.
No caso em concreto, da análise do acórdão ora recorrido exsurge a presença dos
seguintes elementos que se tornaram incontroversos para a análise ora
realizada, quais sejam: (a) houve a construção de empreendimento em área de
preservação permanente, a qual, segundo expressamente afirmado pelo acórdão
recorrido, causou a supressão da vegetação local; (b) esta conduta foi
praticada sem autorização válida, vez que a Licença de Operação nº 12/2008
teria sido expedida em desacordo com a legislação ambiental pertinente; e, (c)
ainda com a nulidade da Portaria, tal circunstância não pode não pode afetar
àqueles que já haviam realizado edificações na área em questão. 5. Note-se que
a análise destas premissas não implicam no revolvimento do conjunto fático e
probatório constante dos autos, uma vez que, tão somente, foi realizada
revaloração da prova, o que é permitido na via recursal sem que haja a
incidência da Súmula 7/STJ. Neste sentido, o seguinte precedente: REsp 1264894/PR,
Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe
09/09/2011. 6. Diferentemente do que entendeu o acórdão ora recorrido, não há
como legitimar a conduta da parte ora recorrida tendo em vista a ausência de
previsão legal autorizativa para tanto. A justificativa utilizada pelo Tribunal
a quo para determinar a manutenção da parte recorrida na localidade -
inviabilidade de se prejudicar àqueles que apoiado na sua validade ou
legalidade realizaram benfeitorias ou edificações na localidade - também não
encontra respaldo na ordem jurídica vigente. 7. Isso porque, sendo a licença
espécie de ato administrativo autorizativo submetido ao regime jurídico
administrativo, a sua nulidade implica que dela não pode advir efeitos válidos
e tampouco a consolidação de qualquer direito adquirido (desde que não
ultrapassado o prazo previsto no art. 54 da Lei nº 9.784/99, caso o
beneficiário esteja de boa fé). Vale dizer, declarada a sua nulidade, a
situação fática deve retornar ao estado ex ante, sem prejuízo de eventual
reparação civil do lesado caso presentes os pressupostos necessários para tal.
Essa circunstância se torna ainda mais acentuada tendo em vista o bem jurídico
tutelado no caso em tela, que é o meio ambiente, e a obrigação assumida pelo
Estado brasileiro em diversos compromissos internacionais de garantir o uso
sustentável dos recursos naturais em favor das presentes e futuras gerações. 8.
Além do mais, as restrições impostas ao exercício de atividades econômicas bem
como de ocupação em áreas de preservação permanente seguem o regime jurídico
das limitações administrativas, espécie de intervenção do Estado na propriedade
que promove restrições nos poderes advindos do seu domínio exercido sobre a
coisa, e não a sua supressão. Assim, em tese, fica afastada a justificativa
utilizada pelo Tribunal a quo de que tal medida acarretaria na perda da
propriedade por meio de desapropriação, sendo que, caso tal fato jurídico de
fato ocorra, o ordenamento dispõe de meios hábeis a tutelar eventuais interesses
legítimos por parte do titular do direito de propriedade. 9. Quanto ao pedido
de indenização formulado para parte ora recorrente, foi reconhecida a prática
de ato ilícito pela parte ora recorrida em face do meio ambiente, é de se
observar que os elementos da responsabilidade civil por ano ambiental bem como
as medidas de reparação dos danos ambientais causados pela parte ora recorrida
foram estabelecidos na sentença proferida pelo Juízo de 1º grau, devendo a
mesma ser restaurada em sua integralidade, nos termos requeridos pela parte ora
recorrente. 10. Recurso especial provido, com a determinação de que sejam
extraídas cópias dos presentes autos e a remessa delas ao Ministério Público do
Estado do Mato Grosso do Sul para apuração de eventual prática de ato de
improbidade administrativa ambiental. (STJ, Recurso Especial nº 1.362.456 - MS
(2013/0007693-0), Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Recorrente: Ministério
Público do Estado de Mato Grosso do Sul, Recorrido: Darci Vieira de Barros)
ADMINISTRATIVO. MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE. PEDIDO DE
LICENÇA DE INSTALAÇÃO DE POSTO DE REVENDA DE COMBUSTÍVEIS. SUPERVENIÊNCIA DE
LEI (LEI Nº 6.978/95, ART. 4º, § 1º) EXIGINDO DISTÂNCIA MÍNIMA DE DUZENTOS
METROS DE ESTABELECIMENTOS COMO ESCOLAS, IGREJAS E SUPERMERCADOS. ALEGADA
OFENSA AOS ARTS. 1º, IV; 5º, XIII E XXXVI; 170, IV E V; 173, § 4º, E 182 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Incisos XXII e XXIII do artigo 5º não prequestionados.
Requerimento de licença que gerou mera expectativa de direito, insuscetível --
segundo a orientação assentada na jurisprudência do STF --, de impedir a
incidência das novas exigências instituídas por lei superveniente, inspiradas
não no propósito de estabelecer reserva de mercado, como sustentado, mas na
necessidade de ordenação física e social da ocupação do solo no perímetro
urbano e de controle de seu uso em atividade geradora de risco, atribuição que
se insere na legítima competência constitucional da Municipalidade. Recurso não
conhecido.
(STF, Primeira Turma, Recurso Extraordinário 235736 / MG,
Relator Ministro Ilmar Galvão, julgamento: 21/03/2000, DJ 26-05-2000 pp-00034,
Ement vol.-01992-03 pp-00549, RTJ vol-00180-03 pp-01144P).
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. DIREITO DE CONSTRUIR.
LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. I. - O direito de edificar é relativo, dado que
condicionado à função social da propriedade: C.F., art. 5º, XXII e XXIII.
Inocorrência de direito adquirido: no caso, quando foi requerido o alvará de
construção, já existia a lei que impedia o tipo de imóvel no local. II. - Inocorrência
de ofensa aos §§ 1º e 2º do art. 182, C.F. III. - Inocorrência de ofensa ao
princípio isonômico, mesmo porque o seu exame, no caso, demandaria a
comprovação de questões, o que não ocorreu. Ademais, o fato de ter sido
construído no local um prédio em desacordo com a lei municipal não confere ao
recorrente o direito de, também ele, infringir a citada lei. IV. - R.E. não
conhecido. (STF, Segunda Turma, Recurso Extraordinário 178836 / SP, Relator
Ministro Carlos Velloso, julgamento: 08/06/1999, DJ 20-08-1999
pp-00044 Ement vol -01959-02 pp-00202)
LOTEAMENTO URBANO. APROVAÇÃO POR ATO ADMINISTRATIVO, COM
DEFINIÇÃO DO PARCELAMENTO. REGISTRO IMOBILIÁRIO. Ato que não tem o efeito de
autorizar a edificação, faculdade jurídica que somente se manifesta validamente
diante de licença expedida com observância das regras vigentes à data de sua
expedição. Caso em que o ato impugnado ocorreu justamente no curso do
processamento do pedido de licença de construção, revelando que não dispunha a
recorrida, ainda, da faculdade de construir, inerente ao direito de
propriedade, descabendo falar-se em superveniência de novas regras a cuja
incidência pudesse pretender ela estar imune. Da circunstância de plantas do
loteamento haverem sido arquivadas no cartório imobiliário com anotações
alusivas a índices de ocupação não decorre direito real a tais índices, à
ausência não apenas de ato de aprovação de projeto e edificação, mas, também,
de lei que confira ao registro tal efeito. Legitimidade da exigência
administrativa de adaptação da proposta de construção às regras do Decreto nº
3.046/81, disciplinador do uso do solo, na área do loteamento. Recurso
conhecido e provido. (STF, Primeira Turma, Recurso Extraordinário 212780 / RJ, Relator
Ministro Ilmar Galvão, julgamento 27/04/1999, DJ 25-06-1999
pp-00030 Ement vol-01956-06 pp-01145)
(...)
VIII. O artigo 43 da lei impugnada dispõe:
Artigo 43 –
Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas a Lei nº 9.989, de
22 de maio de 1998 e a Lei nº 12.927, de 23 de abril de 2008.
Reconhecida como uma norma legal de vanguarda, a Lei “Ivan Valente” significou verdadeira fonte de proteção ambiental no nosso Estado frente aos retrocessos operados pela entrada em vigor da Lei Federal nº 12.651/12.
Este E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vinha, inclusive, lançando mão da referida Lei Estadual nº 9.989/98, mais protetiva do meio ambiente, para afastar a incidência da Lei Federal, menos protetiva. Neste sentido:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. Omissão. Pré-questionamento. LF nº
12.651/12. 1. Omissão. Configura-se a omissão quando o acórdão não aprecia
questão que devia apreciar. Não há omissão quando o acórdão examina as questões
e fundamentos necessários à solução da controvérsia, deixando de lado questões
irrelevantes, implicitamente rejeitadas ou que, pela natureza, não permitem
apreciação nesse momento do processo. No entanto, é adequado que se examinem os
reflexos trazidos pela LF nº 12.651/12 que deu nova disciplina à questão
ambiental. 2. LF nº 12.651/12. Entorno de reservatórios de água. O art. 4º III
manteve a área de preservação permanente no entorno de lagos, lagoas e
reservatórios de água naturais ou artificiais, conforme indicado na licença
ambiental; na ausência da indicação, prevalecem as normas anteriores não
conflitantes, entre elas a Resolução CONAMA nº 4/85 e 302/02. O art. 62,
disposição transitória que cuida das áreas consolidadas em área de preservação
permanente, reduz a área de proteção no entorno dos reservatórios de água em
áreas rurais em que exista ocupação antrópica anterior a 22-7-2008 com
edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris; protege as áreas em
que há exploração rural, não as áreas a se deu uso urbano (ranchos de lazer). O
art. 62 não tem aplicação ao caso dos autos, mantido o acórdão por aplicação da
lei anterior, não alterada pelo art. 4º da lei nova. 3. LE nº 9.989/98.
Competência comum. O art. 24 VI da Constituição Federal atribui competência
comum aos entes federativos para legislar sobre o meio ambiente; ainda que se
entenda que a lei federal reduziu ou eliminou a área de proteção no caso dos
autos, o réu continua obrigado a recompor a vegetação no entorno da represa com
base no art. 1º da LE nº 9.989/98. Embargos recebidos para suprimento da
omissão, sem alteração do resultado, mas com observação. (TJ/SP, 1ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente, Relator Des. Torres de Carvalho, Embargos de
Declaração nª 3005317-61.2010.8.26.0103/50001 9, Embgte: Francisco Ricardo Lobo
e Silva, Embgdo: Ministério Público, Origem: 1ª Vara Cível (Caconde) Proc. nº
1.264/10 ou 515/10).
Enfim, a revogação expressa da Lei Estadual n.º 9.989/98, mais protetiva na defesa do meio ambiente, configura verdadeiro retrocesso socioambiental no Estado de São Paulo, padecendo, pois, de inconstitucionalidade.
Desta forma, o retrocesso
verificado contrapõe-se à ideia de ampla proteção voltada à mantença do meio
ambiente ecologicamente equilibrado, direito este plasmado no art. 191 da
Constituição Estadual e que confere legitimidade ao primado da vedação ao
retrocesso extraída do próprio texto magno, sendo imperiosa, portanto, a
declaração de inconstitucionalidade da legislação atacada, a fim de que seus
efeitos maléficos sejam interrompidos.
Por fim, imperioso destacar que
a questão sub judice não representa
ofensa indireta ou reflexa ao texto constitucional, como poderiam sustentar
futuramente os requeridos, a fim de desqualificar a presente demanda, porquanto
a ofensa perpetrada pelo diploma objurgado viola de forma direta e inconteste o
art. 191 da Carta Bandeirante, e, por conseguinte, o princípio constitucional da
vedação ao retrocesso sócio ambiental, haja vista os efeitos maléficos que seus
dispositivos causaram ao sistema ambiental.
3.
DOS PEDIDOS
a.
DO PEDIDO LIMINAR
À
saciedade demonstrado o fumus boni iuris,
pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais,
apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de
São Paulo é sinal, de per si, para
suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se novas ou
maiores degradações ao meio ambiente.
Está claramente demonstrado que o ato normativo impugnado é inconstitucional por violação do princípio da vedação ao retrocesso ambiental e ausência de participação popular na elaboração da normativa vergastada.
O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Nas áreas albergadas pelo diploma em testilha poderão ser admitidas ocupações e usos incompatíveis com a relevância e importância ambiental do local, que poderá ser degradado em prejuízo da coletividade, que necessita desse ambiente para a manutenção da sadia qualidade da vida humana.
Basta lembrar que muitos danos ambientais são de difícil, senão de impossível recuperação, guardando relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.
Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já eventualmente se verificaram.
De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.
Com efeito, no contexto das ações
diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o
juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os
pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar
de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de
4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC
493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).
À luz deste perfil, requer-se a
concessão de liminar para a suspensão, até o final e definitivo julgamento
desta ação da Lei
Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015.
b. DO PEDIDO PRINCIPAL
Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e
processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada
procedente, com o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 15.684, de
14 de janeiro de 2015, por violação aos
artigos 1º (invasão da competência normativa da União, na forma do artigo 24,
VI, §§ 1º e 2º, da CF) 180, II e 191 da CE/89 e ao princípio da vedação ao
retrocesso em matéria ambiental.
Requer-se ainda que sejam requisitadas informações ao Governador
do Estado de São Paulo e ao Presidente da Assembleia Legislativa Estadual, bem
como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se
sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se deferimento.
São Paulo, 24 de abril de
2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aaamj
bfs
Protocolado nº 053.035/15
Interessado: Luis Fernando Rocha e outros
Assunto: inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015.
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei Estadual nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015.
2. Oficie-se aos representantes informando a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 25 de abril de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aaamj
bfs