EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

                                                                                  

 

 

 

 

Protocolados nº 160.676/15

 

 

                                              

Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos. Criação de cargos de provimento em comissão previstos na Secretaria da Câmara Municipal de Santos. 1. Ausência de descrição legal das atribuições dos cargos em comissão criados pelo artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos. Violação do princípio da reserva legal. O núcleo das competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e das condições do exercício das atividades do cargo público deve estar descrito na lei. Violação do princípio da reserva legal. Arts. 24, § 2º, 1, 115, I, II e V, e 144, da Constituição Paulista. 2. Cargos de provimento em comissão de “Diretor Jurídico”. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito (arts. 30, 98 a 100, e 144 da CE/89).

 

 

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 160.676/15, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face dos incisos I a XXIV do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, bem como, por arrastamento, do Ato n. 04/2014 da Mesa da Câmara, do Município de Santos, pelos fundamentos expostos a seguir:

1.     DOS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

A Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos, que “dá nova estrutura orgânica à Secretaria da Câmara Municipal de Santos, criando, transformando e extinguindo cargos e funções gratificadas no quadro permanente, e adota providências correlatas”, no que interessa, dispõe:

         Percebe-se que o art. 4º, acima reproduzido, criou cargos de provimento em comissão cujas atribuições foram descritas em Ato da Mesa da Diretora da Câmara Municipal de Santos, que segue:

Os dispositivos legais anteriormente descritos são verticalmente incompatíveis com nosso ordenamento constitucional, como será demonstrado a seguir.

2.     O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

O artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos - ao criar os cargos em comissão sem a descrição das respectivas atribuições em lei, bem ainda ao prever cargos de advocacia - contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal por força do art. 144 da Carta Paulista.

As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual, verbis:

“Artigo 30 - À Procuradoria da Assembleia Legislativa compete exercer a representação judicial, a consultoria e o assessoramento técnico-jurídico do Poder Legislativo.

Parágrafo único - Lei de iniciativa da Mesa da Assembleia Legislativa organizará a Procuradoria da Assembleia Legislativa, observados os princípios e regras pertinentes da Constituição Federal e desta Constituição, disciplinará sua competência e disporá sobre o ingresso na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos.

(...)

 

Art. 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. 

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal. 

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

(...)

Art. 99 - São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado: 

I - representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais; 

II - exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior;

Art. 100 - A direção superior da Procuradoria-Geral do Estado compete ao Procurador Geral do Estado, responsável pela orientação jurídica e administrativa da instituição, ao Conselho da Procuradoria Geral do Estado e à Corregedoria Geral do Estado, na forma da respectiva lei orgânica.

Parágrafo único - O Procurador Geral do Estado será nomeado pelo Governador, em comissão, entre os Procuradores que integram a carreira e terá tratamento, prerrogativas e representação de Secretário de Estado, devendo apresentar declaração pública de bens, no ato da posse e de sua exoneração.

(...)

Art. 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preenchem os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

(...)

Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

A princípio, é notadamente inconstitucional a criação dos cargos insertos no artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos, cujas atribuições não foram previstas em lei, mas, sim em Ato da Mesa Diretora da Câmara Municipal.

Isso porque a reserva legal exige lei em sentido formal para disciplina das atribuições de cargo e/ou emprego público, não sendo suficiente a descrição das atividades por meio de Ato da Mesa da Câmara, que se trata de ato normativo subalterno da Mesa da Câmara, cujo valor equivale ao decreto, e não substitui a lei em sentido formal.

Não bastasse, o cargo de provimento em comissão de “Diretor Jurídico”, inserto no mesmo dispositivo, contraria os arts. 30, 98 a 100, da Constituição Estadual, visto que as atividades de advocacia pública, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais investidos mediante aprovação em concurso público.

Cumpre registrar que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência aos arts. 30, 98 a 100, 111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, bem como aos arts. 37, II e V, da Constituição Federal – como será adiante corroborado - cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art. 144 da Carta Estadual.

3.     DA FUNDAMENTAÇÃO

3.1.         Da ausência de descrição legal das atribuições dos cargos de provimento em comissão previstos no artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos.

Cumpre esclarecer que é inconstitucional a criação de cargos de provimento em comissão cujas atribuições sejam de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento efetivo mediante aprovação em concurso público.

A criação de cargos de provimento em comissão não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional, devendo, nos termos do art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, e do art. 115, I, II e V, da Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada para o exercício de funções técnicas ou profissionais, às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.

Não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo público, mas somente daqueles que demandem relação de confiança, devido ao exercício de atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção.

É dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes político-governamentais. Não se coaduna com a criação de cargos desse jaez – cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – atribuições profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas, rotineiras.

Destarte, é absolutamente imprescindível que a lei descreva as efetivas atribuições dos cargos de provimento em comissão, para se aquilatar se realmente se amoldam às funções de assessoramento, chefia e direção.

Ademais, referida exigência se amolda ao próprio princípio da legalidade, o qual se desdobra na reserva legal, a exigir lei em sentido formal para criação e disciplina de cargos públicos, como adverte a doutrina, verbis:

“(...) somente a lei pode criar esse conjunto inter-relacionado de competências, direitos e deveres que é o cargo público. Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X, da Constituição, que comporta uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse dispositivo permite ao Chefe do Executivo promover a extinção de cargo público, por meio de ato administrativo. A criação e a disciplina do cargo público faz-se necessariamente por lei no sentido de que a lei deverá contemplar a disciplina essencial e indispensável. Isso significa estabelecer o núcleo das competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e das condições do exercício das atividades. Portanto, não basta uma lei estabelecer, de modo simplista, que ‘fica criado o cargo de servidor público’. Exige-se que a lei promova a discriminação das competências e a inserção dessa posição jurídica no âmbito da organização administrativa, determinando as regras que dão identidade e diferenciam a referida posição jurídica” (Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 581).

Com efeito, o princípio da legalidade impõe lei em sentido formal para criação e disciplina de cargo público, compreendido este como o conjunto de atribuições e responsabilidades cometidas a um servidor, criado por lei, em número certo, com denominação própria, sujeito à remuneração e à subordinação hierárquica, para o exercício de uma função pública específica (cf. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 16 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012- p. 298).

Desse modo, ponto elementar relacionado à criação de cargos públicos é a exigência de que lei específica – no sentido de reserva legal ou de lei em sentido formal, como ato normativo produzido pelo Poder Legislativo, mediante o competente e respectivo processo - descreva as correlatas atribuições.

Somente a partir da descrição precisa das atribuições do cargo público será possível, a bem do funcionamento administrativo e dos direitos dos administrativos, averiguar-se a completa licitude do exercício das funções públicas pelo agente público.

Trata-se de exigência relativa à competência do agente público para a prática de atos em nome da Administração Pública e, em especial, daqueles que tangenciam os direitos dos administrados, e que, ainda, permite a aferição da legitimidade da forma de investidura no cargo público - a qual deve ser guiada pela legalidade, moralidade, impessoalidade e razoabilidade.

Neste sentido, em casos análogos a este, pronunciou o E. Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade de leis que delegam ao Poder Executivo a fixação da descrição das atribuições de cargos de provimento em comissão, in verbis:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PODER EXECUTIVO. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DECRETOS 26.118/05 E 25.975/05. REESTRUTURAÇÃO DE AUTARQUIA E CRIAÇÃO DE CARGOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. INOCORRENTE OFENSA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RECURSO DESPROVIDO. I - A Constituição da República não oferece guarida à possibilidade de o Governador do Distrito Federal criar cargos e reestruturar órgãos públicos por meio de simples decreto. II - Mantida a decisão do Tribunal a quo, que, fundado em dispositivos da Lei Orgânica do DF, entendeu violado, na espécie, o princípio da reserva legal. III - Recurso Extraordinário desprovido” (STF, RE 577.025-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 11-12-2008, v.u., DJe 0-03-2009).

“1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Condição. Objeto. Decreto que cria cargos públicos remunerados e estabelece as respectivas denominações, competências e remunerações. Execução de lei inconstitucional. Caráter residual de decreto autônomo. Possibilidade jurídica do pedido. Precedentes. É admissível controle concentrado de constitucionalidade de decreto que, dando execução a lei inconstitucional, crie cargos públicos remunerados e estabeleça as respectivas denominações, competências, atribuições e remunerações. 2. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Art. 5° da Lei n° 1.124/2000, do Estado do Tocantins. Administração pública. Criação de cargos e funções. Fixação de atribuições e remuneração dos servidores. Efeitos jurídicos delegados a decretos do Chefe do Executivo. Aumento de despesas. Inadmissibilidade. Necessidade de lei em sentido formal, de iniciativa privativa daquele. Ofensa aos arts. 61, § 1°, inc. II, ‘a’, e 84, inc. VI, ‘a’, da CF. Precedentes. Ações julgadas procedentes. São inconstitucionais a lei que autorize o Chefe do Poder Executivo a dispor, mediante decreto, sobre criação de cargos públicos remunerados, bem como os decretos que lhe dêem execução” (STF, ADI 3.232-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, 14-08-2008, v.u., DJe 02-10-2008).

Desta forma, é de rigor a declaração de inconstitucionalidade do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos, ante a ausência da descrição das atribuições dos cargos de provimento comissionado em lei em sentido formal, cuja omissão não pode ser suprida por Ato da Mesa da Câmara Municipal.

3.2.         Do cargo de “Diretor Jurídico”

Não bastasse a ausência de descrição legal do cargo criado, em violação ao princípio da reserva legal, o cargo em comissão de “Diretor Jurídico” (artigo 4º, item XIV, da lei ora impugnada) não se harmoniza com os arts. 30, 98 a 100 da Constituição Paulista - que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual-, de observância obrigatória pelos Municípios, por força do art. 144, da Constituição Estadual.

Com efeito, as atividades de advocacia pública, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais investidos em cargos públicos, mediante prévia aprovação em concurso público.

Nesse sentido, decidiu o E. Supremo Tribunal Federal, in verbis:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

Portanto, é incompatível o provimento comissionado com a advocacia pública, de modo a revelar a inconstitucionalidade do cargo de “Diretor Jurídico” previsto no item XIV do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, do Município de Santos.

4. DA INCONSTITUCIONALIDADE POR ARRASTAMENTO

Não se pode olvidar que, acaso acolhido o pedido principal da presente ação direta de inconstitucionalidade, restará desprovido de eficácia e utilidade o Ato n. 04/2014, da Mesa da Câmara Municipal de Santos, que regulamentou a Lei Complementar n. 789/2012 ao fixar as atribuições dos cargos comissionados por ela criados.

Torna-se, portanto, necessário que se reconheça sua inconstitucionalidade por arrastamento ou atração, sob pena de se instaurar situação mais gravosa que aquela que se busca combater.

A respeito da inconstitucionalidade por arrastamento, tem-se que: 

"(...) se em determinado processo de controle concentrado de constitucionalidade for julgada inconstitucional a norma principal, em futuro processo, outra norma dependente daquela que foi declarada inconstitucional em processo anterior - tendo em vista a relação de instrumentalidade que entre elas existe - também estará eivada pelo vício da inconstitucionalidade 'conseqüente', ou por 'arrastamento' ou por 'atração'" (Pedro Lenza, "Direito Constitucional Esquematizado", Saraiva, 13ª Edição, p. 208).

Segundo precedentes do Pretório Excelso, é perfeitamente possível a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento (ADI 1.144-RS, Rel. Min. Eros Grau, DJU 08-09-2006, p. 16; ADI-3.645-R, Rel. Min. Ellen Gracie, DJU 01-09-2006, p. 16; ADI-QO 2.982-CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, LexSTF, 26/105; ADI 2.895-AL, Rel. Min. Carlos Velloso, RTJ 194/533; ADI 2.578-MG, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 09-06-2005, p. 4).

A declaração de inconstitucionalidade por arrastamento é possível sempre que: a) o reconhecimento da inconstitucionalidade de determinado dispositivo legal torna despidos de eficácia e utilidade outros preceitos do mesmo diploma, ainda que não tenham sido impugnados; b) nos casos em que o efeito repristinatório restabelece dispositivos já revogados pela lei viciada que ostentem o mesmo vício; c) quando há na lei dispositivos que não foram impugnados, mas guardam direta relação com aqueles cuja inconstitucionalidade é reconhecida.

Neste sentido, em situação similar, decidiu o Tribunal Paulista:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 1.510, de 18 de maio de 2009, do Município de Ibiúna,que cria os cargos de Assessor Jornalista,Assessor Financeiro e Assessor Jurídico nos quadros da Câmara Municipal local. Atribuições de caráter eminentemente técnico. Violação aos arts. 115, incs. II e V, e 144, ambos da CEst. Invalidade, por arrastamento, do Ato n. 37/2009 da Mesa da Câmara, que disciplinou o exercício dos cargos em apreço. Ação procedente.” (TJSP, ADI 0376643-77.2010.8.26.0000, Rel. Des. José Santana, 07-04-2011 – g.n.).

Nesse contexto, a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento, do Ato n. 04/2014, da Mesa da Câmara Municipal de Santos, é medida de rigor.

5. DOS PEDIDOS

5.1. Do pedido liminar

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Santos apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a consequente oneração financeira do erário.

À luz deste perfil, requer-se a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, dos incisos I a XXIV do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, bem como, por arrastamento, do Ato n. 04/2014 da Mesa da Câmara, do Município de Santos.

5.2. Do pedido principal

Diante do exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação direta, a fim de que seja, ao final, julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade dos incisos I a XXIV do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, bem como, por arrastamento, do Ato n. 04/2014 da Mesa da Câmara, do Município de Santos.

Requer-se, ainda, que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Santos, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre os atos normativos impugnados.

 Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 Termos em que,

 Aguarda-se deferimento.

São Paulo, 18 de maio de 2016.

 

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

aaamj/mam

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado nº 160.676/15

Interessado: Promotoria de Justiça de Santos

 

 

 

1.       Promova-se a distribuição de ação direta de inconstitucionalidade, instruída com os protocolados inclusos, em face dos incisos I a XXIV do artigo 4º da Lei Complementar n. 789, de 28 de dezembro de 2012, bem como, por arrastamento, do Ato n. 04/2014 da Mesa da Câmara, do Município de Santos.

 

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 18 de maio de 2016.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

aaamj/mam