EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado nº 166.954/2015
Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré, que “Autoriza o Poder Executivo a fornecer leite em pó para crianças nascidas de mães portadoras do vírus HIV”. Iniciativa Parlamentar. Iniciativa reservada. Lei autorizativa. Reserva da Administração. Separação de poderes. 1. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré, que “Autoriza o Poder Executivo a fornecer leite em pó para crianças nascidas de mães portadoras do vírus HIV”. 2. Encontra-se na reserva da administração e na iniciativa legislativa reservada do Chefe do Poder Executivo a instituição de programas, campanhas e serviços administrativos, por órgãos do Poder Executivo. 3. Lei que autoriza o Poder Executivo a agir em matérias de sua iniciativa privativa implica, em verdade, uma determinação, sendo, portanto, inconstitucional. 4. Quando lei de iniciativa parlamentar cria ou fornece atribuição ao Poder Executivo ou seus órgãos demandando diretamente a realização de despesa pública não prevista no orçamento para atendimento de novos encargos, com ou sem indicação de sua fonte de cobertura inclusive para os exercícios seguintes, ela também padece de inconstitucionalidade por incompatibilidade com os arts. 25, 174, III, e 176, I, CE/89, seja porque aquele exige a indicação de recursos para atendimento das novas despesas (que não estão previstas) seja porque é reservada ao Chefe do Poder Executivo iniciativa legislativa sobre o orçamento anual. 5. Violação do princípio da separação de poderes (arts. 5º; 24, § 2º, 2; 47, II, XIV e XIX, e 144 da Constituição do Estado).
O PROCURADOR-GERAL
DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no
art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de
1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o
disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV, da Constituição Federal, e
ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de
São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem,
respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em
face da Lei nº 5.650, de 27 de junho
de 2014, do Município de Sumaré, pelos seguintes fundamentos:
1.
DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
A Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município
de Sumaré, que “Autoriza o Poder Executivo a fornecer lei em pó para crianças
nascidas de mães portadoras do vírus HIV”, de iniciativa parlamentar, tem a
seguinte redação (fls. 73):
“(...)
Art.
1º - Fica o Poder Executivo autorizado a fornecer leite em pó para crianças
nascidas de mães portadoras do vírus HIV.
Parágrafo
único – O fornecimento estabelecido neste artigo ocorrerá, no mínimo, durante
os dois primeiros anos de vida dos bebês.
Art.
2º - A concessão do benefício previsto nesta lei será feito às mães
comprovadamente carentes, desprovidas de recursos financeiros para aquisição
normal desse alimento básico.
Art.
3º - A seleção das mães e o controle/distribuição do leite em pó serão de
responsabilidade das Secretarias Municipais de Saúde e Desenvolvimento Social,
respectivamente, através dos seus órgãos competentes.
Art.
4º - Os recursos para as despesas decorrentes da execução desta lei correrão
por conta das dotações orçamentárias das Secretarias envolvidas, suplementadas
se necessário, e contarão dos orçamentos municipais dos anos subsequentes.
Art.
5º - O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 60 (sessenta) dias,
contados da data de sua publicação.
Art.
6º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.
(...)”
O ato normativo impugnado
padece de incompatibilidade vertical com a Constituição do Estado de São Paulo,
como adiante será demonstrado.
2. DO
PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE
O referido ato normativo contraria frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal, por força do seguinte preceito, ante a previsão dos arts.
1º, 18, 29 e 31, da Constituição Federal:
“Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
A lei local impugnada contrasta os
seguintes preceitos da Constituição Paulista:
“Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
(...)
Art. 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
(...)
§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:
(...)
2 – criação e extinção das
Secretarias de Estado e órgãos da administração pública, observado o disposto
no artigo 47, XIX;
(...)
Art. 25 - Nenhum projeto de lei que implique a criação ou o aumento de despesa pública será sancionado sem que dele conste a indicação dos recursos disponíveis, próprios para atender aos novos encargos.
(...)
Art. 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:
(...)
II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;
(...)
XIV - praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo;
(...)
XIX - dispor, mediante decreto, sobre:
a. organização e
funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de
despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos;
(...)
Art. 174 - Leis de
iniciativa do Poder Executivo estabelecerão, com observância dos preceitos
correspondentes da Constituição Federal:
(...)
III
- os
orçamentos anuais.
(...)
Art. 176 - São
vedados:
I - o início de
programas, projetos e atividades não incluídos na lei orçamentária anual;
(...).”
3. DA FUNDAMENTAÇÃO
A lei impugnada, de iniciativa parlamentar, disciplina atos de gestão administrativa, referentes à fornecimento de leite em pó para crianças nascidas de mães portadoras de vírus HIV, desprovidas de recursos financeiros para aquisição normal desse alimento básico (art. 1º e 2º da Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré), com imposição de atribuições as Secretarias Municipais de Saúde e Desenvolvimento Social (art. 3º da Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré).
Notadamente, há previsão de atribuição ao Poder Executivo, por parte do Legislativo, ao estabelecer a implantação de um programa de fornecimento de lei em pó para crianças nascidas de mães portadoras do vírus HIV, delimitando todas as condições e peculiaridades a ele concernentes.
Entretanto, a produção normativa não pode transitar à margem das regras inerentes ao processo legislativo, cujas normas constitucionais centrais são de observância obrigatória (RT 850/180; RTJ 193/832).
Postulado
básico da organização do Estado é o princípio da separação dos poderes,
constante do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo, norma de
observância obrigatória nos Municípios conforme estabelece o art. 144 da mesma
Carta Estadual.
Este dispositivo é tradicional pedra fundamental do
Estado de Direito assentado na ideia de que as funções estatais são divididas e
entregues a órgãos ou poderes que as exercem com independência e harmonia,
vedando interferências indevidas de um sobre o outro. Todavia, o exercício
dessas atribuições nem sempre é fragmentado e estanque, pois, observa a
doutrina que:
“O princípio da separação dos poderes (ou divisão, ou distribuição, conforme a terminologia adotada) significa, portanto, entrosamento, coordenação, colaboração, desempenho harmônico e independente das respectivas funções, e ainda que cada órgão (poder), ao lado de suas funções principais, correspondentes à sua natureza, em caráter secundário colabora com os demais órgãos de diferente natureza, ou pratica certos atos que, teoricamente, não pertenceriam à sua esfera de competência” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 585).
Como consequência do princípio da separação dos poderes, a
Constituição Estadual, perfilhando as diretrizes da Constituição Federal,
comete a um Poder competências próprias, insuscetíveis de invasão por outro. Assim,
ao Poder Executivo são outorgadas atribuições típicas da função administrativa,
como dispor sobre a sua organização e seu funcionamento. Em essência, a
separação ou divisão de poderes:
“consiste um confiar cada uma das funções governamentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos diferentes (...) A divisão de Poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: (a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função (...); (b) independência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação” (José Afonso da Silva. Comentário contextual à Constituição, São Paulo: Malheiros, 2006, 2ª ed., p. 44).
Também por decorrência do citado princípio da separação de
poderes, e à vista dos mecanismos de controle recíprocos de um sobre o outro
para evitar abusos e disfunções, a Constituição Estadual cuidou de precisar a
participação do Poder Executivo no processo legislativo. Como observa a
doutrina:
“É a esse arranjo, mediante o qual, pela distribuição de competências, pela participação parcial de certos órgãos estatais controlam-se e limitam-se reciprocamente, que os ingleses denominavam, já anteriormente a Montesquieu, sistema de ‘freios recíprocos’, ‘controles recíprocos’, ‘reservas’, ‘freios e contrapesos’ (checks and controls, checks and balances), tudo isso visando um verdadeiro ‘equilíbrio dos poderes’ (equilibrium of powers).
(...)
A distribuição das funções entre os órgãos do Estado (poderes), isto é, a determinação das competências, constitui tarefa do Poder Constituinte, através da Constituição. Donde se conclui que as exceções ao princípio da separação, isto é, todas aquelas participações de cada poder, a título secundário, em funções que teórica e normalmente competiriam a outro poder, só serão admissíveis quando a Constituição as estabeleça, e nos termos em que fizer. Não é lícito à lei ordinária, nem ao juiz, nem ao intérprete, criarem novas exceções, novas participações secundárias, violadoras do princípio geral de que a cada categoria de órgãos compete aquelas funções correspondentes à sua natureza específica” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593).
Assim, se em princípio a competência normativa é do domínio
do Poder Legislativo, matérias de natureza eminentemente administrativa são
reservadas à iniciativa legislativa do Poder Executivo ou à denominada reserva
da Administração (arts. 24, § 2º, 2, 47, II, XIV e XIX, a).
Esse desenho normativo de status constitucional – aplicável aos Municípios por obra do art.
144 da Constituição Estadual - permite assentar as seguintes conclusões: (a) a
iniciativa legislativa não é ampla nem livre, só podendo ser exercida por
sujeito a quem a Constituição entregou uma determinada competência; (b) ao
Chefe do Poder Executivo a Constituição prescreve iniciativa legislativa
reservada em matérias inerentes à Administração Pública; (c) há matérias
administrativas que, todavia, escapam à dimensão do princípio da legalidade
consistente na reserva de lei em virtude do estabelecimento de reserva de norma
do Poder Executivo. A propósito, frisa Hely Lopes Meirelles a linha divisória
da iniciativa legislativa:
“Leis de
iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores são todas as que
a lei orgânica municipal não reserva, expressa e privativamente à iniciativa do
prefeito. As leis orgânicas municipais devem reproduzir, dentre as matérias
previstas nos arts. 61, § 1º, e 165 da CF, as que se inserem no âmbito da
competência municipal” (Direito Municipal
Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 1997, 9ª ed., p. 431).
A criação de órgãos,
programas, e serviços públicos a cargo do Poder Executivo, adicionada à
respectiva conferência de
atribuições e competências, e a disciplina da organização e funcionamento da
Administração Pública e de órgãos do Poder Executivo, é matéria da reserva de
iniciativa legislativa de seu Chefe, como proclama pacífica jurisprudência:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LEI QUE ATRIBUI TAREFAS AO DETRAN/ES, DE INICIATIVA PARLAMENTAR: INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. C.F, art. 61, § 1°, n, e, art. 84, II e VI. Lei 7.157, de 2002, do Espírito Santo.
I. - É de iniciativa do Chefe do Poder Executivo a proposta de lei que vise a criação, estruturação e atribuição de órgãos da administração pública: C.F, art. 61, § 1°, II, e, art. 84, II e VI.
II. - As regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros.
III. - Precedentes do STF.
IV - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.).
“É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação” (STF, ADI 3.254-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 16-11-2005, v.u., DJ 02-12-2005, p. 02).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 6.835/2001 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. INCLUSÃO DOS NOMES DE PESSOAS FÍSICAS E JURÍDICAS INADIMPLENTES NO SERASA, CADIN E SPC. ATRIBUIÇÕES DA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA. INICIATIVA DA MESA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. A lei 6.835/2001, de iniciativa da Mesa da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, cria nova atribuição à Secretaria de Fazenda Estadual, órgão integrante do Poder Executivo daquele Estado. À luz do princípio da simetria, são de iniciativa do Chefe do Poder Executivo estadual as leis que versem sobre a organização administrativa do Estado, podendo a questão referente à organização e funcionamento da Administração Estadual, quando não importar aumento de despesa, ser regulamentada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, e e art. 84, VI, a da Constituição federal). Inconstitucionalidade formal, por vício de iniciativa da lei ora atacada” (STF, ADI 2.857-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 30-08-2007, v.u., DJe 30-11-2007).
“III - Independência e Separação dos Poderes: processo legislativo: iniciativa das leis: competência privativa do Chefe do Executivo. Plausibilidade da alegação de inconstitucionalidade de expressões e dispositivos da lei estadual questionada, de iniciativa parlamentar, que dispõem sobre criação, estruturação e atribuições de órgãos específicos da Administração Pública, criação de cargos e funções públicos e estabelecimento de rotinas e procedimentos administrativos, que são de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo (CF, art. 61, § 1º, II, e), bem como dos que invadem competência privativa do Chefe do Executivo (CF, art. 84, II)” (STF, ADI-MC 2.405-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 06-11-2002, DJ 17-02-2006, p. 54).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DE ORIGEM PARLAMENTAR. ORGANIZAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA. As regras previstas na Constituição Federal para o processo legislativo aplicam-se aos Estados-membros. Compete exclusivamente ao Governador a iniciativa de leis que cuidem da estruturação e funcionamento de órgãos vinculados ao Poder Executivo (CF, artigos 61, § 1º, II, ‘e’; e 144, § 6º). Precedentes. Inconstitucionalidade da Lei 10890/01, do Estado de São Paulo. Ação julgada procedente” (STF, ADI 2646-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 20-03-2003, v.u., DJ 23-05-2003, p. 30).
“CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - LIMINAR. Há o sinal do bom direito e o risco de manter-se com plena eficácia o quadro quando o diploma atacado resultou de iniciativa parlamentar e veio a disciplinar programa de desenvolvimento estadual - submetendo-o à Secretaria de Estado - a dispor sobre a estrutura funcional pertinente. Segundo a Carta da República, incumbe ao chefe do Poder Executivo deflagrar o processo legislativo que envolva órgão da Administração Pública - alínea ‘e’ do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal” (STF, ADI-MC 2.799-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 01-04-2004, v.u., DJ 21-05-2004, p. 31).
“CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CRIAÇÃO DE ÓRGÃOS PÚBLICOS. INICIATIVA LEGISLATIVA RESERVADA. C.F., art. 61, § 1º, II, a, c e e, art. 63, I; Lei 13.145/2001, do Ceará, art. 4º; Lei 13.155/2001, do Ceará, artigos 6º, 8º e 9º, Anexo V, referido no art. 1º. I. - As regras do processo legislativo, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros. Precedentes do STF. II. - Leis relativas à remuneração do servidor público, que digam respeito ao regime jurídico destes, que criam ou extingam órgãos da administração pública, são de iniciativa privativa do Chefe do Executivo. C.F., art. 61, § 1º, II, a, c e e. III. - Matéria de iniciativa reservada: as restrições ao poder de emenda - C.F., art. 63, I - ficam reduzidas à proibição de aumento de despesa e à hipótese de impertinência de emenda ao tema do projeto. Precedentes do STF. IV - ADI julgada procedente” (STF, ADI 2.569-CE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 19-03-2003, v.u., DJ 02-05-2003, p. 26).
“O respeito às atribuições resultantes da divisão funcional do Poder constitui pressuposto de legitimação material das resoluções estatais, notadamente das leis. - Prevalece, em nosso sistema jurídico, o princípio geral da legitimação concorrente para instauração do processo legislativo. Não se presume, em conseqüência, a reserva de iniciativa, que deve resultar - em face do seu caráter excepcional - de expressa previsão inscrita no próprio texto da Constituição, que define, de modo taxativo, em ‘numerus clausus’, as hipóteses em que essa cláusula de privatividade regerá a instauração do processo de formação das leis. - O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, quando resultante da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do diploma legislativo assim editado, que não se convalida, juridicamente, nem mesmo com a sanção manifestada pelo Chefe do Poder Executivo” (STF, ADI-MC 776-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 23-10-1992, v.u., DJ 15-12-2006, p. 80).
Ora, reproduzindo o art. 61, § 1º, II, e, da Constituição Federal, o art. 24, § 2º, 2, da Constituição
Estadual, confere exclusiva iniciativa legislativa ao Chefe do Poder Executivo
para criação de órgãos da Administração Pública (compreendendo a descrição de suas atribuições e competências, programas
e serviços públicos) e disciplina da organização e funcionamento da
Administração Pública quando houver aumento de despesa.
Sem embargo da reserva de iniciativa legislativa, também
decorre do princípio da divisão funcional do poder a reserva da Administração
Pública, pois, compete ao Poder Executivo o exercício de sua direção superior,
a prática de atos de administração típica e ordinária e a disciplina de sua
organização e de seu funcionamento (art. 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual).
A instituição de programas destinados à execução de
políticas públicas, executados direta ou indiretamente pelo poder público, e,
enfim, da organização e funcionamento da Administração Pública, situa-se no
domínio da reserva da Administração, espaço conferido com exclusividade ao
Chefe do Poder Executivo no âmbito de seu poder normativo imune a
interferências do Poder Legislativo, e que se radica na gestão ordinária dos
negócios públicos, como se infere dos arts. 5º e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual, aplicável
na esfera municipal por força de seu art. 144 e do art. 29 caput da Constituição Federal.
A Constituição
Paulista prevê no art. 47 competência privativa do Chefe do Poder Executivo. O
dispositivo consagra a atribuição de governo do Chefe do Poder Executivo,
traçando suas competências próprias de administração e gestão que compõem a
denominada reserva de Administração, pois, veiculam matérias de sua alçada
exclusiva, imunes à interferência do Poder Legislativo.
A alínea a do
inciso XIX desse art. 47 fornece ao Chefe do Poder Executivo a prerrogativa de
dispor mediante decreto sobre “organização e funcionamento da administração
estadual, quando não implicar aumento de despesa, nem criação ou extinção de
órgãos públicos”, em preceito semelhante ao art. 84, VI, a, da Constituição Federal. Por sua vez, os incisos II e XIV
estabelecem competir-lhe o exercício da direção superior da administração e a
prática dos demais atos de administração, nos limites da competência do Poder
Executivo, enraizando-se no art. 84, II, da Constituição de 1988.
Esses assuntos são privativos do poder normativo do Chefe do
Poder Executivo, como já se decidiu:
“(...) 2. As restrições impostas ao exercício das competências constitucionais conferidas ao Poder Executivo, entre elas a fixação de políticas públicas, importam em contrariedade ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes (...)” (STF, ADI-MC-REF 4.102-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 26-05-2010, v.u., DJe 24-09-2010).
“(...) O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. (...)” (STF, ADI-MC 2.364-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2001, DJ 14-12-2001, p. 23).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N.º 11.830, DE 16 DE SETEMBRO DE 2002, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ADEQUAÇÃO DAS ATIVIDADES DO SERVIÇO PÚBLICO ESTADUAL E DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO PÚBLICOS E PRIVADOS AOS DIAS DE GUARDA DAS DIFERENTES RELIGIÕES PROFESSADAS NO ESTADO. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 22, XXIV; 61, § 1.º, II, C; 84, VI, A; E 207 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. No que toca à Administração Pública estadual, o diploma impugnado padece de vício formal, uma vez que proposto por membro da Assembleia Legislativa gaúcha, não observando a iniciativa privativa do Chefe do Executivo, corolário do princípio da separação de poderes. Já, ao estabelecer diretrizes para as entidades de ensino de primeiro e segundo graus, a lei atacada revela-se contrária ao poder de disposição do Governador do Estado, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento de órgãos administrativos, no caso das escolas públicas (...)” (RTJ 191/479).
A matéria prevista no ato
normativo encontra-se no âmbito da atividade administrativa do município, cuja
organização, funcionamento e direção superior cabem ao Prefeito Municipal, com
auxílio dos Secretários Municipais.
Assim, o Poder Legislativo não
pode através de lei ocupar-se da administração, sob pena de se permitir que o
legislador administre invadindo área privativa do Poder Executivo.
Quando o Poder Legislativo do município edita lei disciplinando atuação administrativa, como ocorre, no caso em exame, em função da obrigação de fornecer lei em pó para crianças nascidas de mães portadoras do vírus HIV, desprovidas de recursos financeiros para aquisição normal desse alimento básico, invade, indevidamente, esfera que é própria da atividade do Administrador Público, violando o princípio da separação de poderes.
Ainda
que se imagine que houvesse necessidade de disciplinar por lei alguma matéria
típica de gestão municipal, a iniciativa seria privativa do chefe do Poder
Executivo, mesmo quando ele não possa discipliná-la por decreto nos termos do
art. 47, XIX, da Constituição Estadual.
Assim,
a Lei, ao fixar obrigações ao poder executivo, de um lado, viola o art. 47, II e
XIV, no estabelecimento de regras que respeitam à direção da administração e à
organização e ao funcionamento do Poder Executivo, matéria essa que é da alçada
da reserva da Administração, e de outro, ela ofende o art. 24, § 2º, 2, na
medida em que impõe atribuição ao Poder Executivo.
Em síntese, cabe nitidamente ao administrador público, e não ao legislador, deliberar a respeito do tema.
E se a tanto não bastasse, se, em linha de princípio,
a falta de recursos orçamentários não causa a inconstitucionalidade de lei,
senão sua ineficácia no exercício financeiro respectivo à sua vigência – porque
“inclina-se a jurisprudência no STF no sentido de que a inobservância por
determinada lei das mencionadas restrições constitucionais não induz à sua
inconstitucionalidade, impedindo apenas a sua execução no exercício financeiro
respectivo” (STF, ADI 1.585-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
19-12-1997, v.u., DJ 03-04-1998, p. 01) -, quando lei de iniciativa parlamentar
cria ou fornece atribuição ao Poder Executivo ou seus órgãos demandando
diretamente a realização de despesa pública não prevista no orçamento para
atendimento de novos encargos, com ou sem indicação de sua fonte de cobertura
inclusive para os exercícios seguintes, ela também padece de inconstitucionalidade
por incompatibilidade com os arts. 25, 174, III, e 176, I, da Constituição
Estadual, seja porque aquele exige a indicação de recursos para atendimento das
novas despesas, seja porque é reservada ao Chefe do Poder Executivo iniciativa
legislativa sobre o orçamento anual, conforme pronuncia o Supremo Tribunal
Federal:
“Ação direta de
inconstitucionalidade. 2. Lei do Estado do Amapá. 3. Organização, estrutura e
atribuições de Secretaria Estadual. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do
Poder Executivo. Precedentes. 4. Exigência de consignação de dotação
orçamentária para execução da lei. Matéria de iniciativa do Poder Executivo.
Precedentes. 5. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 341, p. 35).
“Ação Direta de
Inconstitucionalidade. 2. Lei Do Estado do Rio Grande do Sul. Instituição do
Pólo Estadual da Música Erudita. 3. Estrutura e atribuições de órgãos e
Secretarias da Administração Pública. 4. Matéria de iniciativa privativa do
Chefe do Poder Executivo. 5. Precedentes. 6. Exigência de consignação de
dotação orçamentária para execução da lei. 7. Matéria de iniciativa do Poder
Executivo. 8. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 338, p. 46).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.238/94 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. INSTITUIÇÃO
DO PROGRAMA ESTADUAL DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA, DESTINADO AOS MUNICÍPIOS. CRIAÇÃO
DE UM CONSELHO PARA ADMIUNISTRAR O PROGRAMA. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR.
VIOLAÇÃO DO ARTIGO 61, § 1º, INCISO II, ALÍNEA ‘E’, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. Vício de iniciativa, vez que o projeto de lei foi apresentado por um
parlamentar, embora trate de matéria típica de Administração. 2. O texto
normativo criou novo órgão na Administração Pública estadual, o Conselho de
Administração, composto, entre outros, por dois Secretários de Estado, além de
acarretar ônus para o Estado-membro. Afronta ao disposto no artigo 61, § 1º,
inciso II, alínea ‘e’ da Constituição do Brasil. 3. O texto normativo, ao
cercear a iniciativa para a elaboração da lei orçamentária, colide com o disposto
no artigo 165, inciso III, da Constituição de 1988. 4. A declaração de
inconstitucionalidade dos artigos 2º e 3º da lei atacada implica seu
esvaziamento. A declaração de inconstitucionalidade dos seus demais preceitos
dá-se por arrastamento. 5. Pedido julgado procedente para declarar a
inconstitucionalidade da Lei n. 10.238/94 do Estado do Rio Grande do Sul” (RTJ
200/1065).
E nem se alegue se tratar de mera lei autorizativa, pelo que dispõe o art. 1º da Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré, pois essa natureza não desabona a conclusão de sua inconstitucionalidade.
A autorização legislativa não se confunde com lei autorizativa, devendo aquela primar pela observância da reserva de iniciativa. Ainda que a lei contenha autorização (lei autorizativa) ou permissão (norma permissiva), padece de inconstitucionalidade. Em essência, houve invasão manifesta da gestão pública, assunto da alçada exclusiva do Chefe do Poder Executivo, violando sua prerrogativa de análise da conveniência e da oportunidade das providências previstas na lei.
Lição doutrinária abalizada, analisando
a natureza das intrigantes leis autorizativas, especialmente quando votadas
contra a vontade de quem poderia solicitar a autorização, ensina que:
“(...) insistente na prática legislativa brasileira, a ‘lei’ autorizativa constitui um expediente, usado por parlamentares, para granjear o crédito político pela realização de obras ou serviços em campos materiais nos quais não têm iniciativa das leis, em geral matérias administrativas. Mediante esse tipo de ‘leis’, passam eles, de autores do projeto de lei, a co-autores da obra ou serviço autorizado. Os constituintes consideraram tais obras e serviços como estranhos aos legisladores e, por isso, os subtraíram da iniciativa parlamentar das leis. Para compensar essa perda, realmente exagerada, surgiu ‘lei’ autorizativa, praticada cada vez mais exageradamente autorizativa é a ‘lei’ que - por não poder determinar - limita-se a autorizar o Poder Executivo a executar atos que já lhe estão autorizados pela Constituição, pois estão dentro da competência constitucional desse Poder. O texto da ‘lei’ começa por uma expressão que se tornou padrão: ‘Fica o Poder Executivo autorizado a...’ O objeto da autorização - por já ser de competência constitucional do Executivo - não poderia ser ‘determinado’, mas é apenas ‘autorizado’ pelo Legislativo, tais ‘leis’, óbvio, são sempre de iniciativa parlamentar, pois jamais teria cabimento o Executivo se autorizar a si próprio, muito menos onde já o autoriza a própria Constituição. Elas constituem um vício patente" (Sérgio Resende de Barros. “Leis Autorizativas”, in Revista da Instituição Toledo de Ensino, Bauru, ago/nov 2000, p. 262).
A lei que autoriza o Poder Executivo a agir em matérias de sua iniciativa privativa implica, em verdade, uma determinação, sendo, portanto, inconstitucional.
Neste sentido, vem julgando este egrégio Tribunal, afirmando a inconstitucionalidade das leis autorizativas, forte no entendimento de que essas “autorizações” são mero eufemismo de “determinações”, e, por isso, usurpam a competência material do Poder Executivo:
“LEIS AUTORIZATIVAS – INCONSTITUCIONALIDADE - Se uma lei fixa o que é próprio da Constituição fixar, pretendendo determinar ou autorizar um Poder constituído no âmbito de sua competência constitucional, essa lei é inconstitucional - não só inócua ou rebarbativa - porque estatui o que só o Constituinte pode estatuir. O poder de autorizar implica o de não autorizar, sendo, ambos, frente e verso da mesma competência. As leis autorizativas são inconstitucionais por vício formal de iniciativa, por usurparem a competência material do Poder Executivo e por ferirem o princípio constitucional da separação de poderes.”
“LEI MUNICIPAL QUE IMPÕE INDEVIDO AUMENTO DE DESPESA PÚBLICA SEM A INDICAÇÃO DOS RECURSOS DISPONÍVEIS, PRÓPRIOS PARA ATENDER AOS NOVOS ENCARGOS (CE, ART 25). COMPROMETENDO A ATUAÇÃO DO EXECUTIVO NA EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO - ARTIGO 176, INCISO I, DA REFERIDA CONSTITUIÇÃO, QUE VEDA O INÍCIO DE PROGRAMAS. PROJETOS E ATIVIDADES NÃO INCLUÍDOS NA LEI ORÇAMENTÁRIA ANUAL” (TJSP, ADI 142.519-0/5-00, Rel. Des. Mohamed Amaro, 15-08-2007).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALÍDADE - LEI N° 2.057/09, DO MUNICÍPIO DE LOUVEIRA - AUTORIZA O
PODER EXECUTIVO A COMUNICAR O CONTRIBUINTE DEVEDOR DAS CONTAS VENCIDAS E NÃO
PAGAS DE ÁGUA, IPTU, ALVARÁ A ISS, NO PRAZO MÁXIMO DE 60 DIAS APÓS O VENCIMENTO
– INCONSTITUCIONALÍDADE FORMAL E MATERIAL - VÍCIO DE INICIATIVA E VIOLAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - INVASÃO DE COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO
- AÇÃO PROCEDENTE.
A lei inquinada
originou-se de projeto de autoria de vereador e procura criar, a pretexto de
ser meramente autorizativa, obrigações e deveres para a Administração
Municipal, o que redunda em vício de iniciativa e usurpação de competência do
Poder Executivo. Ademais, a Administração Pública não necessita de autorização
para desempenhar funções das quais já está imbuída por força de mandamentos
constitucionais” (TJSP, ADI 994.09.223993-1, Rel. Des. Artur Marques, v.u.,
19-05-2010).
“Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Lei Municipal n° 2.531, de 25 de novembro de 2009, do
Município de Andradina, 'autorizando' o Poder Executivo Municipal a conceder a
todos os alunos das escolas municipais auxílio pecuniário para aquisição de material
escolar, através de vale-educação no comércio local. Lei de iniciativa da
edilidade, mas que versa sobre matéria reservada à iniciativa do Chefe do
Executivo. Violação aos arts. 5º, 25 e 144 da Constituição do Estado. Não
obstante com caráter apenas 'autorizativo', lei da espécie usurpa a competência
material do Chefe do Executivo. Ação procedente” (TJSP, ADI 994.09.229479-7,
Rel. Des. José Santana, v.u., 14-07-2010).
A argumentação da natureza
autorizativa da norma não elide a conclusão de sua inconstitucionalidade, como
já decidido:
“5. Não é tolerável, com efeito, que, como está prestes a ocorrer neste caso, o Governador do Estado, à mercê das veleidades legislativas, permaneça durante tempo imprevisível com uma lei inconstitucional a tiracolo, ou, o que o seria ainda pior, seja compelido a transmiti-la a seu sucessor, com as conseqüências de ordem política daí derivadas” (STF, ADI-MC 2.367-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 05-04-2001, v.u., DJ 05-03-2004, p. 13).
Feitas estas considerações,
constata-se que a Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré,
viola as disposições dos arts. 5º, 25, 47, II, XI e XIV, 144, 174, III, e 176,
I, da CE.
4.
DO PEDIDO LIMINAR
Estão presentes, na hipótese examinada, os
pressupostos do fumus boni iuris e do
periculum in mora, a justificar a
suspensão liminar da vigência e eficácia do ato normativo impugnado.
A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos
expostos, que indicam, de forma clara, que a lei impugnada padece de inconstitucionalidade.
O perigo da demora decorre especialmente da ideia de
que sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos preceitos questionados,
subsistirá a sua aplicação, com a possível implementação do programa de
fornecimento de leite em pó para crianças nascidas de mães portadoras de HIV,
desprovidas de recursos financeiros para aquisição normal desse alimento
básico.
A ideia do fato consumado, com repercussão concreta,
guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação
direta de inconstitucionalidade.
Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões
declinadas, dificilmente será possível restabelecer o status quo ante.
Por outro lado, de forma
paradoxal, a não concessão da liminar neste momento processual poderá servir de
fundamento, no futuro, para se pleitear e justificar, de forma indevida, a
modulação de efeitos, com base na narrativa de situação consolidada, que
poderia ter sido evitada.
Assim, a imediata
suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores
prejuízos, além dos que eventualmente já se verificaram.
De resto, ainda que não houvesse essa singular
situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.
No contexto das ações diretas e da outorga de provimentos
cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério
relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal
Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente
inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel.
Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC
540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).
Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar,
para fins de suspensão imediata da
eficácia da Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré.
5.
DO PEDIDO PRINCIPAL
Por todo o exposto, aguarda-se o recebimento e
processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja julgada
procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 5.650, de 07 de
junho de 2014, do Municipal de Sumaré.
Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à
Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Sumaré, bem como posteriormente
citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo
impugnado.
Posteriormente, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
São Paulo, 27 de julho de
2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
EFRco/mi
Protocolado nº 166.954/2015
Assunto: inconstitucionalidade
da lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do Município de Sumaré.
1.
Distribua-se a inicial da ação direta de
inconstitucionalidade, em face da Lei nº 5.650, de 27 de junho de 2014, do
Município de Sumaré, junto ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2.
Oficie-se ao interessado,
informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São
Paulo, 27 de julho de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
EFRco/mi