EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 142.900/2015
Ementa:
1.
Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 2°, caput, da Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2005, do Município
de Valparaíso, que vincula cargos de provimento em comissão ao regime da Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT) na estrutura administrativa da administração direta
e indireta do poder executivo municipal.
2.
Sujeição de cargo público comissionado ao regime celetista, contrariando
a exigência do regime administrativo. Incompatibilidade com a natureza jurídica
do cargo de provimento em comissão, cujo ocupante pode ser ad nutum exonerado pelo Chefe do Poder Executivo.
3.
Violação dos princípios da razoabilidade e da moralidade (art. 111, art.
115, II, e art. 144 da Constituição Estadual).
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da
Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, e em conformidade
com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da
República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da
Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no
incluso protocolado, vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE em face dos artigo 2°, caput, da Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2015, do
Município de Valparaíso, pelos
fundamentos expostos a seguir:
1.
DOS ATOS NORMATIVOS
IMPUGNADOS
A Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2015, do Município de Valparaíso, que “dispõe sobre a reestruturação de cargos comissionados na Administração Direta e Indireta do Poder Executivo Municipal e dá outras providências”, possui, no que diz respeito ao objeto desta ação, a seguinte redação, verbis:
“(...)
Artigo 2°. O regime jurídico dos servidores municipais de cargos em comissão é regido pela C.L.T. (Consolidação das Leis Trabalhistas), com direitos, obrigações, deveres e responsabilidades nela definidos e outros que lhe venham a ser atribuídos, salvo aqueles que forem suprimidos por lei e que não tenham sido incorporados.
(...)”. (sic)
O dispositivo legal acima transcrito é verticalmente incompatível com nosso ordenamento constitucional, como será demonstrado a seguir.
2.
O
parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
O dispositivo legal contestado é incompatível com os seguintes preceitos da Constituição Estadual, verbis:
“(...)
Artigo 111 - A administração pública direta, indireta
ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade,
motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Artigo 115 - Para a organização da administração
pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por
qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes
normas:
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende
de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre
nomeação e exoneração;
(...)
Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política,
legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica,
atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta
Constituição.
(...)”
3. DA INADMISSIBILIDADE DA ADOÇÃO DO REGIME
CELETISTA PARA CARGOS COMISSIONADOS
O artigo 2°, caput, da Lei em questão institui a Consolidação das Leis de Trabalho como regime jurídico para os cargos de provimento em comissão.
Ocorre que o provimento em comissão é incompatível com o regime celetista na Administração Pública, porquanto impõe limite à liberdade de provimento e de exoneração do ocupante do cargo público, a dispensa imotivada onerosa prevista pela Consolidação das Leis do Trabalho (art. 115, II e V, Constituição Estadual).
A inserção do cargo comissionado no regime celetista é incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além, fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do cargo, na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar natureza).
O desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária orientada pelos critérios de oportunidade e conveniência da Administração Pública, de sorte que sua sujeição ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador público.
A jurisprudência respalda a declaração de inconstitucionalidade:
“4. Além dessa inconstitucionalidade
formal, ocorre, também, no caso, a material, pois, impondo uma indenização em
favor do exonerado, a norma estadual condiciona, ou ao menos restringe, a
liberdade de exoneração, a que se refere o inc. II do art. 37 da C.F.” (STF,
ADI 182-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 05-11-1997, v.u., DJ
05-12-1997, p. 63.902).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE, INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA PAGA PELOS COFRES PÚBLICOS POR
OCASIÃO DA EXONERAÇÃO OU DISPENSA DE QUEM, SEM OUTRO VÍNCULO COM O SERVIÇO
PÚBLICO, SEJA OCUPANTE DE FUNÇÃO OU CARGO EM COMISSÃO DE LIVRE EXONERAÇÃO, ART.
287 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A nomeação para os cargos em
comissão é feita sob a cláusula expressa de livre exoneração. A disposição que
prevê o pagamento pelos cofres públicos de indenização compensatória aos
ocupantes de cargos em comissão, sem outro vínculo com o serviço público, por
ocasião da exoneração ou dispensa, restringe a possibilidade de livre
exoneração, tal como prevista no art. 37, II, combinado com o art. 25 da
Constituição Federal. 2. Ação direta julgada procedente para declarar a
inconstitucionalidade e a conseqüente ineficácia do art. 287 da Constituição do
Estado de São Paulo, desde a sua promulgação” (STF, ADI 326-SP, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Paulo Brossard, 13-10-1994, m.v., DJ 19-09-1997, p. 45.526).
Inegável a violação aos princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade (art. 111, Constituição Estadual) e à regra da liberdade de exoneração que domina o provimento em comissão (art. 115, II, Constituição Estadual), motivo pelo qual cumpre a declaração da inconstitucionalidade do artigo 2°, caput, da Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2015, do Município de Valparaíso.
4.
DO PEDIDO
Diante do exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação direta, a fim de que seja, ao final, julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do artigo 2°, caput, da Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2015, do Município de Valparaíso.
Requer-se, ainda, que sejam requisitadas informações à
Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Valparaíso, bem como posteriormente
citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre os atos normativos
impugnados.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se deferimento.
São Paulo, 19 de janeiro de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aca
Protocolado n. 142.900/2015
Interessado: Promotoria de Justiça de Valparaíso
Objeto: representação para controle de
constitucionalidade da criação de cargos em comissão pela Lei Complementar n°
57, de 30 de dezembro de 2015, do Município de Valparaíso.
1. Promova-se a distribuição de ação direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado incluso, em face artigo 2°, caput, da Lei Complementar n° 57, de 30 de dezembro de 2015, do Município de Valparaíso;
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 19 de janeiro de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aca