EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 59.268/16
Ação direta de
inconstitucionalidade. Cargo de provimento em comissão de “Assessor Jurídico”
no Município de Tarabai, previsto no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de
fevereiro de 2016, do Município de Tarabai. Arts. 30, 98 a 100, 111, 115, I, II
e V, 144 da CE/89. 1. Cargo de provimento em comissão que não retrata atribuições de
assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas e
profissionais a ser preenchido por servidor público investido em cargo de
provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança. Violação
de dispositivos da Constituição Estadual (arts. 115, I, II e V, e 144). 2. As
atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria
prestada ao Prefeito Municipal, são reservadas a profissionais também
recrutados pelo sistema de mérito. (arts. 30, 98 a 100 da CE/89).
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da
atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734
de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º,
e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74,
inciso VI, e no art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com
amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 59.268/16), vem
perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do cargo
comissionado de “Assessor Jurídico”, previsto no art. 2º da Lei
nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, por ofensa aos
arts. 30, 98 a 100, 111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, ante os fundamentos que passa a expor.
1.
DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO.
A Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, de autoria do Executivo Municipal, Autoriza o Poder Executivo a reestruturar, criar, extinguir e alterar cargos públicos de provimento efetivo e em comissão que especifica e dá outras providências.
Dentre as disposições instituídas na lei examinada, infere-se que fora criado nos quadros da Administração municipal o cargo de provimento em comissão de “Assessor Jurídico”, cujos contornos foram esquadrinhados nos seguintes moldes:
“(...)
Artigo 2º - Fica o Poder
Executivo autorizado a criar os seguintes cargos públicos, de provimento em
comissão:
Cargo |
Quantidade |
Padrão |
Requisitos admissibilidade |
Carga horária semanal |
Assessor jurídico |
01 |
15-A |
Graduação em Direito e inscrição na OAB |
20 horas |
Atribuições do Cargo: Assessorar o Chefe do Poder Executivo
Municipal; atender a consultas, no âmbito administrativo, sobre questões
jurídicas, submetidas à apreciação do Prefeito, Secretários e Coordenadores
Municipais, emitindo pareceres quando solicitado e se necessário, revisar,
atualizar e consolidar a legislação municipal; observar as normas federais e
estaduais que possam ter implicações na legislação local, na medida que foram
sendo expedidas e providenciar a adaptação desta; estudar e revisar minutas
de termos de compromisso e de responsabilidade, contratos administrativos,
minutas de convênios e outros atos que se fizerem necessários a sua
legalização; exercer outras atividades compatíveis com a função, de conformidade
com a disposição legal ou regulamentar para as quais seja expressamente
designado; relatar parecer jurídico dos atos administrativos do Chefe Poder
Executivo e prestar a assessoria judicial quando necessário e previamente
autorizado para tanto. |
(...)”
Pois bem.
O cargo comissionado de “Assessor Jurídico” instituído na estrutura da Administração municipal pelo no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, ofende aos arts. 30, 98 a 100, 111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, conforme restará demonstrado no curso desta vestibular.
2.
DA NATUREZA TÉCNICA OU
BUROCRÁTICA DAS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELOS OCUPANTES DO CARGO COMISSIONADO.
Da
simples leitura das disposições acostadas, é visível que as atribuições
relativas ao cargo de provimento em comissão de “Assessor Jurídico” revelam natureza meramente técnica, burocrática,
operacional e profissional, sendo incompatíveis com a forma de provimento em
comissão, em razão dos seguintes argumentos.
Se analisado amiúde, o cargo em epígrafe revela funções ordinárias, que
exigem tão somente de seu servidor o dever comum de lealdade às instituições
públicas, necessárias a todo agente público, estando fora dos níveis de
direção, chefia e assessoramento superior exigidos pelo Constituinte Originário
quando da edição de regra destinada aos cargos comissionados.
A
incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela
Constituição quanto ao provimento de servidores públicos sem a observância de
concurso.
Embora
o município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do
sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da Constituição Federal), esta
autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita ao âmbito pré-fixado pela
Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros,
1997, p. 459).
No
exercício de sua autonomia administrativa, o município cria cargos, empregos e
funções, mediante atos normativos, instituindo carreiras, vencimentos, entre
outras questões, bem como se estruturando adequadamente.
Todavia,
a possibilidade de que o município organize seus próprios serviços encontra
balizamento na própria ordem constitucional, sendo necessário que o faça por
meio de lei, respeitando necessariamente normas constitucionais federais e
estaduais relativas ao regime jurídico do serviço público, sob pena de ofensa à
ordem jurídica vigente.
Destarte,
no âmbito de todos os Poderes a regra deve ser o preenchimento dos postos via
concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se garante a
acessibilidade geral preconizada no art. 37, I e II, da Constituição Federal,
reproduzido integralmente no art. 115, I e II, da Constituição Bandeirante,
sendo forma, por excelência, de preenchimento de cargos e empregos de natureza
técnica ou burocrática.
Contudo,
tal exigência de certame público não é absoluta. O próprio texto constitucional
prevê a criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e
exoneração, limitada, porém, aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o
governante e o servidor, a fim de que sejam desempenhadas funções inerentes
à atividade predominantemente política.
Ou
seja, há limites implícitos à sua criação, pois do contrário restaria aniquilado
o mandamento constitucional do concurso para acesso ao serviço público.
A
propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em precedente do E. Supremo
Tribunal Federal, que “a criação de cargo
em comissão, em moldes artificiais e não condizentes com as praxes do nosso
ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável
esvaziamento da exigência constitucional do concurso (STF, Pleno,
Repr.1.282-4-SP)” (Direito
administrativo brasileiro, 33. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).
Nesse
contexto, pode-se afirmar que a livre nomeação e exoneração restringe-se aos
cargos ou empregos que, pela natureza das atividades desempenhadas, exijam
excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com
relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem
além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e
qualquer servidor.
Não
por outro motivo, Diógenes Gasparini discorre no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a
direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente que
sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua
orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Por
essas razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A
autoridade nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de
tais cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o
nomeado deixa de gozar de sua confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, 3ª ed., São
Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).
Daí
a afirmação de que “é inconstitucional a
lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas,
burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos
níveis de direção, chefia e
assessoramento superior” (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores
públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).
A jurisprudência proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, exigindo que elas demonstrem, de forma efetiva, a presença de funções concernentes a assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008). Neste sentido:
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS 6.600/1998 (ART. 1º, CAPUT E INCISOS I E II),
7.679/2004 E 7.696/2004 E LEI COMPLEMENTAR 57/2003 (ART. 5º), DO ESTADO DA
PARAÍBA. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. I - Admissibilidade de aditamento do
pedido na ação direta de inconstitucionalidade para declarar inconstitucional
norma editada durante o curso da ação. Circunstância em que se constata a
alteração da norma impugnada por outra apenas para alterar a denominação de
cargos na administração judicial estadual; alteração legislativa que não torna
prejudicado o pedido na ação direta. II - Ofende o disposto no art. 37, II, da
Constituição Federal norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se
harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a
investidura em comissão. Necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador
estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a
exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público.
Precedentes. Ação julgada procedente” (STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJe 13-09-2007, RTJ 202/553).
“Agravo regimental em recurso
extraordinário com agravo. 2. Direito administrativo. 3. Criação de cargos em
comissão por leis municipais. Declaração de inconstitucionalidade pelo TJRS por
violação à disposição da Constituição estadual em simetria com a Constituição
Federal. 3. É necessário que a legislação demonstre, de forma efetiva, que as
atribuições dos cargos a serem criados se harmonizam com o princípio da livre
nomeação e exoneração. Caráter de direção, chefia e assessoramento. Precedentes
do STF. 4. Ausência de argumentos suficientes para infirmar a decisão agravada.
5. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª
Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-02-2012, v.u., DJe 05-03-2012).
Em
síntese, os cargos de provimento em comissão são restritos às atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a
necessária relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de
tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes
político-governamentais. Não se coaduna a criação de cargos dessa natureza –
cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou
funções profissionais ordinárias, passíveis de desempenho por quaisquer
agentes.
Pois bem.
No caso trazido a lume, da simples leitura das atribuições do cargo impugnado,
é despicienda complexa atividade hermenêutica para se visualizar a natureza
ordinária das funções desempenhadas pelo “Assessor Jurídico”, posto que suas
atribuições não ultrapassam os limites funcionais conferidos a qualquer
servidor de provimento efetivo.
Com efeito, observa-se que no cargo em
comento as funções se restringem a atividades técnico-profissionais,
desprovidas do elemento fiduciário requerido para sua consecução, não sendo
legítima, portanto, o provimento comissionado para o desempenho dessas
atribuições nos moldes como foram normatizadas.
Aliás, cumpre ressaltar que o
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já teve a oportunidade de se
manifestar sobre a criação irregular de cargos em comissão em situação
semelhança a ora apreciada, conforme se observa da leitura dos julgados a
seguir mencionados (ADI 111.387-0/0-00, j. em 11.05.2005, rel. des. Munhoz
Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de janeiro de 2005, rel. des. Barbosa
Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30 de janeiro de 2008, rel. des. Elliot
Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des. Armando Toledo, j. 16.07.2008, v.u.).
Na esteira desse raciocínio, portanto, é patente a
inconstitucionalidade do cargo de “Assessor Jurídico” instituído pelo art. 2º
da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, por ofensa ao art. 115, II
e V, da CE/89.
3. DA NATUREZA DAS ATIVIDADES DE
ADVOCACIA PÚBLICA
Não obstante os argumentos esposados no tópico anterior que atestam a inconstitucionalidade do cargo comissionado de “Assessor Jurídico” editado na estrutura administrativa do Município de Tarabai (art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai), a incompatibilidade material da norma impugnada com a Carta Bandeirante se revela em duplicidade, em razão dos seguintes fundamentos.
É sabido que a atividade de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito, ex vi do disposto nos arts. 30, 98 a 100 da Constituição Estadual, que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual, e que deve ser observado pelos municípios por força do art. 144 da Carta Paulista.
Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público (inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes), o que é reverberado pela jurisprudência:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR
11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E
INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES
INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES
PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O
desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder
Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos
Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu
art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade
funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo
de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em
concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).
TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU
EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E
ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ
ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO
DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL).
LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA”
(STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v.,
DJ 02-04-1993, p. 5.611).
“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO
II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO
MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL
REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE
ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA.
INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de
inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se
infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma
impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos
Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo
ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da
Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da
Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária
qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes
públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo
em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito
do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI
4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe
20-08-2010, RT 901/132).
“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de
inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com
dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO
ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe
do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o
tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado.
PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA.
Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual
prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da
carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007,
m.v., DJe 15-08-2008), inclusive a assessoria e a consultoria de corporações
legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também
recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).
Assim, a natureza técnica profissional do cargo de “Assessor Jurídico”, por força dos arts. 30, 98 a 100 da Constituição Estadual, não possibilita a sua instituição pela via do provimento comissionado, sendo, portanto, flagrante a inconstitucionalidade do cargo em comento nos moldes em que fora editado pela edilidade, devendo este Colendo Órgão Especial reconhecer o vício apontando, afastando, por conseguinte, o cargo ora vergastado que se encontra previsto no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai.
4.
DOS PEDIDOS
a)
Do pedido liminar
À
saciedade demonstrado o fumus boni iuris,
pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais, do
Município de Tarabaí, apontados como violadores de princípios e regras da
Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento
desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a
consequente oneração financeira do erário.
Está claramente demonstrada a ofensa à regra que permite excepcionalmente o provimento de cargos em comissão (art. 115, V, CE), pois os cargos plasmados na legislação objurgada não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidos por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo, além da concessão de gratificação indevida de função de confiança a servidores impedidos de receber tal adicional, na medida em que não são titulares de cargo efetivo.
O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.
Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para ocuparem tais cargos ou funções, certamente, não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.
A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.
Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.
Assim, a imediata suspensão da eficácia do enunciados normativos impugnados evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.
De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.
Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).
À luz deste perfil, requer-se a
concessão de liminar para a suspensão parcial, até o final e definitivo
julgamento desta ação, do cargo de provimento em comissão de “Assessor
Jurídico” previsto no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do
Município de Tarabai.
b) Do pedido principal
Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e
processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada
procedente, declarando a inconstitucionalidade do cargo de provimento em
comissão de “Assessor Jurídico” previsto no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de
fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, por ofensa aos arts. 30, 98 a 100,
111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual.
Requer-se,
ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito
Municipal de Tarabai, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do
Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
São Paulo, 23 de agosto de
2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
efrco
Protocolado nº
59.268/16
Interessado: Subprocuradoria-Geral de Justiça Jurídica
Objeto: representação para controle de constitucionalidade das Leis nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, nº 1.487, de 17 de fevereiro de 2016, e nº 1.488, de 17 de fevereiro de 2016, todas do Município de Tarabai.
1. Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade diante do cargo comissionado de “Assessor Jurídico”, previsto no art. 2º da Lei nº 1.485, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Tarabai, por ofensa aos arts. 30, 98 a 100, 111, 115, I, II e V, e 144 da Constituição Estadual.
2. Considerando a decisão proferida pelo Colendo Órgão Especial do E. TJSP na ADI nº 2019760-42.2016.8.26.0000, julgada em 15 de junho de 2016, que declarou a inconstitucionalidade de cargos de provimento em comissão na estrutura administrativa do Município de Tarabai (Lei nº 1.249/10), dentre esses os de “Coordenador do Departamento de Saúde” e “Diretor de Divisão de Saúde, aliada ao fato de ter sido editada, em 17 de fevereiro de 2016, a Lei municipal nº 1.487, que em seu art. 4º especificou as atribuições dos referidos cargos, impende mencionar que, eventualmente, os aludidos postos comissionados podem ainda subsistir na estrutura municipal, sendo necessária, portanto, a extração de cópias e a expedição de ofício ao Promotor de Justiça da localidade, para que apure eventual descumprimento da decisão supramencionada.
3. Comunique-se o representante acerca da presente propositura, encaminhando cópia da inicial.
São Paulo, 23 de agosto de
2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
efrco