EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 63.255/2016
Constitucional. Administrativo. Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Lei nº 7.475, de 18 de junho de 2015, do Município de Guarulhos.
Cargos de provimento em comissão. Funções técnicas e burocráticas. Reiteração
de cargos sob nova roupagem. 1. É inconstitucional a criação de cargos de provimento em
comissão cujas atribuições, ainda que descritas, não evidenciam funções de
assessoramento, chefia e direção, mas,
funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem
preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo
(arts. 111, 115, II e V, CE/89). 2. Reiteração
de cargos, sob nova roupagem, já declarados inconstitucionais em ação direta de
inconstitucionalidade nos autos do Processo nº 2256462-37.2015.8.26.0000. 3. Violação de dispositivos da
Constituição Estadual (arts. 30, 98, §§ 1º a 3º, 111, 115, I, II e V, e art.
144).
O
PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO,
no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar
Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no
art.125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda
no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de
São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 63.25/2016,
que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei nº 7.475,
de 19 de maio de 2016, do Município de Guarulhos, pelos fundamentos expostos a
seguir:
1.
DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
A Lei nº 7.475, de 19 de maio de 2016, do Município
de Guarulhos, que “Altera a Estrutura
Administrativa da Câmara Municipal de Guarulhos, restabelecendo os cargos que
especifica, integrando-os ao quadro de pessoal desta Edilidade e dá outras
providências”, possui a seguinte redação:
“(...)
Art. 1º - Em
decorrência da anulação judicial da Portaria nº 6702 em relação a
reenquadramento de servidores não estáveis, em cargos de provimento efetivo,
expedida em 14 de agosto de 1991, ficam restabelecidos na estrutura
administrativa da Câmara Municipal de Guarulhos, os cargos anteriormente
ocupados por esses servidores, conforme previsto na Lei nº 3.822/91
e especificados no Anexo I desta Lei.
§ 1º - Os cargos ora restabelecidos serão extintos nas datas de suas
respectivas vacâncias.
§ 2º - O reenquadramento nos cargos ora restabelecidos será formalizado através
de Portaria a ser expedida pelo Presidente do Poder Legislativo,
considerando-se automaticamente licenciado o servidor detentor de cargo
eletivo.
Art. 2º - Para fins de
readequação e compatibilização com a estrutura administrativa da Câmara
Municipal de Guarulhos atualmente vigente, os cargos de que trata esta Lei
terão sua denominação, remuneração e atribuições fixadas na conformidade dos
Anexos II e III integrantes desta Lei.
Art. 3º - Fica assegurado aos
servidores titulares dos cargos restabelecidos por esta Lei a percepção dos
adicionais por tempo de serviço denominados quinquênios, progressão horizontal
e sexta-parte, previstos na legislação vigente, utilizando-se como base de
cálculo o padrão de vencimento do cargo ora restabelecido, computando-se como
termo inicial para contagem do tempo a entrada em exercício no serviço público,
sendo vedada a incorporação de quaisquer outras vantagens e qualquer espécie de
equiparação salarial.
Art. 4º -
Fica mantida a vinculação dos servidores que titularizarem os cargos previstos
nesta Lei, ao Regime Próprio de Previdência do Município de Guarulhos, com
fundamento na orientação normativa contida no Parecer GM 030 exarado pela
Advocacia Geral da União e publicado no Diário Oficial da União em 03 de abril
de 2003 e adotado nas Orientações Normativas editadas pelo Ministério da
Previdência Social para aplicação nos regimes próprios de previdência social
dos servidores públicos efetivos.
§ 1º - A contribuição previdenciária ao regime próprio incidirá sobre a
remuneração no cargo titularizado pelo servidor, acrescido das vantagens
previstas no art. 3º, e deverá ser recolhida ao Instituto de Previdência dos
Funcionários Públicos Municipais de Guarulhos - IPREF, na forma e condições
estabelecidas pela Lei Municipal nº 6.056,
de 24 de fevereiro de 2005.
§ 2º - Incumbirá à Câmara Municipal de Guarulhos a continuidade do repasse ao
IPREF da contribuição do servidor, bem como da contribuição a seu cargo, que
terá a mesma base de incidência prevista no § 1º deste artigo.
Art. 5º - Ficam assegurados os
benefícios previdenciários previstos na Lei Municipal nº 6.056,
de 24 de fevereiro de 2005, na conformidade de suas disposições e das contidas
na Constituição Federal, considerada a data de ingresso no serviço público
municipal.
Art. 6º - Ficam convalidados
todos os atos de concessão de aposentadoria aos servidores detentores dos
cargos mencionados no art. 1º desta Lei.
Art. 7º - Aplica-se o disposto
nesta Lei, no que couber, aos beneficiários das pensões legadas pelos
servidores que titularizaram então referidos cargos.
Art. 8º - Esta Lei entrará em
vigor na data de sua publicação, revogando as disposições em contrário, especialmente
a Lei nº 7.382/15.
(...)
(...)”
Os atos normativos transcritos, na parte em que
preveem os cargos em comissão mencionados, são inconstitucionais por violação
dos arts. 111, 115, incisos I, II e V, e 144 da Constituição Estadual, conforme
passaremos a expor.
2.
O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE
A Lei nº 7.475, de 19 de maio de 2016, do Município de
Guarulhos, contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual
está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º,
18, 29 e 31 da Constituição Federal.
Os preceitos da Constituição Federal e da
Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29
daquela e do art. 144 desta.
Tais expressões são incompatíveis com os seguintes
preceitos da Constituição Estadual:
“Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;
(...)
Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”
3. DA REITERAÇÃO DE CARGOS SOB NOVA
ROUPAGEM
Inicialmente, cumpre destacar que todos os cargos
impugnados nesta ação direta, já foram declarados inconstitucionais por este
Egrégio Tribunal de Justiça, nos autos do Processo nº 2256462-37.2015.8.26.0000.
Naquela oportunidade, os mesmos 38 (trinta e oito) cargos
aqui impugnados possuíam as seguintes nomenclaturas (Lei nº 7.382, de 18 de
junho de 2015, do Município de Guarulhos, repita-se, já declarada
inconstitucional):
“ANEXO I
RELAÇÃO DOS
CARGOS CRIADOS
Qde |
Situação Nova |
Remuneração/Escolaridade |
02 |
Assessor de Gestão |
R$ 10.500,00 - NE 1 |
08 |
Assessor de Gestão I |
R$ 8.500,00 - NE 1 |
14 |
Assessor de Gestão II |
R$ 6.500,00 - NE 0 |
14 |
Assessor de Gestão III |
R$ 4.500,00 - NE 0 |
38 |
Total |
|
(...)” (destaque nosso)
Em verdade, o ato normativo ora impugnado (Lei nº
7.475/16, de Guarulhos) restabeleceu os mesmos 38 (trinta e oito) cargos da Lei
nº 7.382/15, de Guarulhos, sob nova roupagem, desrespeitando – uma vez mais – a
Constituição Bandeirante, como passamos a expor.
4. DAS ATRIBUIÇÕES, DA NATUREZA
ORDINÁRIA DOS CARGOS RESTABELECIDOS, E DA SUA INDEVIDA CONSTITUIÇÃO PELA VIA
COMISSIONADA
A Lei nº 7.475/16, do Município de Guarulhos, em seu
Anexo III, trouxe previsão das atribuições dos cargos ora impugnados, nos
seguintes termos:
“(...)
ANEXO III
ATRIBUIÇÕES
Agente Legislativo I
Atuar no Setor de Transportes: - organizando o uso das viaturas para o atendimento dos diversos departamentos; - controlando a manutenção preventiva e corretiva das viaturas de modo a mantê-las em perfeitas condições de uso; - controlando o acesso nos estacionamentos de uso do Poder Legislativo; - organizando as viaturas nas vagas respectivas;
Atuar no Setor de Atas: - inserindo os expedientes administrativos e legislativos na ata dos trabalhos respectivos; - atendendo às solicitações dos superiores hierárquicos; - executando serviços de digitação diversos; - elaborando o Relatório Anual das Atividades;
Assessor Técnico
Atuar no Setor de Plenário: - assessorando a Presidência no decorrer dos trabalhos das sessões ordinárias, extraordinárias, especiais e de julgamento; - autuando os projetos, controlando os prazos diversos e tramitações diferenciadas; - elaborando as pautas das sessões, distribuindo-as dentro do prazo legal; - controlando a frequência dos parlamentares e servidores lotados no departamento; - redigindo correspondências diversas; - mantendo atualizados os sistemas de informática utilizados pelo departamento; - participando de comissões e grupos de trabalho, quando solicitado, efetuando as atividades determinadas pelos respectivos Presidentes;
Auxiliar Legislativo I
Prestar atendimento no Setor de Plenário, auxiliando: - no atendimento dos Vereadores nas Frentes Parlamentares; - na redação das atas das reuniões das Frentes Parlamentares e grupos de trabalhos administrativos em que for designado; - na execução dos serviços de digitação diversos; - nas inscrições dos oradores da Tribuna Livre; - nas autuações dos processos legislativos;
Atuar no Setor do Departamento Pessoal, auxiliando: - na manutenção atualizada das informações dos servidores e parlamentares; - na expedição de certidões diversas; - nos levantamentos em prontuários; - na autuação dos processos administrativos diversos; - na redação de correspondências pertinentes ao setor;
Atuar no Setor de Cerimonial, auxiliando: - nos preparativos das sessões solenes; - no assessoramento dos trabalhos das sessões solenes; - na manutenção atualizada do cadastro de autoridades e ocupantes de cargos públicos e privados diversos;
- na redação de correspondências solicitadas pelo superior hierárquico;
Atuar no Setor Administrativo, auxiliando: - na organização da cessão de uso do Plenário; - no atendimento das reivindicações dos parlamentares e servidores; - na redação de correspondências solicitadas pelo superior hierárquico; - grupos de trabalho, quando solicitado;
Atuar no Setor de Biblioteca, auxiliando: - no atendimento das pessoas que buscam informações no local; - na organização do acervo; - na autuação dos processos administrativos encaminhados ao setor; - na redação de correspondências solicitadas pelo superior hierárquico;
Auxiliar Legislativo
II
Atuar no Telecentro, auxiliando: - no atendimento das pessoas que buscam utilizar referido serviço público; - na organização do uso dos equipamentos; - na distribuição das impressões dos documentos solicitados; - na orientação das pesquisas, quando solicitado;
Atuar na Diretoria de Cerimonial, auxiliando: - nos trabalhos de preparação dos eventos; - nas atividades das sessões solenes; - no atendimento às reivindicações dos diversos departamentos, em relação ao fornecimento de nomes de autoridades e dirigentes de órgãos públicos e privados; - na atuação de processos administrativos;
Atuar no Setor de Ouvidoria, auxiliando: - nos atendimentos telefônicos e eletrônicos, encaminhando para o setor pertinente; - na entrega de correspondências diversas;
Atuar no Setor de Imprensa, auxiliando: - no registro das imagens das sessões;
Jornalista
Atuar no Setor de Imprensa: - encaminhando documentos diversos para a efetivação da publicação em órgãos oficiais; - redigindo matérias; - prestando informações sobre as atividades do Legislativo;
Oficial de Vigilância
e Zeladoria
Atuar no Setor Administrativo: - buscando solucionar os problemas relacionados à sua área de atuação apontados pelos servidores; - atendendo as solicitações do superior hierárquico;
Oficial Legislativo V
Atuar na Procuradoria Especial da Mulher: - promovendo atendimento e encaminhamento para recebimento de orientações; - atendendo contatos telefônicos e eletrônicos, efetuando as devidas anotações; - controlando o número de atendimentos para a execução dos diversos relatórios;
Atuar no Setor de Comissões: - promovendo os levantamentos solicitados; - recebendo os projetos analisados, verificando se as comissões pertinentes manifestaram-se; - verificando os lançamentos das autuações no sistema de informática respectivo; - participando de grupos de trabalho, quando solicitado;
Atuar no Departamento Pessoal: - promovendo as anotações de benefícios diversos para lançamento na folha de pagamento; - autuando os processos administrativos relacionados a servidores; - controlando a escala de férias dos servidores; - controlando a frequência dos servidores e parlamentares;
Atuar no Setor de Tesouraria: - promovendo os lançamentos solicitados; - autuando os processos encaminhados ao setor, segundo as orientações do superior hierárquico; - atendendo as solicitações do superior hierárquico;
Atuar no Setor de Cerimonial: - auxiliando o superior hierárquico nas atividades pertinentes à Diretoria; - autuando os processos administrativos encaminhados ao departamento, segundo as orientações do superior hierárquico; - promovendo os contatos externos para a manutenção atualizada dos registros pertinentes ao departamento; - atendendo as pessoas que buscam informações sobre o Legislativo;
Atuar no Setor de Ouvidoria: - buscando prestar as informações solicitadas pelos usuários; - operando o sistema de informática existente no departamento; - realizando os relatórios pertinentes; - efetuando os contatos externos necessários ao desempenho das atividades;
Atuar no Setor de Expedição de Correspondências: - recebendo as correspondências a serem expedidas e promovendo o devido encaminhamento; - produzindo os relatórios diversos referentes às atividades; - atendendo e orientando aqueles que dirigem-se ao setor;
Atuar no Setor de Plenário: - autuando os processos legislativos, segundo as deliberações plenárias; - promovendo o atendimento dos cidadãos; - auxiliando nos trabalhos das sessões plenárias; - operando o painel eletrônico; - atendendo os parlamentares;
Oficial Legislativo IV
- GO-4
Atuar no Setor de Transportes: - efetuando serviços de digitação; - controlando as viaturas utilizadas por esta Diretoria; - controlando as multas atribuídas aos veículos oficiais e promovendo a devida cobrança; - efetuando o levantamento dos problemas apresentados pelas viaturas e respectivos condutores;
Atuar no Setor de Departamento Pessoal: - auxiliando o superior hierárquico; - promovendo os devidos lançamentos e cálculos na folha de pagamento; - atendendo os servidores, orientando-os nos questionamentos e reivindicações; - elaborando os relatórios diversos pertinentes ao setor; - controlando as nomeações;
Oficial Legislativo IV
- GO-2
Atuar no Setor de Comissões: - auxiliando nos trabalhos das Frentes Parlamentares; - atendendo as reivindicações dos Vereadores; - redigindo correspondências diversas; - participando de grupos de trabalho, quando solicitado;
Atuar no Setor de Cerimonial: - assessorando os trabalhos das sessões solenes; - elaborando o roteiro dos diversos eventos; - efetuando contatos com órgãos públicos objetivando o aprimoramento das atividades;
Oficial Legislativo
III - GO-4
Atuar no Setor de Imprensa: - catalogando o arquivo fotográfico; - promovendo a recuperação de imagens; - atendendo as solicitações do superior hierárquico;
Oficial Legislativo
III - GO-2
Atuar no Setor de Comissões: - autuando processos legislativos; - atendendo os parlamentares nas diversas reivindicações; - promovendo levantamentos necessários à elaboração de relatórios; - participando de grupos de trabalho, quando solicitado;
Oficial Legislativo II
- GO-2
Atuar no Departamento Pessoal: - auxiliando os trabalhos de elaboração de folha de pagamento; - autuando processos administrativos referentes às reivindicações dos servidores e parlamentares; - efetuando controles diversos pertinentes à rotina de pessoal; - operando o sistema de informática disponível no setor;
Oficial Legislativo I
Atuar no Setor de Informática: - auxiliando o superior hierárquico; - atendendo as reivindicações dos servidores e parlamentares, buscando as respectivas soluções; - elaborando relatórios diversos; - efetuando levantamentos de produtos disponíveis no mercado na área de informática que atendam às necessidades do Poder Legislativo;
Programador
Atuar nos Departamentos: - operando o sistema de informática disponível, detectando as falhas apresentadas e buscando o devido aperfeiçoamento; - lançando dados diversos no software destinado à elaboração das atividades; - atendendo os usuários do sistema de informática nos esclarecimentos das dúvidas diversas.
(...)”
Da leitura do ato normativo impugnado supra,
percebe-se a tentativa do legislador municipal em discriminar as atribuições
dos cargos comissionados acima referidos no modelo de livre nomeação a fim de
assessorar na consultoria legislativa da Câmara Municipal de Guarulhos, em
virtude da suposta natureza fiduciária exigida dos ocupantes de cargos desse
jaez.
No entanto, ainda que se considere tais atribuições
descritas, a edição dos referidos cargos se alicerçou na forma de provimento em
comissão, cujo plexo de atribuições reclama funções de direção, chefia e
assessoramento, não se exigindo árdua ginástica hermenêutica para se concluir
que tais cargos revelam plexo de caráter estritamente ordinário, de sorte a
restar patente a inconstitucionalidade da edição dos aludidos postos nos moldes
em que foram editados, pelos seguintes fundamentos.
A instituição de cargos em comissão, à luz da Carta
Republicana de 1988, não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou
desproporcional.
Em respeito ao art. 37, II e V, da Constituição
Federal de 1988, reproduzido no art. 115, II e V, da Constituição Estadual, sua
edição impõe a presença das atribuições de assessoramento, chefia e direção
para as quais se empenhe relação de confiança, sendo defesa, portanto, ao
exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o
provimento efetivo precedido de aprovação em certame de provas ou de provas e
títulos (art. 115, II e V, CE).
Conforme balizada jurisprudência, não é lícito à lei
declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, mas
tão somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de
natureza política de assessoramento, chefia e direção.
Ou seja, a instituição de cargo desse jaez somente
encontra fundamento legítimo quando alicerçada em atribuições de natureza
especial (assessoramento, chefia e direção em nível superior), às quais se
exige relação de confiança, pouco importando a denominação ou forma de
provimento atribuídas, pois,
Destarte, em obediência aos imperativos da Carta
Maior, na edição de cargos comissionados se faz necessária a perquirição de sua
natureza excepcional amparada no elemento fiduciário, não satisfeito pela mera
declaração do legislador quando da atribuição do nome in iuris ao cargo, sendo assaz relevante uma análise do plexo de
atribuições das funções públicas, que reclama as conhecidas atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a
necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho
de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes
político-governamentais.
Impende consignar que remansosa é a jurisprudência
neste sentido, a qual proclama a
inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão
dotados de atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, exigindo delas,
ao revés, a demonstração efetiva da presença de funções concernentes a
assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel.
Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ
05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p.
16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u.,
DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias
Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz
Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00,
Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008).
Entretanto, na contramão dos entendimentos
perfilhados no curso desta inicial, a Lei nº 7.475, de 19 de maio de 2016, do
Município de Guarulhos, editou os cargos vergastados em contrariedade aos
mandamentos constitucionais incidentes sobre a temática.
A partir da análise das funções desempenhadas pelos
ocupantes dos referidos postos, é cristalino o vício na forma elegida pelo
legislador para a instituição dos cargos em epígrafe, posto que suas atribuições
arroladas no Anexo III do aludido diploma evidenciam funções meramente
burocráticas e ordinárias, a ponto de não se permitir a excepcional via do
provimento em comissão.
Ora, as atividades analisadas no tópico anterior não
exigem de seu ocupante especial relação de confiança para com o agente político
que o nomeou, porquanto não se encontram em espectro voltado à articulação, à
coordenação, à supervisão e ao controle de diretrizes político-governamentais.
Em verdade, as funções descritas no acostado
dispositivo revelam, isso sim, o caráter ordinário dos cargos comissionados, vez que podem ser desempenhadas por qualquer agente dotado
de conhecimentos técnicos na respectiva área de atuação, não se fazendo
razoável, portanto, a burla à regra de provimento erigida pelo
Constituinte Originário, que se funda na escolha de agentes via concurso
público, sob pena de afronta direta ao texto constitucional.
Ante os argumentos expostos, é clara a inconstitucionalidade
dos cargos de provimento em comissão, previstos na Lei
nº 7.475, de 19 de maio de 2016, do Município de Guarulhos, devendo este E. Tribunal de Justiça, em prol da coesão do
sistema jurídico municipal e em defesa do patrimônio público, reconhecer o
vício ora apontando, afastando, por conseguinte, servidores lotados
irregularmente em tais postos no âmbito municipal.
5. PEDIDO LIMINAR
À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se
a ele o periculum in mora. A atual
tessitura dos preceitos legais da Câmara Municipal de Guarulhos apontados como
violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é
sinal, de per si, para suspensão de
sua eficácia até final julgamento desta ação, de maneira a evitar oneração do
erário irreparável ou de difícil reparação.
À
luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até
final e definitivo julgamento desta ação da Lei nº 7.475, de 19 de maio de 2016,
do Município de Guarulhos.
6.
DO PEDIDO
Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e
processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada
procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei nº 7.475, de 19 de
maio de 2016, do Município de Guarulhos.
Requer-se ainda que sejam requisitadas informações à
Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Guarulhos, bem como posteriormente
citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo
impugnado.
Posteriormente, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
Termos em que, aguarda-se deferimento.
São Paulo, 30 de agosto de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aaamj/dcm
Protocolado nº 63.25/2016
Assunto: Informa que a despeito da declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 7.382/15, do Município de Guarulhos, o Presidente da Câmara Municipal de Guarulhos segue com intenção de aprovar nova lei, em tese, indevida. Anexa segue cópia do projeto de lei nº 1.437/16
1.
Distribua-se a inicial da ação direta de
inconstitucionalidade, em face da Lei nº 7.475, de 19 de maio de 2016, do
Município de Guarulhos, junto ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2.
Oficie-se ao interessado,
informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 30 de agosto de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aaamj/dcm