EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 93.424/16
Constitucional.
Urbanístico. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar n. 572, de 31
de dezembro de 2015, do Município de São José dos Campos. Ausência de
participação comunitária e planejamento prévio.
Reserva da Administração. 1. Inconstitucional lei municipal que dispõe sobre parcelamento,
uso e ocupação do solo e não assegura a participação comunitária e o planejamento
específico em seu processo legislativo. Contrariedade aos arts. 180, II, 181, §
1º, e 191 da Constituição Paulista. 2.
Iniciativa parlamentar. Matéria relativa à gestão da cidade. Reserva de
administração. Contrariedade ao disposto no art. 5º, caput, e ao art. 47, II e XIV, da Constituição Paulista.
O PROCURADOR-GERAL
DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no
art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de
1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso
IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90,
inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações
colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 93.424/16), vem perante esse Egrégio
Tribunal de Justiça promover, pelos fundamentos adiante expostos, a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei Complementar n. 572, de 31 de dezembro de
2015, do Município de São José dos Campos, pelos fundamentos expostos a seguir.
1. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO
A Lei Complementar n. 572, de 31 de dezembro de 2015, do Município de São José dos Campos, fruto de iniciativa parlamentar, que “Dispõe sobre a regularização de edificações e usos que estejam em desacordo com a lei de uso e ocupação do solo e com o Código de Edificações do Município e dá outras providências", tem a seguinte redação:
“Art. 1º Fica
o Executivo autorizado a promover a legalização de edificações que estejam em
desacordo com a lei de uso e ocupação do solo e com o Código de Edificações do
Município, desde que atendidas as exigências desta lei complementar.
Art. 2º Todas
as edificações, que se encontrem concluídas, prescindindo apenas dos
acabamentos, poderão ser legalizadas para o uso que se encontre consolidado no
local, desde que atendidas, cumulativamente, as condições abaixo:
I - não
estejam localizadas em áreas de risco;
II - não
estejam localizadas em áreas de proteção ambiental, várzeas ou áreas de
preservação permanente;
III - apresentem
condições mínimas de segurança, habitabilidade e higiene;
IV - estejam
localizadas em loteamentos regulares ou regularizados, liberados para
construção.
§ 1º Para
o reconhecimento como, independente da existência de projeto aprovado ou do
“habite-se”, a sua comprovação de existência poderá ser realizada mediante
laudo subscrito por engenheiro ou arquiteto devidamente matriculado no Conselho
Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA, e demais requisitos constantes de
decreto regulamentador;
§ 2º Não
será permitida a legalização de edificações que sejam, objeto de construção ou
ampliação na vigência desta lei Complementar.
Art. 3º Para
fazer jus aos benefícios de que trata esta lei complementar, o proprietário ou
possuidor da edificação deverá protocolar o pedido no prazo de 2 (dois) anos,
contado da data de entrada em vigor desta lei complementar, por meio de
processo administrativo eletrônico, instruído com os seguintes documentos:
I - requerimento
padrão, a ser fornecido pela Administração Pública;
II - cópia
do CNPJ (pessoa jurídica) ou CPF e RG (pessoa física) do proprietário;
III - Anotação
de Responsabilidade Técnica - ART ou Registro de Responsabilidade Técnica - RRT
do profissional responsável com a respectiva comprovação de quitação e que
possua inscrição regular no Município.
IV - certidão
de ações cíveis;
V - documento
comprovando a propriedade ou posse do imóvel, tomando-se como referência as
dimensões do lote ou gleba aprovado pelo Município.
VI - 2
cópias do projeto simplificado, conforme modelo anexo I e I-A.
VII - formulário
indicando qual parâmetro urbanístico não foi atendido, conforme modelo anexo
II;
VIII - Termo
de abertura da Caderneta de Obras, acompanhado do respectivo laudo, conforme
modelo definido pela Associação de Engenheiros e Arquitetos - AEA.
IX - autorização
do Comando Aéreo Regional - COMAER - para projetos situados dentro da área do
Aeródromo de São José dos Campos, nos casos previstos na Portaria 957/GC3 de 15
de julho de 2015;
X - autorização
do Conselho do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico -
CONDEPHAAT do Estado de São Paulo, quando se tratar de imóveis situados dentro
dos perímetros sujeitos à anuência prévia por aquele Conselho.
XI - autorização
da Companhia de Engenharia de Saneamento Ambiental - CETESB, órgão ambiental
estadual, quando o projeto de edificação for objeto de licenciamento ambiental;
§ 1º A
não apresentação da documentação elencada nos incisos do presente artigo
sujeita o processo ao indeferimento sumário, não cabendo reconsideração por
esta ausência documental.
§ 2º A
documentação complementar, necessária ao licenciamento do uso não residencial,
junto à Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Ciência e Tecnologia, deverá
ser apresentada por ocasião da solicitação da Inscrição Municipal e respectivo
Alvará de Funcionamento.
Art. 4º Exclusivamente
para os usos classificados como polo gerador de tráfego nível P2, nos termos do
Decreto 14.845/11, será realizada análise conjunta, sob a coordenação da
Secretaria de Obras com a participação das demais Secretarias pertinentes, com
a emissão de parecer final relacionando eventuais medidas mitigadoras a serem
implementadas pelo responsável pela edificação.
Art. 5º O
requerente poderá optar pela Legalização Automática Responsável - LAR - para
edificações até o limite total de 500,00m² (quinhentos metros quadrados) afim
de promover uma maior celeridade do processo.
Parágrafo único. A
opção pela LAR se dará por meio de requerimento específico, conforme modelo
anexo III.
Art. 6º Os
processos protocolados por meio da LAR prescindirão de análise, ficando contudo
reservado à Prefeitura Municipal de São José dos Campos o direito de auditar o
processo, a qualquer momento, afim de comprovar a veracidade do projeto e
declarações apresentadas.
Art. 7º Constatada
qualquer divergência no projeto ou nas declarações apresentadas na LAR serão
aplicadas cumulativamente as seguintes penalidades:
I - anulação
do processo;
II - suspensão
da inscrição municipal do Responsável Técnico por 6 (seis) meses;
III - no
caso de reincidência a suspensão será de 12 (doze) meses;
IV - multa
ao proprietário do imóvel no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Parágrafo único. O
respectivo Conselho Regional, ao qual o Responsável Técnico esteja vinculado,
será notificado da penalidade aplicada.
Art. 8º Para
os usos desconformes, deverá ser comprovado que a edificação ou atividade,
estava instalada no local, antes da entrada em vigor da presente lei
complementar:
I - quando
se tratar de uso residencial, pelo lançamento tributário;
II - pelo
exercício da atividade por meio da apresentação do CNPJ, incluindo neste as
Instituições religiosas;
III - cadastro
de Micro Empreendedor Individual - MEI;
IV - pessoa
física prestadora de serviço ou comerciante;
a) qualquer
documento público expedido por órgãos federais, estaduais ou municipais, que
comprovem o início da atividade;
b) processos
de Alvará de Funcionamento protocolados na Prefeitura, mesmo indeferidos;
c) quaisquer
notificações, autuações ou multas sobre o funcionamento de firmas que provem o
exercício anterior;
d) quaisquer
documentos protocolizados na Prefeitura que digam respeito às atividades da
firma;
e) quaisquer
documentos que comprovem o início da atividade em nome do interessado e local
pretendido.
Art. 9º Afim
de promover a acessibilidade, os imóveis de uso não residencial deverão dispor
de pelo menos uma instalação sanitária adaptada, sem prejuízo da acessibilidade
vertical e horizontal.
Art. 10. As
construções irregulares que estiverem sob processo de ação demolitória somente
poderão ser beneficiadas por esta lei complementar nas seguintes situações:
I - havendo
anuência da Prefeitura para desistência da ação;
II - após
pagamento das respectivas custas judiciais e dos honorários advocatícios;
III - após
a reparação dos danos causados a terceiros ou desistência expressa destes
últimos aos ressarcimentos devidos.
Art. 11. Será
fornecido gratuitamente pela Prefeitura Municipal o projeto de legalização para
a edificação residencial unifamiliar que contenha área total edificada não
superior a 100,00m² (cem metros quadrados), podendo ser acrescida de até
25,00m² (vinte e cinco metros quadrados) de abrigo desmontável.
§ 1º O
disposto no “caput” deste artigo aplica-se apenas àqueles que satisfaçam
os seguintes requisitos:
I - ser
proprietário ou possuidor de um único imóvel;
II
- ter renda familiar mensal que não ultrapasse a 6 (seis) salários
mínimos;
§ 2º Ficam
isentos de taxas, emolumentos ou outras exações, os imóveis com área total
edificada não superior a 100,00m² (cem metros quadrados), podendo ser acrescida
de até 25,00m² (vinte e cinco metros quadrados) de abrigo desmontável para fins
de legalização.
§ 3º Poderão
fazer jus ao disposto no caput do presente artigo os usos
comerciais e serviços e de uso misto, que contenham área total edificada não
superior a 100,00m² (cem metros quadrados).
§ 4º Para
o fim de viabilizar o atendimento das providências pertinentes ao Município,
constante no “caput” deste artigo, fica a Prefeitura Municipal
autorizada a firmar convênio com entidade ou instituição qualificada, com
despesas até o limite de R$ 500.000,00 (Quinhentos mil reais), que correrão a
conta da dotação orçamentária nº 35.10-339039-15.451.0019.2024-01-110000 já
devidamente consignada no orçamento vigente.
Art. 12. Para
fazer jus aos benefícios previstos no artigo 11 desta lei complementar os
pedidos deverão ser protocolados pelo interessado, instruídos com os seguintes
documentos:
I - requerimento
padrão, a ser fornecido pela Administração Pública;
II - documento
comprovando a propriedade ou posse do imóvel, tomando-se como referência as
dimensões do lote ou gleba aprovado pelo Município;
III - comprovante
de renda familiar de no máximo 6 (seis) salários mínimos;
IV - declaração
de que é proprietário de um único imóvel.
Art. 13. Para
fins de legalização da edificação nos imóveis onde esteja caracterizado o interesse
do desdobro do lote edificado ou de proprietários distintos, fica permitido o
desdobro do lote, desde que solicitado pelo interessado, prescindindo da
regularidade das edificações.
Parágrafo único. Caso
o lote seja edificado fica admitido o desdobro e a legalização da construção
deste, desde que observada a área mínima de 125,00m² (cento e vinte e cinco
metros quadrados) e testada mínima de 5,00m (cinco metros) para cada lote.
Art. 14. Nos
casos onde a edificação ocupe mais de um lote, sendo eles de proprietários
distintos, será admitida a legalização da construção desde que se obtenha no
processo administrativo a anuência de todos os proprietários, sendo autorizada
anexação dos lotes somente para efeitos tributários no Município.
Parágrafo único. Deverá
ser juntado no processo administrativo o termo de ciência e responsabilidade do
proprietário da edificação de que a anexação não implica no direito de registro
no Cartório de Registro de Imóveis.
Art. 15. Qualquer
notificação (“Comunique-se”) para atendimento de solicitações feitas nos
processos referentes a presente legalização deverá ser atendida e sanada no
prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias, contados da data de recebimento da
notificação devidamente comprovada, excetuada as situações previstas nos artigos 4º e 5º desta lei
complementar, cabendo recurso do indeferimento no limite máximo de 6
(seis) meses após a comprovação da comunicação.
Art. 16. Não
incidirá a cobrança de emolumentos sobre as áreas anteriormente regularizadas:
I - áreas
existentes anteriormente à 1970;
II - áreas
tributadas a mais de 10 anos que já receberam o Certificado de Regularidade ou
que venham a recebe-lo;
III - as
áreas que possuírem Habite-se.
Parágrafo único. A
não incidência prevista no caput do presente artigo se aplica
desde que não tenha ocorrido a mudança de uso.
Art. 17. Somente
serão consideradas legalizadas as edificações depois de efetuado o pagamento
dos emolumentos, das taxas de aprovação do projeto e do Imposto Sobre Serviços
de Qualquer Natureza - ISSQN.
§ 1º Os
valores referentes aos pagamentos de emolumentos serão creditados ao Fundo
Municipal de Habitação.
§ 2º É
parte integrante desta lei complementar o Anexo IV, incluso, que estabelece a
tabela de emolumentos a serem pagos.
Art. 18. Será
concedido o desconto de 50% (cinquenta por cento) sobre os emolumentos decorrentes
da edificação sem licença, para os imóveis a serem legalizados, com metragem
construída máxima de 100,00m² (cem metros quadrados), acrescida de até 25,00m²
de abrigo desmontável com o pagamento máximo de R$ 500,00 (quinhentos reais).
Art. 19. Fica
admitida a legalização dos imóveis localizados no Jardim Altos de Santana
situados nas quadras em fase de retificação do registro junto ao Cartório de
Registro de Imóveis, desde que atendidas as disposições desta lei complementar.
Art. 20. O
imóvel que fizer jus a presente lei complementar, não poderá utilizar outra
legalização de imóvel por um período de 5 (cinco) anos, contados a partir da
data de aprovação do projeto.
Art. 21. As
despesas totais com a execução desta lei complementar estão estimadas em R$
1.000.000,00 (um milhão de reais) e correm por conta da dotação orçamentária nº
90.10-339039-16482.0060-2003-01-110000, suplementada em até 20% (vinte por
cento), se necessário.
Art. 22. Esta
lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogada
a lei
complementar 483/2012.”
O ato normativo impugnado padece de incompatibilidade vertical com a Constituição do Estado de São Paulo, como adiante será demonstrado.
2. DO PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE
O referido diploma legal e seu processo legislativo contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal, por força do seguinte preceito, ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31, da Constituição Federal:
“(...)
Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)”.
A lei local impugnada contrasta os seguintes preceitos da Constituição Paulista:
“(...)
Art. 5º. São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
(...)
Art. 47. Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:
(...)
II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;
(...)
XIV - praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo;
(...)
Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 180. No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:
(...)
II - a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, plano, programas e projetos que lhes sejam concernentes;
(...)
Art. 181. Lei municipal estabelecerá em conformidade com as diretrizes do plano diretor, normas sobre zoneamento, loteamento, parcelamento, uso e ocupação do solo, índices urbanísticos, proteção ambiental e demais limitações administrativas pertinentes.
§ 1º - Os planos diretores, obrigatórios a todos os Municípios, deverão considerar a totalidade de seu território municipal. (g. n.)
(...)
Art. 191. O Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico.
(...)”.
O ato normativo impugnado é fruto de iniciativa parlamentar. Foi discutido e aprovado pela Câmara Municipal, sem que tenha havido efetivo planejamento, bem como oportunidade para participação popular.
Não há qualquer dúvida quanto à indispensabilidade de planejamento prévio e de participação popular, princípios que devem ser observados na edição de leis relacionadas ao zoneamento e ao uso do solo.
As expressões colocadas em destaque nos dispositivos acima transcritos (diretrizes, desenvolvimento urbano, participação, entidades comunitárias, plano, programas, projetos, diretrizes, plano diretor, uso e ocupação do solo, proteção ambiental, totalidade do território municipal), não deixam qualquer dúvida de que:
(a) é obrigatória a existência de Plano Diretor em todos os Municípios do Estado de São Paulo;
(b) a ocupação e uso do solo devem ser realizados mediante planejamento prévio e com imprescindível participação popular;
(c) esse planejamento e essa participação também são imprescindíveis no que diz respeito à ocupação e uso do solo com vistas à proteção ambiental;
(d) esse planejamento prévio e essa participação popular, que devem estar presentes no processo de elaboração da legislação referente ao uso e ocupação do solo, inclusive com vistas à proteção ambiental, devem ser feitas de modo global, ou seja, contextualizado, levando em consideração todo o território do Município, advindo daí a exigência de que todos os Municípios tenham Plano Diretor.
Em
síntese: planejamento prévio e participação popular, nos termos acima
delineados, são imprescindíveis à legitimidade constitucional da legislação
relacionada ao uso do solo.
Não
é só.
A disciplina referente à gestão da cidade decorre, essencialmente, da administração realizada pelo Chefe do Executivo, a chamada “reserva da administração”. Na hipótese em exame - tendo em vista que a iniciativa do diploma normativo impugnado foi parlamentar - restou violado o princípio da separação dos poderes (art. 5º, art. 47, II e XIV, da Constituição Paulista, que reproduzem a diretriz contida no art. 2º da Constituição Federal).
De antemão, cumpre registrar que
entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na prática, negativa de vigência
aos arts. 5º, caput, 47, II e XIX, 180,
II, 181, § 1º, e 191, da Constituição Estadual, cuja aplicabilidade à hipótese
decorre de seu art. 144.
3.
DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO PLANEJAMENTO
O ato normativo impugnado desrespeitou a necessidade de planejamento, princípio que deve ser observado na edição de leis relacionadas à instituição de diretrizes urbanas.
Nos termos dos arts. 180, II, e 181, § 1º, da Constituição Estadual, pode-se extrair que planejamento é indispensável à validade e legitimidade constitucional da legislação relacionada ao desenvolvimento urbano.
E não poderia ser diferente, vez que eventuais alterações nesta temática produzem significativas modificações na geografia e dinâmica urbana, seja em termos de mobilidade, saneamento, questões ambientais e outras, sendo imperiosa a elaboração de minucioso planejamento técnico destinado a apontar eventuais desdobramentos resultantes da mudança do ordenamento urbano.
Assim sendo, todo e qualquer regramento concernente ao zoneamento urbano, seja em sede inaugural ou em razão de futuras alterações necessárias no curso do desenvolvimento do território, deve levar em consideração a cidade em sua dimensão integral, dentro de um sistema de ordenamento urbanístico, razão pela qual a exigência de estudos técnicos se faz imprescindível.
Dessa
forma, não há dúvida de que o planejamento é necessário na fase de elaboração
do Plano Diretor. Mas não é suficiente por si só, pois todos e quaisquer
projetos de lei ulteriores, que tratem do uso do solo e da respectiva proteção
ambiental também devem ser submetidos a análises prévias.
Não
fosse assim, o legislador teria a possibilidade de alterar, a seu bel prazer, e
à revelia dos projetos e discussões realizados anteriormente, os destinos
reservados ao uso do solo e ao zoneamento na cidade. E essa interpretação
colocaria por terra os princípios do planejamento e da participação, que
inspiram as diretrizes constitucionais para a edição legislativa nessa matéria.
Cumpre
recordar que a exigência do plano diretor como “instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana”
está assentada no § 1º do art. 182 da Constituição da República. Também está respaldada
no art. 181, § 1º, da Constituição Paulista, que exige que os planos diretores,
obrigatórios em todos os Municípios, considerem a “totalidade de seu território municipal”.
Está, nesta mesma ordem de ideias, por exemplo, o art. 182, caput, da Constituição Federal, estabelecendo que “a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.
Oportuno recordar, ademais, que o inciso VIII do art. 30 da Constituição Federal prevê a competência dos Municípios para “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento, e da ocupação do solo urbano”.
É possível extrair dos dispositivos acima apontados que:
(a) a adequada política de ocupação e uso do solo é valor que conta com assento
constitucional (federal e estadual); (b) a
política de ocupação e uso adequado do solo se faz mediante planejamento
e estabelecimento de diretrizes através de lei; (c) as diretrizes para o
planejamento, ocupação e uso do solo devem constar do respectivo Plano Diretor,
cuja elaboração depende de avaliação concreta das peculiaridades de cada
Município; (d) a legislação específica sobre
uso e ocupação do solo também deve pautar-se em adequado planejamento, a ser
feito de forma global, considerando todo o território do Município.
Portanto, para que a norma urbanística tenha legitimidade e validade, deve necessariamente decorrer de um planejamento, definido como um processo técnico instrumentalizado para transformar a realidade existente de acordo com objetivos previamente estabelecidos.
Não pode decorrer da simples vontade do administrador, desprovida, em muitos casos, de elementos vinculados às reais necessidades do território e de sua população, mas de estudos técnicos que visem assegurar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (habitar, trabalhar, circular e recrear) e garantir o bem- estar de seus habitantes.
O planejamento não é mais um processo discricionário e dependente da mera vontade dos administradores. É uma previsão de exigência constitucional (art. 48, IV, 182, da CF e art. 180, II, da CE). Tornou-se imposição jurídica, mediante a obrigação de elaborar planos, estudos e congêneres, quando se trate da elaboração normativa relativa ao estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano.
Outrossim, o planejamento urbanístico não é um simples fenômeno técnico, mas um verdadeiro processo de criação de normas jurídicas, que ocorre em duas fases: uma preparatória, que se manifesta em planos gerais normativos, e outra vinculante, que se realiza mediante planos de atuação concreta, de natureza executiva.
Discorrendo a respeito do tema, Joseff Woff consigna que o plano urbanístico não constitui simples
conjunto de relatórios, mapas e plantas técnicas, configurando um acontecer
unicamente técnico. Compenetrando-se da realidade a ser transformada e das
operações de transformação que consubstanciam o processo de planejamento, sob
pena de ser mera abstração sem sentido, o plano urbanístico adquire, ele
próprio, por contaminação necessariamente dialética, as características de um
procedimento jurídico dinâmico, ao mesmo tempo normativo e ativo, no sentido de
que os anteprojetos elaborados por técnicos e especialistas adquirem a
categoria de diretrizes para a política do solo e sua edificação, ao mesmo
tempo que, em seus desdobramentos, se manifesta como conjunto de atos e
fundamentos para a produção de atos de atuação urbanística concreta. (El Planeamiento Urbanístico del Território y
lãs Normas que Garantizan su Efectividad, conforme a
A propósito do tema, José Afonso da Silva chega a observar que:
“Muitos fatores contribuem para dificultar a implantação desse processo, tais como carência de meios técnicos de sustentação, de recursos financeiros e de recursos humanos, bem assim certo temor do Prefeito e da Câmara de que o processo de planejamento substitua sua capacidade de decisão política e de comando administrativo.” (Direito Urbanístico Brasileiro, 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 83).
Para que a ordenação urbanística seja legítima, portanto, há de ter objetivos públicos, voltados para a realização da qualidade de vida dos habitantes da cidade e de quem por ela circule, à luz de suas reais necessidades e de critérios objetivos aferidos a partir de estudo técnico.
A própria sistemática constitucional - relativa à necessidade de planejamento, diretrizes, e ordenação global do território urbano - evidencia que o casuísmo, nessa matéria, não é em hipótese alguma admissível.
Entendimento
diverso, inclusive, tornaria sem valor algum todo o trabalho realizado
previamente para fins de elaboração e aprovação da Lei do Plano Diretor. A
propósito, anota Hely Lopes Meirelles (Direito
Municipal Brasileiro, 6. ed., 3. tir., São Paulo, Malheiros, 1993, p. 393 e
395):
“(...)
Toda
cidade há que ser planejada: a cidade nova, para sua formação; a cidade
implantada, para sua expansão; a cidade velha, para sua renovação. Mas não só o
perímetro urbano exige planejamento, como também as áreas de expansão urbana e
seus arredores, para que a cidade não venha a ser prejudicada no seu
desenvolvimento e na sua funcionalidade pelos futuros núcleos urbanos que
tendem a formar-se na periferia.
(...)”.
Tratando especificamente da ocupação e uso do solo, José Afonso da Silva (Direito Urbanístico, 4. ed., São Paulo, Malheiros, 2006, p. 251), em lição que mutatis mutandis é aplicável à hipótese em exame, anota que a respectiva ordenação é um dos aspectos fundamentais do planejamento urbanístico, salientando ainda que:
“(...)
recomenda-se, nessas alterações, muito critério, a fim de que não se façam modificações bruscas entre o zoneamento existente e o que vai resultar da revisão. É preciso ter em mente que o zoneamento constitui condicionamento geral à propriedade, não indenizável, de tal maneira que uma simples liberação inconseqüente ou um agravamento menos pensado podem valorizar demasiadamente alguns imóveis, ao mesmo tempo que desvalorizam outros, sem propósito. É conveniente que o zoneamento resultante da revisão ou da alteração constitua uma progressão harmônica do zoneamento revisado ou alterado, para não causar impactos, que, por sua vez, geram resistências que dificultam sua implantação e execução. É prudente avançar devagar, mas com firmeza, energia e justiça.
(...)”.
Destacando a importância do planejamento urbanístico e da necessária razoabilidade de que se deve revestir a legislação elaborada nesta matéria, recorda Toshio Mukai (Temas atuais de direito urbanístico e ambiental, Belo Horizonte, Editora Fórum, 2004, p. 29), que:
“(...)
a ocupação e o desenvolvimento dos espaços habitáveis, sejam eles no campo ou na cidade, não podem ocorrer de forma meramente acidental, sob as forças dos interesses privados e da coletividade. Ao contrário, são necessários profundos estudos acerca da natureza da ocupação, sua finalidade, avaliação da geografia local, da capacidade de comportar essa utilização sem danos para o meio ambiente, de forma a permitir boas condições de vida para as pessoas, permitindo o desenvolvimento econômico-social, harmonizando os interesses particulares e os da coletividade.
(...)”.
Do mesmo sentir é o pensamento de José dos Santos Carvalho Filho (Comentários ao Estatuto da Cidade, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris Editora, 2006, p. 25/26), ao afirmar que o planejamento, em matéria urbanística, consiste em:
“(...)
processo prévio de análise urbanística pelo qual o Poder Público formula os
projetos para implementar uma política de transformação das cidades com a
finalidade de alcançar o desenvolvimento urbano e a melhoria das condições de
qualquer tipo de ocupação dos espaços urbanos.
(...)
constitui, indiscutivelmente, um dos princípios básicos do Poder Público.
(...)”.
A partir da análise da Lei Complementar n. 572, de 31 de dezembro de 2015, do Município de São José dos Campos, e de seu processo legislativo, verifica-se que o diploma objeto da impugnação não está fundado em planejamento urbanístico destinado a atender os efetivos anseios da cidade e a promover a melhoria das condições de vida dos cidadãos, porquanto busca regularizar, de forma aleatória e sem qualquer lastro técnico, obras clandestinas ou irregulares.
Deste modo, padece de inconstitucionalidade o ato normativo que, sem qualquer estudo prévio consistente – planejamento específico -, de forma casuística, alterou o regime jurídico relativamente ao zoneamento ou uso do solo, ferindo frontalmente o disposto no art. 180, inciso II, bem como no art. 181, § 1º, ambos da Constituição Estadual; bem ainda, por força do art. 144 da Constituição Estadual, os princípios constitucionais estabelecidos nos art. 182, caput, § 1º, e o art. 30, inciso VIII da CF.
4. DA VIOLAÇÃO AO
PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR
A transformação da realidade urbana interfere amplamente na propriedade privada, impondo limites e condicionamentos ao seu uso, como explicado no tópico anterior.
A validade e legitimidade da norma urbanística, em virtude dos condicionamentos e limitações que impõe à atividade e aos bens dos particulares e de seu objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes, pressupõe participação comunitária em todas as fases de sua produção.
Os planos e normas urbanísticas devem levar em conta o bem estar do povo. Cumprem esta premissa quando são sensíveis às necessidades e aspirações da comunidade. Esta sensibilidade, porém, há de ser captada por via democrática e não idealizada autoritariamente. O planejamento urbanístico democrático pressupõe possibilidade e efetiva participação do povo na sua elaboração.
Sendo democrático, ele se coloca contra pressões ilegítimas ou equivocadas em relação ao crescimento e ordenamento da cidade, busca contê-las e orientá-las adequadamente.
O princípio da participação comunitária no estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano é uma exigência da Constituição Estadual (arts. 180, II e 191).
O entendimento jurisprudencial sufraga a necessidade não só de prévio estudo técnico e planejamento, como também da participação comunitária na produção de normas de ordenamento urbanístico. Neste sentido, convém transcrever as seguintes ementas:
“(...)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Ribeirão Preto. Lei Complementar nº 1.973, de 03 de março de 2006, de iniciativa de Vereador, dispondo sobre matéria urbanística, exigente de prévio planejamento. Caracterizada interferência na competência legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo local. Procedência da ação. (ADI 134.169-0/3-00, rel. des. Oliveira Santos, j. 19.12.2007, v.u.).
(...)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Leis n°s. 11.764/2003, 11.878/2004 e 12.162/2004, do município de Campinas - Legislações, de iniciativa parlamentar, que alteram regras de zoneamento em determinadas áreas da cidade - Impossibilidade - Planejamento urbano - Uso e ocupação do solo - Inobservância de disposições constitucionais - Ausente participação da comunidade, bem como prévio estudo técnico que indicasse os benefícios e eventuais prejuízos com a aplicação da medida - Necessidade manifesta em matéria de uso do espaço urbano, independentemente de compatibilidade com plano diretor - Respeito ao pacto federativo com a obediência a essas exigências - Ofensa ao princípio da impessoalidade - Afronta, outrossim, ao princípio da separação dos Poderes - Matéria de cunho eminentemente administrativo - Leis dispuseram sobre situações concretas, concernentes à organização administrativa - Ação direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade das normas.” (ADI 163.559-0/0-00).
No mesmo sentido: ADI 118.767-0/5-00, rel. des. Jarbas Mazzoni, j.07.04.06; ADI 125.012-0/7-00, rel. des. Jarbas Mazzoni, j.02.08.06; ADI 130.137-0/9-00, rel. des. Debatin Cardoso, j. 25.10.06; ADI 125.642-0/1-00, rel. des. Walter de Almeida Guilherme, j. 07.04.06.
A
democracia participativa decorrente dos artigos 180, inciso II e 190 da
Constituição Estadual, alcança a elaboração da lei antes e durante o trâmite de
seu processo legislativo até o estágio final de sua produção.
Feitas essas considerações, no caso em análise não foi obedecida referida existência constitucional, pois não há no processo legislativo (fls. 471/552 do incluso protocolado) sequer menção a participação popular.
Assim
sendo, foram violados os preceitos que asseguram a democracia participativa,
previstos no inciso II do art. 180 e no art. 191 da Constituição Estadual (que
decorrem do inciso XII do art. 29 da Constituição Federal), e que alcançam a
elaboração das leis urbanísticas (uso e ocupação do solo, parcelamento do solo
etc.) antes e durante seu processo legislativo, até o estágio final de produção
da lei.
Por fim, a
ausência de participação comunitária não configura apenas um desprezo aos
ditames da Constituição do Estado de São Paulo, mas, antes de tudo, fere
princípio fundamental do Estado Democrático de Direito presente no parágrafo
único do art. 1º da Constituição Federal.
5. VÍCIO DE INICIATIVA
A matéria referente à gestão da cidade advém, notadamente, da administração realizada pelo Chefe do Executivo, a chamada “reserva de administração”. Dessa forma, no caso em análise, depreende-se ter sido violado o princípio da separação de poderes (art. 5º, art. 47, II e XIV da Constituição Paulista, que reproduzem a diretriz contida no art. 2º da Constituição Federal).
Embora o Município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do sistema federativo (cf. art.1º e art.18 da Constituição Federal), esta autonomia não tem caráter absoluto. Limita-se ao âmbito pré-fixado pelo ente estrutural e hierarquicamente superior, vale afirmar, a Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 459).
A autonomia do Município deve respeitar o princípio da separação dos Poderes, contando o art. 5º da Constituição do Estado com a expressa previsão de que eles atuam de forma independente e harmônica, regra aplicável aos Municípios por força do art. 144 da Constituição Bandeirante, que determina a incidência, com relação àqueles, dos princípios constitucionais estabelecidos.
Pela natureza da matéria regulada na lei impugnada e pelos requisitos que nosso sistema constitucional estabelecem para a elaboração da legislação urbanística, é lícito afirmar que ela demanda planejamento administrativo específico. E o planejamento na ocupação e uso do solo das cidades é algo que só o Poder Executivo é habilitado, estrutural e tecnicamente, a fazer.
Considerando que ao Poder Legislativo cabe legislar, e ao Poder Executivo cabe administrar, é lícito concluir que é inconstitucional o ato legislativo que invade a esfera da gestão administrativa (reserva de administração) - que envolve atos de planejamento, estabelecimento de diretrizes e a realização propriamente dita do que foi estabelecido na fase do planejamento (atos administrativos concretos) – por violar a regra da separação de Poderes.
No caso ora examinado, como a iniciativa legislativa partiu do Poder Legislativo, chega-se à conclusão de que o Legislativo Municipal violou a regra que exige independência e harmonia entre os Poderes, invadindo a esfera das atribuições do Executivo Municipal.
Por tais razões é que a Constituição Estadual, em dispositivo aplicável aos Municípios em função do seu art. 144, prevê, nos incisos II e XIV do seu art. 47, as atribuições privativas do Chefe do Executivo para “exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual”, bem como “praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo”.
Vale, a propósito, colacionar precedentes desse Colendo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, acolhendo, em hipóteses análogas, a tese da inconstitucionalidade por violação da separação de Poderes, e por isso aplicáveis ao caso mutatis mutandis:
“Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei 3.801, de 01 de julho de 2004, do Município de Valinhos, que ‘cria zona corredor 1 – ZC1, nas ruas Martinho Leardine e Pedro Leardine e altera o zoneamento de Z2A para Z3B no JD. Paiquerê e no Condomínio residencial Millenium’. Lei apenas em sentido formal. Incompetência do Poder Legislativo Municipal. Matéria afeta ao Poder Executivo. Violação dos princípios da independência e harmonia dos poderes. Ação procedente.” (TJSP, ADIN 119.158-0/3, Comarca de Valinhos, rel. Des. Denser de Sá, j. 02.02.2006).
“Inconstitucionalidade. Ação Direta. Lei Complementar Municipal 1.482/03. ‘Autoriza, em caráter excepcional, atividades de prestação de serviços (clínicas de acupuntura, terapias e meditações) em trecho da Avenida Sumaré...’. Lei de iniciativa exclusiva do Prefeito. Ofensa à Constituição Estadual. Vício de iniciativa. Ação procedente. Inconstitucionalidade declarada.” (TJSP, ADIN 115.322-0/3-00, Ribeirão Preto, rel. Des. Barbosa Pereira, j.27.07.2005).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Lei Complementar n° 294/05 do Município de Catanduva - Alteração de Zoneamento Urbano - Identificação de lotes que passam a ter característica comercial, em zona estritamente residencial – Inadmissibilidade - Vício de inconstitucionalidade, por motivo de vedada delegação de poder em matéria de reserva legal. Ação julgada procedente.” (ADI 148.671-0/1-00, rel. des. Walter Swensson, j. 23.01.2008, v.u.).
Portanto, a norma impugnada, de
iniciativa parlamentar, é incompatível com o art. 5º e art. 47, incisos II e
XIV, da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios por obra de seu art.
144.
7. DA LIMINAR
Presentes
no caso analisado os pressupostos do fumus
boni iuris e do periculum in mora,
bastantes para autorizar a suspensão liminar da vigência e eficácia do preceito
normativo impugnado.
A
aparência do bom direito se mostra inquestionável pela apreciação de todos os
motivos acima elencados, a demonstrar a inconstitucionalidade da lei impugnada
nesta ação.
O perigo da demora, por sua vez, decorre do fato de que, se
não for determinada a imediata suspensão da vigência e eficácia do ato
normativo impugnado, podem ser realizados projetos, empreendimentos, obras,
entre outras ações nas áreas tratadas pela lei atacada, com intenso
comprometimento dos bens em questão. Tais atitudes, que demandam investimentos
de grande vulto, trarão grandes prejuízos à população municipal, em
favorecimento de poucos, sendo certo que a alteração física de áreas pode ser
irreversível.
A concessão da liminar faz-se essencial para assegurar que a lei promulgada em frontal violação à Constituição Estadual não produza efeitos prejudiciais à população e ao erário, sendo certo que, posteriormente, com a aguardada decisão favorável na presente ação, tal medida também evitará qualquer empecilho à concretização da eficácia do controle concentrado de constitucionalidade.
Diante do exposto, requer-se a concessão
da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia da Lei Complementar n.
572, de 31 de dezembro de 2015, do Município de São José dos Campos.
8. DO PEDIDO
Diante de todo o exposto, aguarda-se o
recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que, ao final,
seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei
Complementar n. 572, de 31 de dezembro de 2015, do Município de São José dos
Campos.
Requer-se, ainda, que sejam requisitadas
informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de São José dos Campos,
bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se
sobre o ato normativo impugnado.
Após, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se deferimento.
São Paulo, 22 de novembro de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ms/mam
Protocolado nº
93.424/16
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face da Lei Complementar n. 572, de 31 de dezembro de 2015, do Município de São José dos Campos.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
3. Cumpra-se.
São Paulo, 22 de
novembro de 2016.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ms/mam