EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado nº 126.933/2016

                                     

Ementa:    

1.      Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 23, da Lei nº 6.250, de 19 de abril de 2005, do Município de Araraquara.

2.      Cargo de provimento em comissão de Coordenador Executivo da Secretaria de Negócios Jurídicos. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito. Funções que extrapolam a natureza política do cargo, conferindo poderes de chefia e atividades técnicas desempenhadas pelos Procuradores Jurídicos do Município (arts. 98 a 100 da Constituição Estadual).

 

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art.90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 126.933/16), que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 23, da Lei nº 6.250, de 19 de abril de 2005, do Município de Araraquara, para declarar a inconstitucionalidade das atribuições atribuídas ao cargo em comissão de Coordenador Executivo de Negócios Jurídicos,  pelos fundamentos expostos a seguir:

1.     DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O art. 23, da Lei nº 6.250, de 19 de abril de 2005, do Município de Araraquara, estabelece o seguinte:

“(...)

Art. 23.  À Secretaria Municipal dos Negócios Jurídicos compete, por meio do Secretário Municipal, do Coordenador Executivo e dos Procuradores Municipais:

I - prestar assistência jurídica ao Prefeito Municipal e aos titulares das Secretarias Municipais;

II - representar o Município, por delegação, em qualquer foro ou instância, nos feitos em que seja autor, réu, assistente ou oponente, no sentido de resguardar seus interesses;

III - redigir projetos de leis, justificativas de vetos, decretos, regulamentos, contratos e outros documentos de natureza jurídica;

IV - elaborar estudos e pareceres de natureza jurídico-administrativa;

V - proceder a inquéritos e sindicâncias;

VI - promover a cobrança judicial ou extrajudicial da dívida ativa do Município ou de quaisquer outras dívidas que não forem liquidadas no prazo legal;

VII - prestar assessoramento jurídico aos Conselhos Municipais, analisando as questões formuladas e orientando quanto aos procedimentos cabíveis;

VIII - manter atualizada a coletânea de leis municipais, bem como a legislação federal e estadual de interesse do Município;

IX - executar outras tarefas que lhe forem atribuídas pelo Prefeito Municipal.

(...)”.

O Anexo VI da Lei nº 6.251, de 19 de abril de 2005, descreve as atribuições do Coordenador Executivo da seguinte forma:

“(...)

Assessorar o Secretário Municipal no planejamento, coordenação, supervisão, organização, implementação e controle das ações estabelecidas pelo Governo relativas a sua área de autuação, de acordo com a competência da Secretaria na qual se encontra lotado, avaliando os resultados obtidos e as metas alcançadas, coordenar, orientar e controlar os trabalhos dos servidores lotados na unidade administrativa sob sua coordenação, relativamente de caráter permanente, coordenar grupos de trabalho, quanto as atividades temporárias, realizar pesquisas, estudos e pareceres relacionados às atividades de sua área, levantar as necessidades e definir os objetivos relativos à sua área de sua atuação, visando o cumprimento de normas estabelecidas; desempenhar outras tarefas correlatas determinadas pelo Prefeito Municipal e pelos Secretários das respectivas pastas (Redação dada pela Lei Municipal nº. 8.256/14)

(...)”.  

O art. 23 da Lei nº 6.250/2005 ao conferir ao cargo de provimento em comissão atribuições na área da advocacia pública é inconstitucional por violação dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.

2.     DA FUNDAMENTAÇÃO

A atividade de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito.

É o que se infere dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual.

Este modelo deve ser observado pelos municípios por força do art. 144 da Constituição Estadual.

Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público (inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes), o que é reverberado pela jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008)., inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).

Deste modo, da análise das atribuições previstas para o cargo de Coordenador Executivo no art. 23 da Lei nº 6.250/2005, nota-se que as funções explicitadas se traduzem em atividades técnicas a serem desempenhadas pelos Procuradores Jurídicos do Município, havendo óbice que sejam exercidas pelo Coordenador Executivo, eis que extrapolam as atribuições políticas inerentes ao referido cargo. Acresce-se que, a natureza técnica profissional destas atribuições não possibilita que sejam exercidas por agente público não concursado, não pertencente à carreira da advocacia pública municipal.

As atividades voltadas à advocacia pública, inclusive a direção ou chefia dos advogados públicos, deve ser destinada exclusivamente a servidores de carreira.

Assim, a atribuição ao Coordenador Executivo de atividades na área da advocacia pública é flagrantemente inconstitucional.

3.     DO PEDIDO

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da expressão Coordenador Executivo prevista no art. 23, da Lei nº 6.250, de 19 de abril de 2005, do Município de Araraquara.

 

Requer-se ainda que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Araraquara, bem como posteriormente citado o Procurador Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

 

São Paulo, 10 de janeiro de 2.017.

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

aca/sh

 

 

 

Protocolado nº 126.933/2016

 

 

  1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face da expressão “Coordenador Executivo” prevista no art. 23, da Lei nº 6.250, de 19 de abril de 2005, do Município de Araraquara, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

 

2.           Oficie-se ao representante, informando a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

3.           Havendo indícios de eventual inconstitucionalidade das funções de confiança de Apoiador de Saúde, Assistente Técnico, Técnico de Controle Interno I e II, previstos no Anexo III, da Lei 6.251/05, acrescentados ao referido anexo, respectivamente, pelas Leis Municipais nºs 7.505/11, 7.867/13 e 8.520/15 e dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Cerimonial, Mestre de Cerimônia, Assessor de Operações de Crédito, Auxiliar de Gabinete, Assistente de Gabinete, Motorista de Gabinete, Fotógrafo, Assessor de Participação Popular, Assessor Especial, Assessor de Relações Internacionais, Assessor de Auditoria de Saúde, Comandante da Guarda Civil Municipal e Corregedor da Guarda Civil Municipal, constantes no Anexo VI, da Lei 6.251/05, e ali incluídos pelas Leis Municipais nº. 7.374/10 e 8.256/14, bem como em virtude de não localizar nos autos a lei de criação dos cargos de provimento em comissão de Motorista de Gabinete, Fotógrafo e Assessor de Participação Popular, embora constante suas atribuições no Anexo VI, da 6.251/05:

a)                Extraiam-se cópias do presente procedimento, autuando-se em apartado;

b)               Oficie-se ao Senhor Prefeito Municipal de Araraquara para que se manifeste a respeito da eventual inconstitucionalidade das funções de confiança de Apoiador de Saúde, Assistente Técnico, Técnico de Controle Interno I e II, previstos no Anexo III, da Lei 6.251/05, acrescentados ao referido anexo, respectivamente, pelas Leis Municipais nºs 7.505/11, 7.867/13 e 8.520/15, bem como dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Cerimonial, Mestre de Cerimônia, Assessor de Operações de Crédito, Auxiliar de Gabinete, Assistente de Gabinete, Motorista de Gabinete, Fotógrafo, Assessor de Participação Popular, Assessor Especial, Assessor de Relações Internacionais, Assessor de Auditoria de Saúde, Comandante da Guarda Civil Municipal e Corregedor da Guarda Civil Municipal, constantes no Anexo VI, da Lei 6.251/05, e ali incluídos pelas Leis Municipais nº. 7.374/10 e 8.256/14, solicitando-se, ainda, que informe a lei de criação dos cargos de provimento em comissão de Motorista de Gabinete, Fotógrafo e Assessor de Participação Popular, remetendo certidões de vigência e cópias de todas as mencionadas leis;

c)      Oficie-se também ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Araraquara para que se manifeste a respeito da eventual inconstitucionalidade das funções de confiança de Apoiador de Saúde, Assistente Técnico, Técnico de Controle Interno I e II, previstos no Anexo III, da Lei 6.251/05, acrescentados ao referido anexo, respectivamente, pelas Leis Municipais nºs 7.505/11, 7.867/13 e 8.520/15, bem como dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Cerimonial, Mestre de Cerimônia, Assessor de Operações de Crédito, Auxiliar de Gabinete, Assistente de Gabinete, Motorista de Gabinete, Fotógrafo, Assessor de Participação Popular, Assessor Especial, Assessor de Relações Internacionais, Assessor de Auditoria de Saúde, Comandante da Guarda Civil Municipal e Corregedor da Guarda Civil Municipal, constantes no Anexo VI, da Lei 6.251/05, e ali incluídos pelas Leis Municipais nº. 7.374/10 e 8.256/14;

d)    Com a resposta ou transcorridos 30 dias da data da expedição dos ofícios, tornem-se aqueles autos conclusos.

 

                  São Paulo, 10 de janeiro de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

aca/sh