Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 141.629/2016

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Programa Municipal de Auxílio Desemprego. Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba. Diploma legal que não se ajusta ao art. 115, II e X, da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade por excepcionar a regra do concurso público e por instituir admissão temporária de pessoal que não atende relevante necessidade administrativa de excepcional interesse público.

 

 

 

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em face da Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, e por arrastamento das Lei nº 2.472/2003 e nº 2.631/2005, da mesma localidade, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

                  A Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, que “AUTORIZA O EXECUTIVO MUNICIPAL A CRIAR O PROGRAMA MUNICIPAL DE AUXÍLIO DESEMPREGO DE SANTANA DE PARNAÍBA – PMADSP ”, prevê no que interessa:

“(...)

Art. 1º - Fica criado junto ao Município de Santana de Parnaíba, o Programa Municipal de Auxílio Desemprego de Santana de Parnaíba - PMADSP, de caráter sócio assistencial, a ser coordenado pela Secretaria Municipal de Assistência Social, visando proporcionar ocupação, qualificação profissional e renda para até 300 (trezentas) pessoas, de ambos os sexos, com idade a partir de dezoito anos, residentes no Município de Santana de Parnaíba, desde que comprovadamente desempregado e que não receba benefício do seguro-desemprego ou qualquer outro programa social equivalente por parte de entidade pública ou_privada.

Parágrafo Único - Do número total de vagas oferecidas, 3% (três por cento) ficam destinadas a pessoas portadoras de deficiência física.

Art. 2º - O Programa concede ao integrante uma bolsa auxílio mensal, no valor de 01 (um) Salário Mínimo_Nacional.

§ 1º - Os benefícios previstos nesta Lei serão concedidos aos integrantes do programa pelo período de 09 (nove) meses.

§ 2º - Nos casos de exclusão do programa, os beneficiados excluídos, somente serão novamente admitidos após o cumprimento de 06 (seis) meses de_carência.

Art. 3º - A participação no Programa Auxílio Desemprego implica na prestação, em caráter temporário, sem vínculo empregatício, de serviços junto a qualquer órgão da Prefeitura Municipal de Santana_de_Parnaíba.

§ 1º - A jornada de atividade dos integrantes do programa fica estipulada em 06 (seis) horas diárias, 05 (cinco) dias por semana, dos quais 01 (um) será destinado a participação em cursos de qualificação profissional, com carga horária de até 06_(seis)_horas/dia.

§ 2º - Os integrantes desenvolverão atividades relacionadas a:

I - manutenção de prédios e equipamentos públicos;

II - limpeza, capina e consertos diversos em praças e canteiros públicos;

III - limpeza, varrição e conservação de logradouros;

IV - limpeza, remoção de entulhos, capinas e/ou roçadas em terrenos baldios;

V - consertos de passeios públicos;

VI - outros serviços e obras compatíveis.

§ 3º - Os integrantes do Programa Municipal de Auxílio-Desemprego ficam proibidos de desenvolver atividades que não estejam descritas no § 2º do art. 3º desta Lei.

Art. 4º - Para a viabilização do presente Programa Municipal de Auxílio Desemprego, fica o Poder Executivo autorizado a fornecer:

I_-_Vale_Transporte;

II_-_Cesta_Básica;

III - Uniformes e Equipamentos de Segurança;

IV - Cursos de Qualificação Profissional.

§ 1º - O benefício previsto no inciso I deste artigo será concedido desde que o integrante comprove residir a mais de dois quilômetros do local onde serão efetuadas as atividades.

§ 2º - O Poder Executivo fica autorizado a firmar convênios com o SEBRAE e/ou SENAI para atender o previsto no inciso IV do art. 4º desta Lei.

Art. 5º - A Prefeitura de Santana de Parnaíba fará seguro de acidentes pessoais a todos os integrantes do Programa perante instituição bancária oficial.

Parágrafo Único - As despesas decorrentes, da contratação do seguro em referência, correrão por conta do integrante do programa sendo descontado diretamente da respectiva folha de pagamento.

Art. 6º - As despesas decorrentes da execução desta Lei correrão à conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessárias.

Art. 7º - As condições para o ingresso, permanência, e exclusão no Programa Municipal de Auxílio Desemprego serão estabelecidas em Decreto do Executivo, a ser editado no prazo de 180 (cento e oitenta dias), a contar da promulgação da presente Lei.

Art. 8º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 9º - Revogam-se as disposições em contrário, em especial as Leis nºs. 2.472/03 e 2.631/05.

(...)”           

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

         Os dispositivos impugnados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

         Com efeito, os atos normativos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144, os quais assim estabelecem:

“Art. 115 – Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)    

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)    

X – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;

(...)

Art. 144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

         Regra constitucional é a admissão de pessoal nos órgãos e entidades da Administração Pública mediante prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como estampa o art. 115, II, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, II, da Constituição Federal.

         Ressalvada a investidura em cargos de provimento em comissão, a admissão de pessoal é sempre orientada por essa regra.

         De outra parte, a Constituição Estadual no art. 115, X, reproduz o quanto disposto no art. 37, IX, da Constituição da República, possibilitando limitada, residual e excepcionalmente a admissão de pessoal por tempo determinado em razão de necessidade administrativa transitória de excepcional interesse público.

         Destarte, não é qualquer interesse público que autoriza a contratação temporária – que constitui outra exceção à regra do concurso público –, mas, tão somente, aquela que veicula uma necessidade do aparelho administrativo na prestação de seus serviços, devendo, ademais, concorrer a excepcionalidade desse interesse público, a temporariedade da contratação e a submissão à previsão legal.

         Embora tenha motivos nobres, por ser voltada ao amparo do trabalhador desempregado, a lei impugnada é verticalmente incompatível com a Constituição do Estado de São Paulo, especialmente com o seu art. 115, II e X.

         A admissão de pessoal a termo, portanto, deve objetivar situações anormais, urgentes, incomuns e extraordinárias que molestem as necessidades administrativas, não servindo ao combate ao desemprego. E, ademais, não se admite dissimulação na investidura em cargo ou emprego públicos à margem do concurso público e para além das ressalvas constitucionais.

         Neste sentido:

“A regra é a admissão de servidor público mediante concurso público: CF, art. 37, II. As duas exceções à regra são para os cargos em comissão referidos no inciso II do art. 37, e a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. CF, art. 37, IX. Nessa hipótese, deverão ser atendidas as seguintes condições: a) previsão em lei dos cargos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público; d) interesse público excepcional. Lei 6.094/2000, do Estado do Espírito Santo, que autoriza o Poder Executivo a contratar, temporariamente, defensores públicos: inconstitucionalidade” (STF, ADI 2.229, Rel. Min. Carlos Velloso, 09-06-2004, DJ 25-06-2004).

“Ação direta de inconstitucionalidade - Artigo 2º, inciso V, da Lei n° 1.423, de 08 de outubro de 2002, que dispõe sobre a contratação temporária de excepcional interesse público e considera como tal a contratação de pessoal para ministrar cursos profissionalizantes, de natureza não permanente - Dispositivo que institui hipótese de contratação de servidor que não se enquadra em situação emergencial e de excepcional interesse público, de modo a dispensar a regra geral que é a da contratação mediante concurso público Inadmissibilidade - Violação dos artigos 111,115, Il e X e 144 da Constituição do Estado de São Paulo – Ação procedente” (TJSP, ADI 161.768-0/0-00, Rel. Des. Debatin Cardoso, 22-10-2008).

Sendo inconstitucional a Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, a lei que instituiu o mesmo programa (Lei nº 2.472/2003 alterada pela Lei nº 2.631/2005, da mesma localidade) – e que foi expressamente revogada pelo artigo 9º do ato normativo impugnado nesta ação – também está eivada do mesmo vício, devendo, por isso, também ser declarada inconstitucional, por arrastamento.

III – Pedido liminar

                  À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Santana de Parnaíba apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, de maneira a evitar oneração do erário irreparável ou de difícil reparação.

                   À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação da Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, e por arrastamento das Lei nº 2.472/2003 e nº 2.631/2005, da mesma localidade.

IV – Pedido

                  Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, e por arrastamento das Lei nº 2.472/2003 e nº 2.631/2005, da mesma localidade.

                  Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Santana de Parnaíba, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

 

Termos em que, pede deferimento.

 

São Paulo, 14 de fevereiro de 2017.

 

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 141.629/2016

Assunto: representação de ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei n. 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba

 

 

 

 

1.                Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade da Lei nº 3.257, de 18 de abril de 2013, do Município de Santana de Parnaíba, e por arrastamento das Lei nº 2.472/2003 e nº 2.631/2005, da mesma localidade junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.                Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 14 de fevereiro de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

ef/dcm