EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 163.647/2016
Ementa:
1)
Ação
direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade de cargos de provimento
em comissão constantes do Anexo II e III da Lei nº 972, de 19 de janeiro de
2017, do Município de Silveiras. Inconstitucionalidade do parágrafo único do
art. 4º da Lei nº 972, de 19 de janeiro de 2017, do Município de Silveiras, que
disciplina a contratação por tempo determinado.
2) Atribuições dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Turismo, Assessor de Serviço Social, Assessor de Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do Gabinete do Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte, Chefe do Setor da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor de Cultura e Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de Limpeza e Secretário, que não retratam assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança. Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art. 144).
3) Cargo de provimento de comissão de Assessor Jurídico do Gabinete do Prefeito. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).
4) A contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público só se legitima se a lei municipal explicitar o caráter excepcional da hipótese de cabimento e inscrever a determinação do prazo.
5) Lei local que genericamente autoriza a Prefeitura Municipal a contratar empregados para atender as necessidades temporárias de excepcional interesse público é incompatível com os arts. 5º, I, 111 e 115, X, da Constituição Estadual.
6) A descrição de hipóteses que não denotam transitoriedade burla o sistema de mérito, compatível com os princípios da isonomia, moralidade, impessoalidade e eficiência (art. 111 e 115, II, CE/89).
7) É incompatível a sujeição dos ocupantes de funções temporárias ao regime celetista por conferir, indiretamente, estabilidade inconciliável com a natureza do serviço, na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços. Violação dos princípios da razoabilidade e da moralidade (arts. 111 e 115, X, da Constituição Estadual)
O
Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição
prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de
novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art.
129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no
art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas
informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 163.647/2016, que segue
como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do parágrafo
único do art. 4º e dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Turismo,
Assessor de Serviço Social, Assessor de Transporte, Assessor de Obras Rurais,
Assessor Jurídico do Gabinete do Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de
Divisão de Transporte, Chefe do Setor da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária,
Chefe do Setor de Cultura e Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe
do Setor de Limpeza e Secretário previstos no Anexo II e III da Lei nº 972, de
19 de janeiro de 2017, do Município de Silveiras, pelos fundamentos
expostos a seguir.
1.
DOS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS
O
protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade, e
a cujas folhas reportar-se-á, foi instaurado em razão da representação da
Promotoria de Justiça de Cachoeira Paulista (fls. 03/05).
A Lei nº 972, de 19 de janeiro de 2017, do Município de Silveiras,
que Altera
a Estrutura Administrativa, dispões sobre o Quadro de Pessoal com adequação dos
vencimentos dos empregados municipais da Prefeitura Municipal de Silveiras, com
base nos artigos 7º, 37, 39 e seus incisos e parágrafos da Constituição
Federal, com suas alterações e dá outra providências, estabelece, no que
interessa, o seguinte:
(...)
Artigo 4º - (...)
Parágrafo único – Em caso de necessidade e objetivando de alcançar rendimento, evitando-se novos encargos permanente ampliação desnecessária do Quadro Geral de Servidores, Prefeitura Municipal poderá contratar pessoal em caráter temporário, sob a égide da CLT, destinado à manutenção especial, nos termos do artigo 37, IX, da Constituição Federal.
(...)
Artigo 30 – Os cargos em comissão com sua quantidade, denominação, descrição sintética dos cargos, bem como os salários são os constantes do Anexo II e III da presente Lei
(...)
Anexo II – CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO
CARGOS Quantidade Referência
ASSESSOR DE TURISMO |
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ASSESSOR DE SERVIÇO SOCIAL |
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ASSESSOR DE TRANSPORTE |
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ASSESSOR DE OBRAS RURAIS |
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ASSESSOR JURÍDICO DO GABINETE DO PREFEITO |
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CONSELHEIRO TUTELAR |
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CHEFE DE DIVISÃO DE TRANSPORTE |
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CHEFE DO SETOR DA |
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EDUCAÇÃO |
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CHEFE DO SETOR DA AÇÃO COMUNITÁRIA |
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CHEFE DO SETOR DE CULTURA E TURISMO |
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CHEFE DO SETOR DE ESPORTE E LAZER |
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CHEFE DO SETOR DE LIMPEZA |
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CHEFE DE GABINETE |
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DIRETOR DE PESSOAL |
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DIRETOR DE PATRIMÔNIO |
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DIRETOR DE LICITAÇÕES |
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DIRETOR DE OBRAS |
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DIRETOR DE TRANSPORTES |
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DIRETOR DE ESPORTE E LAZER |
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DIRETOR DE TURISMO |
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DIRETOR DE FINANÇAS |
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DIRETOR DE TRIBUTOS |
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DIRETOR DE CONTAS |
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DIRETOR DE ENSINO |
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DIRETOR DE CONTROLE DE MATERIAL ESCOLAR |
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DIRETOR DE SAÚDE |
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DIRETOR PSF |
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DIRETOR DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL |
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DIRETOR DE PROGRAMAS SOCIAIS |
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DIRETOR DE AGRICULTURA |
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DIRETOR DE MEIO AMBIENTE |
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SECRETÁRIO |
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Os cargos de provimento em comissão de Assessor de Turismo, Assessor de Serviço Social, Assessor de Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do Gabinete do Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte, Chefe do Setor da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor de Cultura e Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de Limpeza e Secretário são inconstitucionais, uma vez que as respectivas atribuições não evidenciam natureza de assessoramento, chefia e direção, que autorizam a dispensa do concurso público para o provimento.
De outro lado, em relação ao cargo de Assessor Jurídico do Gabinete do Prefeito, por desempenhar atividades de advocacia pública, deve ser recrutado pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).
2.
DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS DE
PROVIMENTO EM COMISSÃO IMPUGNADOS
As
atribuições dos cargos de provimento em comissão de Assessor de Turismo, Assessor de Serviço
Social, Assessor de Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do
Gabinete do Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte,
Chefe do Setor da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor
de Cultura e Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de
Limpeza e Secretário estão descritas da
seguinte forma no Anexo III da Lei nº 972, de 19 de janeiro de 2017, do
Município de Silveiras:
(...)
3.
DA FUNDAMENTAÇÃO
a. Da natureza técnica ou burocrática das funções desempenhadas
pelos ocupantes dos cargos de provimento em comissão impugnados
Os
cargos de provimento em comissão de Assessor de Turismo, Assessor de Serviço Social, Assessor
de Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do Gabinete do
Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte, Chefe do Setor
da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor de Cultura e
Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de Limpeza e
Secretário têm atribuições de natureza
meramente técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais.
A previsão de jornada de trabalho para os referidos cargos de
provimento em comissão de apenas 40 horas semanais (art. 40, parágrafo único da
Lei nº 972/2017, de Silveiras), inferior até às 44 horas semanais previstas
para os servidores efetivos (art. 49), é indicativo da incompatibilidade de
tais cargos com a forma de provimento escolhida.
Tal fato, conjugado com as demais características dos cargos
impugnados, sobretudo a descrição de suas atribuições, reforça a natureza de
unidades executórias de pouca complexidade, de nível subalterno, sem poder de
mando ou comando superior e necessidade do elemento fiduciário para seu
desempenho, o que justificaria o provimento em comissão.
As atribuições previstas para os referidos cargos, relacionadas a
suporte técnico, organização supervisão, gerenciamento, coordenação,
orientação, fiscalização, interlocução, controle, acompanhamentos e informações
são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou a dar suporte a
decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas,
administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior em
que se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do
governo.
O Assessor de Turismo desempenha
atividades técnicas burocráticas relacionadas a planejamento, organização e
execução das atividades relacionadas com a cultura e tradição local,
atribuições distantes dos encargos de comando superior no qual se exige
especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.
Ao Assessor de Serviço Social incumbe atividades relacionadas às ações sociais desenvolvidas na execução de programas, projetos e serviços. Trata-se também do desempenho de atividades meramente técnicas e burocráticas sem a necessidade do elemento fiduciário para o seu provimento.
Ao
Assessor de Transporte foram
previstas atribuições de coordenação de nível subalterna relacionada com a
manutenção e cuidados com os veículos, não exigindo para o seu bom desempenho
relação de especial confiança com o Chefe do Poder Executivo.
Ao
Assessor de Obras Rurais foram
previstas atividades essencialmente burocráticas relacionadas ao acompanhamento
da execução dos serviços de reposição, construção, conservação e revestimento
das vias pública e estradas municipais, bem como a atividade de manutenção do
cadastro dos logradouros e registros de obras públicas, ou seja, atividade
essencialmente burocráticas que não demandam o elemento fiduciário especial
para o seu bom desempenho.
O Conselheiro Tutelar além de desempenhar
atribuições técnicas previstas no Estatuto da Criança e Adolescente, deve ser
eleito conforme previsão do estatuto mencionado.
Ao Chefe da Divisão de Transporte foram
previstas atividades essencialmente burocráticas relacionadas à observância do
cumprimento da legislação em relação a seguro, fardamento dos motoristas,
avaliação de desempenho, supervisão da frequência e escala de férias.
O Chefe do Setor da Educação desenvolve atividades técnicas e burocráticas relativas à assessoramento na execução de projetos e prestação de contas, além da direção de veículos, estando clara a natureza subalterna destituída do poder de direção, chefia ou assessoramento superior.
O mesmo ocorre com o cargo de Chefe do Setor de Ação Comunitária que presta assistência executiva às ações comunitárias, recebendo, analisando e encaminhando as reivindicações, realizando encontros com a população, não necessitando da relação de especial confiança para o bom desempenho das atribuições.
Os cargos de Chefe do Setor de Cultura e Turismo e Chefe do Setor de Esporte e Lazer têm atribuições nitidamente técnicas relativas aos eventos culturais, esportivos e de lazer.
O Chefe do Setor de Limpeza tem atribuições de organização administrativa relativas a varrição e coleta de lixo, bem como de sua execução, manutenção do controle de lixeira e móveis, atividades burocráticas que podem ser desempenhadas por qualquer servidor efetivo.
Por fim o cargo de Secretário tem atribuições essencialmente administrativas e burocráticas relativas a agendamento, arquivo, confecção e remessa de documentos, atendimento ao público, datilografia e digitação, o que, obviamente não reclama confiança especial do Chefe do Poder Executivo para o bom desempenho.
Verifica-se, portanto, que as atribuições previstas para os cargos
mencionados, relacionadas a suporte técnico, coordenação, supervisão,
gerenciamento, coordenação, fiscalização, controle, são atividades destinadas a
atender necessidades executórias ou dar suporte a decisões e execução.
Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas,
distantes dos encargos de comando superior onde se exige especial confiança e
afinamento com as diretrizes políticas do governo.
Embora na descrição das atribuições dos cargos mencionados haja
referência genérica a atividade de programar, coordenar,
chefiar, supervisionar, dirigir, organizar, a análise das
características de cada unidade indica que são destinadas a atender necessidades
executórias ou a dar suporte subalterno a decisões e execução. Trata-se,
portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, distantes
dos encargos de chefia, direção, assessoramento e comando superior em que se
exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.
Dessa
forma, os cargos comissionados anteriormente destacados são incompatíveis com a
ordem constitucional vigente, em especial com
o art. 115 incisos I, II e V, e art. 144, todos da Constituição do Estado de
São Paulo.
Essa
incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela
Constituição quanto ao provimento no serviço público sem concurso.
Embora
o Município seja dotado de autonomia política e administrativa, dentro do
sistema federativo (cf. art. 1º e art. 18 da Constituição Federal), esta
autonomia não tem caráter absoluto, pois se limita ao âmbito pré-fixado pela
Constituição Federal (cf. José Afonso da Silva, Direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros,
1997, p. 459).
A
autonomia municipal deve ser exercida com a observância dos princípios contidos
na Constituição Federal e na Constituição Estadual (cf. Luiz Alberto David
Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso
de direito constitucional, 9. ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 285).
No
exercício de sua autonomia administrativa, o Município cria cargos, empregos e
funções, mediante atos normativos, instituindo carreiras, vencimentos, entre
outras questões, bem como se estruturando adequadamente.
Todavia,
a possibilidade de que o Município organize seus próprios serviços encontra
balizamento na própria ordem constitucional, sendo necessário que o faça
através de lei, respeitando normas constitucionais federais e estaduais
relativas ao regime jurídico do serviço público.
A
regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos
através de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se
garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no art. 37, I da
Constituição Federal; bem como no art. 115, I da Constituição do Estado de São
Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e empregos de
natureza técnica ou burocrática.
A
criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração,
deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor, para
que adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente
política.
Há
implícitos limites à sua criação, visto que assim não fosse, estaria na prática
aniquilada a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço
público.
A
propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em precedente do E. STF, que “a criação de cargo em comissão, em moldes
artificiais e não condizentes com as praxes do nosso ordenamento jurídico e
administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência
constitucional do concurso (STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito administrativo brasileiro, 33.
ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).
Podem
ser de livre nomeação e exoneração apenas aqueles cargos ou empregos que, pela
própria natureza das atividades desempenhadas, exijam excepcional relação de
confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento
político e fidelidade com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes
políticos, que vão bem além do dever comum de lealdade às instituições
públicas, necessárias a todo e qualquer servidor.
É
esse o fundamento da argumentação no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de
certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da
autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover
a direção superior da Administração. Por essas razões percebe-se quão
necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se
desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não
poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua
confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito
administrativo, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).
Daí
a afirmação de que “é inconstitucional a
lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas,
burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos
níveis de direção, chefia e
assessoramento superior” (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores públicos,
2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).
São
a natureza do cargo e as funções a ele cometidas pela lei que estabelecem o
imprescindível “vínculo de confiança” (cf.
Alexandre de Moraes, Direito
constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que
justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam
ser destinados “apenas às atribuições de
direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317).
Essa também é a posição do E. STF (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT VOL-01765-01 PP-00169).
Não é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza o provimento em comissão, a atribuição do cargo deve reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das diretrizes políticas do governo.
Pela análise da natureza e atribuições dos cargos impugnados não se identifica os elementos que justificam o provimento em comissão.
Escrevendo
na vigência da ordem constitucional anterior, mas em lição plenamente aplicável
ao caso em exame, anotava Márcio Cammarosano a existência de limites à criação
de postos comissionados pelo legislador. A Constituição objetiva, com a
permissão para tal criação, “propiciar ao
Chefe de Governo o seu real controle mediante o concurso, para o exercício de
certas funções, de pessoas de sua absoluta confiança, afinadas com as
diretrizes políticas que devem pautar a atividade governamental. Não é,
portanto, qualquer plexo unitário de competências que reclama seja confiado o
seu exercício a esta ou aquela pessoa, a dedo escolhida, merecedora da absoluta
confiança da autoridade superior, mas apenas aquelas que, dada a natureza das
atribuições a serem exercidas pelos seus titulares, justificam exigir-se deles
não apenas o dever elementar de lealdade às instituições constitucionais e
administrativas a que servirem, comum a todos os funcionários, como também um comprometimento
político, uma fidelidade às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos,
uma lealdade pessoal à autoridade superior (...). Admite-se que a lei declare
de livre provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria
superior, mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre
provimento e exoneração cargos como os de auxiliar administrativo, fiscal de
obras, enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador, e outros mais,
de cujos titulares nada mais se pode exigir senão o escorreito exercício de
suas atribuições, em caráter estritamente profissional, técnico, livres de
quaisquer preocupações e considerações de outra natureza” (Provimento de cargos públicos no direito
brasileiro, São Paulo, RT, 1984, p. 95/96).
No
caso em exame, evidencia-se claramente que os cargos de provimento em comissão, antes referidos, destinam-se ao
desempenho de atividades meramente
burocráticas ou técnicas, que não exigem, para seu adequado desempenho, relação
de especial confiança.
É
necessário ressaltar que a posição aqui sustentada encontra esteio em julgados
desse E. Tribunal de Justiça (ADI 111.387-0/0-00, j. em 11.05.2005, rel. des.
Munhoz Soares; ADI 112.403-0/1-00, j. em 12 de janeiro de 2005, rel. des.
Barbosa Pereira; ADI 150.792-0/3-00, julgada em 30 de janeiro de 2008, rel.
des. Elliot Akel; ADI 153.384-0/3-00, rel. des. Armando Toledo, j. 16.07.2008,
v.u.).
Cabe
também registrar que entendimento diverso do aqui sustentado significaria, na
prática, negativa de vigência ao art.
115, incisos I, II e V da Constituição Estadual, bem como ao art. 37 incisos I,
II e V da Constituição Federal, cuja aplicabilidade à hipótese decorre do art.
144 da Carta Estadual.
b.
Da natureza das atividades
de advocacia pública
A atividade de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito.
É o que se infere dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual.
Este modelo deve ser observado pelos municípios por força do art. 144 da Constituição Estadual.
Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público (inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes), o que é reverberado pela jurisprudência:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).
“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).
“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).
“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008)., inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).
Assim, não bastasse a natureza técnica profissional do cargo de Assessor Jurídico de Gabinete, por força dos art. 98 a 100 da Constituição Estadual, não há possibilidade deste cargo ser provido em comissão, por desempenhar atividade típica de advocacia pública.
c.
Do
regime de contratação por tempo determinado
O parágrafo único do art. 4º da Lei nº 972, de 19 de janeiro de 2017, do Município de Silveiras, estabeleceu de forma extremamente genérica a contratação por tempo determinado.
Além de não explicitar o prazo da contratação, não descrever e discriminar as hipóteses de necessidade, houve previsão da submissão dos contratados ao regime da CLT.
O dispositivo legal mencionado apenas estabeleceu que a contratação por prazo determinado teria cabimento para atingir rendimento e evitar a ampliação desnecessária do quadro geral de servidores.
Inspirado pelos princípios de impessoalidade e de moralidade referidos no art. 111 da Constituição Estadual (que reproduz o art. 37, caput, da Constituição Federal) o art. 115, X, da Constituição do Estado (que reproduz o art. 37, IX, da Constituição da República) fixa a necessidade de a lei de cada ente federado estabelecer os casos de contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, pois, segundo José dos Santos Carvalho Filho há três elementos que configuram pressupostos na contratação temporária: a determinabilidade temporal, a temporariedade da função e a excepcionalidade do interesse público (Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 9. ed., pp. 478-479).
A obra legislativa não poderá olvidar a determinação do prazo e a temporariedade da contratação e nem lhe será lícito inscrever como hipótese de seu cabimento qualquer necessidade administrativa senão aquela que for predicada na excepcionalidade do interesse público.
Ocorre que no parágrafo único, do art. 4º da Lei nº 972/2017, do Município de Silveiras, houve a inserção de
hipóteses que não possui o requisito de excepcional interesse público.
Com
efeito, falta o requisito do interesse público excepcional a justificar a contratação
temporária na hipótese genérica de necessidade para não ampliação do quadro
geral de servidores.
Não é somente a temporariedade de uma atividade que
justifica a contratação por tempo determinado, pois, ela pode ser desempenhada
por recursos humanos constantes do quadro de pessoal permanente. Para
autorizá-la, é mister que a lei precise a excepcionalidade da medida.
Entretanto, as situações
ventiladas no artigo impugnado não espelham extraordinariedade,
imprevisibilidade e urgência que fundamentam a legitimidade da admissão
temporária de pessoal no serviço público, na medida em que traduzem situações
concretas ou abstratas, presentes, passadas ou futuras, da rotina
administrativa, e cuja execução compete, de ordinário, a servidores públicos
titulares de cargos de provimento efetivo.
Assim, referido dispositivo da lei local autoriza a
contratação temporária para a prestação de serviços públicos que tipicamente
incumbem à Administração Pública, não configurando situação capaz de legitimar
a contratação por tempo determinado.
É
necessário ressaltar que a posição aqui sustentada encontra esteio em inúmeros
julgados desse E. Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:
“AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Dispositivos da Lei nº 214/2000 do Município
de Itajobi, que instituiu o Programa de Saúde da Família, e alterações
posteriores – Contratações por tempo determinado – Necessidade de observância
da regra de prestação de concurso público, com interpretação restritiva às
hipóteses que a excepcionam – Para que se considere válida a contratação
temporária, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei;
b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja
temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a necessidade de
contratação seja indispensável – Requisitos não preenchidos no caso –
Desrespeito aos artigos 111, 115, incisos II e X, e 144 da Constituição
Estadual – Inconstitucionalidade configurada – Ação julgada procedente, com
modulação dos efeitos”. (TJSP, ADI nº
2225484-77.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Moacir Peres, julgado em 16 de
março de 2016, v.u)
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Art.
2º, incisos III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X e parágrafo único; art. 3º, caput
e art. 4º e incisos, da Lei nº 3.155, de 03 de dezembro de 2014, de
Itaquaquecetuba, Contratação, por tempo determinado, para atendimento de
necessidade temporária de excepcional interesse público.
Natureza dos serviços a prestar.
Inadmissível quando não se apresentam imprevisíveis ou extraordinários.
Prazo
máximo de contratação razoável. Próximo do admitido em precedentes do STF.
Inconstitucionalidade
(art. 111 e art. 115, II e X, CE).
Modulação.
(art. 27 da Lei nº 9.868/99).
Procedente, em parte, a ação, com
modulação”. (TJSP,
ADI nº 2210.892-28.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Evaristo dos Santos,
julgado em 27 de janeiro de 2016, v.u)
“Ação
Direta de Inconstitucionalidade. Incisos III e VII do art. 2º, e do artigo 3º e
§1º (redação dada pelas Leis 2.279/14 e 2.245/13), ambos da Lei 1.027, de 10 de
março de 1995, do Município de São Sebastião. Contratação temporária para
‘campanhas de saúde pública’ e ‘de menores aprendizes’. Inconstitucionalidade.
Inexistência de situação de necessidade temporária de excepcional interesse
público. Inconstitucionalidade, ainda, da autorização para contratação por
lapso temporal superior a 12 (doze) meses. Ação procedente, com efeitos a
partir de 120 dias da data do julgamento”. (TJSP, ADI nº 2128333-14.2015.8.26.0000, Órgão
Especial, Rel. Borelli Thomaz, julgado em 09 de dezembro de 2015, v.u)
“AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Dispositivos da Lei nº 3.581, de 20 de
novembro de 2013, que disciplina as contratações por tempo determinado no
Município de Adamantina. Ausência do requisito de necessidade temporária de
excepcional interesse público, reportando-se a norma a atividades regulares e
corriqueiras. Repercussão geral reconhecida no STF (Tema nº 612).
Inconstitucionalidade reconhecida. Ação procedente, com modulação”. (TJSP, ADI nº
2069047-08.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Tristão Ribeiro, julgado em 26
de agosto de 2015, v.u)
De outro lado, verifica-se
que todos os empregados contratados para
o exercício da função temporária estão submetidos ao regime celetista.
A sujeição dos ocupantes de funções temporárias ao regime celetista não encontra respaldo constitucional. Pelo contrário, sob o pálio do art. 37, II, da Constituição Federal, reproduzido no art. 115, II, da Constituição Estadual, os contratos temporários são inconciliáveis com o regime jurídico celetista que, por excelência, reprime a dispensa imotivada.
Com efeito, a contratação por tempo determinado serve a necessidade temporária de excepcional interesse público, devendo durar enquanto as circunstâncias que o justificaram persistir.
A inserção dessas funções no regime celetista, portanto, é incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além, fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do serviço, na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar natureza).
De fato, o desprovimento da função temporária é medida discricionária orientada pelos critérios de oportunidade e de conveniência da Administração Pública, e a sua sujeição ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador público.
A subordinação dos servidores
públicos temporários ao regime celetista importa em franca violação aos
princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade, previstos no art. 37 da
Constituição Federal e no art. 111 da Constituição Estadual.
Enquanto a razoabilidade serve
como parâmetro no controle da legitimidade substancial dos atos normativos,
requerente de compatibilidade aos conceitos de racionalidade, justiça, bom
senso, proporcionalidade etc., interditando discriminações injustificáveis e,
por isso, desarrazoadas, a moralidade se presta à mensuração da conformidade do
ato estatal com valores superiores (ética, boa fé, finalidade, boa
administração etc.), vedando atuação da Administração Pública pautada por
móveis ou desideratos alheios ao interesse público (primário) – ou seja,
censura o desvio de poder que também tem a potencialidade de incidência nos
atos normativos.
Na espécie, a lei municipal
infringe ambos os princípios. Como a contratação para serviços temporários
constitui exceção à regra constitucional do acesso à função pública (lato
sensu) mediante concurso público, possibilitando a investidura por outros
critérios, sob o pálio da instabilidade e da transitoriedade do vínculo como
elementos essenciais de sua duração, é desarrazoada e imoral a outorga de
prerrogativas próprias do regime contratual a seus ocupantes, tendo em conta
que este sanciona a dispensa imotivada com a indenização compensatória (e
outros consectários). Trata-se da atribuição de uma garantia absolutamente
imprópria a uma relação jurídica precária e instável.
O padrão ordinário, normal e
regular, advindo da Constituição, não admite a oneração dos cofres públicos
para o custeio da exoneração de emprego temporário, à luz da conformação
constitucional que realça a natureza excepcional e temporária de seu provimento
- orientada por força de ingredientes puramente excepcional de necessidade e
interesse público. Em suma, a sujeição dos servidores temporários ao regime
celetista implica intolerável outorga de uma série de vantagens
caracterizadoras de privilégio inadmissível à vista da natureza da contratação
cuja marca eloquente é a instabilidade e temporariedade ditada por necessidade
e interesse público.
Dessa forma, inconstitucional o parágrafo único do art. 4º da Lei nº 972, de 19 de janeiro de 2017, do Município de Silveiras.
4.
DOS PEDIDOS
a. Do pedido
liminar
À
saciedade demonstrado o fumus boni iuris,
pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do
Município de Ilhabela apontados como violadores de princípios e regras da
Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento
desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a
consequente oneração financeira do erário.
Está claramente demonstrado que os cargos de provimento em comissão impugnados não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. De outro lado, o regime de contratação por tempo determinado está totalmente divorciado do tratamento constitucional.
O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.
Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para ocuparem tais cargos, certamente, não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.
A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.
Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.
Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.
De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.
Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).
À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para a
suspensão do parágrafo único do art. 4º da Lei nº 972, de 19 de janeiro de
2017, do Município de Silveiras, bem como das expressões Assessor de Turismo, Assessor de Serviço Social, Assessor de
Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do Gabinete do
Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte, Chefe do Setor
da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor de Cultura e
Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de Limpeza e
Secretário previstas no Anexo II e III da Lei nº 972, de 19 de janeiro de
2017, do Município de Silveiras.
b. Do pedido
principal.
Diante
de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação
declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a
inconstitucionalidade do parágrafo único art. 4º da Lei nº 972, de 19 de
janeiro de 2017, do Município de Silveiras, bem como das expressões Assessor de Turismo, Assessor de Serviço
Social, Assessor de Transporte, Assessor de Obras Rurais, Assessor Jurídico do
Gabinete do Prefeito, Conselheiro Tutelar, Chefe de Divisão de Transporte,
Chefe do Setor da Educação, Chefe do Setor da Ação Comunitária, Chefe do Setor
de Cultura e Turismo, Chefe do Setor de Esporte e Lazer, Chefe do Setor de
Limpeza e Secretário previstas no Anexo II e III da Lei nº 972, de 19 de
janeiro de 2017, do Município de Silveiras.
Requer-se,
ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito
Municipal de Silveiras, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do
Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente,
aguarda-se vista para fins de manifestação final.
Termos
em que,
Aguarda-se
deferimento.
São Paulo, 09 de março de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aca
Protocolado nº 163.647/2016
1. Distribua-se eletronicamente a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.
2. Oficie-se ao representante informando a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 09 de março de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aca