EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado nº 71.509/16

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 73 da Lei Complementar Municipal n. 25/2007 do Município de Caraguatatuba do Decreto Municipal n. 401 de 21 de dezembro de 2015 (por arrastamento), que regulamentam o teto da remuneração dos servidores públicos municipais de Caraguatatuba.

2)      O teto remuneratório dos servidores municipais não pode exceder os subsídios do Prefeito Municipal. Violação do art. 115, XII e 144 da Constituição Estadual c.c. o art. 37, XI da Constituição Federal.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 71.509/2016, que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em  face do artigo 73 da Lei Complementar Municipal nº 25, de 25 de outubro de 2007, e por arrastamento, do Decreto Municipal nº 401 de 21 de dezembro de 2015, todos do Município de Caraguatatuba, pelos fundamentos expostos a seguir.

DISPOSITIVOS IMPUGNADOS

         A Lei Complementar Municipal nº 25, de 25 de outubro de 2007, que “Dispõe sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Caraguatatuba e dá outras providências”, têm a seguinte redação, no que se destaca:

                                      “(...)

Art. 73 – Nenhum funcionário poderá receber, mensalmente, a título de remuneração, importância superior aos limites estabelecidos pela Constituição da República.

(...)

O Decreto Municipal nº 401, de 21 de dezembro de 2015, alterou o artigo 5º, do Decreto n. 234/2015, regulamentou o artigo 73 da Lei Complementar n. 25/2007, excluindo do teto municipal os Procuradores Jurídicos:

“Art. 1º - Fica alterada a redação do artigo 5º do Decreto Municipal n. 234/2015 que passa a ter a seguinte redação:

Art. 5º - O teto da remuneração, proventos e pensão dos servidores públicos municipais, ativos, inativos e pensionistas, é o do subsídio do Prefeito Municipal, na forma do artigo 39, inciso X, da Constituição Federal cumulado com o artigo 73 da Lei Complementar Municipal nº 25/2007, ressalvado o dos procuradores jurídicos municipais, autárquicos e fundacionais cujo teto é de 90,25% sobre o valor definido como subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, na forma do artigo 37, XI, da Constituição Federal.”

A matéria deve ser analisada à luz do art. 115, XII, da Constituição Estadual e do art. 37, XI, da Constituição Federal, aos quais está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão do art. 29 da Constituição Federal e do art. 144 da Carta e Paulista, que estabelecem o seguinte:

Constituição Federal

“(...)

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

(...)

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.”

Constituição Estadual

“Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

XII - em conformidade com o art. 37, XI, da Constituição Federal, a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

Verifica-se, portanto, que o art. 37, XI, da Constituição Federal (com a redação dada pela emenda constitucional nº 41/2003), estabeleceu o chamado teto, limite máximo para a remuneração e subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos, percebidos cumulativamente, ou não, e incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

Tal limite aplica-se à Administração direta, autárquica e fundacional e abrange os membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluindo os detentores de mandato eletivo e demais agentes políticos. Nos termos do § 11 do art. 37 da Constituição Federal (incluído pela Emenda Constitucional nº 47/2005), não se computam para efeito dos limites referidos as parcelas de caráter indenizatória previstas em lei, o que, de todo modo, já se podia deduzir da própria noção de subsídio.

De acordo com a referida norma constitucional, são previstos dois limites máximos a considerar na implementação do sistema remuneratório e de subsídios: o primeiro, já predeterminado pela Constituição, para cada poder; o segundo, a ser fixado por lei da União ou de cada unidade federada, contido, porém, pela observância do primeiro, mas ao qual poderá ser inferior, excetuadas apenas as hipóteses de teto diverso estabelecidas na própria Constituição da República.

Assim, na esfera municipal, adota-se como teto remuneratório o subsídio do prefeito. Este limite máximo pode ser reduzido por lei municipal, mas jamais superado.

Ocorre que a interpretação conferida ao artigo 73 da Lei Complementar n. 25/2007, pelo Município de Caraguatatuba, concretizada no Decreto n. 401/2015, possibilitou que o referido limite não se aplicasse aos Procuradores Jurídicos Municipais.

Desta forma, estabeleceu teto superior ao limite constitucional, violando o princípio remuneratório previsto no art. 37, XI da Constituição Federal, de observância obrigatória pelos municípios nos termos do art. 29 da Constituição Federal e 144 da Constituição Estadual.

Necessário, assim, conferir-se interpretação conforme a Constituição ao artigo 73 da Lei Complementar n. 25/2007, nos termos do artigo 28, parágrafo único, da Lei n. 9.868/99, a fim de que seja excluída qualquer interpretação que autorize o pagamento de remuneração em patamar superior ao subsídio do Prefeito Municipal.

Na hipótese em comento, a redação do mencionado artigo 73, em razão de sua generalização, comporta interpretações equivocadas e contrárias ao texto constitucional, tanto que editado o Decreto Municipal n. 401/2015.

Ensina Luiz Guilherme Marinoni que:

“Constitui técnica que impede a declaração de inconstitucionalidade da norma mediante a afirmação deque esta tem um sentido – ou uma interpretação – conforme à Constituição. (...) O resultado da decisão que realiza “interpretação conforme”, portanto, não apenas expressamente exclui o sentido ou a interpretação sugerido pela norma pelo autor da ação de inconstitucionalidade, mas declara que, mediante determinada interpretação, a norma é constitucional.”[1]

 

 

CONCLUSÃO E PEDIDO

 

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, a fim de que seja conferida interpretação conforme à Constituição, ao artigo 73 da Lei Complementar Municipal n. 25, de 25 de outubro de 2007, do Município de Caraguatatuba, excluindo deste dispositivo qualquer interpretação que autorize a percepção de remuneração em patamar superior ao subsídio do Prefeito Municipal, e, por arrastamento, julgando-se inconstitucional o Decreto Municipal n. 401, de 21 de dezembro de 2015.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Caraguatatuba, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

São Paulo, 13 de março de 2017.

 

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

aaamj

 

 


Protocolado nº 71.509/16

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.

2.     Oficie-se ao interessado, com o envio de cópias, comunicando-se a propositura da ação.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 13 de março de 2017.

 

 

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

aaamj

 

 



[1] SARLET, Ingo Wolfgang. ‘Curso de direito constitucional.’/Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni, Daniel Mitidiero. – 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.