Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

Protocolado n. 169.897/16

 

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação Direta Inconstitucionalidade. Incisos I, II, IV, V e VI do artigo 24, incisos II a XI do artigo 25, inciso VII do artigo 33, e expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do artigo 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André. Advocacia Pública. Impossibilidade de subordinação da Procuradoria Geral à Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos, consignação de atribuições típicas e exclusivas da Advocacia Pública à Secretaria de Assuntos Jurídicos e de Finanças.

1. Os incisos I, II, IV, V e VI, do art. 24 e as expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do art. 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que subordinam hierarquicamente a Procuradoria Geral, órgão da Advocacia Pública, à Secretaria de Assuntos Jurídicos, e não diretamente ao Chefe do Poder Executivo, são incompatíveis com o caput do art. 98, CE/89.

2. Contrastam com o art. 99, CE/89, os incisos II a XI do art. 25 da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que cometem funções típicas e exclusivas da Advocacia Pública à Secretaria de Assuntos Jurídicos.

3. Padece de inconstitucionalidade o inciso VII do art. 33 da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que consigna competir à Secretaria de Finanças “promover as medidas pertinentes à arrecadação da dívida ativa, mediante cobrança amigável, bem como providências relativas a débitos fiscais”, por pertencer exclusivamente essa atribuição ao órgão da Advocacia Pública Municipal (arts. 98 e 99, I e VI, CE/89).

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face dos incisos I, II, IV, V e VI, do art. 24, dos incisos II a XI do art. 25, do inciso VII do art. 33, e das expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do art. 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – Os Preceitos Normativos Impugnados

                   A Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, dispõe sobre a reorganização da estrutura administrativa, reenquadra, cria e extingue cargos e funções, cria novas tabelas de vencimentos e institui diretrizes básicas na área de pessoal da Administração Pública Municipal de Santo André, e contém os seguintes dispositivos:

Artigo 24 - A Secretaria de Assuntos Jurídicos compreende:

I - Procuradoria Geral, que se constitui de:

a) Procuradoria Patrimonial;

b) Procuradoria Judicial

c) Procuradoria Fiscal;

II - Departamento de Assistência Judiciária e Defesa ao Consumidor, que se constitui de:

a) Gerência de Assistência Judiciária;

b) Gerência de Defesa ao Consumidor;

III - Departamento de Guarda Municipal.

IV - Consultoria Geral;

V - Assessoria Técnico-Legislativa;

VI - Comissão Permanente de Inquérito.

Artigo 25 - À Secretaria de Assuntos Jurídicos compete:

I - estabelecer diretrizes à área;

II - representar o Município em Juízo ativa e passivamente;

III - processar e julgar todos os inquéritos administrativos referentes à legalidade dos atos dos servidores municipais;

IV - executar ações de desapropriações e créditos tributários;

V - elaborar projetos de lei e atos normativos;

VI - emitir pareceres sobre questões jurídico-administrativas e fiscais;

VII - promover a cobrança judicial da dívida ativa;

VIII - prestar serviço de assistência judiciária e de defesa à comunidade carente, bem como manter um serviço de segurança ao patrimônio municipal;

IX - exercer funções jurídico-consultivas em relação ao poder Executivo e à Administração em geral;

X - zelar pelo estrito cumprimento da legislação concernente ao Município, oficiando ao prefeito ou a outra autoridade municipal competente, nos casos em que tal se fizer necessário;

XI - propor ao prefeito ou a outra autoridade municipal competente as medidas que se afigurem convenientes à defesa dos interesses do município ou à melhoria do serviço público municipal, especialmente nas áreas conexas à sua esfera de competências.

............................................................................................

Artigo 33 - À Secretaria de Finanças compete:

............................................................................................VII - promover as medidas pertinentes à arrecadação da dívida ativa, mediante cobrança amigável, bem como providências relativas a débitos fiscais.

.........................................................................................

Artigo 50 - Os órgãos componentes da estrutura administrativa da Prefeitura Municipal obedecem à seguinte subordinação hierárquica:

I - Secretaria;

II - Departamento;

III - Gerência.

§ 1º - A Coordenadoria de Planejamento tem nível hierárquico idêntico ao de Secretaria.

§ 2º - A Consultoria Geral, a Assessoria Técnico-Legislativa, a Procuradoria Geral, e a Corregedoria têm nível hierárquico idêntico ao de Departamento.

§ 3º - O nível hierárquico de Serviço, referente aos órgãos administrativos da Secretaria de Educação, Cultura e Esportes, bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal é equivalente ao de Gerência.

§ 4º - O nível hierárquico da Assessoria de Comunicação, Relações Públicas e Imprensa é equivalente ao de Departamento.

§ 5º - O nível hierárquico da Assessoria do Meio Ambiente, Assessoria dos Direitos da Mulher e a Comissão Permanente de Inquérito é equivalente ao de Gerência.

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

                   Os dispositivos acima referidos contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

                   Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta. Destarte, as prescrições da Constituição Estadual que arquitetam o modelo e o perfil da Advocacia Pública são aplicáveis aos Municípios.

                   Os dispositivos normativos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual (que reproduzem os arts. 131 e 132 da Constituição Federal):

Artigo 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público.

..........................................................................................

Artigo 99 - São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado:

I - representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais;

II - exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior;

III - representar a Fazenda do Estado perante o Tribunal de Contas;

...........................................................................................

V - prestar assessoramento técnico-legislativo ao Governador do Estado;

V - prestar assessoramento jurídico e técnico-legislativo ao Governador do Estado;

VI - promover a inscrição, o controle e a cobrança da dívida ativa estadual;

VII - propor ação civil pública representando o Estado;

VIII - prestar assistência jurídica aos Municípios, na forma da lei;

IX - realizar procedimentos administrativos, inclusive disciplinares, não regulados por lei especial;

X - exercer outras funções que lhe forem conferidas por lei.

                   Os incisos I, II, IV, V e VI, do art. 24 e as expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do art. 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que subordinam hierarquicamente a Procuradoria Geral e demais órgãos da Advocacia Pública à Secretaria de Assuntos Jurídicos, são incompatíveis com o caput do art. 98 da Constituição Estadual porquanto esta vincula diretamente a Procuradoria-Geral ao Chefe do Poder Executivo.

                   Contrastam com os incisos I a III e V a X do art. 99 da Constituição Estadual os incisos II a XI do art. 25 da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que cometem funções típicas e exclusivas da Advocacia Pública – consistentes na representação judicial e extrajudicial do poder público e no assessoramento e consultoria nos âmbitos jurídico e normativo - à Secretaria de Assuntos Jurídicos.

                   Padece de inconstitucionalidade o inciso VII do art. 33 da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André, que consigna competir à Secretaria de Finanças “promover as medidas pertinentes à arrecadação da dívida ativa, mediante cobrança amigável, bem como providências relativas a débitos fiscais”, por pertencer exclusivamente essa atribuição ao órgão da Advocacia Pública Municipal, como se infere dos artigos 98, caput, e 99, I e VI, da Constituição Estadual, que tem a prerrogativa de representação judicial e extrajudicial do poder público além da competência para inscrição, controle e cobrança da dívida ativa, judicial ou extrajudicialmente.

III – O Pedido

                   Face ao exposto, requerer-se o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos I, II, IV, V e VI, do art. 24, dos incisos II a XI do art. 25, do inciso VII do art. 33, e das expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do art. 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André.

                   Requer-se ainda sejam requisitadas informações ao Prefeito e ao Presidente da Câmara Municipal de Santo André, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 21 de março de 2017.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

wpmj

 

 

 

 

Protocolado n. 169.897/16

Interessada: Associação dos Procuradores do Município de Santo André - APMSA

Objeto: representação para controle de constitucionalidade por omissão da Lei Orgânica Municipal e das Leis n. 3.939/72 e n. 6.608/90

 

 

 

 

 

 

Promova-se a distribuição de ação direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado em epígrafe mencionado, em face dos incisos I, II, IV, V e VI, do art. 24, dos incisos II a XI do art. 25, do inciso VII do art. 33, e das expressões “Procuradoria Geral” do § 2º do art. 50 e “bem como das Procuradorias Patrimonial, Judicial e Fiscal” do § 3º do art. 50, da Lei n. 6.608, de 12 de março de 1990, do Município de Santo André.

Promovo o arquivamento parcial da representação no tocante à inconstitucionalidade por omissão da Lei Orgânica da previsão do órgão de Advocacia Pública e respectiva carreira, bem como da inconstitucionalidade da Lei n. 3.939, de 13 de novembro de 1972.

A instituição de órgão de Advocacia Pública, segundo tudo indica, foi objeto da Lei n. 3.939, de 13 de novembro de 1972, reproduzida na Lei n. 6.609/90. E não há parâmetro constitucional que exija a topografia da Advocacia Pública e da organização de seus membros em carreira na Lei Orgânica Municipal.

É incabível, sem prejuízo da via difusa, ação direta de inconstitucionalidade em face de norma infraconstitucional anterior à Constituição (STF, ADI 02-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Paulo Brossard, 06-02-1992, m.v., DJ 21-11-1997, p. 60.585).

Com efeito, a inconstitucionalidade é sempre congênita e nunca superveniente, à vista de eventual conflito entre lei anterior e Constituição posterior, sua solução se rege pela recepção ou pela revogação, ou seja, pelo direito intertemporal (STF, ADI 1.227-4-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 02-10-2002, v.u., DJ 29-11-2002) e não pela incompatibilidade vertical própria do controle abstrato de constitucionalidade.

Ciência à interessada e à douta Promotoria de Justiça de Santo André, remetendo-lhes cópia da petição inicial e deste despacho.

 

                            São Paulo, 21 de março de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

wpmj