EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado n. 24.706/2016

 

                                                                                                                                        

Constitucional. Administrativo.  Ação direta de inconstitucionalidade por ação cumulada com ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão. Art. 5º do Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015, do Município de Roseira. Violação ao princípio da legalidade e ao art. 115, V, da Constituição Estadual. Assessor Jurídico. Atribuições da advocacia pública. Ausência de edição de lei específica que estabeleça percentual mínimo dos cargos em comissão, na estrutura administrativa do Poder Executivo, inclusive na indireta, e no âmbito do Poder Legislativo, do Município de Roseira. 1. Previsão no art. 5º do Decreto de nº 1.377, de 14 de maio de 2015, do Município de Roseira, de percentual mínimo de 10% (dez por cento) dos cargos em comissão de natureza técnica/administrativas/docentes a serem preenchidos por servidores do quadro efetivo. Violação ao princípio da legalidade, inserto no art. 111 e ao art. 115, V, da Constituição Estadual; 2. As atividades de advocacia pública e suas respectivas chefias são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito. Violação de dispositivos da Constituição Estadual (arts. 30, 98 a 100 CE/89); 3. Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão. Ausência de edição de lei específica que estabeleça percentual mínimo dos cargos de provimento em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira, na estrutura administrativa do Poder Executivo, inclusive na indireta, e no âmbito do Poder Legislativo, do Município de Roseira; 4. A exigência constitucional de percentual mínimo dos cargos em comissão a serem preenchidos por servidores de carreira institui direito de acesso dos servidores públicos efetivos aos cargos de direção superior, bem como assegura a qualidade, a eficácia e a continuidade do serviço público; 5. Princípio da simetria. Princípio constitucional estabelecido (arts. 115, V, e 144 da Constituição do Estado de São Paulo). Obrigação de legislar. Omissão relevante, transcurso de mais de 8 anos, desde nova redação dada ao inciso V do art. 115 da Constituição Estadual pela Emenda Constitucional nº 21, de 14/2/2006, e mais de 16 anos da redação que a EC nº 19/1998 deu ao inciso V do art. 37 da Constituição Federal.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 5º do Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015 e da expressão “Assessor Jurídico”, inserta na alínea “b”, do inciso II, do art. 6º e Anexo I, da Resolução de nº 03, de 14 de dezembro de 2015, do Município de Roseira, cumulada com AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO em face do Prefeito Municipal e da Câmara Municipal de Roseira, pelos fundamentos a seguir expostos:

I. INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO

         ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

         O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade - a cujas folhas reportar-se-á - foi instaurado a partir de representação encaminhada a esta Procuradoria-Geral de Justiça (fl. 02), a fim de se verificar a existência de lei no referido Município que tenha estabelecido o percentual mínimo de cargos de provimento em comissão a serem preenchidos por servidores públicos efetivos.

Ao prestar informações (fls. 09/10), o Prefeito Municipal informou haver o Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015, estabelecendo o percentual mínimo de cargos de provimento em comissão a serem preenchidos por servidores de carreira, cujo dispositivo tem a seguinte redação (fls. 11/13):

“(...)

Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015

(...)

Art. 5º - Os cargos em comissão de natureza técnica/administrativas/docentes deverão ser preenchidos por servidores do quadro efetivo no percentual mínimo de 10% (dez) por cento.

(...)”

Por sua vez, a Câmara Municipal de Roseira informou ser desnecessária referida previsão em lei do percentual mínimo de cargos de provimento em comissão a serem preenchidos por servidores de carreira porque possui apenas dois cargos de provimento em comissão (fls. 15/16).

A Resolução nº 03, de 14 de dezembro de 2015, do Município de roseira, no que interessa, tem a seguinte redação (fls. 17/36):

“(...)

Art. 6º - Compõem o quadro de servidores da Câmara Municipal de Roseira:

(...)

II – Cargos em Comissão:

a)                01 (um) Cargo de assessor Técnico Legislativo;

b)                01 (um) Cargo de Assessor Jurídico.

(...)

ANEXO I

Compõem o quadro de servidores da Câmara Municipal de Roseira:

III – Cargos em Comissão – Descrição Sumária e Detalhada

d) 01 (um) Cargo de Assessor Jurídico;

(...)

Assessor Jurídico

Requisitos necessários: Possuir registro na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB;

Descrição sumária:

Atuar em atividades de planejamento, elaboração, acompanhamento, pesquisa e execução de procedimentos e programas ligados à área jurídica;

Proporcionar assistência jurídica, nos processos e assuntos jurídicos que envolvam a instituição.

Descrição detalhada:

Executar atividades jurídicas manifestando-se sobre questões de interesse da Câmara Municipal;

Representar o Poder Legislativo Municipal em questões judiciais e/ou extrajudiciais, ativa ou passivamente, que necessitem de profissional especializado da área, independentemente de outorga de procuração;

Receber citações, intimações e notificações nas ações em que a Câmara Municipal seja parte;

Acompanhar e instruir processos, preparar defesas, recursos e peças inerentes;

Emitir pareceres;

Prestar assessoramento e apoio ao Presidente da Câmara, aos órgãos e unidades administrativas em matéria de natureza técnica e jurídica;

Informar em expedientes que lhe forem encaminhados, dentro de sua área de atuação, bem como solicita informações e documentos perante quaisquer unidades administrativas, a fim de obter elementos necessários à defesa dos interesses da Câmara Municipal;

Distribuir internamente os assuntos relacionados a processos e ações judiciais;

Responder pela procuradoria exercendo assessoramento jurídico ao Gabinete da Presidência, aos Vereadores e às Comissões Permanentes e Especiais da Câmara;

Realizar o acompanhamento das Sessões (ordinárias, extraordinárias e solenes) e emissões de pareceres;

Representar o Presidente da Câmara em tarefas correlatas que lhe forem delegadas;

Exercer a procuradoria do Legislativo e realizar a assessoria dos serviços afetos à Procuradoria;

Patrocinar a defesa da Câmara Municipal em juízo e fora dele, quando determinado pela Presidente;

Exarar pareceres em processos legislativos e manifestar-se juridicamente em matérias de natureza legislativa ou administrativa, quando solicitados;

Prestar assistência jurídica e técnica às Comissões Permanentes e às Comissões Especiais, quando solicitados;

Minutar contratos e demais documentos em que a Câmara seja parte interessada;

Prestar esclarecimentos que forem solicitados pela Mesa ou pelos Vereadores, relativos à aplicação do Regimento Interno, Lei Orgânica dos Municípios e ao andamento das proposituras;

Exarar pareceres nos processos administrativos que tramitarem pela Casa, quando solicitados pelo Presidente, Vereadores e Comissões;

Cumprir os prazos regimentais nos pareceres ou orientações em processos legislativos;

Preparar os documentos na ausência ou falta de funcionários;

Prestar orientação de natureza jurídica aos senhores Vereadores;

Preparar projetos de Lei, de Resolução e de Decreto Legislativo, assim como verificar Atos e Portarias;

Acompanhar processos junto ao Judiciário, Tribunal de Contas e demais órgãos oficiais em que a Câmara figure como parte;

Executar a datilografia ou digitação dos documentos confeccionados;

Distribuir tarefas conforme a competência de cada cargo e setor;

Assinar e responder pelos atos de sua unidade junto à Presidência da Câmara, Tribunal de Contas e outros Órgãos de fiscalização decorrente de Poderes devidamente constituídos;

Fiscalizar a realização da execução de outras tarefas afins pertencentes à Procuradoria;

Coligir informações sobre legislação federal, estadual e municipal atinente às atividades da Câmara;

Informar à chefia as irregularidades encontradas nas instalações das dependências da Câmara;

Exercer outras atividades correlatas determinadas pela chefia.

(...)”

A previsão normativa citada acima, é inconstitucional por violação aos arts. 30, 98, 99, 100, 111, 115, V, 144 da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.

II. O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

Os dispositivos impugnados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta.

Os dispositivos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“(...)

Artigo 30 - À Procuradoria da Assembléia Legislativa compete exercer a representação judicial, a consultoria e o assessoramento técnico-jurídico do Poder Legislativo.

Parágrafo único - Lei de iniciativa da Mesa da Assembléia Legislativa organizará a Procuradoria da Assembléia Legislativa, observados os princípios e regras pertinentes da Constituição Federal e desta Constituição, disciplinará sua competência e disporá sobre o ingresso na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos.

(...)

Art. 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. 

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal. 

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

(...)

Art. 99 - São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado: 

I - representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais; 

II - exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior;

Art. 100 - A direção superior da Procuradoria-Geral do Estado compete ao Procurador Geral do Estado, responsável pela orientação jurídica e administrativa da instituição, ao Conselho da Procuradoria Geral do Estado e à Corregedoria Geral do Estado, na forma da respectiva lei orgânica.

Parágrafo único - O Procurador Geral do Estado será nomeado pelo Governador, em comissão, entre os Procuradores que integram a carreira e terá tratamento, prerrogativas e representação de Secretário de Estado, devendo apresentar declaração pública de bens, no ato da posse e de sua exoneração.

Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)”

III. INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO: ART. 5º DO DECRETO DE Nº 1.377, DE 14 DE MAIO DE 2015, DO MUNICÍPIO DE ROSEIRA

De início, cumpre mencionar ser inconstitucional a ausência de lei que estabeleça percentual mínimo de cargos de provimento em comissão a serem ocupados por servidores de carreira.

Na presente situação, há apenas o art. 5º do Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015, do Município de Roseira, o qual viola os arts. 111, 115, V e 144, da Constituição Estadual, que têm a seguinte redação:

“(...)

Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)” g.n

         Tendo em vista que a criação de percentual mínimo de cargos de provimento em comissão encontra-se adstrito à reserva absoluta ou formal, a invalidade da previsão daquele no art. 5º do Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015, do Município de Roseira, resta presente.

Inclusive esse egrégio Tribunal de Justiça já se manifestou nesse sentido:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO – AUSÊNCIA DE LEI QUE ESTABELEÇA PERCENTUAL MÍNIMO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO NA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DO MUNICÍPIO DE JAMBEIRO E DA CÂMARA MUNICIPAL - MORA LEGISLATIVA RECONHECIDA – OFENSA AO ART. 115, V, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – AÇÃO PROCEDENTE”. (TJ/SP, ADI nº 2171386-11.2016.8.26.0000, Des. Rel. Ferraz de Arruda, julgada em 01 de fevereiro de 2017) g.n

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO – AUSÊNCIA DE LEI ESTABELECENDO PERCENTUAL MÍNIMO DE CARGOS EM COMISSÃO, NA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DO PODER LEGISLATIVO DE JACAREÍ, A SER OCUPADO POR SERVIDORES EFETIVOS – NORMA DO ARTIGO 115, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – MORA LEGISLATIVA CONFIGURADA – FIXAÇÃO DO PRAZO DE 180 (CENTO E OITENTA DIAS) PARA PROVIDÊNCIAS, A CONTAR DA DATA DO JULGAMENTO – ESTABELECIMENTO DO PERCENTUAL MÍNIMO DE 50% (CINQUENTA POR CENTO) PARA O CASO DE PERSISTIR A INÉRCIA – PEDIDO INICIAL JULGADO PROCEDENTE”. (TJ/SP, ADI nº 2127177-54.2016.8.26.0000, Des. Rel. Francisco Casconi, julgada em 19 de outubro de 2016) g.n

IV. INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO: ASSESSOR JURÍDICO, PREVISTO NA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DA CÂMARA MUNICIPAL DE ROSEIRA

É inconstitucional a criação de cargos ou empregos de provimento em comissão cujas atribuições são de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento efetivo mediante aprovação em concurso público.

         A criação de cargos de provimento em comissão não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional, devendo, nos termos do art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, e do art. 115, II e V, da Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada para o exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.

         Não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção, e não nos meramente burocráticos, definitivos, operacionais, técnicos, de natureza profissional e permanente.

         Portanto, têm a ver com essas atribuições de natureza especial (assessoramento, chefia e direção em nível superior), para as quais se exige relação de confiança, pouco importando a denominação e a forma de provimento atribuídas, pois, verba non mutant substantiam rei. Necessária é a análise de sua natureza excepcional, a qual não se satisfaz com a mera declaração do legislador. O essencial é análise do plexo de atribuições das funções públicas.

         É dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes político-governamentais. Não coaduna a criação de cargos desse jaez – cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou funções profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas, rotineiras.

         A jurisprudência proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, ao exigir que elas demonstrem, de forma efetiva, que eles tenham funções de assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008; STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJe 13-09-2007, RTJ 202/553; STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-02-2012, v.u., DJe 05-03-2012).

Ademais, é incompatível com os arts.  30 e 98 a 100 da Constituição Estadual a forma de provimento em comissão livre destinada ao cargo de Diretor Jurídico no dispositivo impugnado.

Pois, não bastassem as ponderações anteriores, atividades inerentes à advocacia pública como assessoramento, consultoria e representação jurídica dos órgãos e entidades da Administração Pública centralizada ou descentralizada, são exclusivamente reservadas a profissionais investidos em cargos de provimento efetivo da respectiva carreira mediante aprovação prévia em concurso público, como revela a remissão ao art. 132 da Constituição Federal contida no § 1º do art. 98 da Constituição Estadual.

Assim, as atividades de advocacia pública, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais investidos mediante aprovação em concurso público.

Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes, o que é reverberado pela jurisprudência:

“AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE – ARTS. 35 E 36 E ANEXO III DA LEI 1.751/91 E ART. 3º DA LEI 1.982/95, AMBAS DO MUNICÍPIO DE ELIAS FAUSTO – INADMISSIBILIDADE DE PREVISÃO DE EMPREGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO SEM DESCRIÇÃO DAS RESPECTIVAS ATRIBUIÇÕES – CARGO DE “CONSULTOR JURÍDICO” QUE DEVE SER PROVIDO NA FORMA DE SISTEMA DE MÉRITO, POR SE TRATAR DE ADVOCACIA PÚBLICA – PREVISÃO DE GRATIFICAÇÃO DE ATÉ 100% DE ACRÉSCIMO SALARIAL QUE CONFIGURA AUMENTO INDIRETO E DISSIMULADO DE REMUNERAÇÃO – VIOLAÇÃO AOS ARTS. 5º, 98, 99, 100, 115, 128 E 144 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – AÇÃO JULGADA PROCEDENTE PELO MÉRITO COM MODULAÇÃO DE EFEITOS”. (TJSP, II nº 2145442-41.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. João Negrini Filho, julgado em 27 de janeiro de 2016, v.u)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Arts. 1º, §1º, II e III, e 8º, da Lei nº 1.585/2009, e art. 1º, parágrafo único, II, da Lei nº 1.568/2009, todas do município de Salesópolis – Criação dos cargos de “Diretor técnico Jurídico do departamento de Contenciosos Judiciais e Execução Fiscal” e “Diretor Técnico Jurídico do departamento de Assuntos Administrativos, Licitações, Contratos e Convênios” e “Advogado” – Descrição que caracteriza atividade exclusiva funcional dos integrantes da Advocacia Pública, cuja investidura no cargo depende de prévia aprovação em concurso público – Violação dos artigos 98 a 100, da Constituição Paulista – Ação procedente, modulados os efeitos desta decisão para terem início em cento e vinte dias contados a partir deste julgamento”. (TJSP, ADI nº 2163849-95.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Luiz Antonio de Godoy, julgado em 09 de dezembro de 2015, v.u)   

“Ação direta de inconstitucionalidade. Cargo de Assessor Jurídico da Câmara Municipal de Novo Horizonte. Cargo em comissão. Hipótese de que não configura função de chefia, assessoramento e direção. Função técnica. Atividade de advocacia pública. Inobservância aos arts. 98 a 100, 111, 115, incisos I, II e V, e 144, todos da Constituição Estadual. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Ação procedente.” (TJSP, ADI nº 2114733-23.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Márcio Bartoli, julgado em 9 de dezembro de 2015, v.u)

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Questionamento do artigo 11 da Lei nº 10, de 26 de março de 2014, do município de Palestina, na parte em que criou o cargo de provimento em comissão de “Assessor Jurídico”. Alegação de inconstitucionalidade. Reconhecimento. Cargo que – a par de não corresponder a funções de direção, chefia e assessoramento superior – tem as mesmas atribuições da Advocacia Pública e, pela ausência de situação de emergência e excepcionalidade, deve ser reservado a profissional recrutado por sistema de mérito e aprovação em certame público, nos termos do art. 98 a 100, da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade manifesta. Ação julgada procedente.” (TJSP, ADI nº 2155538-52.2014.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Ferreira Rodrigues, julgado em 13 de maio de 2015, v.u)

Portanto, é incompatível o provimento comissionado com a advocacia pública, de modo a revelar a inconstitucionalidade do cargo de Assessor Jurídico, inserto na alínea “b”, do inciso II, do art. 6º e Anexo I da Resolução de nº 03, de 14 de dezembro de 2015, do Município de Roseira.

V. INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO: AUSÊNCIA DE LEI QUE ESTABELEÇA PERCENTUAL MÍNIMO DOS CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO A SEREM PRENCHIDOS POR SERVIDORES DE CARREIRA NA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DO PODER EXECUTIVO, INCLUSIVE NA INDIRETA, E NO ÂMBITO DO PODER LEGISLATIVO, DO MUNICÍPIO DE ROSEIRA

A-   DA OMISSÃO INCONSTITUCIONAL

A necessidade da fixação em lei de percentual mínimo de cargos em comissão na estrutura administrativa dos Poderes Públicos a serem ocupados por servidores efetivos decorre da Emenda Constitucional nº 21, de 14.02.2006, que, reproduzindo o art. 37, V, da Constituição Federal (com a redação dada pela EC nº 19/1998), deu a seguinte redação ao art. 115, V da Constituição Estadual:

“(...)

Art. 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento

(...)”.

A regra dos cargos em comissão é a transitoriedade.

Todavia, o que se vê no Brasil é uma burla à Constituição às avessas, um número de 600 mil servidores que não são concursados, mas que são investidos em cargos que deveriam ser ocupados por servidores titulares de cargos de provimento efetivo.

A Emenda nº 19/98 tentou corrigir essa perversão do sistema, ao alterar o inciso V do art. 37 da Constituição Federal. A Emenda determinou que um percentual mínimo dos cargos em comissão fosse ocupado por servidores concursados.

A nossa ordem constitucional republicana privilegia a meritocracia, não o favoritismo, o nepotismo ou qualquer outro subjetivismo.

O princípio da moralidade impõe o recrutamento do pessoal que servirá ao Poder Público pelo critério do concurso público. Excepcionalmente, para hipóteses cada vez mais excepcionalíssimas, caberá o provimento em comissão e, dentre essas hipóteses, há que prevalecer a preferência por quem já integra a carreira.

Os cargos públicos têm de restar acessíveis a todos aqueles que, providos da qualificação profissional exigida, também se mostrem merecedores de ocupá-los, após vencerem a corrida de obstáculos de um concurso sério, transparente, aberto a todos, fenômeno com o qual a Democracia não pode transigir.

Cumpre salientar que o art. 115, V, da Constituição Estadual institui o princípio constitucional de acessibilidade aos cargos de direção superior da administração aos servidores públicos efetivos.

A necessidade de observância a tal mandamento constitucional visa não só estimular e servir de prêmio à dedicação do servidor efetivo, mas passa a integrar o próprio plano de carreira. Deve se estabelecer uma proporcionalidade para que alguns cargos de provimento em comissão da administração sejam preenchidos por servidores públicos efetivos.

De outro lado, tal proporcionalidade é necessária para assegurar a qualidade, a eficiência, a profissionalização e a continuidade do serviço público, sobretudo por ocasião das mudanças de governo, quando se verifica uma substituição significativa dos ocupantes de cargos importantes da direção superior da Administração Pública. Nas trocas de governos, deve existir uma estrutura mínima de pessoal do quadro de servidores públicos para ocupação de postos responsáveis pela condução superior da administração para que ela não sofra solução de continuidade.

O art. 90 da Constituição Estadual prevê a ação de inconstitucionalidade por omissão de medida necessária para tornar efetiva norma ou princípio da Constituição.

A omissão na fixação do percentual que assegurará a acessibilidade aos cargos em comissão pelos servidores efetivos configura violação ao art. 115, V, da Constituição Estadual, que, pelo princípio da simetria previsto em seu art. 144, deve ser observado pelos municípios na sua produção normativa e organização administrativa.

B.    DO DEVER DE LEGISLAR

A nossa Constituição Federal tem natureza compromissória e dirigente, uma vez que, mais do que organizar e limitar o poder político, institui direitos consubstanciados em prestações materiais exigíveis e impõe metas vinculantes para os poderes constituídos.

A realização ordinária da vontade constitucional concretiza-se através do processo legislativo conduzido pelos agentes públicos eleitos e pelo exercício regular das atribuições conferidas aos órgãos públicos.

No entanto, quando a inefetividade se instala, frustrando a supremacia da Constituição, cabe ao Judiciário suprir o déficit de legitimidade democrática da atuação do Legislativo.

A Constituição Federal é composta de normas jurídicas dotadas de supralegalidade. Atributo das normas constitucionais é sua imperatividade. Descumpre a imperatividade de uma norma constitucional quer quando se adota uma conduta por ela vedada – em violação a uma norma proibitiva, quer quando se deixa de adotar uma conduta por ela determinada – em violação de uma norma preceptiva. Porque assim é, a Constituição é suscetível de violação tanto por ação como por omissão. (Luís Roberto Barroso, O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2012, p. 279).

Na hipótese que se apresenta, a omissão normativa municipal de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, no que diz respeito ao quadro funcional da Administração Direta e da Indireta, e de iniciativa do Poder Legislativo, no que toca à estrutura da Câmara Municipal, reclamam intervenção excepcional do Judiciário para a realização da vontade constitucional.

A propósito, já decidiu o Supremo Tribunal Federal que:

“Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público.” (STF. ADIn 1.439-DF, Rel Min. Celso de Mello, DJ 30.05.2003)

Observe-se que a referida norma constitucional não possui eficácia imediata, pois exige que a lei estabeleça as condições e os percentuais mínimos dos cargos em comissão que serão preenchidos por servidores públicos efetivos.

Assim, a fixação de percentual de cargos de comissão a serem preenchidos por servidores público efetivos é necessária para que se torne efetivo o art. 115, V, da Constituição Estadual que garante ao servidor público efetivo acesso aos cargos da administração superior do município.

Lembremos que, embora existam outras classificações quanto à eficácia das normas constitucionais, ou seja, sua aptidão para produção de efeitos no mundo jurídico, é convincente aquela proposta por José Afonso da Silva, que as separa em: (a) normas de eficácia plena (self-executing ou “autoexecutáveis”); (b) normas de eficácia contida (ou de conteúdo “restringível”); (c) normas de eficácia limitada (not self-executing, ou “não autoexecutáveis”).

Sabe-se que somente as primeiras, nessa classificação (normas de eficácia plena) produzem efeitos imediatos, independentemente de edição de normas infraconstitucionais. As da segunda categoria, por sua vez, são aquelas que produzem efeitos imediatos mesmo sem serem regulamentadas, mas estão sujeitas a delimitação ou restrições por norma infraconstitucional. As da última categoria são esvaziadas de eficácia imediata, só concretizando a promessa constitucional nelas contida com a edição da legislação infraconstitucional pertinente ao tema (autor citado, Aplicabilidade das normas constitucionais, 3. ed., São Paulo, Malheiros, 1998, p. 63 e ss).

Naquilo que interessa ao caso específico, não há dúvida de que o dispositivo constitucional mencionado assegura a acessibilidade dos servidores públicos aos cargos em comissão. A concretização dessa diretriz constitucional está nitidamente vinculada ou condicionada à edição de ato normativo de escalão inferior para a fixação do seu percentual e condições.

Desse modo, tratando-se de matéria subordinada à iniciativa legislativa do Prefeito Municipal, nos termos do art. 24, § 2º, 1, da Constituição Estadual, quanto aos servidores que compõe a Administração Direta e a Indireta, e à iniciativa da Câmara Municipal, quanto ao seu quadro de servidores, verificada a inércia, fica absoluta e incontestavelmente configurada a omissão normativa, a exigir a intervenção do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através do exercício da jurisdição constitucional.

C.    A OMISSÃO NORMATIVA INFRACONSTITUCIONAL E SUA SOLUÇÃO

A superlativa gravidade da omissão normativa inconstitucional se evidencia, na medida da constatação de que ela perdura por mais de seis anos, considerada a data da redação dada ao inciso V do art. 115 da Constituição Estadual. E, por mais de 14 anos, tomando por base a redação do art. 37, V, da Constituição Federal.

Com efeito, ao prestar informações, o Prefeito Municipal informou haver apenas o Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015, do Município de Roseira, prevendo o percentual mínimo de 10% (dez por cento) dos cargos de provimento em comissão a serem preenchidos por servidores públicos efetivos, que conforme afirmado em tópico anterior não supre a exigência de lei, inserta no art. 115, V, da Constituição Estadual (fls. 09/10).

Por sua vez, a Câmara Municipal de Roseira se manifestou no sentido da desnecessidade de referida previsão em lei porque possui apenas dois cargos de provimento em comissão (fl. 15/16), o que se mostra inadmissível, além do que pode haver criação de novos cargos de provimento em comissão a serem ocupados por comissionados puros.

 A omissão do Prefeito Municipal e da Câmara Municipal, respectivamente, em dar início ao processo legislativo, em conformidade com os parâmetros constitucionais, estabelecendo percentual mínimo de cargos em comissão a serem ocupados por servidores público efetivos, indica de modo claro a prevalência da omissão legislativa, levando-nos a concluir que sem a intervenção jurisdicional, com o reconhecimento da inconstitucionalidade por omissão, a lacuna infraconstitucional não encontrará solução.

A omissão do legislador para tornar efetiva norma constitucional de eficácia limitada encontra reparo através da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. É o que dispõe o art. 90, § 4º, da Constituição Estadual (que reproduz, com adaptações, a previsão contida no art. 103, § 2º, da CF):

“(...)

Art. 90.

(...)

§ 4º. Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma desta Constituição, a decisão será comunicada ao Poder competente para a adoção das providências necessárias à prática do ato que lhe compete ou início do processo legislativo, e, em se tratando de órgão administrativo, para a sua ação em trinta dias, sob pena de responsabilidade.

(...)”.

O Col. Supremo Tribunal Federal tem, há muito, reafirmado a necessidade de firme combate às omissões normativas inconstitucionais, que se revelam tanto na ausência de norma infraconstitucional como na sua insuficiência para dar concretude às diretrizes estabelecidas na Constituição Federal (ADI 1.458-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 23-5-96, DJ de 29-9-96. No mesmo sentido: ADI 1.439-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-5-96, DJ de 30-5-03).

A propósito do tema, inclusive, esse Colendo Órgão Superior decidiu recentemente que:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO. Alegação de ofensa ao Art. 115, inciso V, da Constituição Estadual, que dispõe que os cargos em comissão (destinados apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento) devem ser preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei.

Reconhecimento de inconstitucionalidade em razão da inexistência de norma disciplinando a questão no âmbito do município de Nova Campina. Mora legislativa configurada. Ação procedente com fixação do prazo de 180 (cento e oitenta) dias para que a omissão seja suprida.

Estabelecimento, ainda, do percentual mínimo de 50 % (cinquenta por cento) para preenchimento dos cargos em comissão por servidores públicos efetivos, na hipótese de persistência da omissão normativa além do prazo fixado. (Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão nº 0140894-75.2013.8.26.0000, Rel. Des. Ferreira Rodrigues, j. 20 de agosto de 2014).”

A doutrina, do mesmo modo, anota que a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão é instrumento de “defesa da integralidade da vontade constitucional. É procedimento apropriado para a declaração da mora do legislador, com o consequente desencadeamento, por iniciativa do próprio órgão remisso, do processo de suprimento da omissão inconstitucional” (Clèmerson Merlin Clève, A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro, 2. ed., São Paulo, RT, 2000, p. 339/340).

Confira-se ainda: Luís Roberto Barroso, O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2004, p. 195/198; Oswaldo Luiz Palu, Controle de constitucionalidade, 2. ed., São Paulo, RT, 2001, p. 285/291.

Tendo presente que o processo objetivo de controle de constitucionalidade tem como finalidade assentada na Constituição Federal assegurar sua eficácia normativa, a interpretação finalista e sistemática para tal instituto deve conduzir à conclusão de que a mera determinação de suprimento da omissão legislativa não será suficiente no caso concreto aqui examinado, pois seguramente haverá manutenção da situação de omissão inconstitucional.

Esse quadro demonstra o acerto da solução da doutrina e da jurisprudência que vislumbram a possibilidade de suprimento da omissão normativa infraconstitucional pela própria decisão proferida no controle concentrado.

Dirley da Cunha Júnior (Controle judicial das omissões do poder público, São Paulo, Saraiva, 2004, p. 547) põe a questão em destaque, observando que:

“(...)

para além da ciência da declaração da inconstitucionalidade aos órgãos do Poder omissos, é necessário que se estipule um prazo razoável para o suprimento da omissão. Mas não é só. A depender do caso, expirado esse prazo sem que qualquer providência seja adotada, cumprirá ao Poder Judiciário, se a hipótese for de omissão de medida de índole normativa, dispor normativamente sobre a matéria constante da norma constitucional não regulamentada. Essa decisão, acentue-se, será provisória, terá efeitos gerais (erga omnes) e prevalecerá enquanto não for realizada a medida concretizadora pelo poder público omisso (...)”. (g.n.)

 No mesmo sentido, é o pensamento de Luís Roberto Barroso, formulando críticas à interpretação restritiva do alcance do instituto aqui empregado (O controle de constitucionalidade no direito brasileiro, cit., p. 208/214), bem como a doutrina de Clèmerson Merlin Clève (A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro, cit., p. 349/350).

Em suma, com o esperado acolhimento desta ação, será pertinente a fixação de prazo para que a lacuna legislativa seja eliminada, bem como a determinação de que, na hipótese de persistência da omissão normativa, como decorrência da eficácia vinculante da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça, seja fixado percentual mínimo para os comissionamentos do pessoal com vínculo efetivo com a municipalidade.

Apenas a título de ilustração e como parâmetro para a fixação do percentual mínimo por esse Colendo Órgão Especial necessária para conferir eficácia vinculante à decisão a ser proferida, importante apontar a proporção de cargos em comissão existentes no Governo Federal, tradicionalmente apontado como fonte inesgotável de funções comissionadas, verificada no  Boletim Estatístico de Pessoal, publicado no mês de janeiro de 2013, (http://www.servidor.gov.br/publicacao/boletim_estatistico/bol_estatistico_13/Bol201_Jan2013.pdf).

De acordo com o referido documento, havia, em dezembro de 2012, 90.173 servidores exercendo funções comissionadas na União (em um universo de 999.661 servidores). O grupo mais significativo e com maior evidência dentre essas funções refere-se os cargos de DAS (Cargo de Direção e Assessoramento Superiores). O número de servidores enquadrados nesse quadro corresponde a 24,85 % do total de comissionados da União (22.417 funcionários) e, dentre esses, apenas 26,4% (5.930) são comissionados puros que não tem qualquer vínculo com a Administração Pública. Ainda que não seja vinculante, o comportamento da União, que conta com a maior arrecadação dentre os entes federativos, deve ser espelho para as demais, sobretudo os menores - inclusive do ponto de vista fiscal - que são os Municípios.

VI. DO PEDIDO LIMINAR

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município de Roseira apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se ilegítima investidura em cargos públicos e a consequente oneração financeira do erário e à boa organização dos serviços públicos locais de advocacia pública.

À luz desta contextura, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento da expressão “Assessor Jurídico”, inserta na alínea “b”, do inciso II, do art. 6º e Anexo I da Resolução de nº 03, de 14 de dezembro de 2015, do Município de Roseira.

VII.    DO PEDIDO PRINCIPAL

Face ao exposto, requer-se o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para:

a)                       declarar a inconstitucionalidade do art. 5º do Decreto nº 1.377, de 14 de maio de 2015 e da expressão “Assessor Jurídico”, inserta na alínea “b”, do inciso II, do art. 6º e Anexo I, da Resolução de nº 03, de 14 de dezembro de 2015, do Município de Roseira;

         b) a declaração da existência de mora legislativa, quanto à edição de lei específica (Poder Executivo) e ato normativo específico (Câmara Municipal), para fixação de percentual mínimo dos cargos em comissão a serem preenchidos por servidores públicos de carreira, em relação à estrutura administrativa do Poder Executivo (inclusive da administração descentralizada) e à do Poder Legislativo, do Município de Roseira;

         c) seja dada ciência à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Roseira, fixando-se prazo sucessivo para o encaminhamento de proposta legislativa (Prefeito Municipal) e para a edição dos atos normativos (Câmara Municipal), imprescindíveis à concretização das diretrizes constitucionais já consignadas;

         d) seja fixado percentual mínimo dos cargos em comissão para preenchimento por servidores públicos efetivos, a ser observado pelo município, na hipótese de persistência da omissão normativa além do prazo fixado no item anterior.

Requer-se, ainda, que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Roseira, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre os atos normativos impugnados.

 Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 Termos em que,

 Aguarda-se deferimento.

São Paulo, 17 de março de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

wpmj/mi

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 24.706/2016

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade cumulada com Inconstitucionalidade por Omissão em relação ao Município de Roseira.

2.     Providenciem-se as anotações e comunicações de praxe aos interessados.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 17 de março de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

 

wpmj/mi