Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

Protocolado n. 169.822/16

 

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação Direta Inconstitucionalidade. Art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, inclusive na redação das Leis n. 1.506, de 20 de julho de 1999, n. 1.827, de 22 de setembro de 2006, e n. 2.344, de 22 de novembro de 2016, do Município de Mirante do Paranapanema. Servidor público. Remuneração. Gratificação. Dedicação plena. Percentual aleatório. Ofensa à impessoalidade. Art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, inclusive na redação do art. 4º da Lei Complementar 113, de 22 de novembro de 2016, e do art. 2º da Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017, do Município de Paranapanema. Servidor público. Regime jurídico. Licença para tratamento de assuntos de interesse particular. Concessão obrigatória. Violação ao interesse público e à eficiência.

1. Ofende a razoabilidade, o interesse público, e as exigências do serviço a instituição de gratificação de dedicação plena a servidores comissionados porque não são servidores que ocupam cargo público a título profissional, mas, por relação de confiança em postos de assessoramento, chefia e direção em que a dedicação plena é elementar à natureza da investidura em comissão e seu estipêndio básico já o remunera por ela (arts. 111 e 128, CE/89).

2. A possibilidade de fixação aleatória de seu valor, limitado a um percentual máximo, corrompe a impessoalidade e discrepa da reserva legal absoluta e da separação de poderes (arts. 5º, 24, § 2º, 1, e 111, CE/89).

3. Não consulta o interesse público e a eficiência a obrigatoriedade de concessão de licença não remunerada para tratamento de assuntos de interesse particular ao servidor público, ceifando o Chefe do Poder Executivo do exame de sua conveniência e oportunidade e periclitando a continuidade e a regularidade do serviço (art. 111, CE/89).

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face das expressões “comissionados” e “de até 100% (cem por cento)” do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, na redação da Lei n. 2.344, de 22 de novembro de 2016 (e, por arrastamento, da Lei n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, e da redação original do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989) e do art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, na redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017 (e, por arrastamento, do art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016), do Município de Mirante do Paranapanema, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – Os Preceitos Normativos Impugnados

                   O art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, em sua redação original assim dispunha:

Artigo 6º - Como forma de compensação à dedicação plena de serviço, poderá ser concedido aos ocupantes de cargos de provimento em comissão constantes do anexo II da Lei nº 979, de 07 de junho de 1985, com as alterações da Lei Municipal nº 1.119, de 09 de maio de 1989, gratificação mensal de até 50% (cinquenta por cento) sobre os respectivos vencimentos.                 

                   Referido preceito foi alterado diversas vezes.

                   A Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, deu-lhe a seguinte redação:

Artigo 1º - Fica alterado o artigo 6º, da Lei Municipal nº 1133, de 11 de setembro de 1989, para a seguinte redação:

Artigo 6º - Como forma de compensação à dedicação plena de serviço, poderá ser concedido aos funcionários públicos municipais, concursados, efetivos, comissionados, gratificação mensal de até 100% (cem por cento) sobre os respectivos salários base.

                   A Lei n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, modificou a redação do art. 1º da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, in verbis:

Artigo 1º - Fica alterado o artigo 1º das Lei Municipal nº 1506, de 20 de julho de 1999, que passa a vigorar com a seguinte redação:

Artigo 6º - Como forma de compensação à dedicação plena de serviço, poderá ser concedido aos funcionários públicos municipais, concursados, efetivos, comissionados e aprovados por processo seletivo, gratificação mensal de até 100% (cem por cento) sobre o salário base.

                   E a Lei n. 2.44, de 22 de novembro de 2016, atribuiu-lhe a seguinte redação:

Artigo 1º - O ARTIGO 6º DA LEI MUNICIPAL Nº 1133, DE 11 DE SETEMBRO DE 1989, e suas ulteriores redações dadas pela LEI MUNICIPAL Nº 1.506, DE 20/07/1999 E LEI MUNICIPAL Nº 1.827, DE 22/11/2006, passa a vigorar com a seguinte redação:

Artigo 6º - Como forma de compensação à dedicação plena de serviço, poderá ser concedido aos funcionários públicos municipais, concursados, efetivos e comissionados, gratificação mensal de até 100% (cem por cento) sobre os salários base.

                   A Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, que instituiu o regime jurídico dos servidores públicos municipais, dispunha em sua redação original o seguinte:

Artigo 107 - O funcionário estável terá direito à licença para tratar de assuntos de interesse particular, sem vencimentos e por período não superior a (02) dois anos.

§ 1º - A licença não será concedida quando o afastamento do funcionário for inconveniente ao serviço público.

§ 2º - O funcionário deverá aguardar em exercício a concessão da licença.

§ 3º - Somente será concedido nova licença, após decorrido o período de 60 (sessenta) meses de serviços ininterruptos prestados a municipalidade.

Artigo 108 - Não será concedida licença para tratar de assuntos particulares ao servidor nomeado, removido ou transferido antes que este assuma o exercício do cargo.

Artigo 109 - A autoridade que houver concedido a licença poderá determinar o retorno do funcionário, sempre que o exigir o interesse público.

Artigo 110 - O funcionário poderá, a qualquer tempo, reassumir o exercício das atribuições do cargo, cessando-se, assim, os efeitos da licença.

Artigo 111 - O funcionário não poderá obter nova licença para tratar de assuntos de interesse particular antes de decorridos dois (02) anos do término da anterior.

                  

                   O art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016, deu a seguinte redação:

Artigo 4º - O ARTIGO 107 da Lei Complementar nº 13/95, de 18 de julho de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação:

ARTIGO 107 – O funcionário estável terá direito à licença para tratar de assuntos de interesse particular, sem vencimentos, e por um período de até dois anos, renovável por igual período concedido, a critério do servidor.

                   Além disso, o art. 1º da Lei Complementar n. 133, de 22 de novembro de 2016, revogou o art. 109 da Lei Complementar n. 13/95.

                   Por fim, a Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017, revogou a Lei Complementar n. 113/16 e alterou em seu art. 2º o art. 107 da Lei Complementar n. 13/95, in verbis:

Artigo 2º - O ARTIGO 107 da Lei Complementar nº 13/95, de 18 de julho de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação:

ARTIGO 107 – O funcionário estável terá direito à licença para tratar de assuntos de interesse particular, sem vencimentos, e por um período de até dois anos, podendo a autoridade que concedeu a licença determinar o retorno do funcionário sempre que exigir o interesse público.

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

                   Os dispositivos acima referidos contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

                   Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta. Destarte, as prescrições da Constituição Estadual que arquitetam o modelo e o perfil da Advocacia Pública são aplicáveis aos Municípios.

                   Os dispositivos normativos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições.
§ 2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.

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Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

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1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração;

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Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

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Artigo 128 - As vantagens de qualquer natureza só poderão ser instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço.

1. Gratificação de dedicação plena          

1.1. Ausência de razoabilidade, interesse público e exigências do serviço na concessão a servidores comissionados

                   As expressões “comissionados” e “de até 100% (cem por cento)” do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, na redação da Lei n. 2.344, de 22 de novembro de 2016, contrastam com os arts. 5º, 24, § 2º, 1, 111, e 128, da Constituição Estadual.

                   Adicional ou gratificação de dedicação plena é relacionado ao regime especial de trabalho do servidor público, em que o servidor desempenha suas funções exclusivamente à pessoa jurídica de direito público a que se vincula, sem estar impedido do desempenho de outras em entidade pública ou privada, diversas das que desempenha para aquela em regime de dedicação plena (Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., p. 231).

                   Hely Lopes Meirelles explica a diferença entre dedicação de tempo integral e dedicação exclusiva:

“A diferença entre o regime de tempo integral e o de dedicação plena está em que, naquele, o servidor só pode trabalhar no cargo ou na função que exerce para a Administração, sendo-lhe vedado o desempenho de qualquer outra atividade profissional púbica ou particular, ao passo que neste (regime de dedicação plena), o servidor trabalhará na atividade profissional de seu cargo ou de sua função exclusivamente para a Administração, mas poderá desempenhar atividade diversa da de seu cargo ou de sua função sem qualquer outro emprego particular ou público, desde que compatíveis com o da dedicação plena.

No regime de tempo integral o servidor só poderá ter um emprego; no de dedicação plena poderá ter mais de um desde que não desempenhe a atividade correspondente à sua função pública exercida neste regime. Exemplificando: o professor em regime de tempo integral só poderá exercer as atividades do cargo e nenhuma outra atividade profissional pública ou particular; o advogado em regime de dedicação plena só poderá exercer a advocacia para a Administração da qual é servidor, mas poderá desempenhar a atividade de magistério ou qualquer outra, para a Administração (acumulação de cargos) ou para particulares” (Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, 16ª. ed., Revista dos Tribunais, 1991, pp. 401-403).

                   Ora, não há substrato lógico, proporcional e racional para se instituir em prol de servidores investidos em cargos de provimento em comissão gratificação pela dedicação plena ao serviço, posto não serem servidores que ocupam cargo público a título profissional, mas, por relação de confiança em postos de assessoramento, chefia e direção em que a dedicação plena é elementar à natureza da investidura em comissão e seu estipêndio básico já o remunera por ela.

                   Logo, a expressão “e comissionados” do art. 6º da Lei n. 1.133/89 na redação dada pelo art. 1º da Lei n. 2.344/16 não prima pelos princípios de razoabilidade e interesse público nem atende a exigências do serviço (arts. 111 e 128, Constituição Estadual).

                   Idênticas máculas acoimavam a redação original do art. 6º da Lei n. 1.133/89 – que instituía a gratificação em prol exclusivamente do servidor comissionado – bem como as expressões “comissionados” que as Leis n. 1.506/99 e n. 1.827/06 atribuíram ao art. 6º da Lei n. 1.133/89.

1.2. Inobservância de impessoalidade, separação de poderes e reserva de lei em seus valores

                   As expressões “de até 50% (cinquenta por cento)” da redação original do art. 6º da Lei n. 1.133/89, e “de até 100% (cem por cento)” que as Leis n. 1.506/99, n. 1.827/06 e n. 2.344/16 atribuíram ao art. 6º da Lei n. 1.133/89, são incompatíveis com os princípios de impessoalidade, separação de poderes e reserva de lei (arts. 5º e 111, Constituição Estadual).

                   A permissão contida na lei em foco que o valor dessa gratificação seja fixado a partir de percentuais variáveis observado limite máximo, definidos a critério do Chefe do Poder Executivo, ofende os princípios de separação de poderes, reserva de lei e impessoalidade na Administração Pública, previstos nos arts. 5º, 24, § 2º, 1, e 111 da Constituição Estadual.

         Ora, a estipulação de seus valores ficou confiada ao alvedrio do Chefe do Poder Executivo, descumprindo o princípio da legalidade remuneratória atinente aos servidores públicos (decorrência do princípio da legalidade administrativa), que, corrompendo a impessoalidade, fornece ao Chefe do Poder Executivo ampla e excessiva discricionariedade, permitindo-lhe aquinhoar, por escolha imotivada ou motivada por critérios alheios ao interesse público primário, alguns servidores credores da gratificação com percentuais maiores ou menores que outros igualmente nessa situação.

                   A escolha aleatória, subjetiva, pessoal e diferenciada dos percentuais da gratificação não se amolda às exigências da moralidade e impessoalidade na medida em que é permeável a critérios desprovidos de objetividade, neutralidade, imparcialidade, igualdade e impessoalidade. Na compreensão do princípio da impessoalidade está, entre outros, a matriz da igualdade, repudiando tratamentos discriminatórios desprovidos de relação lógica e proporcional entre o fator de discriminação e a sua finalidade.

                   A previsão legal impugnada possibilita, portanto, ao Chefe do Poder Executivo local atribuir diferentes percentuais (referentes à gratificação) sem qualquer critério objetivo ou por critérios sigilosos ou subjetivos, expondo a Administração Pública a tratamentos desigualitários, imorais, desarrazoados, e, sobretudo, distantes do interesse público primário.

                   Se a mens legis é a remuneração condigna e diferenciadamente daqueles servidores públicos que, pela natureza de suas funções, estão sujeitos à plena dedicação à Administração Pública - justificando-se essa discriminação em seu favor e em detrimento dos demais - não há motivo plausível, racional, proporcional, ético, funcional e objetivo a sustentar a instituição nesse grupo, classe ou categoria de servidores públicos de tratamento diferenciado entre seus integrantes.

                   A previsão legal impugnada permite, por exemplo, que, por favorecimentos ou perseguições, ou pela incidência dos vícios do amiguismo, do fllhotismo, do compadrio, do coronelismo, do aparelhamento, uns sejam aquinhoados com maiores percentuais da vantagem pecuniária que outros, mercê da identidade objetiva de situações jurídicas. 

         A definição do percentual devido a título de gratificação constitui é matéria da reserva de lei, cuja competência é exclusiva do Poder Legislativo, sob de agressão ao princípio da separação dos poderes, como já decidido:

“O tema concernente à disciplina jurídica da remuneração funcional submete-se ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei, vedando-se, em conseqüência, a intervenção de outros atos estatais revestidos de menor positividade jurídica, emanados de fontes normativas que se revelem estranhas, quanto à sua origem institucional, ao âmbito de atuação do Poder Legislativo, notadamente quando se tratar de imposições restritivas ou de fixação de limitações quantitativas ao estipêndio devido aos agentes públicos em geral. - O princípio constitucional da reserva de lei formal traduz limitação ao exercício das atividades administrativas e jurisdicionais do Estado. A reserva de lei - analisada sob tal perspectiva - constitui postulado revestido de função excludente, de caráter negativo, pois veda, nas matérias a ela sujeitas, quaisquer intervenções normativas, a título primário, de órgãos estatais não-legislativos. Essa cláusula constitucional, por sua vez, projeta-se em uma dimensão positiva, eis que a sua incidência reforça o princípio, que, fundado na autoridade da Constituição, impõe, à administração e à jurisdição, a necessária submissão aos comandos estatais emanados, exclusivamente, do legislador. Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anômala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes” (STF, ADI-MC 2.075-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-02-2001, v.u., DJ 27-06-2003, p. 28).

“Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto n. 01, de 5-11-2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados” (STF, ADI 3.369-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, 16-12-2004, DJ 01-02-2005).  

                   Pelas mesmas razões padecem de inconstitucionalidade a redação original do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, e a que foi dada pelas Leis n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999.

2. Licença para tratamento de assuntos de interesse particular

                   O delineamento da licença para tratamento de assuntos de interesse particular como direito do servidor público tal como estatuído no art. 107 da Lei Complementar n. 13/95 na redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar n. 114/17 é incompatível com os princípios de eficiência e interesse público (art. 111, Constituição Estadual).

                   Efetivamente, não consulta o interesse público e a eficiência a obrigatoriedade de concessão de licença não remunerada para tratamento de assuntos de interesse particular ao servidor público, ceifando o Chefe do Poder Executivo do exame de sua conveniência e oportunidade.

                   Com efeito, a legislação impugnada subordina ao arbítrio exclusivo do servidor a suspensão do exercício das funções do cargo, comprometendo negativamente a continuidade e a regularidade do serviço público em prol de interesse particular.  

                   Idênticos vícios imolavam o art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, na redação dada pelo art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016.

III – Pedido liminar

                   À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura da legislação contestada, apontada como violadora da Constituição do Estado de São Paulo, é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se atuação desconforme com o ordenamento jurídico, criadora de lesão irreparável ou de difícil reparação seja pela oneração indevida dos cofres públicos seja pelo prejuízo à continuidade do serviço público.

                   À luz desta contextura, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, dos das expressões “comissionados” e “de até 100% (cem por cento)” do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, na redação da Lei n. 2.344, de 22 de novembro de 2016 (e, por arrastamento, da Lei n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, e da redação original do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989) e do art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, na redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017 (e, por arrastamento, do art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016), do Município de Mirante do Paranapanema.

IV - O Pedido

                   Face ao exposto, requerer-se o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade das expressões “comissionados” e “de até 100% (cem por cento)” do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, na redação da Lei n. 2.344, de 22 de novembro de 2016 (e, por arrastamento, da Lei n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, e da redação original do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989) e do art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, na redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017 (e, por arrastamento, do art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016), do Município de Mirante do Paranapanema.

                   Requer-se ainda sejam requisitadas informações ao Prefeito e ao Presidente da Câmara Municipal de Mirante do Paranapanema, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 28 de março de 2017.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 169.822/16

Interessado: Climério Costa Lima

Objeto: representação para controle de constitucionalidade da Lei Complementar n. 113/16 e da Lei n. 2.344/16, do Município de Mirante do Paranapanema

 

 

 

 

 

 

1.                Promova-se a distribuição de ação direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado em epígrafe mencionado, em face das expressões “comissionados” e “de até 100% (cem por cento)” do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989, na redação da Lei n. 2.344, de 22 de novembro de 2016 (e, por arrastamento, da Lei n. 1.827, de 22 de novembro de 2006, da Lei n. 1.506, de 20 de julho de 1999, e da redação original do art. 6º da Lei n. 1.133, de 11 de setembro de 1989) e do art. 107 da Lei Complementar n. 13, de 18 de julho de 1995, na redação dada pelo art. 2º da Lei Complementar n. 114, de 21 de fevereiro de 2017 (e, por arrastamento, do art. 4º da Lei Complementar n. 113, de 22 de novembro de 2016), do Município de Mirante do Paranapanema.

2.                Promovo o arquivamento parcial da representação relativamente às alegações de violação à legislação infraconstitucional, porque à luz do art. 125, § 2º, da Constituição Federal, o contencioso abstrato, concentrado, direto e objetivo de lei ou ato normativo municipal tem como exclusivo parâmetro a Constituição Estadual, de sorte que “a pretensão de cotejo entre o ato estatal impugnado e o conteúdo de outra norma infraconstitucional não enseja ação direta de inconstitucionalidade” (STF, AgR-ADI 3.790-PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Menezes Direito, 29-11-2007, v.u., DJe 01-02-2008).

3.                Promovo o arquivamento da representação em relação ao art. 77 da Lei Complementar n. 13/95 na redação da Lei Complementar n. 113/16 porque o art. 1º da Lei Complementar n. 114/17 suprimiu a expressão “anuência do servidor”, erradicando a inconstitucionalidade que havia na constitucional previsão de indenização em razão do indeferimento do gozo de férias por necessidade de serviço, e que consiste em responsabilidade civil do Estado por ato lícito. À vista da revogação da norma, descredencia-se o cabimento da ação direta de inconstitucionalidade, sem prejuízo do controle incidental de sua constitucionalidade nas vias ordinárias inclusive no tocante aos seus efeitos, como consta da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF, RE-AgR 397.354-SC, 2ª Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, 18-10-2005, v.u., DJ 18-11-2005, p. 21) e da orientação pacífica da egrégia Procuradoria-Geral de Justiça consubstanciada na Súmula 23.

4.                Ciência ao interessado e à douta Promotoria de Justiça de Mirante do Paranapanema, remetendo-lhes cópia da petição inicial e deste despacho.

                   São Paulo, 28 de março de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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