EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

Protocolado nº 087.675/2016

 

 

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu, que “altera a Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que dispõe sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e ocupação do solo do Município de Jahu”. 1. Ausência de planejamento técnico na produção da lei de ordenamento do uso e ocupação do solo. Violação dos arts. 180, I, II e V, 181, caput, § 1º, da Constituição Estadual. 2. Violação ao princípio da impessoalidade. Atividade legislativa teve por escopo beneficiar determinado empreendimento plenamente identificável. Tratamento diferenciado em detrimento do interesse público. Ausência de justificativa razoável. 3. Artigos 3° a 8° e 10, da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu. Ausência de Participação Popular. A lei de ordenamento do uso e ocupação do solo tem como elemento formal obrigatório, para atribuição de legitimidade substancial ao uso do poder, a participação comunitária. Violação dos arts. 180, II e 191, da Constituição Estadual. 4. Artigos 6°, 7° e 8°, da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu. Violação ao devido processo legislativo. Artigos acrescentados por emendas parlamentares rejeitadas pela Câmara de Vereadores. Ofensa aos artigos 28 e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV da Constituição Federal, e ainda art.  74, inciso VI e art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, em face da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu, que “altera a Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que dispõe sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e ocupação do solo do Município de Jahu”, pelos seguintes fundamentos:

1. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O protocolado que instrui esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade e, a cujas folhas reportar-se-á, foi instaurado a partir de representação apresentada pelo Promotor de Justiça de Jahu (fls. 02/21).

A Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Jahu, dispõe, verbis:

“Art. 1° Fica acrescentado o art. 76-A à Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, com a seguinte redação:

“Art. 76-A. Nos casos em que o lote, mesmo que resultante de unificação e desmembramento, possuir duas ou mais zonas de uso/especiais, prevalecerá a de maior percentual sobre a área total do lote, sendo então considerado integralmente esse tipo de zona para os fins de aplicação desta Lei Complementar.

§ 1° Para efeitos de aplicação dos parâmetros da Zona Especial Corredor Urbano-Territorial (ZECUT) e da Zona Especial Anel Urbano (ZEAU), nos casos de lotes localizados em mais de uma zona de uso/especial, observar-se-á primeiramente a predominância da zona, nos moldes do caput deste artigo, para posteriormente aplicar as disposições do art. 67, § 5º, e do art. 68, § 5°, ambos desta Lei Complementar.

§ 2° A regra estabelecida neste artigo não se aplica às unidades compostas por Zona Especial de Parques Urbanos (ZEPUR) e Zona Especial do Rio Jahu (ZERJ).

§ 3° As disposições constantes deste artigo somente se aplicam para os lotes decorrentes de parcelamento ou desmembramento, nos termos da legislação federal.”

Art. 2° Ficam convalidados todos os alvarás e licenças regularmente emitidos pelo Município, nos termos da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, até a entrada em vigor da presente Lei Complementar, para os casos de lotes localizados em mais de uma zona de uso/especial, desde que respeitados os parâmetros de algumas das zonas incidentes sobre o lote.

Art. 3° Fica alterado o inciso IX, do § 4°, do art. 51 da Lei Complementar Municipal n° 443, de 14 de novembro de 2012, com a seguinte redação:

“Art. 51. .....

§ 4°.....

IX – altura ou gabarito máximo de 5 pavimentos.”

Art. 4° Fica alterado o “Anexo II – Quadro de Zoneamento”, da Lei Complementar Municipal n° 443, de 14 de novembro de 2012, na coluna “ZPR 1”, linha “Pavimentos”, que passa a vigorar com a seguinte redação: “5 pavimentos”.”

Art. 5° Altera o caput do artigo 15 da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 15. Considera-se condomínio urbanístico ou condomínio horizontal de lotes, a divisão de gleba ou lotes em frações ideais correspondentes a unidades autônomas destinadas à edificação para fins residenciais e comerciais, em edificações unifamiliares ou destinadas a comércio, sendo admitida a abertura de vias de domínio privado que não implique na abertura de logradouros públicos, nem na modificação ou ampliação dos já existentes, com abertura de vias internas de domínio privado, nos termos da Lei n. 4.591/64.”

Art. 6° Fica alterada a redação do artigo 91 da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, passando a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 91. Nas áreas situadas dentro do raio delimitado no Anexo V – Mapa de Corredores Urbano-Territoriais Polinúcleos e Anel Urbano, os empreendimentos que pretendam alterar o uso do solo para se enquadrar nos usos parâmetros urbanísticos dos Polinúcleos, além da Outorga Onerosa de Alteração de Uso do Solo, deverão elaborar estudo de impacto de vizinhança.”

Art. 7° Fica alterada a redação do § 5° do artigo 67, da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que passa a vigorar com o seguinte texto:

“Art. 67. ......

§ 5°. Estão compreendidas na Zona Especial Corredor Urbano-Territorial (ZECUT), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via, incluindo as vias marginais às vias de ligação regional, em que está traçado o Corredor Urbano-Territorial.”

Art. 8° Fica alterada a redação do § 5° do artigo 68, da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que passa a vigorar com o seguinte texto:

“Art. 68. (...)

§ 5°. Estão compreendidas na Zona Especial Anel Urbano (ZEAU), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via em que está traçado o Anel Urbano.”

Art. 9° (VETADO).

Art. 10. Fica revogado o parágrafo segundo do art. 7° da Lei Complementar Municipal n° 443, de 14 de novembro de 2012, e alterado o inciso III do mesmo dispositivo, que passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 7°. .......       

I-              .......

II-            .......

III-    No mínimo 5% (cinco por cento) em áreas institucionais.”

Art. 11. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 12. Ficam revogadas as disposições em contrário.” (sic)

         Os artigos 1° e 2° constavam no projeto original enviado à Câmara dos Vereadores pelo Prefeito Municipal (fls. 1619/1620).

         Por meio da Emenda Parlamentar n° 01 (fls. 1489), foram incluídos os artigos 3º e 4°.

         Por sua vez, por meio da Emenda Parlamentar n° 02 (fls. 1491), foi incluído o artigo 5°.

         A Emenda Parlamentar n° 03 (fls. 1494), por seu turno, incluiu o artigo 6°.

         Já os artigos 7° e 8°, foram incluídos por meio da Emenda Parlamentar n° 04 (fls. 1495).

         Para finalizar, por meio da Emenda Parlamentar n° 14 (fls. 1512), foi incluído o artigo n° 10.

         As alterações na lei de zoneamento, parcelamento, uso e ocupação do solo ocorreram sem estudos técnicos e justificativas plausíveis. Na verdade, decorreram do acolhimento pelos parlamentares de pretensões de particulares voltadas à aprovação de determinados empreendimentos imobiliários, em patente violação ao princípio da impessoalidade.

         Ademais, os dispositivos legais acrescidos por emendas parlamentares não foram submetidos à discussão comunitária e, alguns desses, sequer aprovados pela Câmara, em violação ao devido processo legislativo.

Em suma, a lei impugnada padece de incompatibilidade vertical com a Constituição do Estado de São Paulo, como adiante será demonstrado.

2. DO PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

O processo legislativo do referido diploma legal contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, a qual está subordinada a produção normativa municipal, nos termos dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal e do art. 144 da Constituição Paulista, verbis:

“Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

A lei local impugnada afronta os seguintes preceitos da Constituição Paulista, verbis:

“Artigo 28 – Aprovado o projeto de lei, na forma regimental, será ele enviado ao Governador que, aquiescendo, o sancionará e promulgará.

(...)

Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto- organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Artigo 180 No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:

I - o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de seus habitantes;

II – a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, planos, programas e projetos que lhes sejam concernentes;

(...)

V - a observância das normas urbanísticas, de segurança, higiene e qualidade de vida;

(...)

Artigo 181 Lei municipal estabelecerá em conformidade com as diretrizes do plano diretor, normas sobre zoneamento, loteamento, parcelamento, uso e ocupação do solo, índices urbanísticos, proteção ambiental e demais limitações administrativas pertinentes.

§ 1º Os planos diretores, obrigatórios a todos os Municípios, deverão considerar a totalidade de seu território municipal.

(...)

Artigo 191 O Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico.”

3. DA AUSÊNCIA DE PLANEJAMENTO TÉCNICO

O ato normativo impugnado desrespeitou a necessidade de planejamento, princípio que deve ser observado na edição de leis relacionadas ao uso do solo.

Nos termos dos arts. 180, II e V, e 181, caput, §1º, da Constituição Estadual, pode-se extrair que planejamento é indispensável à validade e legitimidade constitucional da legislação relacionada ao uso do solo.

Todo e qualquer regramento relativo ao uso e ocupação do solo, seja ele geral ou individualizado (autorização para construção em determinado imóvel, regularização de construção, alteração do uso do solo para determinada via, área ou bairro, etc.) deve levar em consideração a cidade em sua dimensão integral, dentro de um sistema de ordenamento urbanístico, razão pela qual a exigência de planejamento e estudos técnicos.

O art. 182, caput, da Constituição Federal disciplina que “a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.

O inciso VIII do art. 30 da Constituição Federal prevê ainda a competência dos Municípios para “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento, e da ocupação do solo urbano”.

Em decorrência dos dispositivos acima apontados, pode-se concluir que: (a) a adequada política de ocupação e uso do solo é valor que conta com assento constitucional (federal e estadual); (b) a política de ocupação e uso adequado do solo se faz mediante planejamento e estabelecimento de diretrizes através de lei; (c) as diretrizes para o planejamento, ocupação e uso do solo devem constar do respectivo plano diretor, cuja elaboração depende de avaliação concreta das peculiaridades de cada Município; (d) a legislação específica sobre uso e ocupação do solo deve pautar-se por adequado planejamento e participação popular.

A norma urbanística é, por sua natureza, uma disciplina, um modo, um método de transformação da realidade, de superposição daquilo que será a realidade do futuro àquilo que é a realidade atual.

Para que a norma urbanística tenha legitimidade e validade deve decorrer de um planejamento que é um processo técnico instrumentalizado para transformar a realidade existente no sentido de objetivos previamente estabelecidos. Não pode decorrer da simples vontade do administrador, mas de estudos técnicos que visem assegurar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (habitar, trabalhar, circular e recrear) e garantir o bem- estar de seus habitantes.

O planejamento não é mais um processo discricionário e dependente da mera vontade dos administradores. É uma previsão e exigência constitucional (art. 48, IV, 182, da CF e art. 180, II, da CE). Tornou-se imposição jurídica, mediante a obrigação de elaborar planos, estudos quando se trate da elaboração normativa relativa ao estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano.

O planejamento urbanístico não é um simples fenômeno técnico, mas um verdadeiro processo de criação de normas jurídicas, que ocorre em duas fases: uma preparatória, que se manifesta em planos gerais normativos, e outra vinculante, que se realiza mediante planos de atuação concreta, de natureza executiva.

Discorrendo a respeito do tema, Joseff Woff consigna que o plano urbanístico não constitui simples conjunto de relatórios, mapas e plantas técnicas, configurando um acontecer unicamente técnico. Compenetrando-se da realidade a ser transformada e das operações de transformação que consubstanciam o processo de planejamento, sob pena de ser mera abstração sem sentido, o plano urbanístico adquire, ele próprio, por contaminação necessariamente dialética, as características de um procedimento jurídico dinâmico, ao mesmo tempo normativo e ativo, no sentido de que os anteprojetos elaborados por técnicos e especialistas adquirem a categoria de diretrizes para a política do solo e sua edificação, ao mesmo tempo que, em seus desdobramentos, se manifesta como conjunto de atos e fundamentos para a produção de atos de atuação urbanística concreta. (El Planeamiento Urbanístico del Território y lãs Normas que Garantizan su Efectividad, conforme a la Ley Federal de Ordenación Urbana, em La Ley Federal Alemana de Ordenación Urbanística y los Municípios, p. 28 ,  apud José Afonso da Silva, Direito Urbanístico Brasileiro,  2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 83).

A propósito do tema, José Afonso da Silva chega a observar que:

“Muitos fatores contribuem para dificultar a implantação desse processo, tais como carência de meios técnicos de sustentação, de recursos financeiros e de recursos humanos, bem assim certo temor do Prefeito e da Câmara de que o processo de planejamento substitua sua capacidade de decisão política e de comando administrativo.” (Direito Urbanístico Brasileiro, 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 83).

A ordenação do uso e ocupação do solo é um dos aspectos substanciais do planejamento urbanístico. Preconiza uma estrutura orgânica para a cidade, mediante aplicação de instrumentos legais como o do zoneamento e de outras restrições urbanísticas que, como manifestação concreta do planejamento urbanístico, tem por objetivo regular o uso da propriedade do solo e dos edifícios em áreas homogêneas no interesse do bem-estar da população, conformando-os ao princípio da função social.

Para que o zoneamento seja legítimo, há de ter objetivos públicos, voltados para a realização da qualidade de vida dos habitantes da cidade e de quem por ela circule.

O zoneamento, como atividade urbanística, busca a transformação e orientação da realidade das cidades, dando uma sistematização senão a ideal, pelo menos, a possível e mais adequada. Por esse motivo é que a delimitação das zonas, sua localização e área com definição dos usos e restrições urbanísticas, dependem de um estudo que deve levar em conta a situação existente e os objetivos do poder público com respeito às características a dar a cidade, segundo as possibilidades atuais e futuras do seu desenvolvimento, tal como precisa ser com qualquer tipo de planejamento.

Como instrumento legal urbanístico, o zoneamento deve ser estruturado, sistematizado, para que possa proporcionar o adequado e sustentável crescimento da cidade tendo sempre em vista o bem-estar da comunidade.

A sistemática constitucional - relativa à necessidade de planejamento, diretrizes, e ordenação global da ocupação e uso do solo - evidencia que o casuísmo, nessa matéria, não é em hipótese alguma admissível.

O ato normativo que altera sensivelmente as condições, limites e possibilidades do uso do solo urbano, sem realização de qualquer planejamento ou estudo específico, viola diretamente a sistemática constitucional na matéria.

Não se admite, nesse quadro, modificações individualizadas, pontuais, casuísticas e dissociadas da estrutura sistêmica da utilização de todo o solo urbano estampadas nas leis de uso e ocupação do solo urbano. Caso contrário, tornaria inócuo e sem qualquer validade todo o planejamento e estudos realizados pelo Poder Executivo, por ocasião da propositura e aprovação da lei complementar que instituiu o Plano Diretor Participativo do Município.

Acerca da importância do planejamento urbanístico que deve preceder a toda e qualquer legislação elaborada nesta matéria, discorre Toshio Mukai que:

“(...) a ocupação e o desenvolvimento dos espaços habitáveis, sejam eles no campo ou na cidade, não podem ocorrer de forma meramente acidental, sob as forças dos interesses privados e da coletividade. Ao contrário, são necessários profundos estudos acerca da natureza da ocupação, sua finalidade, avaliação da geografia local, da capacidade de comportar essa utilização sem danos para o meio ambiente, de forma a permitir boas condições de vida para as pessoas, permitindo o desenvolvimento econômico-social, harmonizando os interesses particulares e os da coletividade” (Temas atuais de direito urbanístico e ambiental. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 29).

No caso em tela, pela análise do processo legislativo, verifica-se que a lei objeto da impugnação não está fundada em planejamento urbanístico que busca o crescimento ordenado da cidade e a melhoria das condições de vida dos cidadãos.

A lei impugnada, ainda que tenha sido de iniciativa do Executivo, por não decorrer da atividade de planejamento urbano do município, compromete o crescimento organizado da cidade e a ocupação ordenada de seus espaços.

Deste modo, patente a inconstitucionalidade do ato normativo que, sem qualquer estudo prévio consistente, dispõe sobre zoneamento, por ferir frontalmente o disposto nos artigos 180, incisos I e V, e 181, caput e § 1º, da Constituição Estadual, bem como, por força do artigo 144 da Constituição Estadual, os princípios constitucionais estabelecidos nos artigos 181, caput e § 1º, e 30, inciso VIII, da Constituição Federal.

4.  DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE.

O fundamento das normas urbanísticas há de ser sempre o de atender às necessidades prioritárias da comunidade e não o de satisfazer os interesses políticos ou econômicos de alguns particulares ou de agentes políticos.  

Nesse sentido, a fim de compreender as efetivas razões que levaram à edição da lei ora contestada, cumpre fazer uma breve digressão sobre o regramento anterior, previsto pela Lei Complementar n° 443/2012 antes das alterações promovidas pela Lei objurgada, bem como sobre o processo de aprovação do empreendimento imobiliário “Authentic Residence” - o qual, como será demonstrado, se visou beneficiar com a alteração legislativa em questão.

Nos termos da redação original do § 5° do artigo 67 da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, do Município de Jahu (que trata sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e a ocupação do solo no Município de Jahu), serão considerados pertencentes à Zona Especial Corredor Urbano-Territorial (ZECUT), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via, incluindo as vias marginais às vias de ligação regional, em que está traçado o Corredor-Urbano-Territorial, salvo os imóveis localizados nas Zonas Exclusivamente Residenciais 1 (ZER-1) já consolidadas ou com parcelamento já aprovado na data de publicação desta Lei Complementar.

Por sua vez, antes das alterações promovidas pela Lei impugnada, dispunha o § 5° do artigo 67 da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, do Município de Jahu, que estão compreendidas na Zona Especial Anel Urbano (ZEAU), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via em que está traçado o Anel Urbano, salvo os imóveis localizados nas Zonas Exclusivamente Residenciais 1 (ZER-1) já consolidadas ou com o parcelamento já aprovado na data de publicação desta Lei Complementar.

Já o artigo 76 da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012 prevê que: “Qualquer edificação ou lote pode ter usos mistos desde que se trate de usos permitidos na zona e sejam atendidas as características e exigências estabelecidas nesta Lei”.

A Lei impugnada, por seu turno, previu que:

“Art. 1° Fica acrescentado o art. 76-A à Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, com a seguinte redação:

“Art. 76-A. Nos casos em que o lote, mesmo que resultante de unificação e desmembramento, possuir duas ou mais zonas de uso/especiais, prevalecerá a de maior percentual sobre a área total do lote, sendo então considerado integralmente esse tipo de zona para os fins de aplicação desta Lei Complementar.

§ 1° Para efeitos de aplicação dos parâmetros da Zona Especial Corredor Urbano-Territorial (ZECUT) e da Zona Especial Anel Urbano (ZEAU), nos casos de lotes localizados em mais de uma zona de uso/especial, observar-se-á primeiramente a predominância da zona, nos moldes do caput deste artigo, para posteriormente aplicar as disposições do art. 67, § 5º, e do art. 68, § 5°, ambos desta Lei Complementar.

§ 2° A regra estabelecida neste artigo não se aplica às unidades compostas por Zona Especial de Parques Urbanos (ZEPUR) e Zona Especial do Rio Jahu (ZERJ).

§ 3° As disposições constantes deste artigo somente se aplicam para os lotes decorrentes de parcelamento ou desmembramento, nos termos da legislação federal.”

Art. 2° Ficam convalidados todos os alvarás e licenças regularmente emitidos pelo Município, nos termos da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, até a entrada em vigor da presente Lei Complementar, para os casos de lotes localizados em mais de uma zona de uso/especial, desde que respeitados os parâmetros de algumas das zonas incidentes sobre o lote.

(...)

Art. 7° Fica alterada a redação do § 5° do artigo 67, da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que passa a vigorar com o seguinte texto:

“Art. 67. ......

§ 5°. Estão compreendidas na Zona Especial Corredor Urbano-Territorial (ZECUT), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via, incluindo as vias marginais às vias de ligação regional, em que está traçado o Corredor Urbano-Territorial.”

Art. 8° Fica alterada a redação do § 5° do artigo 68, da Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que passa a vigorar com o seguinte texto:

“Art. 68. (...)

§ 5°. Estão compreendidas na Zona Especial Anel Urbano (ZEAU), sendo passíveis de receber as disposições deste tipo de zoneamento, os imóveis com testada voltada para a via em que está traçado o Anel Urbano.”

 

(...)”.

 Observa-se, assim, que a Lei impugnada criou regra mais permissiva, ao prever que, na hipótese de lote abrangendo mais de uma zona de uso, mesmo que decorrente de unificação ou desmembramento, prevalecerá aquela de maior abrangência sobre a área total do lote, sendo então considerado integralmente esse tipo de lote.

Fez-se, ainda, questão de explicitar que, na aplicação dos parâmetros da Zona Especial Corredor Urbano-Territorial e da Zona Especial Anel Urbano, nos casos de lotes localizados em mais de uma zona de uso, deve-se observar primeiramente a regra recém criada (predominância de zona), para posteriormente aplicar as disposições do do art. 67, § 5º, e do art. 68, § 5°, da Lei (imóveis com testada voltada para a via em que traçado o Corredor Urbano-Territorial ou o Anel Urbano, conforme o caso).

Outrossim, por meio dos artigos 7° e 8° da Lei impugnada, reformaram-se os parágrafos 5° dos artigos 67 e 68 que excluíam da regra da testada para incidência das Zonas Especial Corredor Urbano-Territorial e Especial Anel Urbano os imóveis localizados nas Zonas Exclusivamente Residenciais 1 (ZER-1) já consolidados ou com o parcelamento já aprovado na data de publicação da Lei.

Ocorre que a aprovação da Lei objurgada se deu durante o curso de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo em face do Município de Jaú e da AEJ Construtora e Incorporadora Ltda, tendo por objeto a paralisação da obra “Authentic Residence”, localizada no cruzamento da Avenida João Franceschi e da Rua Josefina Sanzovo Hernandez, no Bairro Jardim Alvorada II, Jahu, por violação à lei de zoneamento (processo n° 1006104-70.2014.8.26.0302).

Com efeito, após investigações realizadas no âmbito do Inquérito Civil n° 14.0315.0000634/2014-4, o Ministério Público expediu ofício à Municipalidade, recomendando, no prazo improrrogável de dez dias, que se promovesse e comprovasse a adoção de medidas administrativas e/ou judiciais visando à paralisação da aludida obra

 

 

 

É que a modificação teve por escopo beneficiar determinados munícipes (os proprietários dos imóveis alcançados pelas alterações, ou que neles exerçam atividades comerciais), que embora aqui não tenham sido identificados (até por que a investigação de fatos extrapola os limites do processo objetivo de controle de normas), são plenamente identificáveis.

Os dispositivos normativos impugnados violaram o princípio da impessoalidade, que não é senão manifestação típica do princípio da igualdade (Cf. Celso Antônio Bandeira de Mello, "O conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade", p. 68).  Olvidou-se o legislador que a lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos (Cf. Celso Antônio Bandeira de Mello, “Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, Malheiros, São Paulo, 1995, 3.ª ed., p. 10).

Em artigo sobre o princípio da igualdade, Fábio Konder Comparato anota que “a força desse princípio impõe-se não só ao aplicador da lei, na esfera administrativa ou judiciária, mas também ao próprio legislador. Em outras palavras, quando a Constituição consagra a igualdade, ela está proibindo implicitamente, quer a interpretação inigualitária das normas legais, quer a edição de leis que consagrem, de alguma forma, a desigualdade vedada. Ao lado, pois, de uma desigualdade perante a lei, pode haver uma desigualdade da própria lei, o que é muito mais grave.” (Cf. “Precisões sobre os conceitos de lei e de igualdade jurídica”, Editora Revista dos Tribunais, ano 87, v. 750, abril de 1998, pp. 11/19).

Esclarece o indigitado jurista que esse vício de inconstitucional desigualdade da própria lei pode ocorrer de duas formas. Haverá, de modo absoluto, uma infração ao princípio de igualdade, quando a lei for editada, explícita ou implicitamente, para regular um só caso individual. Diversamente, a desigualdade será relativa, quando a lei determinar, de modo arbitrário, a diferenciação ou a identificação de situações jurídicas, vale dizer, quando tratar desigualmente os iguais ou igualmente os desiguais (ob. e loc. cits.).

A propósito, recorda Celso Antônio Bandeira de Mello, que “a Administração tem que tratar todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis (...) O princípio em causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia” (Curso de direito administrativo, 12ªed., 2ªtir., São Paulo, Malheiros, 2000, p.84).

Como salienta Hely Lopes Meirelles, tratando do zoneamento urbano, “normas edilícias devem evitar o quanto possível essas súbitas e freqüentes modificações de uso, que afetam instantaneamente a propriedade e as atividades particulares, gerando instabilidade no mercado imobiliário urbano e intranqüilidade na população citadina (...) O Município só deve impor ou alterar zoneamento quando essa medida for exigida pelo interesse público, com real vantagem para a cidade e seus habitantes” (Direito Municipal Brasileiro, cit., p.407).

Por este motivo, as normas urbanísticas se prestam à satisfação política dos membros do Legislativo, seu fundamento há de ser sempre o de atender às necessidades prioritárias da comunidade.

Daí também advém o vício dos atos normativos impugnados.

5. DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR

Para que o Município possa exercer sua autonomia legislativa em matéria de urbanismo, é preciso possibilitar e efetivamente garantir o controle social, isto é, a “participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, planos, programas e projetos que lhes sejam concernentes” (art. 180, II, CE/89).

A participação popular no desenvolvimento urbano é um instrumento legitimador das normas produzidas na ordem democrática, que, além de possibilitar a discussão especializada e multifocal do assunto, garante-lhe a própria constitucionalidade, como robustece o art. 29, XII, da Constituição Federal de 1988:

“Por conseguinte, será forçoso reconhecer que, diante das normas disciplinadoras do Estatuto, não há mais espaço para falar em processo impositivo (ou vertical) de urbanização, de caráter unilateral e autoritário e, em consequência, sem qualquer respeito às manifestações populares coletivas. Em outras palavras, abandona-se o velho hábito de disciplinar a cidade por regulamentos exclusivos e unilaterais do Poder Público. Hoje as autoridade governamentais, sobretudo as do Município, sujeitam-se ao dever jurídico de convocar as populações e, por isso, não mais lhe fica assegurada apenas a faculdade jurídica de implementar a participação popular no extenso e contínuo processo de planejamento urbanístico” (José dos Santos Carvalho Filho, Comentários ao Estatuto da Cidade, Lumen Juris, 4ªed, Rio de Janeiro: 2011, p. 298, g.n.).

Na fase de preparo do anteprojeto de lei houve participação popular mediante audiência pública promovida pelo Poder Executivo (fls. 1266/1273 do protocolado nº 87.675/2016).

No entanto, protocolizada a mensagem que campeia o Projeto de Lei Complementar 09/2015 na Câmara de Jahu, este não contou em seu trâmite com a necessária participação da comunidade, que não se exaure na fase do anteprojeto no seio do Poder Executivo.

Isso porque, após a realização de uma única audiência pública na Casa Legislativa, no dia 10 de junho de 2015 (fls. 1280/1290), houve a inserção de emendas parlamentares que deram origem aos artigos 3° a 8° e 10 impugnados na presente ação direta de inconstitucionalidade (fls. 1489/1490).

Portanto, a necessidade de participação da comunidade na discussão e deliberação das alterações na lei de zoneamento de Jahu restou prejudicada no processo legislativo da Lei Complementar impugnada nº 504, de 17 de fevereiro de 2016, do mesmo Município, pois, não abrangeu as emendas parlamentares aditivas.

Quanto à obrigatoriedade de discussão com a sociedade das emendas parlamentares ao projeto de lei original, foi louvada pelo eminente Desembargador Samuel Junior em declaração de voto vencedor em julgamento proferido por esse Colendo Órgão Especial, cuja ementa assim está redigida:

ação direta de inconstitucionalidade – lei complementar disciplinando o uso e ocupação do solo – processo legislativo submetido À participação popular – votação, contudo, de projeto substitutivo que, a despeito de alterações significativas do projeto inicial, não foi levado ao conhecimento dos munícipes – vício insanável – inconstitucionalidade declarada.

‘O projeto de lei apresentado para apreciação popular atendia aos interesses da comunidade local, que atuava ativamente a ponto de formalizar pedido exigindo o direito de participar em audiência pública. Nada obstante, a manobra política adotada subtraiu dos interessados a possibilidade de discutir assunto local que lhes era concernente, causando surpresa e indignação. Cumpre ressaltar que a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com ideias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhe expõem os interesses envolvidos e as consequências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta” (TJSP, ADI 994.09.224728-0, Rel. Des. Artur Marques, m.v., 05-05-2010). – grifo nosso.         

Se assim é em face da oferta de substitutivo, idêntico tratamento deve ser dispensado a emendas parlamentares, porque a democracia participativa assegurada no inciso II do art. 180 e no art. 191 da Constituição Estadual, assim como no inciso XII do art. 29 da Constituição Federal, alcança a elaboração do ordenamento do solo antes e durante seu processo legislativo até o estágio final de produção da lei.

Assim, constata-se violação ao inciso II do art. 180 da Constituição Bandeirante, visto que é imprescindível a participação da comunidade para discutir acerca de alterações nas regras sobre o zoneamento urbano, pois resta clara a significativa alteração do ordenamento urbanístico.

Sobre a intervenção popular, já decidiu esse E. Tribunal:

“A participação popular na criação de leis versando política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Ela deve ser assegurada não apenas de forma indireta e genérica no ordenamento normativo do Município, mas especialmente na elaboração de cada lei que venha a causar sério impacto na vida da comunidade.” (ADIN n. 0052634-90.2011.8.26.0000 – rel. Elliot Akel – j. 27.02.13)

 

6. DA VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO: DISPOSITIVOS LEGAIS REJEITADOS PELA CÂMARA DE VEREADORES

O processo legislativo, compreendido o conjunto de atos (iniciativa, emenda, votação, sanção e veto) realizados para a formação das leis, é objeto de minuciosa previsão na Constituição Federal, para que se constitua em meio garantidor da independência e harmonia dos Poderes.

 O desrespeito às normas do processo legislativo, cujas linhas mestras estão traçadas na Constituição da República, conduz à inconstitucionalidade formal do ato produzido, que poderá sofrer o controle repressivo, difuso ou concentrado, por parte do Poder Judiciário.

Nesse sentido, observa-se que os artigos 6°, 7° e 8°, da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Jahu, foram acrescentados pelas Emendas Parlamentares nn. 03 e 04, as quais restaram rejeitadas pela Câmara Legislativa, na sessão do dia 25 de novembro de 2015, consoante se atesta nas fls. 1494/1495.

Destarte, aludidos dispositivos legais são flagrantemente inconstitucionais, por ofensa aos artigos 28 e 144, da Constituição Paulista.

7. DO PEDIDO LIMINAR

Estão presentes, na hipótese examinada, os pressupostos do fumus bonis iuris e do periculum in mora, a justificar a suspensão liminar da vigência e eficácia das alterações destacadas anteriormente.

A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos expostos, que indicam, de forma clara, que a Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, do Município de Jahu, que modifica a Lei que disciplina o zoneamento no mesmo Município, padece de vício de inconstitucionalidade formal - ausência de planejamento técnico e participação popular e violação ao devido processo legislativo consistente na promulgação de dispositivo legal rejeitado pela Câmara Legislativa - e material – afronta ao princípio da impessoalidade.

O perigo da demora decorre especialmente da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos preceitos questionados, subsistirá a sua aplicação, com um crescimento desordenado da cidade, com comprometimento ao planejamento urbanístico, ao bem estar da população, à qualidade de vida e ao desenvolvimento sustentável da comuna, que dificilmente poderão ser sanados, na hipótese provável de procedência da ação direta.

Basta lembrar que a ocupação do solo com base nas alterações sobre o regramento do zoneamento poderá levar a situações urbanisticamente não desejáveis que, por sua vez, são passíveis de gerar conflitos e intranquilidade na comunidade.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.

Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, dificilmente será possível restabelecer o status quo ante.

Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já eventualmente já se verificaram.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.

No contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu, que “altera a Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que dispõe sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e ocupação do solo do Município de Jahu”.

8. DO PEDIDO PRINCIPAL.

Por todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Direta, para que ao final seja julgada procedente, com a declaração da inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu, que “altera a Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que dispõe sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e ocupação do solo do Município de Jahu”.

 Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Jahu, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 

São Paulo, 28 de março de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

efsj


 

Protocolado nº 087.675/2016

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 504, de 17 de fevereiro de 2016, de Jahu, que “altera a Lei Complementar n° 443, de 14 de novembro de 2012, que dispõe sobre o zoneamento, o parcelamento, o uso e ocupação do solo do Município de Jahu”.

 

 

 

1.     Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade.

2.     Comunique-se a propositura da ação ao interessado.

3.     Cumpra-se.

 

São Paulo, 28 de março de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

efsj