EXCELENTÍSSIMO SENHOR
DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado
n. 165.166/2016
Ementa: Constitucional. Administrativo.
Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014, do Município
de Bilac. Contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade
temporária de excepcional interesse público. Ausência de excepcionalidade.
Prazo de duração excessivo. Necessidade de interpretação conforme. 1.
A contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária
de excepcional interesse público só se legitima se a lei municipal explicitar o
caráter excepcional da hipótese de cabimento. 2. Lei local que genericamente “disciplina as contratações por
tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional
interesse público” é incompatível com o art. 115, X, CE/89, que reproduz o art.
37, IX, CF/88. 3. A descrição de hipóteses que não
denotam transitoriedade e a possibilidade de prorrogação contratual burla o
sistema de mérito, compatível com os princípios da isonomia, moralidade,
impessoalidade e eficiência (art. 111 da CE/89). 4. Tampouco é razoável a duração de contratos temporários por
prazo total de até 24 (vinte e quatro) meses, impondo interpretação conforme a
Constituição, para que referido prazo só alcance as hipóteses de contratação
temporária previstas no inciso III do art. 2º da Lei, sendo certo que nas
demais hipóteses, a contratação não poderá ter duração superior a 12 meses,
tempo razoável para realização de certame.
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, IV, da Constituição Federal, e ainda nos arts. 74, VI e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 2º, incisos II e IV a VII e art. 3º, caput da Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014, do Município de Bilac, pelos fundamentos a seguir expostos:
I
– OS DISPOSITIVOS NORMATIVOS IMPUGNADOS
A Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014, do Município de Bilac, “dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal”, e assim estabelece, no que interessa:
“Art. 2º Considera-se necessidade
temporária de excepcional interesse público o atendimento de necessidades
urgentes, emergenciais e específicas, nos casos de:
I – assistência a situações de calamidade pública;
II – assistência a emergências em saúde pública;
III – substituição de pessoal decorrente de licenças
previstas na legislação vigente, inclusive afastamento por nomeação para
exercício de cargo em comissão;
IV – cumprimento de convênios ou execução de programas e
de ações de natureza emergencial ou transitória;
V – vacância de cargos públicos no período de até 1 (um)
ano após o término do prazo de validade do concurso realizado para provê-los,
ou da data de publicação do seu resultado final, desde que não tenha havido a
inscrição ou a aprovação de qualquer candidato no certame;
VI – contratação de professores para atuar na educação de
jovens e adultos ministrada pela rede municipal de ensino;
VII – realização de levantamentos cadastrais e
socioeconômicos declarados urgentes e inadiáveis.
Art.
3º As contratações previstas nesta Lei serão efetivadas por meio de contrato
administrativo de prestação de serviço, por tempo determinado, pelo prazo
máximo de até 24 (vinte e quatro) meses, podendo ser rescindidos, a qualquer
tempo, nas hipóteses previstas no art. 10 desta Lei.
(...)”
Os dispositivos normativos transcritos são inconstitucionais por violação dos arts. 111 e 115, X da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
Os dispositivos normativos impugnados contrariam frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição
Federal.
Os preceitos da
Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144,
que assim estabelece:
“Artigo 144
- Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e
financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios
estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
O art. 144 da
Constituição Estadual, que determina a observância na esfera municipal, além
das regras da Constituição Estadual, dos princípios da Constituição Federal, é
denominado “norma estadual de caráter remissivo, na medida em que, para a
disciplina dos limites da autonomia municipal, remete para as disposições
constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo Tribunal Federal ao
credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal por
esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe
06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello, 18-10-2010, DJe
26-10-2010).
Daí decorre a possibilidade de contraste da lei
local com o art. 144 da Constituição Estadual, por sua remissão à Constituição
Federal e a seu art. 37, IX, se a tanto não bastasse como parâmetro, nesta
ação, o art. 115, II e X da Constituição Estadual.
A autonomia municipal é condicionada pelo art. 29 da
Constituição da República. O preceito estabelece que a Lei Orgânica Municipal e
sua legislação deve observância ao disposto na Constituição Federal e na
respectiva Constituição Estadual, sendo reproduzido pelo art. 144 da Constituição
do Estado.
Eventual ressalva à
aplicabilidade das Constituições federal e estadual só teria, ad
argumentandum tantum, espaço naquilo que a própria Constituição da
República reservou como privativo do Município, não podendo alcançar matéria
não inserida nessa reserva nem em assunto sujeito aos parâmetros limitadores da
auto-organização municipal ou aqueles que contêm remissão expressa ao direito
estadual.
Os atos normativos em questão
são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo 111 - A
administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes
do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Artigo 115 -
Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as
fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é
obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
X - a lei estabelecerá os casos de
contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de
excepcional interesse público”.
A – AS HIPÓTESES DE
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE PESSOAL
Os incisos II e IV a VII do
art. 2º da Lei n. 2.008, de 15 de julho de 2014, arrolam hipóteses de contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade
temporária de excepcional interesse público, que contrariam o inciso X do art.
115 da Constituição Federal.
Assistência a emergências em
saúde pública, cumprimento de convênios, execução de programas, vacância em
cargos públicos após término de prazo de validade de concurso, contratação de
professores e realização de levantamentos cadastrais não têm ontologicamente os
requisitos de transitoriedade e excepcionalidade e constituem expressões
amplas, genéricas e indeterminadas que não demonstram efetiva excepcionalidade
determinada e específica, como exige o parâmetro constitucional.
A contratação por tempo determinado, para atender a necessidade
temporária de excepcional interesse público se destina ao suprimento de
necessidade administrativa em face de “circunstâncias que compelem a Administração Pública a adotar medidas de
caráter emergencial para atender a necessidades urgentes e temporárias e que
desobrigam, por permissivo constitucional, o administrador público de realizar
um concurso público para a contratação temporária” (STF, ADI
3.649-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014),
sendo, portanto, exigível, para além de outros requisitos, que a contratação
tenha como meta o atendimento de necessidade temporária e que esta se
qualifique por excepcional interesse público.
Tampouco
é possível afirmar aprioristicamente que as contratações por tempo determinado
para assistência a emergências em saúde
pública sejam hábeis para atendimento de necessidade de excepcional
interesse público. Surtos e epidemias podem ocorrer, porém, não são suficientes
por si próprios para indicar a excepcionalidade da medida se não for agregada à
insuficiência de recursos humanos no quadro de pessoal da entidade ou do órgão
da Administração Pública.
A
amplitude, a indeterminação, e a vagueza das expressões permitem aninhar em seu
pressuposto qualquer situação na área da saúde sem indicação de seu caráter
transitório e extraordinário e da impossibilidade de sua consecução pelo
emprego dos recursos humanos ordinários dos quadros da Administração. Tem-se
que é “inconstitucional a lei que, de forma vaga, admite a contratação
temporária para as atividades de educação pública, saúde pública, sistema
penitenciário e assistência à infância e à adolescência, sem que haja
demonstração da necessidade temporária subjacente” (STF, ADI
3.649-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014).
Idêntica
premissa se estende à realização de levantamentos
cadastrais e socioeconômicos declarados urgentes e inadiáveis, e ao cumprimento de convênios com órgãos
estaduais ou federais e execução de programas. O levantamento de dados é
atividade ordinária da Administração Pública, a ser desempenhada pela
mão-de-obra investida em cargos ou empregos públicos de seu quadro de pessoal,
sendo certo que a imprecisão de quando tais levantamentos seriam urgentes ou
inadiáveis não permite a identificação da hipótese excepcional que justificaria
sua realização por servidores que não aqueles da Administração.
De outro lado, a execução de
convênios celebrados com outras esferas públicas não introduz excepcionalidade
ou transitoriedade porque a cooperação governamental é comum e a sua celebração
implica apoio para desempenho de atividades públicas próprias e permanentes do
Município ou que a ele foram delegadas. Acórdão deste colendo Órgão Especial afirma que não
anima a contratação temporária o genérico atendimento a objetivos resultantes
de quaisquer convênios ou consórcios porque não se presta ao serviço de
atividades administrativas permanentes:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA
PERMITIDA GENERICAMENTE, PARA CONVÊNIOS CELEBRADOS ENTRE O MUNICÍPIO E A UNIÃO
OU MUNICÍPIO E ESTADO. MEDIDA EXCEPCIONAL INAPLICÁVEL A FUNÇÕES DE NATUREZA
PERMANENTE. MOLÉSTIA AO PRECEITO DO INCISO X DO ARTIGO 115 DA CONSTITUIÇÃO
PAULISTA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. AÇÃO PROCEDENTE” (TJSP, ADI
990.10.196095-8, Órgão Especial, Rel. Des. Renato Nalini, v.u., 17-11-2010).
O
mesmo ocorre em relação à execução de programas, que devem ficam a cargo do
quadro de pessoal permanente da Administração, observando-se que o cumprimento
de “ações de natureza emergencial ou transitória” é dotada de generalidade que
não permite identificar nem a necessidade temporária e nem o excepcional
interesse público.
De
outro lado, a possibilidade de contratação
temporária de professores para atuar na educação de jovens e adultos na rede
municipal de ensino padece de inconstitucionalidade manifesta, pois referidas hipóteses não espelham
extraordinariedade, imprevisibilidade e urgência que fundamentam a legitimidade
da admissão temporária de pessoal no serviço público, na medida em que traduzem
situações concretas ou abstratas, presentes, passadas ou futuras, da rotina
administrativa, e cuja execução compete, de ordinário, a servidores públicos
titulares de cargos de provimento efetivo. Mencionado dispositivo da lei local
autoriza a contratação temporária para a prestação de serviços públicos que
tipicamente incumbem à Administração Pública, não configurando situação capaz
de legitimar a contratação por tempo determinado.
O mesmo se aplica à contratação derivada da vacância de cargos
públicos no período de até um ano após o fim do prazo de validade de concurso
para provimento, quando não houver inscrição ou aprovação de candidatos.
Admitir a contratação temporária nessas hipóteses, além de não consistir
hipótese de excepcional interesse público, significa admitir que o
Administrador deixe de tomar as providências necessárias ao provimento de
cargos pelo período de um ano, o que vai de encontro ao interesse público.
Destaque-se que a adoção de
cláusulas abertas para contratação temporária de servidores, permitindo todo e
qualquer preenchimento, não se coaduna com o disposto no art. 115, X da
Constituição estadual, porquanto também acaba por delegar ao Administrador a
tarefa – específica do legislador – de definir em concreto situações que
legitimam a contratação temporária.
Regra constitucional é a
admissão de pessoal nos órgãos e entidades da Administração Pública mediante
prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como
estampa o art. 115, II, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, II,
da Constituição Federal. Ressalvada a investidura em cargos de provimento em
comissão, a admissão de pessoal é sempre orientada por essa regra.
A Constituição Estadual no
art. 115, X, reproduz o quanto disposto no art. 37, IX, da Constituição da
República, possibilitando limitada, residual e excepcionalmente a admissão de
pessoal por tempo determinado em razão de necessidade administrativa
transitória de excepcional interesse público.
Não é qualquer interesse
público que autoriza a contratação temporária – que constitui outra exceção à
regra do concurso público – somente aquele que veicula uma necessidade do
aparelho administrativo na prestação de seus serviços, devendo, ademais,
concorrer a excepcionalidade desse interesse público, a temporariedade da
contratação e a submissão à previsão legal, notadamente pela imprevisibilidade
e extraordinariedade da situação e a impossibilidade de a Administração Pública
acorrê-lo com meios próprios e ordinários de seu quadro de recursos humanos.
A admissão de pessoal a
termo, portanto, deve objetivar situações anormais, urgentes, incomuns e
extraordinárias que molestem as necessidades administrativas, não se admitindo
dissimulação na investidura em cargos ou empregos públicos à margem do concurso
público e para além das ressalvas constitucionais, pois, segundo José dos
Santos Carvalho Filho há três elementos que configuram pressupostos na
contratação temporária: a determinabilidade temporal, a temporariedade da
função e a excepcionalidade do interesse público (Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2002, 9. ed., pp. 478-479).
Repita-se, por relevante,
que a lei específica não poderá utilizar de cláusulas amplas, genéricas e
indeterminadas. Deve empregar conceitos que consubstanciem aquilo que seja
possível conceber na excepcionalidade.
Em outras palavras, “empregando
o termo excepcional para caracterizar o interesse público do Estado, a
Constituição deixou claro que situações administrativas comuns não podem
ensejar o chamamento desses servidores” (José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2002, 9. ed., pp. 478-479).
A admissibilidade da
contratação por tempo determinado visa ao “suprimento de pessoal perante
contingências que desgarrem da normalidade das situações e presumam admissões
apenas provisórias, demandadas em situações incomuns, cujo atendimento reclama
satisfação imediata e temporária (incompatível, portanto, com o regime normal
de concursos) (...) situações nas quais ou a própria atividade a ser
desempenhada, requerida por razões muitíssimo importantes, é temporária,
eventual (não se justificando a criação de cargo ou emprego, pelo quê não
haveria cogitar do concurso público), ou a atividade não é temporária, mas o excepcional
interesse público demanda que se faça imediato suprimento temporário de uma
necessidade (neste sentido, ‘necessidade temporária’), por não haver tempo
hábil para realizar concurso, sem que suas delongas deixem insuprido o
interesse incomum que se tem de acobertar” (Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, São
Paulo: Malheiros, 2009, 20. ed., pp. 281-282).
Por fim, consigne-se que o tema foi objeto de Repercussão Geral no Colendo Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:
“Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Ação direta de
inconstitucionalidade de lei municipal em face de trecho da Constituição do
Estado de Minas Gerais que repete texto da Constituição Federal. Recurso
processado pela Corte Suprema, que dele conheceu. Contratação temporária por
tempo determinado para atendimento a necessidade temporária de excepcional
interesse público. Previsão em lei municipal de atividades ordinárias e
regulares. Definição dos conteúdos jurídicos do art. 37, incisos II e IX, da
Constituição Federal. Descumprimento dos requisitos constitucionais. Recurso
provido. Declarada a inconstitucionalidade da norma municipal. Modulação dos
efeitos.
1. O assunto corresponde ao Tema nº 612 da Gestão por Temas da
Repercussão Geral do portal do STF na internet e trata, “à luz dos incisos II e
IX do art. 37 da Constituição Federal, da constitucionalidade de lei municipal
que dispõe sobre as hipóteses de contratação temporária de servidores
públicos”.
2. Prevalência da regra da obrigatoriedade do concurso público (art.
37, inciso II, CF). As regras que restringem o cumprimento desse dispositivo
estão previstas na Constituição Federal e devem ser interpretadas
restritivamente.
3. O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal
pode ser resumido, ratificando-se, dessa forma, o entendimento da Corte Suprema
de que, para que se considere válida a contratação temporária, é preciso que:
a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação
seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público
seja excepcional; e) a necessidade de contratação seja indispensável, sendo
vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que
devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.
4. É inconstitucional a lei municipal
em comento, eis que a norma não respeitou a Constituição Federal. A imposição
constitucional da obrigatoriedade do concurso público é peremptória e tem como
objetivo resguardar o cumprimento de princípios constitucionais, dentre eles,
os da impessoalidade, da igualdade e da eficiência. Deve-se, como em outras
hipóteses de reconhecimento da existência do vício da inconstitucionalidade,
proceder à correção da norma, a fim de atender ao que dispõe a Constituição
Federal.” (REx n. 658.026-MG, Rel. Min. Dias Toffoli, dje 31/10/2014)
B – PRAZO DE DURAÇÃO DAS CONTRATAÇÕES
O caput do artigo 3º da Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014
estabelece que as contratações temporárias poderão ser realizadas por até 24
meses.
Adotou-se período excessivo,
longo e elástico de contratação, que não ostenta qualquer razoabilidade, o que
denota, ademais, nítida intenção de subversão à regra da investidura permanente
e efetiva em cargo ou emprego públicos mediante aprovação em prévio concurso
público.
A lei de regência da
contratação temporária, além de descrever seus pressupostos (as hipóteses
abstratas de seu cabimento) deve conter a fixação do período necessário de vigência
e eficácia da contratação, que deve ser curto (Odete Medauar. Direito Administrativo Moderno, São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, 11. ed., p. 270).
A Suprema Corte deliberou
que é razoável prazo de 12 (doze) meses:
“7) A realização de contratação temporária
pela Administração Pública nem sempre é ofensiva à salutar exigência
constitucional do concurso público, máxime porque ela poderá ocorrer em
hipóteses em que não há qualquer vacância de cargo efetivo e com o escopo,
verbi gratia, de atendimento de necessidades temporárias até que o ocupante do
cargo efetivo a ele retorne. Contudo, a contratação destinada a suprir uma
necessidade temporária que exsurge da vacância do cargo efetivo há de durar
apenas o tempo necessário para a realização do próximo concurso público,
ressoando como razoável o prazo de 12 meses” (STF, ADI 3.649-DF, Tribunal
Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014).
No mesmo sentido, o Tribunal
Paulista:
“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Incisos III e VII do art. 2º, e
do artigo 3º e §1º (redação dada pelas Leis 2.279/14 e 2.245/13), ambos da Lei
1.027, de 10 de março de 1995, do Município de São Sebastião. Contratação
temporária para ‘campanhas de saúde pública’ e ‘de menores aprendizes’.
Inconstitucionalidade. Inexistência de situação de necessidade temporária de
excepcional interesse público. Inconstitucionalidade,
ainda, da autorização para contratação por lapso temporal superior a 12 (doze)
meses. Ação procedente, com efeitos a partir de 120 dias da data do
julgamento”. (TJSP,
ADI nº 2128333-14.2015.8.26.0000, Órgão Especial, Rel. Borelli Thomaz, julgado
em 09 de dezembro de 2015, v.u, g.n.)
Ora, admitir a duração
máxima dos contratos por até 24 meses, foge da excepcionalidade, notadamente se
analisados os incisos I e II do art. 2º, porquanto situações como calamidade
pública e emergências relativas à saúde, não são de efeitos prolongados no
tempo superior a 12 (doze) meses, e a necessidade de pessoal por conta de
vacância empenha de imediato providências para substituição definitiva nas
vagas.
Seria inimaginável uma
hipótese de calamidade pública com duração de dois anos. Não se poder olvidar
que o Município conta com seu quadro de cargos efetivos para atender às
demandas que sobrevierem e, além do mais, um ano é período suficiente para a
conclusão de concurso público a fim de prover novos cargos.
De outro lado, não se pode
olvidar que o artigo 2º da Lei 2.008, de 15 de julho de 2014, prevê, no inciso
III, hipótese de contratação, não impugnada nessa ação, para substituição de
pessoal decorrente de licenças previstas na legislação vigente, inclusive
afastamento por nomeação para exercício em cargo em comissão.
Trata-se de hipótese em que a contratação temporária não será sucedida da realização de um concurso público. De fato, imagine-se um professor que tenha obtido uma licença para tratar assuntos particulares pelo prazo de 2 anos. Durante esse período, será viável a contratação temporária e a Administração Pública não terá interesse na realização de concurso público para a referida função, na medida em que, findo o período da licença, o servidor ocupante do cargo efetivo retornará.
Desse modo, o art. 3º da lei municipal deve ser interpretado conforme a Constituição, a fim de que o prazo ali previsto só alcance as hipóteses de contratação temporária previstas no inciso III do art. 2º da Lei nº 2008/14. De outro lado, quando a contratação temporária se der com fundamento nos demais incisos do art. 2º, a contratação temporária não poderá ter duração superior a 12 meses, tempo razoável para a realização do certame.
Nesse sentido
decidiu o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI nº 3649-RJ, Rel. Min.
Luiz Fux, j. 28.05.14.
III – Pedido
Face ao exposto, requer o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º, incisos II e IV a VII da Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014, do Município de Bilac e dar intepretação conforme ao art. 3º, caput, da mesma lei, no sentido de que os prazos lá previstos só alcançam as hipóteses de contratação temporária previstas no inciso III do art. 2º da Lei nº 2008/14, sendo certo que nas demais hipóteses, a contratação temporária não poderá ter duração superior a 12 meses, tempo razoável para a realização do certame.
Requer ainda sejam
requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Bilac, bem como posteriormente citado o douto Procurador-Geral
do Estado para se manifestar sobre os dispositivos normativos impugnados,
protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.
Termos
em que, pede deferimento.
São Paulo, 03 de maio de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
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Protocolado n.
165.166/2016
Interessado: Promotoria de Justiça de Bilac
Assunto: Inconstitucionalidade da Lei nº
2.008, de 15 de julho de 2014, do Município de Bilac.
1. Distribua-se
a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face do
art. 2º, incisos II e IV a VII e art. 3º, caput
da Lei nº 2.008, de 15 de julho de 2014, do Município de Bilac, junto ao
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 03
de maio de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
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