Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente
do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Protocolado
n. 150.156/2016
Constitucional.
Ação direta de inconstitucionalidade. Remuneração de Vereadores. Inexistência
dos direitos à revisão geral anual aos agentes políticos municipais. Regra da
legislatura. 1. Não
gozam os agentes políticos municipais dos direitos à revisão geral anual em
obséquio às regras de anterioridade da legislatura e da inalterabilidade do
subsídio durante esse período, iluminadas pelo princípio da moralidade
administrativa. 2. Violação da
Constituição Estadual (arts. 111, 115, XI, e 144, CE/89; arts. 29, VI, e 37, X,
CF/88).
O Procurador-Geral de Justiça do
Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art.
116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei
Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto
nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts.
74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas
informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse
Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em face da Resolução nº
327, de 31 de março de 2016, da Câmara Municipal de Batatais, pelos fundamentos
a seguir expostos:
I
– O ATO NORMATIVO IMPUGNADO
A Resolução nº 327, de 31 de março de 2016, da Câmara
Municipal de Batatais, assim dispõe:
“Art. 1º - O subsídio dos Vereadores à Câmara Municipal de Batatais, fixados pela Resolução nº 301, de 08 de agosto de 2012, fica da seguinte forma:
I. revisão de 4% sobre o subsídio do mês de março de 2016, a partir de 1º de abril de 2016, a ser pago no mês de maio de 2016;
II. revisão de 4% sobre o subsídio do mês de março de 2016, a partir de 1º de maio de 2016, a ser pago no mês de junho de 2016;
III. revisão de 4% sobre o subsídio do mês de março de 2016, a partir de 1º junho de 2016, a ser pago a partir do mês de julho de 2016.
Art. 2º - O mesmo percentual de reajuste estipulado no artigo anterior será aplicado ao subsídio do Presidente da Câmara.
Art. 3º - As despesas decorrentes das disposições desta Resolução, correrão à conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.
Art. 4º - Revogam-se as disposições em contrário.
Art. 5º - Esta resolução entra em vigor a partir de 1º de
abril de 2016.”
Como se percebe, a Resolução foi editada em 31 de
março de 2016, retroagindo seus efeitos a partir de 1º de abril, ou seja, com a
legislatura em curso.
Ocorre que tais disposições violam a regra da
legislatura e da inadmissibilidade da revisão geral anual a agentes políticos
municipais, como veremos adiante.
II
– O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE
A Resolução nº 327, de
31 de março de 2016, da Câmara Municipal de Batatais, contraria frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal, ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição
Federal.
De fato, a da Resolução nº 327, de 31 de março de
2016, da Câmara Municipal de Batatais, autoriza o reajuste do subsídio mensal
dos Vereadores, pela aplicação do percentual de 4%, três vezes, a partir de 1º
de abril, 1º de maio e 1º de junho, respectivamente.
O ato normativo mencionado é incompatível com os
seguintes preceitos da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios por
força de seu art. 144:
“Art. 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive
as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é
obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
XI – a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos, sem
distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á
sempre na mesma data e por lei específica, observada a iniciativa privativa em
cada caso;
(...)
Art.
144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e
financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios
estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
A Resolução combatida ofende o inciso XI do art. 115
da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, X, da Constituição Federal, e
que deve ser analisado em conjunto ao art. 39, § 3º, da Carta Magna, pois, os
agentes políticos não foram contemplados com o direito à revisão geral anual de
sua remuneração que é adstrito aos servidores públicos investidos em cargos de
provimento efetivo.
Não é ocioso ponderar que os agentes políticos não
profissionais, titulares de mandatos eletivos temporários, não são detentores
do direito à revisão geral anual, até porque, tal direito, é incompatível com a
natureza do cargo.
Assim se inclina a doutrina a professar que:
“(...) os direitos à irredutibilidade e a revisão geral anual são exclusiva e explicitamente consignados aos servidores públicos stricto sensu e aos agentes políticos investidos, estável ou vitaliciamente, em cargos isolados ou de carreira de natureza técnico-científica, não se estendendo aos agentes políticos. Em especial, aos municipais, por colidir com a regra da fixação dos subsídios na legislatura precedente em momento anterior às eleições” (Wallace Paiva Martins Júnior. Remuneração dos Agentes Públicos, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 226, g.n.).
Ainda é impositiva a
ponderação de que o art. 29, VI, da Constituição Federal, incorporado pela
Constituição do Estado por obra de seu art. 144, é invocável para fins desta
ação direta de inconstitucionalidade.
Com efeito, o
art. 144 da Constituição Estadual, que determina a observância na esfera
municipal, além das regras da Constituição Estadual, dos princípios da
Constituição Federal, é denominado “norma estadual de caráter remissivo, na
medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia municipal, remete
para as disposições constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo
Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de
lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes,
31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello,
18-10-2010, DJe 26-10-2010).
Daí decorre a
possibilidade de contraste da lei local com o art. 144 da Constituição Estadual
por sua remissão à Constituição Federal e a seu art. 29, VI.
A
jurisprudência desse colendo Tribunal de Justiça assim enuncia:
“Ação
direta de inconstitucionalidade - sustentada inconstitucionalidade dos artigos
4º e 5º, caput, §§ 1º, 4º e 5º, da Lei nº 11.600, de 09 de abril de 2008,
em sua redação original e na que foi dada pelo artigo 1º, I e II, da Lei nº
11.622, de 05 de maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto, que ‘Fixa
os subsídios do Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários e Vereadores para a
legislatura a iniciar-se em 1º de janeiro de 2009 e dá outras providências’, e
‘Dá nova redação ao parágrafo 4º e acrescenta o parágrafo 5º ao artigo 5º da
Lei n° 11.600, de 09/04/08’, respectivamente
- vedada é a vinculação do
reajuste dos subsídios do Chefe do Poder Executivo, do Vice, e de seus
auxiliares diretos à revisão geral
anual do funcionalismo público municipal - é vedada a fixação dos
subsídios dos Vereadores em percentual dos subsídios dos Deputados Estaduais -
é vedada, ainda, a vinculação do reajuste dos subsídios dos Vereadores à
revisão geral anual do funcionalismo público municipal ou à alteração dos
subsídios dos Deputados Estaduais, eis que inalterável o valor daqueles durante
a legislatura, por força da reintrodução pela EC 23/2000, da chamada ‘regra da legislatura’ aos parlamentares municipais
- vedada é a instituição de décimo terceiro
subsídio a quem tem vínculo não profissional com a Administração Pública - é
vedada a expansão do subsídio como parcela única concebido, para abranger
valores excedentes à remuneração do mandato parlamentar estadual (ajuda de
custo, jeton, verba
de gabinete e outras) violação dos artigos 1º, 111, 115, XI, XII e XV, 124, §
2º, 144 e 297, da CE - ação procedente, assentando-se, ademais, a fim de que os
Vereadores da atual Legislatura de Ribeirão Preto não fiquem sem remuneração,
que, a este título, na corrente receberão o subsídio que vigorou na Legislatura
anterior, obviamente que sem a revisão anual e observados os limites
estabelecidos no inciso VI, do art. 29 da Constituição Federal” (TJSP, ADI
994.09.002644-6, Órgão Especial, Rel. Des. Palma Bisson, 10-02-2010, v.u.).
Note-se que o disposto nos arts. 111 e 115, XI, da
Constituição Estadual, reproduz os arts. 37, caput, e inciso X da Constituição Federal.
O art. 144 da Constituição Estadual, que determina a
observância na esfera municipal, além das regras da Constituição Estadual, dos
princípios da Constituição Federal, é denominado “norma estadual de caráter
remissivo, na medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia
municipal, remete para as disposições constantes da Constituição Federal”, como
averbou o Supremo Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de
constitucionalidade de lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel.
Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min.
Celso de Mello, 18-10-2010, DJe 26-10-2010).
Os arts. 29, VI, e 37, caput, X, da Constituição Federal estabelecem que os agentes
políticos municipais não têm direito à revisão geral anual
(em obséquio às regras de anterioridade da legislatura e da inalterabilidade do
subsídio durante esse período), como vem
decidindo o Supremo Tribunal Federal (ADI
3.491-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 27-09-2006, v.u., DJ
23-03-2007, p. 71, RTJ 201/530; AgR-RE 411.156-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Celso de
Mello, 29-11-2011, v.u., DJe 19-12-2011; STF, AgR-RE 484.307-PR, 1ª Turma, Rel.
Min. Cármen Lúcia, 23-03-2011, v.u., DJe 08-04-2011; AgR-AI 776.230-PR, 1ª
Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 09-11-2010, v.u., DJe 26-11-2010; AgR-RE
229.122-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, 25-11-2008, v.u., DJe 19-12-2008;
AI 720.929-RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 29-09-2008, DJe 10-10-2008).
Neste sentido:
“7. No julgamento do Recurso Extraordinário n. 800.617/SP, de minha relatoria, decidiu-se que: a) o art. 37, inc. X, da Constituição da República não é aplicável aos Vereadores, porque exclusivo dos servidores públicos e; b) quanto à fixação de subsídio, os agentes políticos municipais dispõem de norma constitucional própria e expressa:
‘A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, assentou que ‘a remuneração do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Vereadores será fixada pela Câmara Municipal em cada legislatura para a subsequente. C.F., art. 29, V’ (RE 206.889, Relator o Ministro Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 13.6.1997). Assim, por exemplo:
‘A Lei Maior impôs tratamento jurídico diferenciado entre a classe dos servidores públicos em geral e o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais. Estes agentes públicos, que se situam no topo da estrutura funcional de cada poder orgânico da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, são remunerados exclusivamente por subsídios, cuja fixação ou alteração é matéria reservada à lei específica, observada, em cada caso, a respectiva iniciativa (incisos X e XI do art. 37 da CF/88). - O dispositivo legal impugnado, ao vincular a alteração dos subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado às propostas de refixação dos vencimentos dos servidores públicos em geral ofendeu o inciso XIII do art. 37 e o inciso VIII do art. 49 da Constituição Federal de 1988. Sobremais, desconsiderou que todos os dispositivos constitucionais versantes do tema do reajuste estipendiário dos agentes públicos são manifestação do magno princípio da Separação de Poderes. Ação direta de inconstitucionalidade procedente’ (ADI 3.491, Relator o Ministro Ayres Britto, Plenário, DJ 23.3.2007, grifos nossos).
‘VEREADORES. REMUNERAÇÃO. COMPETÊNCIA DA CÂMARA MUNICIPAL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ARTIGO 29, INCISO V. E da competência privativa da Câmara Municipal fixar, até o final da legislatura, para vigorar na subsequente, a remuneração dos vereadores. O sistema de remuneração deve constituir conteúdo da Lei Orgânica Municipal - porque se trata de assunto de sua competência -, a qual, porem, deve respeitar as prescrições estabelecidas no mandamento constitucional (inciso V do artigo 29), que e norma de eficácia plena e autoaplicável. Recurso extraordinário não conhecido’ (RE 122.521, Relator o Ministro Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ 6.12.1991).
‘RECURSO EXTRAORDINÁRIO - VINCULAÇÃO DOS SUBSÍDIOS DOS AGENTES POLÍTICOS LOCAIS À REMUNERAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS - INADMISSIBILIDADE - EXPRESSA VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 37, XIII) - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Revela-se inconstitucional a vinculação dos subsídios devidos aos agentes políticos locais (Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores) à remuneração estabelecida em favor dos servidores públicos municipais. Precedentes’ (RE 411.156-AgR, Relator o Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, Dje 19.12.2011, grifos nossos).
Nada há a prover quanto às alegações do Recorrente.
8. Pelo exposto,
nego seguimento ao recurso extraordinário (caput do art. 557 do Código de
Processo Civil e § 1º do art. 21 do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal)” (STF, RE 808.790-SP, Rel. Min. Cármen Lúcia,
19-05-2014,
DJe 27-05-2014).
Desse modo, patente a inconstitucionalidade da Resolução
nº 327/2016, da Câmara Municipal de Batatais, que permite o reajuste do
subsídio dos Vereadores, por violação à regra da legislatura e da
inadmissibilidade da revisão geral anual a agentes políticos municipais.
III – Pedido liminar
À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se
a ele o periculum in mora. A atual
tessitura dos preceitos legais do Município de Batatais apontados como
violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal,
de per si, para suspensão de sua
eficácia até final julgamento desta ação, de maneira a evitar oneração do
erário irreparável ou de difícil reparação.
À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para
suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação da
Resolução nº 327, de 31 de março de 2016, da Câmara Municipal de Batatais.
IV – Pedido
Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento
da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade
da Resolução nº 327, de 31 de março de 2016, da Câmara Municipal de Batatais.
Requer-se
ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal
de Batatais, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar
sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista,
posteriormente, para manifestação final.
Termos em que, pede deferimento.
São Paulo, 18 de maio de 2017.
Gianpaolo
Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ef/dcm
Protocolado
n. 150.156/2016
Assunto: Resolução
nº 327/16, expedida pela Câmara Municipal de Batatais, que dispõe sobre a
revisão dos subsídios dos Vereadores e Presidente da Câmara Municipal de
Batatais
1. Distribua-se a petição inicial
da ação direta de inconstitucionalidade da Resolução nº 327, de 31 de março de
2016, da Câmara Municipal de Batatais junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado,
informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 18 de maio de 2017.
Gianpaolo
Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ef/dcm