Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 177.072/2016

 

 

 

Ação direta de inconstitucionalidade. Declaração parcial de nulidade sem redução de texto do art. 69 da Lei Orgânica Municipal, do art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal paulista. Declaração parcial de nulidade sem redução de texto para o fim de excluir sua aplicação aos servidores comissionados e contratados temporariamente, porquanto a sujeição desses servidores ao regime celetista é incompatível com a liberdade de provimento e exoneração (para os comissionados) e o regime administrativo (para os temporários). Violação ao art. 115, incisos II e X, da Constituição Estadual e aos princípios da razoabilidade e da moralidade (art. 111, da CE/89).

 

 

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, visando a declaração de nulidade parcial sem redução de texto do art. 69 da Lei Orgânica Municipal, do art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal Paulista, para o fim de excluir sua aplicação aos servidores comissionados e contratados por prazo determinado, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

          A Lei Orgânica Municipal de Laranjal Paulista, prevê no que interessa:

“(...)

Art. 69 – O regime jurídico único para todos os servidores da administração é o estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho.

(...)”

         Por seu turno, a Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, do Município de Laranjal Paulista, que “Dispõe sobre a Reorganização da Estrutura Administrativa, do Quadro de Pessoal e Salários, das Carreiras, da Avaliação de Desempenho, do Regulamento da Guarda Civil Municipal e Estatuto do Magistério da Prefeitura de LARANJAL PAULISTA-SP e dá outras providências”, assim determina:

“(...)

Art. 96 – O regime jurídico principal, de direitos, vantagens, deveres e descontos legais, aplicável aos servidores é a Consolidação das Leis do trabalho – CLT e toda legislação pertinente.

(...)”

         Por fim, a Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, do Município de Laranjal Paulista, que “Dispõe sobre a Reestruturação Organizacional, Escala de Vencimentos, Enquadramento dos Empregados da Câmara Municipal de Laranjal Paulista e dá outras Providências”, prevê in verbis:

“(...)

Art. 1º - As relações de trabalho dos empregados da Câmara Municipal de Laranjal Paulista obedecerão à classificação, as normas e demais disposições estabelecidas no Regime Jurídico adotado aos Empregados Municipais e na presente Lei.

(...)

Art. 3º - Para os efeitos desta lei, considera-se:

I – emprego público: conjunto de atribuições e responsabilidades representado por um lugar, instituído nos quadros do funcionalismo, criado por lei, em quantidade certa, com denominação própria e atribuições específicas, regido pela CLT;

(...)”

Os dispositivos legais anteriormente descritos são verticalmente incompatíveis com nosso ordenamento constitucional, como será demonstrado a seguir.

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE      

As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual, verbis:

“Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

X- a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado, para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público;

(...)

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)”

Da leitura dos atos normativos impugnados, verifica-se que o art. 69 da Lei Orgânica Municipal, o art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e os arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal Paulista, acabam por determinar as disposições do regime celetista aos servidores de cargos de provimento em comissão e também aos contratados por prazo determinado.

Ocorre que o provimento em comissão e a contratação por tempo determinado, para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, são incompatíveis com o regime celetista na Administração Pública, porquanto a dispensa imotivada onerosa prevista pela Consolidação das Leis do Trabalho impõe limite à liberdade de exoneração dos ocupantes do cargo público comissionado e à transitoriedade inerente à contratação temporária (art. 115, II, e X, Constituição Estadual).

Com efeito, a inserção do emprego comissionado no regime celetista é incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além, fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do cargo, na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar natureza).

O desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária orientada pelos critérios de oportunidade e conveniência da Administração Pública, de sorte que sua sujeição ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador público.

Desta forma, a sujeição dos ocupantes de funções temporárias para atender à necessidade transitória de excepcional interesse público à CLT não encontra respaldo constitucional. Pelo contrário, sob o pálio do art. 37, II, da Constituição Federal, reproduzido no art. 115, II, da Constituição Estadual, os contratos temporários são inconciliáveis com qualquer regime previsto na Consolidação das Leis do Trabalho que, por excelência, reprime a dispensa imotivada.

A contratação por tempo determinado serve à necessidade temporária de excepcional interesse público, devendo durar enquanto as circunstâncias que o justificaram persistir.

De fato, o desprovimento da função temporária é medida discricionária orientada pelos critérios de oportunidade e de conveniência da Administração Pública, e a sua sujeição ao regime celetista, ainda que por meio de contratação temporária previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, tolhe a liberdade de exoneração reservada ao administrador público.

Assim, o art. 69 da Lei Orgânica Municipal, o art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85/2007, e os arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145/2013, todas do Município de Laranjal Paulista, que permitem interpretação de aplicabilidade a servidores comissionados e temporários, importam em franca violação aos princípios jurídicos da moralidade e da razoabilidade, previstos no art. 37 da Constituição Federal e no art. 111 da Constituição Estadual.

Enquanto a razoabilidade serve como parâmetro no controle da legitimidade substancial dos atos normativos, requerente de compatibilidade aos conceitos de racionalidade, justiça, bom senso, proporcionalidade etc. interditando discriminações injustificáveis e, por isso, desarrazoadas, a moralidade se presta à mensuração da conformidade do ato estatal com valores superiores (ética, boa-fé, finalidade, boa administração etc.), vedando atuação da Administração Pública pautada por móveis ou desideratos alheios ao interesse público (primário) – ou seja, censura o desvio de poder que também tem a potencialidade de incidência nos atos normativos.

Na espécie, há violação a ambos os princípios. Como a contratação para serviços temporários e para cargos de provimento em comissão constitui exceção à regra constitucional do acesso à função pública (lato sensu) mediante concurso público, possibilitando a investidura por outros critérios, sob o pálio da instabilidade e da transitoriedade do vínculo como elementos essenciais de sua duração, é desarrazoada e imoral a outorga de prerrogativas próprias do regime contratual a seus ocupantes, tendo em conta que este sanciona a dispensa imotivada com a indenização compensatória. Trata-se da atribuição de uma garantia absolutamente imprópria a uma relação jurídica precária e instável.

O padrão ordinário, normal e regular, advindo da Constituição, não admite a oneração dos cofres públicos para o custeio da exoneração de emprego temporário, à luz da conformação constitucional que realça a natureza excepcional e temporária de seu provimento - orientada por força de ingredientes puramente excepcionais de necessidade e interesse público.

Desta forma, necessária a declaração de nulidade parcial sem redução de texto do art. 69 da Lei Orgânica Municipal, do art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal Paulista, para o fim de excluir sua aplicação aos servidores comissionados e contratados por prazo determinado.

III – Pedido

         Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente visando a declaração de nulidade parcial sem redução de texto do art. 69 da Lei Orgânica Municipal, do art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal Paulista, para o fim de excluir sua aplicação aos servidores comissionados e contratados por prazo determinado.

         Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Laranjal Paulista, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 23 de junho de 2017.

 

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 177.072/2016

Assunto: Análise da constitucionalidade da Lei Orgânica do Município de Laranjal Paulista que estabelece o regime da CLT para os cargos de provimento em comissão

 

 

 

 

1.                Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade visando a declaração de nulidade parcial sem redução de texto do art. 69 da Lei Orgânica Municipal, do art. 96, caput, da Lei Complementar nº 85, de 12 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º e 3º, inciso I, da Lei Complementar nº 145, de 14 de outubro de 2013, todas do Município de Laranjal Paulista, para o fim de excluir sua aplicação aos servidores comissionados e contratados por prazo determinado junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.                Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 23 de junho de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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