EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

 

 

Protocolado nº 160.901/2016

                                     

Ementa:    

1.      Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 18, da Lei Complementar nº 17, de 24 de outubro de 2011, e, por arrastamento, do Decreto nº. 6.517, de 01 de fevereiro de 2017, do Município de Mongaguá.

2.      Cargo de provimento em comissão de Assessor Jurídico Municipal. As atividades de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito. Funções que extrapolam a natureza política do cargo, conferindo poderes de chefia às atividades técnicas desempenhadas pelos Procuradores Jurídicos do Município (arts. 98 a 100 da Constituição Estadual).

 

 

 

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inciso VI, e no art.90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 160.901/16), que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do 18, da Lei Complementar nº 17, de 24 de outubro de 2011, e, por arrastamento, do Decreto nº. 6.517, de 01 de fevereiro de 2017, do Município de Mongaguá, pelos fundamentos expostos a seguir:

1.     DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

O art. 18, da Lei Complementar nº 17, de 24 de outubro de 2011, do Município de Mongaguá, estabelece o seguinte:

“(...)

Art. 23.  O Consultor Jurídico Municipal, cargo em comissão, de livre nomeação e livre exoneração pelo Chefe do Executivo, previsto na Lei Municipal 2.475, de 1º de Julho de 2011 e pela Lei 2.418, de 30 de junho de 2010, passa a denominar-se Assessor Jurídico Municipal e terá sua investidura no quadro da Municipalidade, recebendo vencimentos compatíveis com o de procurador nível III, devendo cumprir jornada de 40 (quarenta) horas semanais, sem todavia, fazer jus à qualquer progressão de nível de que trata esta lei:

 (...)”.

 

O Decreto nº 6.517, de 01 de fevereiro de 2017, descreve as atribuições do Assessor Jurídico Municipal da seguinte forma:

“(...)

Art. 2º. São atribuições dos titulares do cargo de Assessor Jurídico Municipal:

I-                  Prestar assessoria e consultoria aos titulares e auxiliares dos órgãos que integram a estrutura administrativa da Prefeitura a que estejam vinculados, nos assuntos de natureza jurídica submetidos à sua apreciação;

II-                Assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativas dos atos a serem por ela praticados, ou já efetivados;

III-              Analisar e/ou examinar minutas de editais, contratos, acordos, convênios ou aditivos de interesse dos órgãos da Administração Pública Municipal, a que estejam vinculados;

IV-             Cumprir com a orientação normativa oriunda da Procuradoria Geral do Munícipio, nos casos previstos em lei;

V-               Elaborar estudos e preparar informações, por solicitações dos titulares dos órgãos da Administração Direta e Autárquica da Prefeitura a que estejam vinculados;

VI-             Auxiliar na elaboração, alteração e retificação de atos normativos;

VII-           Prestar orientações jurídica às comissões de licitação, sindicância e processo administrativo disciplinar;

VIII-         Examinar, prévia, conclusiva e exclusivamente, no âmbito de casa órgão da Administração Pública Municipal a que estejam vinculados, os atos que tenham conteúdo o reconhecimento da inexigibilidade ou da dispensa de licitação;

IX-              Emitir pareceres de natureza jurídica sobre os mais variados assuntos submetidos a exame;

X-                Auxiliar o diretor da pasta à qual estejam vinculados nas decisões de recursos administrativos interpostos contra atos de servidores vinculados àquele;

XI-              Outras atribuições que lhe sejam correlatas previstas em lei ou em decreto.

(...)”.  

Os atos impugnados ao conferirem ao cargo de provimento em comissão atribuições na área da advocacia pública é inconstitucional por violação dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual, conforme passaremos a expor.

2.     DA FUNDAMENTAÇÃO

A atividade de advocacia pública, inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais recrutados pelo sistema de mérito.

É o que se infere dos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual que se reportam ao modelo traçado no art. 132 da Constituição Federal ao tratar da advocacia pública estadual.

Este modelo deve ser observado pelos municípios por força do art. 144 da Constituição Estadual.

Os preceitos constitucionais (central e radial) cunham a exclusividade e a profissionalidade da função aos agentes respectivos investidos mediante concurso público (inclusive a chefia do órgão, cujo agente deve ser nomeado e exonerado ad nutum dentre os seus integrantes), o que é reverberado pela jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).

“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008)., inclusive a assessoria e a consultoria de corporações legislativas, e suas respectivas chefias, são reservadas a profissionais também recrutados pelo sistema de mérito (arts. 98 a 100, CE/89).

Deste modo, da análise das atribuições previstas para o cargo de Assessor Jurídico Municipal, nota-se que as funções explicitadas se traduzem em atividades técnicas a serem desempenhadas pelos Procuradores Jurídicos do Município, havendo óbice que sejam exercidas pelo mencionado Assessor Jurídico, eis que extrapolam as atribuições políticas inerentes ao referido cargo. Acresce-se que, a natureza técnica profissional destas atribuições não possibilita que sejam exercidas por agente público não concursado, não pertencente à carreira da advocacia pública municipal.

As atividades voltadas à advocacia pública, inclusive a direção ou chefia dos advogados públicos, deve ser destinada exclusivamente a servidores de carreira.

Assim, a atribuição ao Assessor Jurídico de atividades na área da advocacia pública é flagrantemente inconstitucional.

3.     DO PEDIDO

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade do art.  18, da Lei Complementar nº 17, de 24 de outubro de 2011, e, por arrastamento, do Decreto nº. 6.517, de 01 de fevereiro de 2017, ambos do Município de Mongaguá.

 

Requer-se ainda que sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Mongaguá, bem como posteriormente citado o Procurador Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

 

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

 

São Paulo, 28 de julho de 2.017.

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

ef/sh