Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 143.193/2016

 

 

Ementa:

1)     Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar, que dispõe sobre o programa municipal de auxílio-desemprego.

2)     Programa social para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, destinada a absorver mão de obra desempregada, com contratação de pessoal por tempo determinado. Concessão de bolsa auxílio desemprego vinculada à contraprestação de serviços para a municipalidade.

3)     Inconstitucionalidade por excepcionar a regra do concurso público. Previsões que não se ajustam à regra do artigo 115, inc. X, da Constituição do Estado.

 

 

 

 

 

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

A Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005 do Município de Cajamar, que "Dispõe sobre o programa municipal de auxílio-desemprego e dá outras providências", assim dispõe:

   

 

A Lei nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007, também de Cajamar, por sua vez, alterou a redação da referida lei, da seguinte forma:

        

Editada em 26 de outubro de 2009, a Lei nº 1.350 também alterou a redação da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005. Vejamos:

        

Por fim, a Lei nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, mais uma vez o fez, conforme segue:

 

 

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

 A Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar, é verticalmente incompatível com a Constituição do Estado de São Paulo, especialmente com os seus artigos 111; 115, incisos II e X; e 144, verbis:

“Art. 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115 – Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)      

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)      

X – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;

Art. 144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

Regra constitucional é a admissão de pessoal nos órgãos e entidades da Administração Pública mediante prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como estampa o art. 115, II, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, II, da Constituição Federal.

Ressalvada a investidura em cargos de provimento em comissão, a admissão de pessoal é sempre orientada por essa regra.

De outra parte, a Constituição Estadual no art. 115, X, reproduz o quanto disposto no art. 37, IX, da Constituição da República, possibilitando limitada, residual e excepcionalmente a admissão de pessoal por tempo determinado em razão de necessidade administrativa transitória de excepcional interesse público.

Destarte, não é qualquer interesse público que autoriza a contratação temporária – que constitui outra exceção à regra do concurso público –, mas, tão somente, aquela que veicula uma necessidade do aparelho administrativo na prestação de seus serviços, devendo, ademais, concorrer a excepcionalidade desse interesse público, a temporariedade da contratação e a submissão à previsão legal.

Embora tenha motivos nobres, por ser voltada ao amparo do trabalhador desempregado, as leis impugnadas são verticalmente incompatíveis com a Constituição do Estado de São Paulo, especialmente com o seu art. 115, II e X.

A admissão de pessoal a termo, portanto, deve objetivar situações anormais, urgentes, incomuns e extraordinárias que molestem as necessidades administrativas, não servindo ao combate ao desemprego. E, ademais, não se admite dissimulação na investidura em cargo ou emprego públicos à margem do concurso público e para além das ressalvas constitucionais.

Neste sentido:

“A regra é a admissão de servidor público mediante concurso público: CF, art. 37, II. As duas exceções à regra são para os cargos em comissão referidos no inciso II do art. 37, e a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. CF, art. 37, IX. Nessa hipótese, deverão ser atendidas as seguintes condições: a) previsão em lei dos cargos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público; d) interesse público excepcional. Lei 6.094/2000, do Estado do Espírito Santo, que autoriza o Poder Executivo a contratar, temporariamente, defensores públicos: inconstitucionalidade” (STF, ADI 2.229, Rel. Min. Carlos Velloso, 09-06-2004, DJ 25-06-2004).

“Ação direta de inconstitucionalidade - Artigo 2º., inciso V, da Lei n° 1.423, de 08 de outubro de 2002, que dispõe sobre a contratação temporária de excepcional interesse público e considera como tal a contratação de pessoal para ministrar cursos profissionalizantes, de natureza não permanente - Dispositivo que institui hipótese de contratação de servidor que não se enquadra em situação emergencial e de excepcional interesse público, de modo a dispensar a regra geral que é a da contratação mediante concurso público Inadmissibilidade - Violação dos artigos 111,115, Il e X e 144 da Constituição do Estado de São Paulo – Ação procedente” (TJSP, ADI 161.768-0/0-00, Rel. Des. Debatin Cardoso, 22-10-2008).

Aliás, o art. 4º da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, ao definir o conteúdo do programa de emergencial de Auxílio-Desemprego, subordina o recebimento da bolsa auxílio-desemprego e do auxílio alimentação (art. 3º) à prestação de serviços ao município de forma genérica, apenas exigindo “a prestação de serviços de interesse da comunidade do município, sem vínculo de subordinação e sem comprometimento das atividades já desenvolvidas pelo Executivo”.

No caso em exame, revestido de auxílio-desemprego, a lei disciplinou verdadeira contratação de pessoas desempregadas para prestação de serviços para a municipalidade, prevendo jornada de trabalho (art. 5º da Lei nº 1.174/2005), e valor da bolsa auxílio-desemprego (inciso I do art. 2º da Lei nº 1.174/2005 tanto em sua redação original quanto na redação dada pela Lei nº 1.350/2009). Não define a lei situação excepcional que poderia justificar a contratação, o que evidencia a inconstitucionalidade dos referidos preceitos legais.

Por todas essas razões, inconstitucionais são as hipóteses de contratação temporária, uma vez que a absorção de mão-de-obra desempregada, com contratação de pessoal por tempo determinado, para prestar serviços à Municipalidade de Cajamar contraria a Constituição do Estado de São Paulo por falta de excepcional interesse público. Note-se que o objetivo da legislação questionada é a contratação temporária de pessoas para executar tarefas genéricas que não revelam a excepcionalidade.

Destarte, é possível afirmar que a lei impugnada ofende frontalmente os seguintes dispositivos da Constituição do Estado de São Paulo: arts. 111; 115, incisos II e X, e 144.

III – DO Pedido

         Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar.

         Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Cajamar, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 05 de julho de 2017

 

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

efsj/mam

 

              

 

 

 

 


 

Protocolado n. 143.193/2017

Assunto: Análise de constitucionalidade da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar

 

 

1.                Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade da Lei nº 1.174, de 06 de setembro de 2005, na redação dada pelas Leis nº 1.273, de 14 de dezembro de 2007; nº 1.350, de 26 de outubro de 2009; e nº 1.468, de 15 de dezembro de 2011, todas do Município de Cajamar, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.                Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 05 de julho de 2017

 

         Gianpaolo Poggio Smanio

         Procurador-Geral de Justiça

efsj/mam