Excelentíssimo
Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo
Protocolado n. 116.582/2016
Ementa: Constitucional.
Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigo 18 da Lei n°
3.720, de 26 de dezembro de 2013, do Município da Estância Balneária de
Ubatuba. Vinculação vedada à periodicidade e aos índices da revisão geral anual
dos servidores públicos municipais. Vedada
vinculação da alteração às datas e índices da revisão geral anual do
funcionalismo público municipal (art. 115, XV, CE/89).
O
Procurador-Geral
de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição
prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de
novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em
conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da
Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do
Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso procedimento,
vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a
presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE visando a anulação das
expressões “de acordo com os índices e datas em que o Poder Executivo Municipal
dispuser sobre a concessão de reajuste dos vencimentos e salários dos
servidores públicos municipais” constantes no artigo 18 da Lei n° 3.720, de 26
de dezembro de 2013, do Município de Estância Balneária de Ubatuba, pelos fundamentos a seguir expostos:
I – O Ato Normativo Impugnado
A Lei n° 3.720,
de 26 de dezembro de 2013, do Município da Estância Balneária de Ubatuba, que “dispõe sobre reestruturação da Fundação de
Arte e Cultura de Ubatuba”, possui, no que diz respeito ao objeto desta
ação, o seguinte teor, verbis:
“Art. 18 – Fica autorizada a Fundação de Arte e Cultura de Ubatuba a conceder reajuste dos salários ou remunerações de seus empregados, de acordo com os índices e datas em que o Poder Executivo Municipal dispuser sobre a concessão de reajuste dos vencimentos e salários dos servidores públicos municipais. (...)”. – grifo nosso (fl. 22)
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
As
expressões legais impugnadas contrariam frontalmente a Constituição do Estado
de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a
previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.
Os
dispositivos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição
Estadual, aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144:
“Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
XV - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público, observado o disposto na Constituição Federal;
(...)”
Ao vincular o
momento e o índice da alteração da remuneração dos empregados da Fundação de
Arte e Cultura de Ubatuba aos da revisão geral anual concedida ao funcionalismo
público municipal, o preceito impugnado se incompatibiliza com o inciso XV do
art. 115 da Constituição Estadual – que reproduz o art. 37, XIII, da
Constituição Federal.
Não autoriza o ordenamento constitucional a vinculação entre a remuneração dos empregados de fundações públicas e a dos servidores públicos municipais para fins de revisão geral anual. Conforme observa autorizada doutrina:
“(...) as manifestações da jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal sempre indicaram a impossibilidade de vinculação entre carreiras
diversas, interditando que os estipêndios de uma determinada categoria
correspondessem a um percentual de outro e, conseqüentemente, que o aumento
concedido a uma fosse estendido à outra, impedindo ‘majorações de vencimentos
em cadeia’. Assim, por exemplo, a vinculação, prevista em lei estadual, da alteração dos subsídios do
Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado às propostas de
fixação dos vencimentos dos servidores públicos em geral ofende o inciso XIII
do art. 37. O que não se coaduna com a noção proibitiva do art. 37, XIII, é uma
vinculação positiva, diferentemente da inserção de um limite, tornando o
vencimento ou subsídio de uma carreira dependente de outra” (Wallace Paiva
Martins Junior. Remuneração dos agentes
públicos, São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 133-136).
Nesse sentido é a
jurisprudência deste Colendo Órgão Especial, em casos análogos a este,
envolvendo a vinculação da revisão geral anual dos subsídios dos agentes
políticos a dos servidores públicos municipais, verbis:
“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 4º DA LEI Nº 11.894, DE 14 DE FEVEREIRO DE 2003. - A Lei Maior impôs tratamento jurídico diferenciado entre a classe dos servidores públicos em geral e o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais. Estes agentes públicos, que se situam no topo da estrutura funcional de cada poder orgânico da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, são remunerados exclusivamente por subsídios, cuja fixação ou alteração é matéria reservada à lei específica, observada, em cada caso, a respectiva iniciativa (incisos X e XI do art. 37 da CF/88). - O dispositivo legal impugnado, ao vincular a alteração dos subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado às propostas de refixação dos vencimentos dos servidores públicos em geral ofendeu o inciso XIII do art. 37 e o inciso VIII do art. 49 da Constituição Federal de 1988. Sobremais, desconsiderou que todos os dispositivos constitucionais versantes do tema do reajuste estipendiário dos agentes públicos são manifestação do magno princípio da Separação de Poderes. Ação direta de inconstitucionalidade procedente” (STF, ADI 3.491-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 27-09-2006, v.u., DJ 23-03-2007, p. 71, RTJ 201/530).
“Ação direta de
inconstitucionalidade - sustentada inconstitucionalidade dos artigos 4º e 5º,
caput, §§ 1º, 4º e 5º, da Lei nº 11.600, de 09 de abril de 2008, em sua redação
original e na que foi dada pelo artigo 1º, I e II, da Lei nº 11.622, de 05 de
maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto, que ‘Fixa os subsídios do
Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários e Vereadores para a legislatura a iniciar-se
em 1º de janeiro de 2009 e dá outras providências’, e ‘Dá nova redação ao
parágrafo 4º e acrescenta o parágrafo 5º ao artigo 5º da Lei n° 11.600, de
09/04/08’, respectivamente - vedada é a vinculação do reajuste dos subsídios do
Chefe do Poder Executivo, do Vice, e de seus auxiliares diretos à revisão geral
anual do funcionalismo público municipal - é vedada a fixação dos subsídios dos
Vereadores em percentual dos subsídios dos Deputados Estaduais - é vedada,
ainda, a vinculação do reajuste dos subsídios dos Vereadores à revisão geral
anual do funcionalismo público municipal ou à alteração dos subsídios dos
Deputados Estaduais, eis que inalterável o valor daqueles durante a
legislatura, por força da reintrodução pela EC 23/2000, da chamada ‘regra da
legislatura’ aos parlamentares municipais - vedada é a instituição de décimo
terceiro subsídio a quem tem vínculo não profissional com a Administração
Pública - é vedada a expansão do subsídio como parcela única concebido, para
abranger valores excedentes à remuneração do mandato parlamentar estadual
(ajuda de custo, jeton, verba de gabinete e outras) violação dos artigos 1º,
111, 115, XI, XII e XV, 124, § 2º, 144 e 297, da CE - ação procedente,
assentando-se, ademais, a fim de que os Vereadores da atual Legislatura de
Ribeirão Preto não fiquem sem remuneração, que, a este título, na corrente
receberão o subsídio que vigorou na Legislatura anterior, obviamente que sem a
revisão anual e observados os limites estabelecidos no inciso VI, do art. 29 da
Constituição Federal” (TJSP, ADI 994.09.002644-6, Órgão Especial, Rel. Des.
Palma Bisson, 10-02-2010, v.u.).
“O Colendo
Supremo Tribunal Federal já assentou ser inconstitucional dispositivo de lei
estadual vinculando a alteração do subsídio do Governador, do Vice-Governador e
dos Secretários de Estado ao reajuste dos vencimentos dos servidores públicos.
(...) ‘Mutatis mutantis’ a situação é a mesma em se tratando de lei municipal
que vincula a alteração do subsídio de vereador ao reajuste do funcionário
público municipal. Evidente a inconstitucionalidade de dispositivo que prevê
tal vinculação para o reajuste dos vereadores, porquanto também nessa hipótese
ocorre violação à ‘regra da legislatura’, estatuída no artigo 29, VI, da
Constituição da República. É o caso dos autos, em que a edição de lei atrelando
a revisão do subsídio dos vereadores ao reajuste dos servidores municipais,
ensejou alteração daquele na mesma legislatura, pelos próprios parlamentares,
que assim acabaram por legislar em causa própria, em clara e inequívoca
transgressão ao princípio da moralidade administrativa, que a Constituição
Federal consagra (artigo 37) e protege (art. 5º, LXXIII). Em suma, como bem
anotou o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, ‘Sendo que a
remuneração deve ser fixada em cada legislatura para a subsequente, não é
tolerável a 'revisão anual dos subsídios',’ mesmo porque ‘Não faria sentido
que, de um lado, a Carta Magna condicionasse a fixação dos subsídios dos
Vereadores a legislatura e, de outro lado, mantivesse para os parlamentares,
sem mais, a aplicação da regra geral do art. 37, X’ (fl. 501). Por derradeiro,
é oportuna trazer à baila vetusta decisão da Suprema Corte, da lavra do
Ministro Mário Guimarães, ao julgar o RE nº 25.793/SP, em 1º de agosto de 1955,
quando se decidiu que ‘Não podem as Câmaras Municipais alterar durante o
período do mandato, o subsídio de seus vereadores (...), colhendo-se desse
venerando acórdão citação sobre a matéria, que nos dias atuais tem inteira
aplicabilidade e está assim redigida: ‘João Barbalho, comentando o art. 46, da
Constituição de 91, achava que deveria a fixação do subsidio ser antes da
eleição, de modo que se não soubesse quem queria o beneficiado - cautela que
hoje consta da Constituição de 46, e terminava suas considerações com a citação
destas palavras de Aristóteles, sempre oportuna entre nós - 'Combinai de tal
forma vossas leis e vossas instituições, que os empregos não possam ser objeto
de um cálculo interessado’ (V. Comentários à Constituição Federal Brasileira,
pg. 235)’ (...)” (TJSP, II 161.056-0/0-00, Órgão Especial, Rel. Des. Mário
Devienne Ferraz, 13-08-2008, v.u.).
III – Pedido
Diante de tudo o quanto acima foi exposto, requer-se
o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja
julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade das expressões “de acordo com os índices e datas em que o
Poder Executivo Municipal dispuser sobre a concessão de reajuste dos
vencimentos e salários dos servidores públicos municipais” constantes no artigo
18 da Lei n° 3.720, de 26 de dezembro de 2013, do Município de Estância
Balneária de Ubatuba.
Requer-se
ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal
de Ubatuba, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se
manifestar sobre o ato normativo impugnado, protestando por nova vista,
posteriormente, para manifestação final.
Termos em que, pede
deferimento.
São
Paulo, 27 de junho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ef
Protocolado n. 116.582/2016
Interessado: Doutor Lúcio Camargo de Ramos Júnior – Promotor de
Justiça de Ubatuba
Objeto: representação para controle de constitucionalidade da
expressão “de acordo com os índices e
datas em que o Poder Executivo Municipal dispuser sobre a concessão de reajuste
dos vencimentos e salários dos servidores públicos municipais” constante no
artigo 18 da Lei n° 3.720, de 26 de dezembro de 2013, do Município de Estância
Balneária de Ubatuba.
1. Distribua-se no Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, instruída com o protocolado em epígrafe, a
petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face da expressão “de acordo com os índices e datas em que o
Poder Executivo Municipal dispuser sobre a concessão de reajuste dos
vencimentos e salários dos servidores públicos municipais” constante no artigo
18 da Lei n° 3.720, de 26 de dezembro de 2013, do Município de Estância
Balneária de Ubatuba.
2. Ciência aos interessados.
São Paulo, 27 de junho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
ef