Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 113.045/16

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara. Subsídio de agentes políticos municipais (Prefeito). Alteração durante a legislatura.

1. Incompatível com a anterioridade da legislatura e a inalterabilidade do subsídio Prefeito durante a legislatura regra que promove a majoração de seu valor.

2. Constituição Estadual: arts. 111 e 144.

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – Os Atos Normativos Impugnados

                   A Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara, dispôs sobre o reajuste salarial do Prefeito Municipal de Nhandeara. Eis seu teor:

Art. 1º. Fica o subsídio do Prefeito Municipal de Nhandeara, reajustado no percentual de 50% (cinquenta por cento), sobre o subsídio do mês de julho de 2014.

Art. 2º. As despesas decorrentes desta Lei correrão por conta de dotações próprias de cada órgão, suplementadas se necessário.

Art. 3º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. (fl. 85)

                   A lei, de iniciativa da Câmara Municipal, elevou os subsídios do Prefeito Municipal durante a legislatura.

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

                   A lei impugnada contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal. Ela é incompatível com os seguintes preceitos da Constituição Estadual, aplicável aos Municípios por força de seu art. 144, e que assim estabelece:

Artigo 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

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Artigo 144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

                   O art. 144 da Constituição Estadual, que determina a observância na esfera municipal, além das regras da Constituição Estadual, dos princípios da Constituição Federal, é denominado “norma estadual de caráter remissivo, na medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia municipal, remete para as disposições constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello, 18-10-2010, DJe 26-10-2010).

                   Daí decorre a possibilidade de contraste de lei ou ato normativo local com o art. 144 da Constituição Estadual por sua remissão à Constituição Federal e a seu art. 29, V e VI.

                   Ora, como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal, “o subsídio do prefeito é fixado pela Câmara Municipal até o final da legislatura para vigorar na subsequente” (STF, RE 204.889-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Menezes Direito, 26-02-2008, m.v., DJe 16-05-2008).

                   Patente, pois, a violação ao art. 144 da Constituição Estadual, pois, a alteração dos subsídios durante a legislatura é inconstitucional como se verifica de sucessivos julgamentos adiante transcritos:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SUBSÍDIOS DE PREFEITO E VEREADORES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Fixação para legislatura subsequente. Princípio da anterioridade. Precedentes. 2. O Tribunal a quo não julgou válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição da República. Inadmissibilidade do recurso pela alínea c do art. 102, inc. III, da Constituição da República. Precedente” (STF, AgR-RE 484.307-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, 23-03-2011, v.u., DJe 08-04-2011).

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREFEITO, VICE-PREFEITO E VEREADORES. REMUNERAÇÃO. MAJORAÇÃO. FIXAÇÃO. LEGISLATURA SUBSEQUENTE. ART. 29, V, DA CONSTITUIÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. I – O Tribunal de origem, ao constatar que os Atos 3 e 4/97 da Mesa da Câmara Municipal de Arapongas traduziram majoração de remuneração, agiram em conformidade com o entendimento pacífico desta Suprema Corte no sentido de que a remuneração de Prefeito, Vice-Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal, para a legislatura subsequente, de acordo com o disposto no art. 29, V, da Constituição Federal. Precedentes. III – Agravo regimental improvido” (STF, AgR-AI 776.230-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 09-11-2010, v.u., DJe 26-11-2010).

“CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. VEREADORES. REMUNERAÇÃO. FIXAÇÃO. LEGISLATURA SUBSEQÜENTE. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. CF/88, ART. 29, V. 1. Princípio da anterioridade - A remuneração de Prefeito, Vice-Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal, para a legislatura subsequente (CF, art. 29, V). Precedentes. 2. As razões do regimental não atacam os fundamentos da decisão agravada. 3. Agravo regimental improvido” (STF, AgR-RE 229.122-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, 25-11-2008, v.u., DJe 19-12-2008).

                   Outrossim a alteração dos subsídios durante a legislatura é incompatível com o princípio da moralidade, constante do art. 111 da Constituição do Estado de São Paulo, na medida em que sua operacionalização nesse período oportuniza a concessão de benesse indevida (a majoração do subsídio) em detrimento do prestígio às regras do jogo previamente definidas, consistentes na fixação precedente do subsídio do Chefe do Poder Executivo à sua investidura no cargo.

III – Pedido liminar

                   À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura da lei impugnada do Município de Nhandeara apontada como violadora de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se dispêndio indevido de recursos públicos e a consequente oneração financeira do erário.

                   À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, da Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara.

IV – Pedido

                   Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara.

                   Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Nhandeara, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 20 de outubro de 2016.

 

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

wpmj

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 113.045/16

Interessada: Doutora Ingrid Maria Bertolino Braido – Promotor de Justiça de Nhandeara

Objeto: representação para controle de constitucionalidade da Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, e da Lei n. 1.974, de 17 de fevereiro de 2009, do Município de Nhandeara

 

 

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se no egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, instruída com o protocolado em epígrafe, a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei n. 2.263, de 08 de julho de 2014, do Município de Nhandeara.

2.     Arquivo a representação na parte em que impugna a gratificação de especialidade médica contida no art. 7º da Lei n. 1.974, de 17 de fevereiro de 2009, do Município de Nhandeara, por não me convencer de sua inconstitucionalidade.

3.     Referida lei instituiu a gratificação aos médicos do funcionalismo público municipal “que detiverem titulação de especialista em áreas específicas”, por título devidamente comprovado, o que se afina ao ideário que inspira a adoção de vantagens pecuniárias conectada à sua vantajosidade ao interesse público, consistente na melhora do serviço pelo aprimoramento técnico do profissional. Trata-se de vantagem modal, que valoriza as condições pessoais do servidor, e que não é supérflua por exigir dele um plus além do requisito de habilitação para o cargo, atendendo, pois, ao art. 39, § 1º, da Constituição Federal, e ao art. 128 da Constituição Estadual.

4.     Ciência aos interessados.

São Paulo, 20 de outubro de 2016.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

wpmj