Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

Protocolado n. 173.956/2016

 

 

 

 

Ementa: Constitucional. Previdenciário. Ação Direta Inconstitucionalidade. Lei n. 94, de 28 de dezembro de 1995, do Município de Tuiuti. Direito à complementação dos proventos de aposentadoria aos servidores públicos municipais inativos. Ausência de fonte de custeio. Violação aos princípios do interesse público e da razoabilidade. 1. Incompatível com o art. 218 da Constituição Estadual, que determina a observância dos princípios da seguridade social previstos nos arts. 194 e 195 da Constituição Federal [dentre eles, os de que a seguridade social deve ser custeada por contribuições dos trabalhadores e de que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total (art. 195, II, § 5º)], o direito à complementação de proventos de aposentadoria aos servidores municipais inativos, integrantes do regime geral de previdência social. 2. Inexistência de interesse público e de razoabilidade, violadora dos arts. 111 e 128 da Constituição Estadual, na complementação de proventos de aposentadoria de servidores públicos, integrantes do regime geral de previdência social, medida que lhes outorga integralidade remuneratória recusada na inatividade.

 

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei nº 94, de 28 de dezembro de 1995, do Município de Tuiuti, pelos fundamentos a seguir expostos:

 

I – O Ato Normativo Impugnado

 

                   A Lei n. 94, de 28 de dezembro de 1995, do Município de Tuiuti, “dispõe sobre a complementação salarial a servidor municipal quando da sua aposentadoria” assegura aos aposentados do serviço público direito à complementação de seus vencimentos, nos seguintes termos:

“Art. 1º - Ao se aposentar pelo INSS, de forma voluntária ou compulsória, será concedido ao servidor municipal, o pagamento da diferença entre o provento da aposentadoria e a remuneração que vinha recebendo, desde que tenha prestado efetivo serviço à Municipalidade pelo período mínimo de 15 (quinze)a nos, obedecendo a tabela proporcional a seguir:

Tempo de serviço

Percentual

15 anos

70%

16 anos

73%

17 anos

76%

18 anos

79%

19 anos

82%

20 anos

85%

21 anos

88%

22 anos

91%

23 anos

94%

24 anos

97%

25 anos

100%

 

Art. 2º - As correções salariais concedidas aos servidores ativos, serão repassadas automaticamente aos servidores beneficiários desta lei, de forma a se cumprir integralmente ao disposto no caput.

Art. 3º - A tabela do artigo 1º desta lei se aplica a todos os funcionários que se aposentarem a partir da promulgação desta lei.

Art. 4º - As despesas decorrentes da execução desta lei, correrão por conta das dotações próprias, e se necessário for, pela abertura de crédito adicional especial.

Art. 5º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação”.

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

                   A norma impugnada contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

                   Os preceitos da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144, que assim estabelece:

“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

                   As regras jurídicas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 128 – As vantagens de qualquer natureza só poderão ser instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço.

(...)

Artigo 218 – O Estado garantirá, em seu território, o planejamento e desenvolvimento de ações que viabilizem, no âmbito de sua competência, os princípios de seguridade social previstos nos artigos 194 e 195 da Constituição Federal”.

                   Essa última é norma remissiva que incorpora à Constituição Estadual os princípios da seguridade social contidos na Constituição Federal, em especial o caput, o inciso II e o § 5º do art. 195 desta:

“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

(...)

II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

(...)

§ 5º. Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio social”.

                    A norma local impugnada outorga a complementação de benefícios previdenciários mercê da inexistência de fonte de custeio, pois ela é paga exclusiva e integralmente por recursos oriundos do erário.

                   Se os servidores beneficiários não gozam de direito à integralidade ou paridade de seus proventos com a remuneração do pessoal ativo, falece interesse público e razoabilidade na instituição da complementação desse benefício previdenciário.

                   Agrava-se a situação a compreensão da natureza do vínculo dos beneficiários da lei (servidores públicos municipais) ante sua sujeição ao regime geral de previdência social, que não tolera complementação de proventos à custa do erário, nem integralidade ou paridade, resta evidente a ausência de interesse público e razoabilidade na sua instituição, não podendo tal situação se perpetuar no município.

                   O colendo Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já pronunciou, reiteradas vezes, a inconstitucionalidade de leis municipais similares (ADI 164.947-0/9-00, Rel. Des. Mário Devienne Ferraz, v.u., 12-11-2008; ADI 158.764-0/4-00, Rel. Des. A. C. Mathias Coltro, v.u., 16-07-2008; ADI 150.585-0/9-00, Rel. Des. Luiz Tâmbara, v.u., 26-08-2009; ADI 154.602-0/7, Rel. Des. Sousa Lima, m.v., 10-09-2008).

                   Neste sentido, a instituição de complementação de aposentadoria é inconstitucional em virtude de sua incompatibilidade com o art. 195, § 5º, da Constituição Federal de 1988, que exige a prévia existência de fonte de custeio para criação, majoração ou extensão de benefício da seguridade social, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

“A exigência inscrita no art. 195, § 5º, da Carta Política traduz comando que tem, por destinatário exclusivo, o próprio legislador ordinário, no que se refere a criação, majoração ou extensão de outros benefícios ou serviços da seguridade social” (STF, AI 151.106-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 26-11-1993).

III – Pedido

                   Face ao exposto, requer o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 94, de 28 de dezembro de 1995, do Município de Tuiuti.

                   Requer ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Tuiuti, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 06 de abril de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

blo