Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

Protocolado n. 35.625/17

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré. Autorização ao Poder Executivo para criação do canil da Guarda Municipal. Iniciativa Parlamentar. Separação de poderes. Reserva de iniciativa legislativa. Reserva da Administração.

1. A iniciativa parlamentar de lei que autoriza o Poder Executivo à criação do canil da Guarda Municipal é incompatível com o princípio da separação de poderes.

2. A direção superior, a prática de atos de gestão e a disciplina do funcionamento e da organização administrativa pertencem privativamente ao Chefe do Poder Executivo, e se houver aumento de despesa pública à sua iniciativa legislativa reservada.

3. A criação de órgãos do Poder Executivo ou a consignação de atribuições a órgãos depende da iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo.

4. Constituição Estadual: arts. 5º, 24, § 2º, 2, 25, 47, II, XIV e XIX, a, 174, III, e 176, I.

 

 

 

 

 

            O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – O ATO NORMATIVO IMPUGNADO

                  A Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré, de iniciativa parlamentar, dispõe sobre a criação do Canil da Guarda Municipal da seguinte maneira:

“Art. 1º - Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a criar o canil da Guarda Municipal, diretamente subordinado à direção da Guarda Municipal de Sumaré.

Art. 2º - O canil tem por finalidade possibilitar a utilização de cães adestrados com objetivo de auxiliar os guardas municipais na proteção dos bens, serviços, instalações do Município e em outras situações relacionadas com as atividades e atribuições da Guarda Municipal.

Art. 3º - Observadas as disposições do artigo anterior, e sem prejuízo da Lei nº 4419, de 23 de abril de 2007, que dispõe sobre o Código Municipal de preservação e proteção dos animais no Município de Sumaré, e da legislação federal aplicável, os cães do canil de que trata esta Lei poderão ser empregados em:

I – patrulhamento diário e dos próprios municipais, e em eventos;

II – operações de busca, resgate e salvamento, e demais operações de socorro, como apoio à Defesa Civil;

III – demonstrações recreativas ou educacionais;

IV – provas oficiais e estrutura;

V – formaturas e desfiles de caráter cívico-militar; e

VI – atividades de cinoterapia.

Art. 4º - As instalações, atividades e o efetivo de cães serão supervisionados e avaliados por uma Comissão Examinadora, designada pela Secretaria de Segurança e Defesa Civil.

Parágrafo único – Farão parte da Comissão Examinadora, obrigatoriamente e sem acréscimos em seus respectivos vencimentos, o Secretário e o Diretor da Secretaria de Segurança e Defesa Civil, o responsável pelo adestramento de cães e um membro da Secretaria Municipal de Saúde, ligado ao Centro de Controle de Zoonoses.

Art. 5º - A Secretaria Municipal de Saúde, através do Centro de Controle de Zoonoses, indicará um médico-veterinário que realizará visitas técnicas periódicas ao canil a fim de prestar apoio e orientação profissional preventiva, sendo as ações clínicas e cirúrgicas realizadas por serviço veterinário a ser contratado ou conveniado pela Guarda Municipal.

Art. 6º - O canil será composto por até dez cães, número que poderá ser aumentado mediante parecer favorável da Comissão Examinadora.

Art. 7º - Os guardas municipais designados para manutenção do canil deverão possuir curso de adestrador e condutor de cães, realizado pela Guarda Municipal ou por órgão oficial especializado na matéria.

Art. 8º - Os cães integrantes do canil constituem patrimônio do Município.

Art. 9º - Fica a critério do Poder Executivo Municipal regulamentar esta Lei através de Decreto.

Art. 10 – As despesas com a execução desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 11 – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.”

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

            A lei, em suma, consigna atribuições a órgão do Poder Executivo (Guarda Municipal), criando em sua estrutura serviço específico e disciplinando sua gestão, e determinando novas atribuições a outros órgãos do Poder Executivo (Secretaria de Saúde; Secretaria de Segurança e Defesa Civil).

                   Apesar de sancionada pelo Prefeito Municipal, ela padece de inconstitucionalidade.

                   A lei local é incompatível com os seguintes preceitos da Constituição Estadual aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144:

Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

(...)

Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

(...)

§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:

(...)

2 - criação e extinção das Secretarias de Estado e órgãos da administração pública, observado o disposto no artigo 47, XIX;

(...)

Artigo 25 - Nenhum projeto de lei que implique a criação ou o aumento de despesa pública será sancionado sem que dele conste a indicação dos recursos disponíveis, próprios para atender aos novos encargos.

(...)

Art. 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:

(...)

II - exercer, com o auxílio direto dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;

(...)

XIV – praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo;

(...)

XIX – dispor, mediante decreto, sobre:

a) organização e funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos;

(...)

Artigo 174 - Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão, com observância dos preceitos correspondentes da Constituição Federal:

(...)

III - os orçamentos anuais.

(...)

Artigo 176 - São vedados:

I - o início de programas, projetos e atividades não incluídos na lei orçamentária anual; 

         Em se tratando de processo legislativo é princípio que as normas do modelo federal são aplicáveis e extensíveis por simetria às demais órbitas federativas. Neste sentido pronuncia a jurisprudência:

“(...) as regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros” (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.).

“As regras básicas do processo legislativo federal são de observância obrigatória pelos Estados-membros e Municípios” (STF, ADI 2.731-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 02-03-2003, v.u., DJ 25-04-2003, p. 33).

“A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno --- artigo 25, caput ---, impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo. O legislador estadual não pode usurpar a iniciativa legislativa do Chefe do Executivo, dispondo sobre as matérias reservadas a essa iniciativa privativa” (STF, ADI 1.594-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 04-06-2008, v.u., DJe 22-08-2008).

“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que as regras básicas do processo legislativo da Constituição Federal, entre as quais as que estabelecem reserva de iniciativa legislativa, são de observância obrigatória pelos estados-membros” (RT 850/180).

“A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno (artigo 25, caput), impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo” (RTJ 193/832).

         A inconstitucionalidade decorre da iniciativa parlamentar, agressiva da separação de poderes prevista no art. 5º da Constituição Estadual, porque seu objeto é, de um lado, a dotação de atribuições a órgão do Poder Executivo, o que depende de lei de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo (art. 24, § 2º, 2, Constituição Estadual), e de outro, a disciplina da organização e funcionamento da Administração e a prática de atos de sua direção superior e típicos de sua gestão ordinária são da alçada privativa do Chefe do Poder Executivo, desde que não impliquem aumento de despesa ou a criação e extinção de órgãos públicos a exigir lei de sua iniciativa reservada (art. 47, II, XIV e XIX, a, Constituição Estadual).

         Portanto, a lei local impugnada é incompatível com os arts. 5º, 24, § 2º, 2, e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual, como vem decidindo a Suprema Corte:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N.º 11.830, DE 16 DE SETEMBRO DE 2002, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ADEQUAÇÃO DAS ATIVIDADES DO SERVIÇO PÚBLICO ESTADUAL E DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO PÚBLICOS E PRIVADOS AOS DIAS DE GUARDA DAS DIFERENTES RELIGIÕES PROFESSADAS NO ESTADO. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 22, XXIV; 61, § 1.º, II, C; 84, VI, A; E 207 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. No que toca à Administração Pública estadual, o diploma impugnado padece de vício formal, uma vez que proposto por membro da Assembleia Legislativa gaúcha, não observando a iniciativa privativa do Chefe do Executivo, corolário do princípio da separação de poderes. Já, ao estabelecer diretrizes para as entidades de ensino de primeiro e segundo graus, a lei atacada revela-se contrária ao poder de disposição do Governador do Estado, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento de órgãos administrativos, no caso das escolas públicas” (RTJ 191/479).

“É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação” (STF, ADI 3.254-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 16-11-2005, v.u., DJ 02-12-2005, p. 02).

“À luz do princípio da simetria, são de iniciativa do Chefe do Poder Executivo estadual as leis que versem sobre a organização administrativa do Estado, podendo a questão referente à organização e funcionamento da Administração Estadual, quando não importar aumento de despesa, ser regulamentada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, e e art. 84, VI, a da Constituição federal)” (STF, ADI 2.857-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 30-08-2007, v.u., DJe 30-11-2007).

            Quando lei de iniciativa parlamentar cria ou fornece atribuição ao Poder Executivo ou seus órgãos demandando diretamente a realização de despesa pública não prevista no orçamento para atendimento de novos encargos, com ou sem indicação de sua fonte de cobertura inclusive para os exercícios seguintes, ela também padece de inconstitucionalidade por incompatibilidade com os arts. 25 e 176, I, da Constituição Estadual e, para além, com o art. 174, III, da Constituição Estadual, preceito que reserva ao Chefe do Poder Executivo iniciativa legislativa sobre o orçamento anual, conforme pronuncia o Supremo Tribunal Federal:

“Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei do Estado do Amapá. 3. Organização, estrutura e atribuições de Secretaria Estadual. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. Precedentes. 4. Exigência de consignação de dotação orçamentária para execução da lei. Matéria de iniciativa do Poder Executivo. Precedentes. 5. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 341, p. 35).

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei Do Estado do Rio Grande do Sul. Instituição do Pólo Estadual da Música Erudita. 3. Estrutura e atribuições de órgãos e Secretarias da Administração Pública. 4. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. 5. Precedentes. 6. Exigência de consignação de dotação orçamentária para execução da lei. 7. Matéria de iniciativa do Poder Executivo. 8. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 338, p. 46).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.238/94 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. INSTITUIÇÃO DO PROGRAMA ESTADUAL DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA, DESTINADO AOS MUNICÍPIOS. CRIAÇÃO DE UM CONSELHO PARA ADMIUNISTRAR O PROGRAMA. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 61, § 1º, INCISO II, ALÍNEA ‘E’, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Vício de iniciativa, vez que o projeto de lei foi apresentado por um parlamentar, embora trate de matéria típica de Administração. 2. O texto normativo criou novo órgão na Administração Pública estadual, o Conselho de Administração, composto, entre outros, por dois Secretários de Estado, além de acarretar ônus para o Estado-membro. Afronta ao disposto no artigo 61, § 1º, inciso II, alínea ‘e’ da Constituição do Brasil. 3. O texto normativo, ao cercear a iniciativa para a elaboração da lei orçamentária, colide com o disposto no artigo 165, inciso III, da Constituição de 1988. 4. A declaração de inconstitucionalidade dos artigos 2º e 3º da lei atacada implica seu esvaziamento. A declaração de inconstitucionalidade dos seus demais preceitos dá-se por arrastamento. 5. Pedido julgado procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 10.238/94 do Estado do Rio Grande do Sul” (RTJ 200/1065).    

                   Nem se alegue a natureza autorizativa da norma, pois, ela não é proficiente para desabonar sua inconstitucionalidade.

                   A autorização legislativa não se confunde com lei autorizativa, devendo aquela primar pela observância da reserva de iniciativa. Ainda que a lei contenha autorização (norma autorizativa) ou permissão (norma permissiva) padece de inconstitucionalidade porque sua iniciativa é da alçada exclusiva do Chefe do Poder Executivo, cuja prerrogativa de análise da conveniência e da oportunidade das providências previstas na lei foi violada.

                   Lição doutrinária abalizada, analisando a natureza das intrigantes leis autorizativas, especialmente quando votadas contra a vontade de quem poderia solicitar a autorização, ensina que:

“insistente na prática legislativa brasileira, a ‘lei’ autorizativa constitui um expediente, usado por parlamentares, para granjear o crédito político pela realização de obras ou serviços em campos materiais nos quais não têm iniciativa das leis, em geral matérias administrativas. Mediante esse tipo de ‘leis’, passam eles, de autores do projeto de lei, a co-autores da obra ou serviço autorizado. Os constituintes consideraram tais obras e serviços como estranhos aos legisladores e, por isso, os subtraíram da iniciativa parlamentar das leis. Para compensar essa perda, realmente exagerada, surgiu ‘lei’ autorizativa, praticada cada vez mais exageradamente autorizativa  é a ‘lei’ que - por não poder determinar - limita-se a autorizar o Poder Executivo a executar atos  que já lhe estão autorizados pela Constituição, pois estão dentro da competência constitucional desse Poder. O texto da ‘lei’ começa por uma expressão que se tornou padrão: ‘Fica o Poder Executivo autorizado a...’ O objeto da autorização -  por já ser de competência constitucional do Executivo - não poderia ser ‘determinado’, mas é apenas ‘autorizado’ pelo Legislativo, tais ‘leis’, óbvio, são sempre de iniciativa parlamentar, pois jamais teria cabimento o Executivo se autorizar a si próprio, muito menos onde já o autoriza a própria Constituição. Elas constituem um vício patente” (Sérgio Resende de Barros. “Leis Autorizativas”, in Revista da Instituição Toledo de Ensino, Bauru, ago/nov 2000, p. 262).

                   A lei que autoriza o Poder Executivo a agir em matérias de sua iniciativa privativa implica, em verdade, uma determinação, sendo inconstitucional. Assim vem julgando este egrégio Tribunal, afirmando a inconstitucionalidade das leis autorizativas, forte no entendimento de que essas “autorizações” são mero eufemismo de “determinações” e, por isso, usurpam a competência material do Poder Executivo:

“LEIS AUTORIZATIVAS – INCONSTITUCIONALIDADE - Se uma lei fixa o que é próprio da Constituição fixar, pretendendo determinar ou autorizar um Poder constituído no âmbito de sua competência constitucional, essa lei e inconstitucional. — não só inócua ou rebarbativa, — porque estatui o que só o Constituinte pode estatuir O poder de autorizar implica o de não autorizar, sendo, ambos, frente e verso da mesma competência - As leis autorizativas são inconstitucionais por vicio formal de iniciativa, por usurparem a competência material do Poder Executivo e por ferirem o princípio constitucional da separação de poderes.

VÍCIO DE INICIATIVA QUE NÃO MAIS PODE SER CONSIDERADO SANADO PELA SANÇÃO DO PREFEITO - Cancelamento da Súmula 5, do Colendo Supremo Tribunal Federal.

LEI MUNICIPAL QUE, DEMAIS IMPÕE INDEVIDO AUMENTO DE DESPESA PÚBLICA SEM A INDICAÇÃO DOS RECURSOS DISPONÍVEIS, PRÓPRIOS PARA ATENDER AOS NOVOS ENCARGOS (CE, ART 25). COMPROMETENDO A ATUAÇÃO DO EXECUTIVO NA EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO - ARTIGO 176, INCISO I, DA REFERIDA CONSTITUIÇÃO, QUE VEDA O INÍCIO DE PROGRAMAS. PROJETOS E ATIVIDADES NÃO INCLUÍDOS NA LEI ORÇAMENTÁRIA ANUAL (TJSP, ADI 142.519-0/5-00, Rel. Des. Mohamed Amaro, 15-08-2007).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALÍDADE - LEI N° 2.057/09, DO MUNICÍPIO DE LOUVEIRA - AUTORIZA O PODER EXECUTIVO A COMUNICAR O CONTRIBUINTE DEVEDOR DAS CONTAS VENCIDAS E NÃO PAGAS DE ÁGUA, IPTU, ALVARÁ A ISS, NO PRAZO MÁXIMO DE 60 DIAS APÓS O VENCIMENTO – INCONSTITUCIONALÍDADE FORMAL E MATERIAL - VÍCIO DE INICIATIVA E VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - INVASÃO DE COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO - AÇÃO PROCEDENTE.

A lei inquinada originou-se de projeto de autoria de vereador e procura criar, a pretexto de ser meramente autorizativa, obrigações e deveres para a Administração Municipal, o que redunda em vício de iniciativa e usurpação de competência do Poder Executivo. Ademais, a Administração Pública não necessita de autorização para desempenhar funções das quais já está imbuída por força de mandamentos constitucionais” (TJSP, ADI 994.09.223993-1, Rel. Des. Artur Marques, v.u., 19-05-2010).

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal n° 2.531, de 25 de novembro de 2009, do Município de Andradina, 'autorizando' o Poder Executivo Municipal a conceder a todos os alunos das escolas municipais auxílio pecuniário para aquisição de material escolar, através de vale-educação no comércio local. Lei de iniciativa da edilidade, mas que versa sobre matéria reservada à iniciativa do Chefe do Executivo. Violação aos arts. 5º, 25 e 144 da Constituição do Estado. Não obstante com caráter apenas 'autorizativo', lei da espécie usurpa a competência material do Chefe do Executivo. Ação procedente” (TJSP, ADI 994.09.229479-7, Rel. Des. José Santana, v.u., 14-07-2010).

                   A argumentação da natureza autorizativa da norma e da inércia na execução da lei não elide a conclusão de sua inconstitucionalidade, como já decidido:

“5. Não é tolerável, com efeito, que, como está prestes a ocorrer neste caso, o Governador do Estado, à mercê das veleidades legislativas, permaneça durante tempo imprevisível com uma lei inconstitucional a tiracolo, ou, o que o seria ainda pior, seja compelido a transmiti-la a seu sucessor, com as consequências de ordem política daí derivadas” (STF, ADI-MC 2.367-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 05-04-2001, v.u., DJ 05-03-2004, p. 13).

            A Administração Pública está vinculada positivamente ao princípio da legalidade (art. 37, Constituição Federal; art. 111, Constituição Estadual) e, atendendo-se à consideração (essencial) do cancelamento da Súmula 05 do Supremo Tribunal Federal, afigura-se impossível ao Chefe do Poder Executivo (vetando ou não a lei de iniciativa parlamentar que disciplina a matéria) cumpri-la (ou seja, atender à autorização nela contida), pois, a inconstitucionalidade a tisna desde seu nascedouro, e a dimensão do princípio da legalidade (rectius: juridicidade) requer a conformidade dos atos da Administração com o ordenamento jurídico inteiro – inclusive as normas constitucionais.

III – Pedido

                   Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré.

                   Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Sumaré, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 19 de junho de 2017.

 

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 35.625/17

Interessada: Prefeitura Municipal de Sumaré

Objeto: representação para o controle de constitucionalidade da Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré

 

 

 

 

1.    Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade da Lei n. 5.405, de 05 de julho de 2012, do Município de Sumaré, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, instruída com o protocolado em epígrafe referido.

2.    Oficie-se à interessada e à douta Promotoria de Justiça de Sumaré, informando-lhes a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

                   São Paulo, 19 de junho de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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