EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado nº 34.259/2017
Ementa: Ação direta de
inconstitucionalidade. Inconstitucionalidade: a) das expressões “Diretor
Presidente”, “Diretor Adjunto”, “Coordenador Administrativo” e “Procurador
Jurídico” constantes do caput e do § 1º do art. 5º e do § 6º deste mesmo
art. 5º, da Lei nº 2.026/73, com a redação dada pela Lei nº 4.257/97; b) do §
2ºdo art. 3º da Lei nº 4.257/97; c) dos Anexos I e II da Lei nº 4.257/97, com
as posteriores alterações, especialmente as determinadas pelas Leis nº
5.153/02, 6.906/09 e 7.722/14, todas de Marília.
1) É inconstitucional a criação de cargos
e empregos cujas atribuições não estejam descritas em lei. Inadmissível a descrição
de atribuições em Estatuto ou Regimento Interno. Princípio da reserva legal
absoluta.
2) É inconstitucional a criação de
cargos e empregos em comissão que não retratam atribuições de assessoramento,
chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e
profissionais. Desnecessidade de especial vínculo de confiança e lealdade com
as diretrizes políticas da autoridade superior a ensejar a possibilidade de
criação de cargos e empregos públicos de provimento em comissão.
3) Violação aos artigos 24, § 2º,
1, 111, 115, incisos II e V, e 144, da Constituição Paulista.
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da
atribuição prevista no art. 116, inc. VI, da Lei Complementar Estadual nº 734,
de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º,
e no art. 129, inc. IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74, inc.
VI, e no art. 90, inc. III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo
nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 172.608/16, que segue
anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face: a) das expressões “Diretor
Presidente”, “Diretor Adjunto”, “Coordenador Administrativo” e “Procurador
Jurídico” constantes do caput e do §
1º do art. 5º e do § 6º deste mesmo art. 5º, da Lei nº 2.026/73, com a redação
dada pela Lei nº 4.257/97; b) do § 2º do art. 3º da Lei nº 4.257/97; c) dos
Anexos I e II da Lei nº 4.257/97, com as posteriores alterações, especialmente
as determinadas pelas Leis nº 5.153/02, 6.906/09 e 7.722/14, todas de Marília, pelos
fundamentos expostos a seguir:
I - ATOS NORMATIVOS
IMPUGNADOS
A Lei n° 2.026, de 13 de setembro de 1.973,
do Município de Marília autorizou a constituição de uma sociedade de economia
mista por ações denominada Companhia
de Desenvolvimento Econômico de Marília – CODEMAR.
O seu
art. 5º, § 5º, dispôs expressamente que os seus estatutos fixariam as funções
dos Diretores da companhia.
Ao longo
dos anos e após o advento da Constituição de 1.988, a Lei nº 2.026/73 foi
objeto de diversas alterações, dentre as quais se destacam aquelas que versam sobre
os cargos e empregos, inclusive os em comissão, que são objeto da presente ação
direta de inconstitucionalidade, conforme será melhor exposto a seguir.
Em primeiro lugar, tem-se a Lei nº 4.257, de 07 de fevereiro de
1.997 deu nova redação ao art. 5º, §§ 1º e 6º, da Lei nº 2.026/73, que
passaram a dispor:
“Art. 5º. A Companhia de
Desenvolvimento Econômico de Marília será administrada por uma Diretoria
Executiva composta por um Diretor
Presidente e um Diretor Adjunto,
com funções executivas auxiliada por um Coordenador
Administrativo e um Procurador
Jurídico e assessorada por um Conselho de Administração como órgão de
deliberação colegiada.
§ 1º. O Diretor Presidente e o Diretor
Adjunto, serão escolhidos pelo Conselho de Administração, na forma
estabelecida pela legislação específica, e contratados pelo regime da
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e o Coordenador e Procurador
Jurídico serão contratados ela Diretoria Executiva, ‘ad Referendum’ do
Conselho de Administração e exercerão cargos comissionados regidos pelo regime
da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
(...)
§ 6º. Os
estatutos fixarão as funções e as competências, observada a Legislação vigente
e específica, do Conselho de Administração, do Conselho Fiscal, dos Diretores e
Auxiliares”. (g.n.)
Além disso, em seu art. 3º, a referida Lei
nº 4.257/97 cuidou da instituição dos empregos, ao dispor:
“Art. 3º. Fica instituído na Companhia de
Desenvolvimento Econômico de Marília – CODEMAR, o organograma com a
quantidade de empregos e suas respectivas denominações, constantes dos Anexos I
e II, bem como as funções
gratificadas constantes do Anexo IIII, que ficam fazendo parte integrante desta
Lei.
§ 1º. Os
empregos constantes do Anexo I, deverão ser preenchidos através de prévia
habilitação em concurso público de provas e serão contratados diretamente pela
Diretoria Executiva, ‘Ad Referendum’ do Conselho de administração, observado o
princípio da isonomia.
§ 2º. Os empregos de provimento em comissão para
funções de confiança, serão contratados diretamente pela Diretoria Executiva,
‘Ad Referendum’ do Conselho de Administração.
(...)”. (g.n.)
E o Anexo I, que versa sobre o quadro
de empregos, dispôs:
NÚMERO DE FUNÇÕES |
DENOMINAÇÃO |
02 |
Almoxarife |
03 |
Auxiliar de Contabilidade |
05 |
Corretor |
07 |
Auxiliar de Escritório |
03 |
Auxiliar do Setor de
Pessoal |
02 |
Mecânico I |
01 |
Caixa |
03 |
Cobrador |
01 |
Contador |
03 |
Escriturário |
01 |
Mestre de Obras |
10 |
Supervisor Geral |
02 |
Engenheiro |
03 |
Faxineiro |
04 |
Fiscal de Plataforma |
01 |
Funileiro |
01 |
Lavador |
04 |
Mecânico II |
21 |
Motorista I |
02 |
Motorista II |
15 |
Operador de Máquinas I |
15 |
Operador de Máquinas II |
50 |
Trabalhador Braçal |
05 |
Pedreiro |
03 |
Servente de Obras |
01 |
Soldador |
01 |
Operador de Usina de
Asfalto |
07 |
Vigia |
Já o Anexo II, sobre empregos de provimento em comissão, estabelecia, na sua
redação original:
DENOMINAÇÃO |
VAGAS |
SÍMBOLO |
REQUISITOS PARA PROVIMENTO |
Coordenador de Obras |
01 |
C – 2 |
Engenheiro Civil |
Administrador do Terminal Rodoviário Municipal |
01 |
C-2 |
|
Encarregado do Setor de Compras e Licitação |
01 |
C-3 |
|
Encarregado do Setor de Segurança no Trabalho |
01 |
C-5 |
Técnico em Segurança no Trabalho |
Agenciador |
10 |
C-5 +comissão |
|
Após a Lei nº 4.556, de 1º de dezembro de 1998, dispôs:
“Art. 1º.
Fica extinto o emprego denominado ‘ADMINISTRADOR DO TERMINAL RODOVIÁRIO
MUNICIPAL’, Símbolo C-2, constante do Anexo II – Empregos de Provimento em
Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997.
Art. 2º. Ficam criados no Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, os seguintes empregos:
DENOMINAÇÃO |
VAGAS |
SÍMBOLO |
REQUISITO
PARA PROVIMENTO |
Assistente
Técnico |
02 |
C
– 3 |
-o- |
Após, a Lei
nº 5.153, de 25 de março de 2002 alterou o Anexo II – Empregos de
Provimento em Comissão, ao prever:
“Art. 1º. Ficam criados no Anexo II
– Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de
1997, modificada posteriormente, os seguintes empregos:
DENOMINAÇÃO |
VAGAS |
SÍMBOLO |
REQUISITOS
PARA PROVIMENTO |
Encarregado
do Setor de Medicina do Trabalho |
01 |
C
– 3 |
Médico
em Medicina do Trabalho, em nível de pós- graduação |
Encarregado
do Setor de Engenharia de Segurança do Trabalho |
01 |
C
– 3 |
Engenheiro
ou Arquiteto, com especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho, em
nível de graduação |
Técnico
Encarregado do Setor de Segurança do Trabalho (Obras) |
01 |
C-
5 |
Portador
de Registro Profissional expedido pelo Ministério do Trabalho |
Na continuidade, a Lei nº 5.379, de 26 de dezembro de 2002, estabeleceu:
“Art. 1º. Ficam criados no Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, os seguintes empregos:
DENOMINAÇÃO |
VAGAS |
SÍMBOLO |
REQUISITO
PARA PROVIMENTO |
Assistente
Técnico da Fazenda |
02 |
C
– 3 |
-o- |
Na
continuidade, a Lei nº 6.906, de 10
de março de 2009, trouxe as seguintes disposições de relevo para o caso
em tela:
“Art. 1º. O emprego de Assistente Técnico de Fazenda, Símbolo
C-3, constante do Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº
4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente, passa a
denominar-se Assistente Técnico, permanecendo inalterado o respectivo Símbolo.
Art. 2º. Ficam extintos do Anexo II – Empregos de Provimento
em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada
posteriormente, 6 (seis) empregos de Agenciador, Símbolo C-5.
Art. 3º. Ficam acrescentados no Anexo II – Empregos de
Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada
posteriormente, 2 (dois) empregos de Assistente Técnico-Símbolo C-3.
Art. 4º. O Símbolo do emprego de Coordenador de Obras,
constante do Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de
07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente, passa a ser o C-1ª.
Art. 5º. Ficam criadas no Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente,, os seguintes empregos:
DENOMINAÇÃO |
VAGAS |
SÍMBOLO
|
REQUISITOS
PARA PROVIMENTO |
Coordenador
de Pavimentação |
01 |
C
– 2 |
Ensino
médio |
Coordenador
Geral de Serviços |
03 |
C
– 2 |
Ensino
fundamental incompleto |
Assessor
do Diretor Presidente |
01 |
C
– 2 |
Ensino
médio |
Coordenador
de Compras e Licitações |
01 |
C
– 2 |
Ensino
fundamental |
Assistente
Técnico II |
01 |
C
- 4 |
Ensino
médio |
A
Lei nº 7.052, de 31 de dezembro de
2009, estabeleceu:
“Art. 1º. Ficam extintos do Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente, especialmente pelas Leis ns. 4556, de 01 de dezembro de 1998, 5153, de 25 de março de 2002, 5379, de 26 de dezembro de 2002 e 6906, de 10 de março de 2009, os seguintes cargos:
a) 1(um)
emprego de Coordenador de Obras, Símbolo C-1A.
b) 6(seis)
empregos de Assistente Técnico, Símbolo C-3.
c) 1(um)
emprego de Encarregado do Setor de Compras e Licitação, Símbolo C-3.
d) 1(um)
emprego de Assistente Técnico II, Símbolo C-4.
e) 3(três)
empregos de Agenciador, Símbolo C-5.
f) 1(um)
emprego de Encarregado do Setor de Segurança no Trabalho, Símbolo C-5.
g) 1(um)
emprego de Técnico Encarregado do Setor de Segurança do Trabalho (Obras),
Símbolo C-5.
Art. 2º. Em decorrência do contido no Processo nº 1107/2009, da 2ª Vara do Trabalho de Marília, 01 emprego de provimento em comissão de Agenciador, símbolo C-5, será extinto na vacância”.
Posteriormente, a Lei
nº 7.722, de 12 de dezembro de 2014, trouxe novas modificações:
“Art. 1º. Fica extinto 1 (um) emprego de Coordenador Geral de
Serviços, Símbolo C-2, constante do Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão,
da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente.
Art. 2º. Fica criado no Anexo II – Empregos de Provimento em Comissão, da Lei nº 4257, de 07 de fevereiro de 1997, modificada posteriormente., 1 (um) emprego de Coordenador de Engenharia e Obras Civis, Símbolo C-2, com o requisito para provimento ‘curso de engenharia’”.
O Estatuto Social da Companhia de
Desenvolvimento Econômico de Marília – Decreto nº 7.339, de 11 de março de 1997,
estabeleceu as competências do Diretor Presidente e do Diretor Adjunto.
O Regimento Interno da Companhia de
Desenvolvimento Econômico de Marília – CODEMAR trouxe a descrição das
atribuições de outros órgãos e empregos (fls.48/107 do expediente anexo).
II - O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
Os dispositivos legais impugnados são
incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Paulista, in verbis:
“(...)
Art. 5º. São Poderes do Estado,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º. É vedado a qualquer dos
Poderes delegar atribuições.
(...)
Art. 111 – A administração pública
direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade,
finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 115 – Para a organização da
administração pública direta ou indireta, inclusive as fundações instituídas ou
mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das
seguintes normas:
(...)
II - a investidura em cargo ou
emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou
de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado
em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V - as funções de confiança,
exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos
em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos,
condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às
atribuições de direção, chefia e assessoramento;
(...)
Art. 144- Os Municípios, com
autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto
organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)”.
III - DOS CARGOS E EMPREGOS PÚBLICOS DA COMPANHIA DE
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DE MARÍLIA
Todos os cargos e empregos impugnados – efetivos e em
comissão – são inconstitucionais, porque as respectivas atribuições não estão
definidas em lei. Em alguns casos, as respectivas atribuições constam do
Estatuto e do Regimento Interno da CODEMAR e, em outros casos, não há qualquer
especificação das atribuições.
Com relação aos cargos e empregos de preenchimento em
comissão de “Coordenador Administrativo”, “Procurador Jurídico”, “Coordenador
de Pavimentação”, “Coordenador Geral de Serviços”, “Coordenador de Compras e
Licitações”, “Encarregado do Setor de Medicina do Trabalho” e “Encarregado do
Setor de Engenharia de Segurança do Trabalho”, a sua inconstitucionalidade
também decorre do fato de que o exame de suas respectivas atribuições descritas
no Regimento Interno da sociedade de economia mista evidencia que não
compreendem funções de chefia, direção ou assessoramento, mas sim funções
técnicas, burocráticas, profissionais e ordinárias. Em síntese, tais cargos
jamais poderiam ser comissionados.
III - A - AUSÊNCIA DE
DESCRIÇÃO EM LEI DAS ATRIBUIÇÕES DE TODOS OS CARGOS E EMPREGOS PÚBLICOS
Nenhum dos cargos
e empregos públicos permanentes e em comissão contemplados pelo caput do art. 5º da Lei nº 2.026/73, com
a redação dada pela Lei nº 4.257/97, assim como pelos Anexos I e II da Lei nº
4.257/97, com todas as posteriores modificações, possuem descrição das respectivas atribuições em lei.
Aliás, o § 6 do art. 5º da Lei nº
2.026/73, com a redação dada pela Lei nº 4.257/97, estabeleceu que: “Os estatutos fixarão as funções e as
competências, observada a Legislação vigente e específica, do Conselho de
Administração, do Conselho Fiscal, dos Diretores e Auxiliares”.
Porém, o princípio da
legalidade impõe lei em sentido formal para disciplina das atribuições de
qualquer função pública lato sensu
(cargo ou emprego públicos).
Embora distintos seus
regimes jurídicos, cargo e emprego significam o lugar e o conjunto de
atribuições e responsabilidades determinadas na estrutura organizacional, com
denominação própria, criado por lei, sujeito à remuneração e à subordinação
hierárquica, provido por uma pessoa, na forma da lei, para o exercício de uma
específica função permanente conferida a um servidor.
Ponto elementar relacionado
à criação de cargos ou empregos públicos é a necessidade de a lei específica –
no sentido de reserva legal ou de lei em sentido formal, ou, ainda, de
princípio da legalidade absoluta ou restrita, como ato normativo produzido no
Poder Legislativo mediante o competente e respectivo processo - descrever as
correlatas atribuições.
A criação do cargo público
impõe a fixação de suas atribuições porque todo cargo pressupõe função
previamente definida em lei (Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito
Administrativo, São Paulo: Atlas, 2006, p. 507; Odete Medauar. Direito
Administrativo Moderno, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 287; Marçal
Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p.
581).
Neste sentido, para a
criação de cargos ou empregos públicos, é imprescindível lei específica que descreva
as correlatas atribuições, consoante expõe lúcida doutrina:
“(...) somente a lei pode criar
esse conjunto inter-relacionado de competências, direitos e deveres que é o
cargo público. Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X, da Constituição,
que comporta uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse dispositivo
permite ao Chefe do Executivo promover a extinção de cargo público, por meio de
ato administrativo. A criação e a disciplina do cargo público faz-se
necessariamente por lei no sentido de que a lei deverá contemplar a disciplina
essencial e indispensável. Isso significa estabelecer o núcleo das
competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e
das condições do exercício das atividades. Portanto, não basta uma lei
estabelecer, de modo simplista, que ‘fica criado o cargo de servidor público’.
Exige-se que a lei promova a discriminação das competências e a inserção dessa
posição jurídica no âmbito da organização administrativa, determinando as
regras que dão identidade e diferenciam a referida posição jurídica” (Marçal
Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2005, p.
581).
Somente a partir da
descrição precisa das atribuições do cargo público será possível, a bem do
funcionamento administrativo e dos direitos dos administrados, averiguar-se a
completa licitude do exercício de suas funções pelo agente público.
Trata-se de exigência
relativa à competência do agente público para a prática de atos em nome da
Administração Pública e, em especial, aqueles que tangenciam os direitos dos
administrados, e que se espraia à aferição da legitimidade da forma de
investidura no cargo público que deve ser guiada pela legalidade, moralidade,
pela impessoalidade e pela razoabilidade.
Nem se alegue, por oportuno,
que ao Chefe do Poder Executivo remanesceria competência para descrição das
atribuições dos empregos públicos, sob pena de convalidar a invasão de matéria
sujeita exclusivamente à reserva legal.
A possibilidade de
regulamento autônomo para disciplina da organização administrativa não
significa a outorga de competência para o Chefe do Poder Executivo fixar
atribuições de cargo público e dispor sobre seus requisitos de habilitação e
forma de provimento.
Com maior razão a exigência
de reserva legal em se tratando de cargos ou empregos de provimento em
comissão, uma vez que serve para mensuração da perfeita subsunção da hipótese
normativa concreta ao comando constitucional excepcional que restringe o
comissionamento às funções de assessoramento, chefia e direção. Portanto,
somente se a lei possuir atribuições nela descritas desse jaez será legítima e
não abusiva nem artificial sua criação e sua forma de provimento.
Quanto aos cargos de
provimento efetivo, a exigência da reserva legal descritiva de suas atribuições
também é impositiva na medida em que contribui para o bom funcionamento
administrativo e o respeito aos direitos dos administrados ao delimitar as
competências de cada cargo na organização municipal.
Sobre o tema, esse Colendo
Órgão Especial já se pronunciou. Confira-se:
“Ação direta de
inconstitucionalidade – LCM N. 113/07do Município de Peruíbe que alterando o
quadro geral dos servidores municipais de que trata o art. 210 da Lei n°
1.330/90 e suas modificações posteriores criou os cargos de provimento em
comissão de assessor de setor, chefe de setor, assessor de serviço, chefe de
serviço, assessor de comunicação, coordenador geral, diretor de divisão,
diretor de trânsito, assessor de departamento, diretor musical, diretor de
departamento e procurador geral, constantes de seu anexo II, sem, todavia, lhes
descrever as atribuições. Violação do princípio da reserva legal.” (ADIN Rel.
Des. Alves Bevilacqua, j. 22.08.2012)
Inconstitucionais, por conseguinte, as expressões “Diretor Presidente”, “Diretor Adjunto”, “Coordenador Administrativo” e “Procurador Jurídico” constantes do caput do art. 5º da Lei nº 2.026/73, com a redação dada pela Lei nº 4.257/97, assim como os Anexos I e II da Lei nº 4.257/97, com as posteriores modificações, especialmente as determinadas pelas Leis nºs 5.153/02, 6.906/09 e 7.722/14, todas de Marília.
III – B – CARGOS E EMPREGOS
PÚBLICOS EM COMISSÃO QUE NÃO EXPRESSAM FUNÇÕES DE CHEFIA, DIREÇÃO E
ASSESSORAMENTO
O art.
5º da Lei nº 2.026/73, com a redação dada pela Lei nº 4.257/97, criou quatro
cargos comissionados, quais sejam: 1) Diretor Presidente; 2) Diretor Adjunto;
3) Coordenador Administrativo; 4) Procurador Jurídico, deixando para os
estatutos a fixação de suas funções e competências.
Por seu turno, o Anexo II da Lei nº 4.257/97 trouxe os
empregos de provimento em comissão da CODEMAR. O citado Anexo II sofreu
posteriores alterações, especialmente pelas Leis nº 5.153/02, 6.906/09 e
7.722/14.
Hoje,
tal Anexo II compreende os seguintes empregos de provimento em comissão: 1)
Coordenador de Pavimentação; 2) Coordenador Geral de Serviços; 3) Coordenador
de Engenharia e Obras Civis; 4) Coordenador de Compras e Licitações; 5)
Encarregado do Setor de Medicina do Trabalho; 6) Encarregado do Setor de
Engenharia de Segurança do Trabalho; 7) Assessor do Diretor Presidente.
As
funções do Diretor Presidente e do Diretor Adjunto estão descritas no Estatuto da
CODEMAR.
Já o
Regimento Interno contempla as funções do Diretor Presidente e do Diretor
Adjunto, assim como as funções da Procuradoria-Jurídica, da Coordenadoria de
Obras, do Setor de Compras e Licitação e dos Setores de Engenharia de
Segurança, Medicina e Segurança do Trabalho, bem como do Encarregado do Setor
de Engenharia de Segurança do Trabalho e do Encarregado do Setor de Medicina do
Trabalho.
Examinando-se
as atribuições conferidas pelo Estatuto e pelo Regimento Interno, é possível
afirmar que os cargos comissionados de “Coordenador Administrativo” e “Procurador
Jurídico”, bem como os empregos comissionados de “Coordenador de Pavimentação”,
“Coordenador Geral de Serviços”, “Coordenador de Compras e Licitações”, “Encarregado
do Setor de Medicina do Trabalho” e “Encarregado do Setor de Engenharia de
Segurança do Trabalho” apresentam natureza meramente técnica, burocrática,
operacional e profissional, que exigem somente o dever comum de lealdade às
instituições públicas necessárias a todo e qualquer servidor.
Anote-se
que o Regimento Interno estabelece no que pertine ao
caso em tela:
“Art. 8º. Compete a Coordenadoria Administrativa:
I – Auxiliar a Diretoria Executiva nos assuntos relacionados com a administração da Companhia;
II – Planejar, organizar, comandar, controlar e coordenar os serviços administrativos da Companhia;
III – Aplicar, fazer aplicar, orientar e fiscalizar a execução dos atos e regulamentos referentes a pessoal da Companhia e estabelecer normas destinadas a uniformizar a aplicação da legislação relativa a pessoal;
IV – Organizar a estrutura administrativa da Companhia, fixado em regime interno;
V – Autorizar a prestação de serviços extraordinários de conformidade com as necessidades;
VI – Desenvolver outras atividades correlatas.
(...)
Art. 9º. A Procuradoria Jurídica compete:
I – Auxiliar a Diretoria Executiva nos assuntos jurídicos da Companhia;
II – Defender Judicial e Extrajudicialmente os direitos e interesses da Companhia;
III – Elaborar pareceres sobre consultas formuladas pela Diretoria e demais unidades, relativas a assuntos de natureza Jurídica Administrativa e Fiscal;
IV – Promover cobrança judicial de créditos da Companhia, que não sejam liquidados nos prazos legais e regulamentares;
V – Desenvolver outras atividades correlatas que lhe forem determinadas pela Diretoria Executiva da Companhia.
(...)
Art. 13º. Compete ao Setor de Compras e Licitação:
a) COMPRAS
I – Efetuar as compras de materiais e equipamentos de acordo com o pedido formulado e a devida autorização superior;
II – Promover uma pesquisa de mercado, para que a aquisição seja a mais apropriada e que atenda aos interesses da empresa, com referência as necessidades, qualidade e preços;
III – Fornecer autorização para entrega dos materiais e serviços de conformidade com a compra e a contratação dos mesmos;
IV – Encaminhar para a unidade
responsável, os pedidos de valores superiores ao limite de isenção, para o procedimento licitatório de acordo
com a legislação em vigor;
V – Acompanhar todo o processo licitatório em todas as
aquisições e contratações que a empresa realizar;
VI – Fornecer mensalmente relatório das atividades do setor
de compras;
VII – Executar outras atividades correlatas.
b) LICITAÇÃO
I – Executar o processo licitatório de conformidade com a
legislação em vigor;
II – Promover as publicações, registros e controles dos
processos licitatórios arquivando-os em ordem cronológica para qualquer
verificação futura;
III – Executar preenchimento, emissão remessa e recebimento
de documentos pertinentes ao processo licitatório;
IV – Proceder as aberturas de licitações, promovendo a
lavratura de atas correspondentes;
V – Executar outras atividades correlatas.
(...)
Art. 16º. Setor de Engenharia de Segurança, Medicina e
Segurança do Trabalho:
a) SETOR DE ENGENHARIA DO TRABALHO
I – Exercer a direção, a chefia e a coordenação geral dos
trabalhos da unidade de serviços que lhe está subordinado;
II – Orientar e assessorar as diversas unidades da empresa em
assuntos relacionados à segurança e medicina do trabalho;
III – Inspecionar áreas e equipamentos da empresa quanto à
segurança no trabalho;
IV – Inspecionar a implantação, funcionamento e observância
das normas e utilização de equipamentos de segurança;
V – Promover medidas profiláticas como campanhas de
vacinação, campanha da voa visão, campanha antitabagismo e outras;
VI – Enviar relatórios periódicos às diversas unidades da
empresa, comunicando a existência de riscos, ocorrência de acidentes e medidas
necessárias para a prevenção de acidentes no trabalho;
VII – Promover a investigação e a análise das causas dos
acidentes e propor medidas corretivas e preventivas;
VIII – Acompanhar, organizar e orientar as ações da CIPA –
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes;
IX – Fazer a supervisão e orientação junto a empresas contratadas
e subcontratadas (empreiteiras) com relação à observância de procedimentos e
normas de segurança do trabalho.
b) SETOR DE MEDICINA DO TRABALHO
I – Aplicar os conhecimentos de Medicina do Trabalho ao
ambiente da empresa e a todos os seus componentes de modo a preservar a saúde e
a integridade do trabalhador;
II – Coordenador o PCMSO – Programa de Controle Médico de
Saúde Ocupacional de acordo com a Norma Regulamentadora nº 7;
III – Executar os exames de saúde: admissional, periódico, de
retorno ao trabalho, de mudança de função e demissionais,
comunicando à empresa as anomalias constatadas;
IV – Determinar providências quando constatadas agravos à
saúde do trabalhador;
V – Analisar e registrar em documentos específicos todos os
acidentes de trabalho e todos os casos de doença ocupacional ocorridos na
empresa, descrevendo os fatores e características dos agentes;
VI – Fazer relatório periódico com os dados pertinentes aos
acidentes de trabalho, doenças ocupacionais e agentes insalubres;
VII – Atender aos trabalhadores no ambulatório quando por
estes solicitados;
VIII – Colaborar com as atividades da CIPA;
IX – Executar outras atividades correlatas.
c) SEGURANÇA DO TRABALHO (Obras)
I – Aplicar os conhecimentos Técnicos de Segurança do
Trabalho ao ambiente de trabalho e todos os seus componentes de modo a
eliminar, neutralizar ou atenuar os riscos ali existentes à saúde e à
integridade dos trabalhadores;
II – Colaborar tecnicamente nos projetos de implantação de
novas instalações físicas e tecnológicas;
III – Manter estreito relacionamento com os membros da CIPA,
atendendo, orientando e treinando para suas atividades;
IV – Esclarecer e conscientizar os trabalhadores sobre os
acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, estimulando-os em favor da
prevenção;
V – Promover e inspecionar o uso correto dos Equipamentos de
Proteção Individual;
VI – Registrar em documento específico todos os acidentes e
todos os casos de doença ocupacional ocorridos na empresa, descrevendo seu
histórico e suas características;
VII – Emitir relatórios periódicos sobre as atividades do
SESMT;
VIII – Executar outras atividades correlatas.
(...)
B – OBRAS E SERVIÇOS
1) SETOR DE ENGENHARIA, TOPOGRAFIA E
CONSTRUÇÃO CIVIL
Art. 18º. Compete ao Setor de Engenharia, Topografia e
Construção Civil:
a) ENGENHARIA
I – Exercer atividades de orientação, pesquisas referentes a
projetos e execução de trabalhos de sua especialidade, supervisão de obras e
geral, peritagens e arbitramentos;
II – Acompanhar a execução das obras contratadas,
pavimentação asfáltica, guias e sarjetas e dar orientações nas construções,
manutenção e reparos das mencionadas obras, assegurando os padrões técnicos
exigidos;
III – Efetuar medições ou avaliações de obras, bem como
calcular os itens necessários ao processo de pagamento;
IV – Executar outras atividades correlatas.
b) TOPOGRAFIA
I – Executar levantamentos topográficos em geral de locações,
nivelamentos de precisão de cálculos, desenhos e croquis, inclusive cópias,
ampliações e reduções decorrentes desses trabalhos;
III – Zelar pela conservação e manutenção dos equipamentos e
aparelhos utilizados no trabalho;
IV – Executar outras tarefas correlatas.
c) CONSTRUÇÃO CIVIL
I – Conduzir toda a execução na área ad construção civil e
outras obras;
II – Interpretar desenhos e especificações técnicas, a fim de
determinar a execução das tarefas de construção civil, orientando a equipe e
objetivando a realização dos serviços de forma precisa e efetiva;
III – Distribuir as tarefas individuais e coletivas,
supervisionando na execução das mesmas, para garantir a qualidade e o bom
andamento dos serviços;
IV – Requisitar materiais, conferindo as quantidades e
qualidades dos mesmos, a fim de garantir a execução correta das tarefas,
conforme projetos e especificações técnicas;
V – Executar outras tarefas correlatas.
(...)
3) SETOR DE PAVIMENTAÇÃO, TERRAPLANAGEM, GALERAIS, GUIAS E
SARJETAS, CAPA ASFÁLTICA E TAPA BURACO
Artigo 18º - Compete ao Setor de Pavimentação, Terraplanagem,
Galerias, Guias e Sarjetas, Capa Asfáltica e Tapa Buraco:
a) PAVIMENTAÇÃO
I – Executar os serviços de pavimentação nas ruas onde forem
autorizadas pelo setor competente;
II – Promover a execução dos serviços dentro das
especificações técnicas exigidas;
III – Comunicar ao setor competente o término dos serviços
executados;
IV – Executar outras atividades correlatas.
b) TERRAPLANAGEM
I – Preparar as vias públicas e locais determinadas para
aplicação dos serviços de pavimentação;
II – Comunicar ao setor competente o término dos serviços
executados;
III – Executar outras atividades correlatas.
c) GALERIAS
I – Executar a construção de canais, galerias pluviais,
dissipador, alas de contenção e drenos;
II – Fazer executar todos os serviços de acordo com as
especificações técnicas;
III – Atender de imediato as solicitações dos setores
competentes;
IV – Executar outras atividades correlatas.
d) GUIAS E SARJETAS
I – Executar os serviços de construção e instalação de guias
e sarjetas nos locais determinados pelo setor competente;
II – Fazer executar todos os serviços de conformidade com
especificações técnicas estabelecidas;
III – Executar outras atividades correlatas.
e) CAPA ASFÁLTICA
I – Executar o serviço de pavimentação nos locais
determinados pelo setor competente;
II – Fazer executar todos os serviços de conformidade com
especificações técnicas;
III – Executar outras atividades correlatas.
f) TAPA-BURACO
I – Executar os serviços de tapa-buraco nos locais
determinados pelo setor competente;
II – Fazer executar todos os serviços de conformidade com
especificações técnicas;
III – Executar outras atividades correlata”.
Examinando-se as atribuições dos setores acima referidos,
infere-se que não há, evidentemente, nenhum componente nos postos acima
transcritos a exigir o controle de execução das diretrizes políticas do dirigente
a serem desempenhados por quem detenha absoluta fidelidade a orientações
traçadas, sendo, por isso, ofensivos aos princípios da moralidade e da
impessoalidade (art. 111, Constituição Estadual), que orientam os incisos II e
V, do art. 115, da Constituição Estadual.
Nesse sentido, é inconstitucional a criação de cargos ou
empregos públicos de provimento em comissão cujas atribuições sejam de natureza
burocrática, ordinária, técnica, operacional e profissional, que não revelam
plexos de assessoramento, chefia e direção, e que devem ser desempenhadas por
servidores efetivos mediante aprovação em concurso público.
A jurisprudência proclama a inconstitucionalidade de leis que
criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas,
burocráticas ou profissionais, ao exigir que elas demonstrem, de forma efetiva,
que eles tenham funções de assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI
3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u.,
DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª
Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux,
11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão
Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008).
A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o
preenchimento dos postos através de concurso público de provas ou de provas e
títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no
art. 37, I, da Constituição Federal; bem como no art. 115, I, da Constituição
do Estado de São Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos e
empregos de natureza técnica ou burocrática.
Há, com efeito, implícitos limites à sua criação, porquanto,
se assim não fosse, estaria aniquilada na prática a exigência constitucional de
concurso para acesso ao serviço público.
A propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em
precedente do E. Supremo Tribunal Federal, que “a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes
com as praxes do nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser
encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional do concurso
(STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito
administrativo brasileiro, 33. Ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).
Prelecionando na vigência da ordem constitucional anterior,
mas em magistério plenamente aplicável ao caso em exame, anotava Márcio Cammarosano a existência de limites à criação de postos
comissionados pelo legislador. A Constituição objetiva, com a permissão para
tal criação, “propiciar ao Chefe de
Governo o seu real controle mediante o concurso, para o exercício de certas
funções, de pessoas de sua absoluta confiança, afinadas com as diretrizes
políticas que devem pautar a atividade governamental. Não é, portanto, qualquer
plexo unitário de competências que reclama seja confiado o seu exercício a esta
ou aquela pessoa, a dedo escolhida, merecedora da absoluta confiança da
autoridade superior, mas apenas aquelas que, dada a natureza das atribuições a
serem exercidas pelos seus titulares, justificam exigir-se deles não apenas o
dever elementar de lealdade às instituições constitucionais e administrativas a
que servirem, comum a todos os funcionários, como também um comprometimento
político, uma fidelidade às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos,
uma lealdade pessoal à autoridade superior (...). Admite-se que a lei declare
de livre provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria
superior, mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre
provimento e exoneração cargos como os de auxiliar administrativo, fiscal de
obras, enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador, e outros mais,
de cujos titulares nada mais se pode exigir senão o escorreito exercício de
suas atribuições, em caráter estritamente profissional, técnico, livres de
quaisquer preocupações e considerações de outra natureza” (Provimento de cargos públicos no direito
brasileiro, São Paulo, RT, 1984, p. 95/96).
Cumpre observar que os cargos e empregos públicos mencionados
não refletem a imprescindibilidade do elemento fiduciário em concurso às
atribuições de assessoramento, chefia e direção em nível superior.
Como bem pontificado em venerando acórdão desse Egrégio
Tribunal, verbis:
“A criação de tais cargos [em
comissão] é exceção a esta regra geral e tem por finalidade propiciar ao
governante o controle de execução de suas diretrizes políticas, sendo exigido
de seus ocupantes absoluta fidelidade às orientações traçadas.
Em sendo assim, deve ser limitada
aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante
e o servidor.
(...)
Tratando-se de postos comuns – de
atribuição de natureza técnica e profissional -, em que não se exige de quem
vier a ocupá-los o estabelecimento de vínculo de confiança ou fidelidade com a
autoridade nomeante, deveriam ser assumidos, em caráter definitivo, por
servidores regularmente aprovados em concurso público de provas ou de provas e
títulos, em conformidade com a regra prevista no citado inciso II” (TJSP, ADI
173.260-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Armando Toledo, v.u., 22-07-2009).
Em suma, os cargos e empregos públicos criados pelos
dispositivos legais ora contestados consubstanciam funções técnicas,
burocráticas, operacionais e profissionais, e, por isso, devem ser preenchidos
por servidores públicos investidos em cargo de provimento efetivo, recrutados
após prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos.
IV – PEDIDO
Ante o exposto, aguarda-se o
recebimento e processamento da presente ação direta, a fim de que seja, ao
final, julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade: a) das
expressões “Diretor Presidente”, “Diretor Adjunto”, “Coordenador
Administrativo” e “Procurador Jurídico” constantes do caput e do § 1º do art. 5º e do § 6º deste mesmo art. 5º, da Lei nº
2.026/73, com a redação dada pela Lei nº 4.257/97; b) do § 2º do art. 3º da Lei
nº 4.257/97; c) dos Anexos I e II da Lei nº 4.257/97, com as posteriores
alterações, especialmente as determinadas pelas Leis nº 5.153/02, 6.906/09 e
7.722/14, todas de Marília.
Requer-se, ainda, que sejam requisitadas informações à
Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Marília, bem como posteriormente
citado o Procurador-Geral do Estado, para manifestar-se sobre os atos
normativos impugnados.
Posteriormente, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se
deferimento.
São Paulo, 09 de junho de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
pss
Protocolado nº 34.259/17
Interessado: Promotoria
de Justiça de Marília
Assunto: análise de constitucionalidade da Lei nº 2.026, de 13 de setembro de 1973, do Município de Marília.
1.
Distribua-se a inicial da ação direta de
inconstitucionalidade, em face: a) das expressões “Diretor Presidente”,
“Diretor Adjunto”, “Coordenador Administrativo” e “Procurador Jurídico” constantes
do caput e do § 1º do art. 5º e do §
6º deste mesmo art. 5º, da Lei nº 2.026/73, com a redação dada pela Lei nº
4.257/97; b) do § 2º do art. 3º da Lei nº 4.257/97; c) dos Anexos I e II da Lei
nº 4.257/97, com as posteriores alterações, especialmente as determinadas pelas
Leis nº 5.153/02, 6.906/09 e 7.722/14, todas de Marília, instruída com o
protocolado em epígrafe referido.
2. Oficie-se
ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição
inicial.
São Paulo, 09 de junho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
pss