Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado nº 7.275/2017

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Expressão “ou de comoção interna” do inciso I e incisos II, III, V e VI do art. 2º, da expressão “ressalvado o disposto no §2º deste artigo”, inserta no caput, do art. 3º e dos §§1º e 2º, do art. 3º, da Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, na redação dada pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, do Município de Herculândia. Servidores Públicos. Contratação por tempo determinado para atendimento de necessária temporária de excepcional interesse público. Hipóteses: (a) comoção interna; (b) campanhas de saúde pública; c) implantação de serviço urgente e inadiável; d) execução de serviços absolutamente transitórios e de necessidade esporádica; e) execução direta de obra determinada (Lei nº 2.180/1990, art. 2º). Inexistência de atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público. Duração. Prazo excessivo para contratação de obra pública certa (Lei nº 2.180/1990, com a redação dada pela Lei nº 2.560/2000, caput do art. 3º, e seu §2º). Recontratação dos contratados temporários, após exíguo prazo, a contar do desligamento. Burla à regra do concurso público e ofensa aos princípios de razoabilidade, moralidade e impessoalidade (Lei nº 2.180/1990, com a redação dada pela Lei nº 2.560/2000, §1º do art. 3º).

1. Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, que arrola no art. 2º como hipóteses de contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público a) comoção interna (parte final do inciso I), b) campanhas de saúde pública (inciso II), c) implantação de serviço urgente e inadiável (inciso III), d) execução de serviços absolutamente transitórios e de necessidade esporádica (inciso V), e e) execução direta de obra determinada (inciso VI).

2. Incompatibilidade com o art. 115, X, CE/89, por não haver demonstração de efetiva excepcionalidade determinada e específica.  

3. Duração excessiva das contratações para trabalhar em obra pública certa (expressão “ressalvado o disposto no §2º deste artigo”, prevista no caput do art. 3º e §2º, do art. 3º, Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, com a redação dada pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000), que não se conforma com a transitoriedade reclamada (art. 115, X, CE/89).

4. Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, que altera o §1º do art. 3º, do Município de Herculândia, possibilitando a recontratação dos contratados temporários, após decorrido o prazo mínimo de três meses e um dia, a contar da data do desligamento do contratado, discrepa dos princípios de razoabilidade, moralidade e impessoalidade e da regra do concurso público (arts. 111 e 115, II, CE/89).

 

 

                  O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício de suas atribuições (artigo 116, VI, da Lei Complementar Estadual nº 734/93; artigos 125, §2º, e 129, IV, da Constituição Federal; artigos 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo), com amparo nas informações colhidas no incluso Protocolado n. 169.825/16, vem perante esse egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da expressão “ou de comoção interna” do inciso I e dos incisos II, III, V e VI do art. 2º, da expressão “ressalvado o disposto no §2º deste artigo” do caput, do art. 3º e dos §§1º e 2º do art. 3º, da Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, na redação dada pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, do Município de Herculândia, pelos fundamentos a seguir expostos:

 

I - OS preceitoS normativoS impugnadoS

                  

A Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, de Herculândia foi editada para disciplinar as contratações por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público.

De particular interesse para esta ação os seguintes preceitos dessa lei (fl. 05):

“(...)

Lei nº 2.180/1990

Art. 2º - As contratações nos termos desta Lei somente poderão ocorrer em casos de:

I – Calamidade pública ou de comoção interna;

II – Campanhas de saúde pública;

III – Implantação de serviço urgente e inadiável;

(...)

V – Execução de serviços absolutamente transitórios e de necessidade esporádica;

VI – Execução direta de obra determinada;

(...)

Art. 3º - A contratação será feita independentemente da existência de cargo, emprego ou função, mediante processo seletivo simplificado se houver tempo, observando-se prazo determinado e compatível com cada pontuação, de no máximo seis meses, ressalvado o disposto no §2º deste artigo.

§1º - Ficam vedados a prorrogação de contratados e a contratação da mesma pessoa ainda que para serviços diferentes.

§2º - O prazo dos contratos de pessoa para trabalhar em obra pública certa será fixado de acordo com a duração desta, mas não superior a 24 meses;

(...)”

         Posteriormente, a Lei 2.180, de 29 de agosto de 1990, sofreu alteração pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, do Município de Herculândia, com a seguinte descrição (fl. 04):

“(...)

Lei nº 2.560/2000

Art. 1º - O caput do art. 3º e o seu §1º da Lei 2.180, de 29 de agosto de 1990, mantido o parágrafo 2º, passam a vigorar com as seguintes redações:

“Art. 3º - A contratação será feita independentemente da existência de cargo, emprego ou função, observando-se prazo determinado e compatível com cada situação, de no máximo doze meses, ressalvado o disposto no §2º deste artigo”.

§1º - Será permitida a recontratação de qualquer pessoa, após decorrido o prazo mínimo de 03 (três) meses e 01 (um) dia, a contar da data de seu desligamento anterior.

Art. 2º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

(...)”

 

II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE

                   A Constituição Federal assegura aos Municípios autonomia, mas, determina-lhes respeito aos princípios da própria Constituição Federal e da Constituição Estadual (art. 29). A Constituição do Estado de São Paulo em atenção ao art. 29 da Constituição da República assim dispõe:

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

                   Destarte, as Constituições Federal e Estadual preordenam o exercício da autonomia municipal.

                   Os preceitos legais acima destacados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal, porque são incompatíveis com o disposto nos arts. 111 e 115, II e X, da Constituição do Estado de São Paulo que assim preceituam:

“(...)

Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

..................................................................................

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

..................................................................................

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

..................................................................................

X - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

                                      (...)”

 

1. As hipóteses de contratação temporária de pessoal

                  A expressão “ou de comoção interna” do inciso I e os incisos II, III, V e VI do art. 2º da Lei n. 2.180/1990, arrolam hipóteses de contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público, que contrariam o inciso X do art. 115 da Constituição Federal.

                   Comoção interna, campanhas de saúde pública, implantação de serviço urgente e inadiável, execução de serviços absolutamente transitórios e de necessidade esporádica e execução direta de obra determinada, não têm ontologicamente os requisitos de transitoriedade, imprevisibilidade e excepcionalidade e constituem expressões amplas, genéricas e indeterminadas que não demonstram efetiva excepcionalidade determinada e específica, como exige o parâmetro constitucional.

                   A contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público se destina ao suprimento de necessidade administrativa em face de “circunstâncias que compelem a Administração Pública a adotar medidas de caráter emergencial para atender a necessidades urgentes e temporárias e que desobrigam, por permissivo constitucional, o administrador público de realizar um concurso público para a contratação temporária” (STF, ADI 3.649-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014), sendo, portanto, exigível, para além de outros requisitos, que a contratação tenha como meta o atendimento de necessidade temporária e que esta se qualifique por excepcional interesse público.

                   A contratação por tempo determinado na ocorrência de comoção interna é expressão ampla, ambígua, genérica, imprecisa, indeterminada, vaga, que não é indicativa a priori de situação transitória, imprevisível, extraordinária, urgente, e excepcional se não for agregada à insuficiência de recursos humanos no quadro de pessoal da entidade ou do órgão da Administração Pública ou a circunstâncias especiais que demonstrem a necessidade da medida.

                   A amplitude, a indeterminação, e a vagueza permitem aninhar em seu pressuposto qualquer comoção intestina sem indicação de seu caráter transitório e extraordinário e da impossibilidade de sua consecução pelo emprego dos recursos humanos ordinários dos quadros da Administração. Tem-se que é “inconstitucional a lei que, de forma vaga, admite a contratação temporária para as atividades de educação pública, saúde pública, sistema penitenciário e assistência à infância e à adolescência, sem que haja demonstração da necessidade temporária subjacente” (STF, ADI 3.649-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014).

         Nas demais situações descritas nos incisos II, III, V e VI do art. 2º da Lei nº 2.180/1990 também não se verificam os requisitos acima destacados.

Com efeito, campanhas de saúde pública (inciso II do art. 2º), como as de vacinação em prol de grupos vulneráveis (sarampo, gripe etc.) são episódicas, porém não são excepcionais, incomuns ou extraordinárias.

         A implantação de serviços urgentes e inadiáveis (inciso III do art. 2º) e a execução de serviços absolutamente transitórios e de necessidade esporádica (incisos V do art. 2º) desacompanhada de elemento de excepcionalidade, isto é, sem demonstração da insuficiência de meios ordinários da Administração, deturpa os requisitos excepcionais da contratação temporária.

A execução direta de obra determinada (incisos VI do art. 2º) é absolutamente normal, corriqueiro, previsível e ordinário no exercício das funções administrativas, assim como a necessidade de trabalhadores braçais que, ademais, é função de postos permanentes de qualquer esfera da Administração – notadamente nos Municípios – o que patenteia, no particular, tentativa de burla ao provimento de cargos ou empregos permanentes por concurso público. Não há na norma ligação com eventual insuficiência de recursos humanos no quadro de pessoal da entidade ou do órgão da Administração Pública nem com parâmetros de urgência, transitoriedade ou excepcionalidade.

         Regra constitucional é a admissão de pessoal nos órgãos e entidades da Administração Pública mediante prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como estampa o art. 115, II, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 37, II, da Constituição Federal. Ressalvada a investidura em cargos de provimento em comissão, a admissão de pessoal é sempre orientada por essa regra.

                   A Constituição Estadual no art. 115, X, reproduz o quanto disposto no art. 37, IX, da Constituição da República, possibilitando limitada, residual e excepcionalmente a admissão de pessoal por tempo determinado em razão de necessidade administrativa transitória de excepcional interesse público. Não é qualquer interesse público que autoriza a contratação temporária – que constitui outra exceção à regra do concurso público – somente aquele que veicula uma necessidade urgente do aparelho administrativo na prestação de seus serviços, devendo, ademais, concorrer a excepcionalidade desse interesse público, a temporariedade da contratação e a submissão à previsão legal, notadamente pela imprevisibilidade e extraordinariedade da situação e a impossibilidade de a Administração Pública acorrê-lo com meios próprios e ordinários de seu quadro de recursos humanos.

                   A admissão de pessoal a termo, portanto, deve objetivar situações anormais, urgentes, incomuns e extraordinárias que molestem as necessidades administrativas, não se admitindo dissimulação na investidura em cargos ou empregos públicos à margem do concurso público e para além das ressalvas constitucionais, pois, segundo José dos Santos Carvalho Filho há três elementos que configuram pressupostos na contratação temporária: a determinabilidade temporal, a temporariedade da função e a excepcionalidade do interesse público (Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 9. ed., pp. 478-479).

                   A lei específica não poderá utilizar de cláusulas amplas, genéricas e indeterminadas. Deve empregar conceitos que consubstanciem aquilo que seja possível conceber na excepcionalidade. Neste sentido, já foi decidido:

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. C.F., art. 37, IX. Lei 9.198/90 e Lei 10.827/94, do Estado do Paraná. (...) III. - A lei referida no inciso IX do art. 37, C.F., deverá estabelecer os casos de contratação temporária. No caso, as leis impugnadas instituem hipóteses abrangentes e genéricas de contratação temporária, não especificando a contingência fática que evidenciaria a situação de emergência, atribuindo ao chefe do Poder interessado na contratação estabelecer os casos de contratação: inconstitucionalidade. IV. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (RTJ 192/884).

“CONSTITUCIONAL. LEI ESTADUAL CAPIXABA QUE DISCIPLINOU A CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDORES PÚBLICOS DA ÁREA DE SAÚDE. POSSÍVEL EXCEÇÃO PREVISTA NO INCISO IX DO ART. 37 DA LEI MAIOR. INCONSTITUCIONALIDADE. ADI JULGADA PROCEDENTE. (...) III - O serviço público de saúde é essencial, jamais pode-se caracterizar como temporário, razão pela qual não assiste razão à Administração estadual capixaba ao contratar temporariamente servidores para exercer tais funções. IV - Prazo de contratação prorrogado por nova lei complementar: inconstitucionalidade. V - É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de não permitir contratação temporária de servidores para a execução de serviços meramente burocráticos. Ausência de relevância e interesse social nesses casos. VI - Ação que se julga procedente” (STF, ADI 3.430-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12-08-2009, v.u., DJe 23-10-2009).

“É inconstitucional a lei que, de forma vaga, admite a contratação temporária para as atividades de educação pública, saúde pública, sistema penitenciário e assistência à infância e à adolescência, sem que haja demonstração da necessidade temporária subjacente” (STF, ADI 3.469-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 28-05-2014, m.v., DJe 30-10-2014).

“O artigo 37, IX, da Constituição exige complementação normativa criteriosa quanto aos casos de ‘necessidade temporária de excepcional interesse público’ que ensejam contratações sem concurso. Embora recrutamentos dessa espécie sejam admissíveis, em tese, mesmo para atividades permanentes da Administração, fica o legislador sujeito ao ônus de especificar, em cada caso, os traços de emergencialidade que justificam a medida atípica” (STF, ADI 3.721-CE, Rel. Min. Teori Zavascki, 09-06-2016, m.v., DJe 15-08-2016).

                   A admissibilidade da contratação por tempo determinado visa ao “suprimento de pessoal perante contingências que desgarrem da normalidade das situações e presumam admissões apenas provisórias, demandadas em situações incomuns, cujo atendimento reclama satisfação imediata e temporária (incompatível, portanto, com o regime normal de concursos) (...) situações nas quais ou a própria atividade a ser desempenhada, requerida por razões muitíssimo importantes, é temporária, eventual (não se justificando a criação de cargo ou emprego, pelo quê não haveria cogitar do concurso público), ou a atividade não é temporária, mas o excepcional interesse público demanda que se faça imediato suprimento temporário de uma necessidade (neste sentido, ‘necessidade temporária’), por não haver tempo hábil para realizar concurso, sem que suas delongas deixem insuprido o interesse incomum que se tem de acobertar” (Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Malheiros, 2009, 20. ed., pp. 281-282).

                   Em outras palavras, “empregando o termo excepcional para caracterizar o interesse público do Estado, a Constituição deixou claro que situações administrativas comuns não podem ensejar o chamamento desses servidores” (José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 9. ed., pp. 478-479).

                   Em síntese, como deliberou o Supremo Tribunal Federal:

“3. À luz do conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição da República e da jurisprudência firmada por esta Suprema Corte em sede de Repercussão Geral (RE 658.026, Relator Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, DJe 31.10.2014), a contratação temporária reclama os seguintes requisitos para sua validade: (i) os casos excepcionais devem estar previstos em lei; (ii) o prazo de contratação precisa ser predeterminado; (iii) a necessidade deve ser temporária; (iv) o interesse público deve ser excepcional; (iv) a necessidade de contratação há de ser indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração, mormente na ausência de uma necessidade temporária” (STF, ADI 5.163-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux. 08-04-2015, v.u., DJe 18-05-2015).

Inclusive esse egrégio Tribunal de Justiça assim se pronunciou:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Presidente Prudente. Lei Complementar nº 192, de 13.11.11 que dispõe sobre contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Natureza dos serviços a prestar. Expressão 'comoção interna ou emergência' contida no inciso I do art. 2º e incisos II a VIII do mesmo artigo. Previsão abrangente e genérica e sem caracterizar a excepcionalidade exigida. Inadmissível quando não se apresentam imprevisíveis ou extraordinários. Inconstitucionalidade (art. 111 e art. 115, II e X, CE). Prazo de prorrogação. Art. 5º. Razoabilidade do prazo estabelecido – 12 meses, prorrogáveis por mais 12 meses, no total de 24 meses. Próximo do admitido em precedente do STF. Procedente, em parte, a ação”. (TJ/SP, ADI nº 2144952-82.2016.8.26.0000, Des. Rel. Evaristo dos Santos, julgada em 08 de fevereiro de 2017) g.n

“Ação direta de inconstitucionalidade. Incisos III e VII do art. 2º, e do artigo 3º e §1º (redação dada pelas Leis 2.279/14 e 2.245/13), ambos da Lei 1.027, de 10 de março de 1995, do Município de São Sebastião. Contratação temporária para 'campanhas de saúde pública' e 'de menores aprendizes'. Inconstitucionalidade. Inexistência de situação de necessidade temporária de excepcional interesse público. Inconstitucionalidade, ainda, da autorização para contratação por lapso temporal superior a 12 (doze) meses. Ação procedente, com efeitos a partir de 120 dias da data do julgamento”. (TJ/SP, ADI nº 2128333-14.2015.8.26.0000, Des. Rel. Borelli Thomaz, jugada em 09 de dezembro de 2015) g.n

 

2. Duração excessiva dos contratos de execução de obra pública certa

                   Apesar do caput do art. 3º da Lei nº 2.180/1990, na redação dada pela Lei nº 2.560/2000, dispor que o prazo para as hipóteses de contratação temporária para atender à necessidade de excepcional interesse público é de no máximo doze meses, o próprio dispositivo excepcionou a hipótese do §2º do citado art. 3º.

                   Com efeito, para a contratação de servidores para trabalhar em obra pública certa o prazo será fixado de acordo com a duração desta, mas não superior a 24 meses, o que se afigura excessivo à vista da própria situação descrita na norma.

                   É nítido que essa hipótese não pode ter larga duração no tempo por carecer completamente a excepcionalidade e a transitoriedade. O §2º, do art. 3º é excessivo e não se conforma com a transitoriedade elementar à contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público e, portanto, contrasta com o inciso X do art. 115 da Constituição do Estado de São Paulo.

                   Com efeito, “para que se efetue a contratação temporária, é necessário que não apenas seja estipulado o prazo de contratação em lei, mas, principalmente, que o serviço a ser prestado revista-se do caráter da temporariedade” (STF, ADI 3.430-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12-08-2009, v.u., DJe 23-10-2009).

Além disso, colidem com o princípio de razoabilidade constante do art. 111 da Constituição Estadual por conterem medida inadequada, desnecessária e desproporcional.

 

3. Recontratação dos contratados temporários desligados

 

                   Antes da alteração da Lei nº 2.180/1990 pela Lei nº 2.560/2000, do Município de Herculândia, não havia possibilidade de prorrogação de contratados e a contratação da mesma pessoa, ainda que para serviços diferentes (antiga redação do §1º, do art. 3º da Lei nº 2.180/1990).

                   Ocorre que com o advento da Lei nº 2.560/1990 do Município de Herculândia, houve alteração da redação do §1º do art. 3º da Lei nº 2.180/1990, o que possibilitou a recontratação de qualquer pessoa, após decorrido o prazo mínimo de três meses e um dia, a contar da data do desligamento do contratado.

Constata-se que a recontratação da pessoa desligada após o diminuto prazo de três meses e um dia contraria os princípios de razoabilidade, moralidade e impessoalidade e da regra do concurso público, inscritos nos arts. 111 e 115, II, da Constituição do Estado de São Paulo.

A permissão da recontratação de pessoas recrutadas para serviços de prazo determinado vencido diminuto interstício, possibilitando que em após três meses e um dia sejam contratados novamente sem critério objetivo e razoável algum, baseados na escolha amplamente discricionária dos dirigentes e gestores públicos, abrindo oportunidades a toda sorte de mazelas como o apadrinhamento, o filhotismo, o amiguismo etc. em detrimento da ética que deve presidir os negócios públicos, e por fim, facilita a permanência – ainda que descontínua – de pessoas no exercício de função pública investidas à margem do sistema de mérito albergado na regra do provimento de cargos ou empregos públicos permanentes mediante aprovação em concurso público.

Trata-se de medida que não apresenta adequação, necessidade e proporcionalidade ao interesse público, sendo salutar exatamente o contrário – a instituição de interstício de maior dimensão para evitar recontratações. A norma contém excesso e contraria cânones como bom senso, lógica e racionalidade, o que a torna incompatível com o princípio de razoabilidade previsto no art. 111 da Constituição Paulista.

 

III – PEDIDO

                   Face ao exposto, requer-se o recebimento e processamento da presente ação, para que ao final seja julgada procedente, declarando a inconstitucionalidade da expressão “ou de comoção interna” do inciso I e dos incisos II, III, V e VI do art. 2º, da expressão “ressalvado o disposto no §2º deste artigo” do caput, do art. 3º e dos §§1º e 2º do art. 3º, da Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, na redação dada pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, do Município de Herculândia.

                   Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e à Prefeitura Municipal de Herculândia, bem como, em seguida, citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado, e, posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

         Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 19 de junho de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

wpmj/mi

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado nº 7.257/2017

Interessada: Doutor Rodrigo de Moraes Garcia - 2º Promotor de Justiça de Tupã

Objeto: representação para controle de constitucionalidade de leis do Município de Herculândia

 

        

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade impugnando a expressão “ou de comoção interna” do inciso I e dos incisos II, III, V e VI do art. 2º, da expressão “ressalvado o disposto no §2º deste artigo” do caput, do art. 3º e dos §§1º e 2º do art. 3º, da Lei nº 2.180, de 29 de agosto de 1990, na redação dada pela Lei nº 2.560, de 06 de dezembro de 2000, do Município de Herculândia, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

                   São Paulo, 19 de junho de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

wpmj/mi