Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 44.694/17

 

 

 

 

 

 

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação Direta Inconstitucionalidade. Art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017. Art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e as expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º,§ 2º e 3º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí. Advocacia Pública. Subordinação ao Secretário e à Secretaria de Assuntos Jurídicos. Atribuições típicas da Advocacia Pública ao Secretário e à Secretaria de Assuntos Jurídicos. Violação aos arts. 98 a 100 da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade das expressões “Assessor Especial”, “diretor estratégico”, “diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, do município de tatuí. 1. Não se compatibilizam com os arts. 98 a 100, da CE/89, o art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, o art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e as expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí, que subordinam a Advocacia Pública Municipal ao Secretário e à Secretaria de Negócios Jurídicos, e cometem funções próprias da Advocacia Pública a tais agente e órgão públicos. A Advocacia Pública Municipal é titular exclusiva da representação, consultoria e assessoramento do Poder Executivo, estando vinculada diretamente ao Chefe do Poder Executivo, não podendo ser supervisionada, controlada ou subordinada a outro órgão público nem dirigida por outra autoridade senão servidor de carreira investido em cargo de provimento em comissão de sua cúpula.

2. Cargos de provimento em comissão que não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção, senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo. Inexigibilidade de especial relação de confiança. Violação de dispositivos da Constituição Estadual (art. 115, I, II e V, e art. 144).

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, das expressões “Assessor Especial”, “Diretor Estratégico”, “Diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, ambos da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, bem como do art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e das expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí, pelos fundamentos a seguir expostos:

 

I – OS dispositivoS NormativoS ImpugnadoS

                   A Lei n. 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, do Município de Tatuí, “dispõe sobre a reorganização da estrutura administrativa da Prefeitura Municipal de Tatuí”.

                  De interesse para a presente ação os preceitos 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, as expressões “Assessor Especial”, “Diretor Estratégico”, “Diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, in verbis:

Art. 9º. São competências específicas dos Órgãos Estratégicos:

(...)

II - Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos:

a) patrocinar os interesses do município em juízo, na forma das leis processuais;

b) exercer a representação extrajudicial do município nos atos jurídicos em que deva intervir, mediante expressa delegação do Prefeito;

c) elaborar minutas de informações a serem prestadas ao Poder Judiciário, nos mandados de segurança em que o Prefeito, Secretários Municipais e dirigentes de unidades da Administração Direta sejam apontados como coatoras;

d) fiscalizar a legalidade dos atos dos órgãos da Administração Direta, propondo sua anulação quando for o caso ou as medidas judiciais cabíveis;

e) (...);

f) propor medidas jurídicas para a proteção do patrimônio municipal ou o aperfeiçoamento das práticas administrativas;

g) representar ao Prefeito, de ofício ou quando solicitado, sobre providências de ordem jurídica que lhe pareçam reclamadas pelo interesse público, para a boa aplicação das leis vigentes, bem assim sobre inconstitucionalidade de leis;

h) propor ao Prefeito, Secretários Municipais e autoridades de idêntico nível hierárquico as medidas que julgar necessárias à uniformização da legislação e da jurisprudência administrativa, na Administração Direta;

i) coordenar e viabilizar apoio jurídico à execução das políticas, diretrizes e metas de governo;

j) coordenar todos os atos e procedimentos atinentes a convênios, sindicâncias e processos administrativos visando conservar os Princípios da Legalidade, Impessoalidade e Moralidade Pública;

..........................................................................................

ANEXO I

QUADRO DE CARGOS EM COMISSÃO  

DENOMINAÇÃO

QUANTIDADE

REF

ASSESSOR ESPECIAL

03

I–XVIII

CHEFE DE GABINETE

01

I-XIX

DIRETOR ESTRATÉGICO

12

I-XI

DIRETOR EXECUTIVO

13

I-VIII

ASSESSOR DE GABINETE I

03

I-XII

ASSESSOR DE GABINETE II

08

I-II

ASSESSOR

17

I-V

COORDENADOR

10

I-IV

SUPERVISOR

60

I-III

APOIO ADMINISTRATIVO

10

I-II

 

ANEXO II

DESCRIÇÃO SUMÁRIA DAS ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS EM COMISSÃO  

CARGO

DESCRIÇÃO

CHEFE DE GABINETE

(...)

ASSESSOR ESPECIAL

Assessorar o Prefeito em assuntos de natureza política e técnica, bem como de operações dos serviços de administração direta municipal; assessorar o Prefeito nas atividades de organização e controle de políticas públicas; assessorar o Prefeito nos procedimentos orçamentários e jurídicos; assessorar o prefeito na aplicação das ações políticas do seu plano de governo; zelar pela guarda de informações fundamentais das quais tome conhecimento em decorrência do seu cargo. Executar outras tarefas correlatas.

ASSESSOR DE GABINETE I

(...)

DIRETOR

dirigir, coordenador e supervisionar os trabalhos específicos de cada área de atuação; planejar, programar e operacionalizar processos de trabalho de natureza política, responsabilizando-se por resultados, implementar as diretrizes e ações do Plano de Governo em cada área específica de atuação, de acordo com as determinações do Prefeito; tomar decisões sobre determinado programa político – ideológico inerente as ações de governo; fiscalizar o fiel cumprimento e perfeito desenvolvimento das ações políticas designadas e direcionadas; zelar pela guarda de informações fundamentais das quais tome conhecimento em decorrência do seu cargo. Executar outras tarefas correlatas.

ASSESSOR DE GABINETE II

assessorar o prefeito nas ações e metas para efetivação do Plano de Governo; auxiliar grupos de trabalho no planejamento de projetos visando a implementação das políticas públicas estabelecidas pelo prefeito e secretários; assessorar o prefeito nas áreas e funções no pleno sentido das necessidades da ação governamental; zelar pela guarda de informações fundamentais das quais tome conhecimento em razão do seu cargo. Executar atividades assemelhadas e afins.

ASSESSOR

(...)

COORDENADOR

(...)

SUPERVISOR

(...)

APOIO ADMINISTRATIVO

(...)

..............................................................................................

 

                   Por sua vez, os arts. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV, 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, possuem a seguinte: 

Art. 1º Compete à Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos de Tatuí:

I - patrocinar os interesses do município em juízo, na forma das leis processuais;

II - exercer a representação extrajudicial do município nos atos jurídicos em que deva intervir, mediante expressa delegação da Prefeita;

III - elaborar minutas de informações a serem prestadas ao Poder Judiciário, nos mandados de segurança em que a Prefeita, Secretários Municipais e dirigentes de unidades da Administração Direta sejam apontados como coatoras;

IV - fiscalizar a legalidade dos atos dos órgãos da Administração Direta, propondo sua revogação e/ou anulação quando for o caso ou as medidas judiciais cabíveis;

(...)

VI - propor medidas jurídicas para a proteção do patrimônio municipal ou o aperfeiçoamento das práticas administrativas;

VII - manter atualizada a legislação municipal, propondo ao Prefeito a sua revisão e consolidação;

VIII - promover os procedimentos administrativos e judiciais de desapropriação;

IX - representar a Prefeita, de ofício ou quando solicitado, sobre providências de ordem jurídica que lhe pareçam reclamadas pelo interesse público, para a boa aplicação das leis vigentes, bem assim sobre a inconstitucionalidade de leis;

X - propor a Prefeita, Secretários Municipais e Diretores as medidas que julgar necessárias à uniformização da legislação e da jurisprudência administrativa na Administração Direta;

XI - elaborar, redigir e publicar atos normativos primários e secundários;

(...)

XIV - determinar a abertura de Sindicâncias e Processos Administrativos Disciplinares;

 

Art. 2º A Secretaria de Negócios Jurídicos de Tatuí fica organizada com a seguinte estrutura, vinculada diretamente ao Secretário:

(...)

III - Departamento de Assuntos Jurídicos:

a) Divisão de Projetos, Leis e Atos Oficiais;

b) Advocacia;

c) Procuradoria;

d) Procon.

Art. 3º Compete ao Departamento de Assuntos Jurídicos:

(...)

§2º Através dos Advogados que compõem o quadro de servidores efetivos:

a) elaborar e revisar os contratos de locação, concessão e comodato;

b) emitir pareceres, quando solicitados, sobre matérias e processos administrativos, especialmente ligados a licitação, contratos e convênios;

c) atuar diretamente e promover a defesa dos interesses do Município, em juízo ou fora dele, nos processos de natureza cível, trabalhista, previdenciária, tributária e criminal;

d) atuar nos Procedimentos Administrativos Disciplinares (PAD), Sindicâncias e Processos Administrativos de Ressarcimento de Danos;

e) prestar assessoria jurídica às Secretarias e Departamentos da Administração Pública Direta,

Indireta, Autarquias e Fundações, quando designados;

f) acompanhar o andamento de processos em todas as suas fases, comparecendo às audiências, bem como praticar todos os atos necessários para garantir o seu bom andamento;

g) executar outras atividades correlatas que lhe forem atribuídas.

§3º Através dos Procuradores que compõem o quadro de servidores efetivos:

a) realizar a representação judicial da Municipalidade, ativa ou passivamente, nas Ações

Civis Públicas;

b) representar judicialmente o município nas ações de execução fiscal;

c) emitir pareceres em processos legislativos, quando solicitados;

d) acompanhar o andamento dos precatórios judiciais;

e) realizar a gestão dos processos administrativos instaurados para acompanhamento das questões relativas às ações de execução fiscal;

f) promover desapropriações de forma amigável ou judicial;

g) acompanhar o andamento de processos em todas as suas fases, comparecendo a audiências,

bem como praticar todos os atos necessários para garantir o seu bom andamento;

h) executar outras atividades correlatas que lhe forem atribuídas.

 (...)

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

                   Os dispositivos acima referidos do Município de Tatuí contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

                   Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força do art. 29 daquela e do art. 144 desta.

                   Os dispositivos normativos contestados são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

Artigo 98 - A Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público.

§ 1º - Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da Constituição Federal.

§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do “caput” deste artigo.

§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.

Artigo 99 - São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado:

I - representar judicial e extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial, exceto as universidades públicas estaduais;

II - exercer as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades autárquicas a que se refere o inciso anterior;

III - representar a Fazenda do Estado perante o Tribunal de Contas;

IV - exercer as funções de consultoria jurídica e de fiscalização da Junta Comercial do Estado;

V - prestar assessoramento jurídico e técnico-legislativo ao Governador do Estado;

VI - promover a inscrição, o controle e a cobrança da dívida ativa estadual;

VII - propor ação civil pública representando o Estado;

VIII - prestar assistência jurídica aos Municípios, na forma da lei;

IX - realizar procedimentos administrativos, inclusive disciplinares, não regulados por lei especial;

X - exercer outras funções que lhe forem conferidas por lei.

Artigo 100 - A direção superior da Procuradoria Geral do Estado compete ao Procurador-Geral do Estado, responsável pela orientação jurídica e administrativa da instituição, ao Conselho da Procuradoria Geral do Estado e à Corregedoria-Geral do Estado, na forma da respectiva Lei Orgânica.

Parágrafo único - O Procurador-Geral do Estado será nomeado pelo Governador, em comissão, entre os Procuradores que integram a carreira e terá tratamento, prerrogativas e representação de Secretário de Estado, devendo apresentar declaração pública de bens, no ato da posse e de sua exoneração.

............................................................................................

Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

............................................................................................

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

............................................................................................

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

............................................................................................

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

..............................................................................................

X - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;

............................................................................................

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

                   O art. 144 da Constituição Estadual limita e condiciona a autonomia municipal, determinando a observância dos princípios estabelecidos na Constituição Federal e na Constituição Estadual, não bastasse o caráter reprodutivo dos arts. 98 a 100, 111, e 115, II, V, e X, da Constituição Estadual, em relação aos arts. 37, caput, II, e IX e 61, § 1º, II, a, e 132, da Constituição Federal.

1 – Subordinação da Advocacia pública ao Secretário e à Secretaria de Negócios Jurídicos e conferência de atribuições típicas da Advocacia Pública à Secretaria de Negócios Jurídicos

                   O art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e o art. 3º, §1º e §2º, do Decreto Municipal nº. 17.729, de 03 de fevereiro de 2.017, situam órgãos da Advocacia Pública e da Procuradoria do Município na Secretaria de Negócios Jurídicos, sujeitando a Procuradoria, Procuradores e Advogados à subordinação hierárquica da Secretaria de Negócios Jurídicos e, portanto, ao seu titular – o Secretário de Assuntos Jurídicos.

                   Tais preceitos não se compatibilizam com o art. 98, caput, da Constituição Estadual, que subordina a Advocacia Pública diretamente ao Chefe do Poder Executivo, nem com o art. 100 da Constituição Estadual que indica como dirigente da instituição o Procurador-Geral, recrutado para investidura em cargo de provimento em comissão reservado aos membros da respectiva carreira, como decidido pela Suprema Corte brasileira em acórdão timbrando que:

“Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).

                   Por sua vez, o art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, bem como o art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí conferem à Secretaria de Negócios Jurídicos atribuições que são típicas e exclusivas da Advocacia Pública, discrepando do traçado contido na expressão “responsável pela advocacia do Estado” do caput do art. 98 da Constituição Estadual, e, notadamente, dos incisos I, II, V, VII do artigo 99 da Constituição Estadual que arrola as funções institucionais da Advocacia Pública de maneira privativa.

                   A Advocacia Pública Municipal é titular exclusiva da representação, consultoria e assessoramento do Poder Executivo, estando vinculada diretamente ao Chefe do Poder Executivo, não podendo ser supervisionada, controlada ou subordinada a outro órgão público nem dirigida por outra autoridade senão servidor de carreira investido em cargo de provimento em comissão de sua cúpula.

2 – Inconstitucionalidade das expressões “Assessor Especial”, “diretor estratégico”, “diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, do município de tatuí.

         As atribuições dos cargos em comissão de “assessor especial”, “diretor estratégico”, “diretor executivo”, e “assessor de gabinete II”,  anteriormente descritas, têm natureza meramente técnica, burocrática, operacional e profissional, conforme se observa pela descrição das funções destinadas aos ocupantes de tais cargos. Os cargos impugnados desempenham funções de natureza puramente profissional, técnica, burocrática ou operacional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior, exigindo-se tão somente o dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor.

         Dessa forma, os cargos comissionados anteriormente destacados são incompatíveis com a ordem constitucional vigente, em especial com os arts. 111, 115 incisos I, II e V, e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

         Essa incompatibilidade decorre da inadequação ao perfil e limites impostos pela Constituição quanto ao provimento no serviço público sem concurso.

         A regra, no âmbito de todos os Poderes Públicos, deve ser o preenchimento dos postos por meio de concurso público de provas ou de provas e títulos, pois assim se garante a acessibilidade geral (prevista inclusive no art. 37, I, da Constituição Federal; bem como no art. 115, I, da Constituição do Estado de São Paulo). Essa deve ser a forma de preenchimento dos cargos de natureza técnica ou burocrática.

         A criação de cargos de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor, para que adequadamente sejam desempenhadas funções inerentes à atividade predominantemente política.

         Há implícitos limites à sua criação, visto que assim não fosse, estaria na prática aniquilada a exigência constitucional de concurso para acesso ao serviço público.

         A propósito, anota Hely Lopes Meirelles, amparado em precedente do E. Supremo Tribunal Federal, que “a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes com as praxes do nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional do concurso (STF, Pleno, Repr.1.282-4-SP)” (Direito administrativo brasileiro, 33. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 440).

         Podem ser de livre nomeação e exoneração apenas aqueles cargos que, pela própria natureza das atividades desempenhadas, exijam excepcional relação de confiança e lealdade, isto é, verdadeiro comprometimento político e fidelidade com relação às diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos, que vão bem além do dever comum de lealdade às instituições públicas, necessárias a todo e qualquer servidor.

         É esse o fundamento da argumentação no sentido de que “os cargos em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, onde se necessita de um agente que sobre ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Por essas razões percebe-se quão necessária é essa fragilidade do liame. A autoridade nomeante não pode se desfazer desse poder de dispor dos titulares de tais cargos, sob pena de não poder contornar dificuldades que surgem quando o nomeado deixa de gozar de sua confiança” (cf. Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p. 208).

         Daí a afirmação de que “é inconstitucional a lei que criar cargo em comissão para o exercício de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior (cf. Adilson de Abreu Dallari, Regime constitucional dos servidores públicos, 2. ed., 2. tir., São Paulo, RT, 1992, p. 41, g.n.).

         São a natureza do cargo a ele cometidas pela lei que estabelecem o imprescindível “vínculo de confiança” (cf. Alexandre de Moraes, Direito constitucional administrativo, São Paulo, Atlas, 2002, p. 158), que justifica a dispensa do concurso. Daí o entendimento de que tais cargos devam ser destinados “apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento” (cf. Odete Medauar, Direito administrativo moderno, 5. ed., São Paulo, RT, p. 317). 

         Essa também é a posição do E. Supremo Tribunal Federal (ADI-MC 1141/GO, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, J. 10/10/1994, Pleno, DJ 04-11-1994, PP-29829, EMENT VOL-01765-01 PP-00169).

         Não é qualquer unidade de chefia, assessoramento ou direção que autoriza o provimento em comissão e o exercício da função de confiança. A atribuição do cargo deve reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível superior de condução das diretrizes políticas do governo.

         Pela análise da natureza e atribuições dos cargos impugnados, não se identificam os elementos que justificam o provimento em comissão.

         Assim sendo, tendo em vista que os cargos de provimento em comissão, antes referidos, destinam-se ao desempenho de atividades meramente burocráticas ou técnicas, que não exigem, para seu adequado desempenho, relação de especial confiança, alternativa não resta senão declará-los inconstitucionais.

III – PEDIDO LIMINAR  

                   À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura das normas municipais apontadas como violadoras de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se atuação desconforme o ordenamento jurídico e geradora de lesão irreparável ou de difícil reparação, especificamente no que se relaciona ao regular funcionamento da Advocacia Pública e aos cargos em comissão questionados na presente.

                   À luz desta contextura, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, das expressões “Assessor Especial”, “Diretor Estratégico”, “Diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, ambos da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, bem como do art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e das expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí.

IV – Pedido

         Face ao exposto, requerer-se o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, das expressões “Assessor Especial”, “Diretor Estratégico”, “Diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, ambos da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, bem como do art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e das expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí.                

 

         Requer-se ainda sejam requisitadas informações ao Presidente da Câmara Municipal de Tatuí, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

 

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 05 de julho de 2017.

 

 

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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Protocolado n. 44.694/14

Interessado: Doutor José Augusto de Barros Faro – Promotor de Justiça de Tatuí

Objeto: representação para controle de constitucionalidade da Lei n. 5.071, de 06 de janeiro de 2017 e do Decreto Municipal n. 17.729, de 03 de fevereiro de 2.017, do Município de Tatuí

 

 

 

 

1.    Promova-se a distribuição de ação direta de inconstitucionalidade, instruída com o protocolado em epígrafe mencionado, em face do art. 9º, inciso II, alíneas “a”, “b”, “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, e “i”, das expressões “Assessor Especial”, “Diretor Estratégico”, “Diretor Executivo” e “Assessor de Gabinete II”, previstas nos anexos I e II, ambos da Lei nº 5.071, de 06 de janeiro de 2.017, bem como do art. 1º, incisos I, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XI e XIV e das expressões “advocacia” e “procuradoria”, contida no art. 2º, inciso III, alíneas “b” e “c” e art. 3º, §1º e §2º, do Decreto nº 17.729, de 03 de fevereiro de 2017, do Município de Tatuí.

2.    Ciência ao interessado, remetendo-lhe cópia da petição inicial e deste despacho.

 

                            São Paulo, 05 de julho de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

blo/sh