EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado
nº 7.972/17
Ementa:
1) Ação direta de inconstitucionalidade.
Art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º
da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo.
2) A concessão de gratificação a
servidores públicos, tomando por base o tempo de serviço, critério motivador de
outras gratificações (adicional por tempo de serviço e sexta parte), viola os
princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, razoabilidade, interesse
público.
3) Norma que confere indiscriminado
aumento indireto e dissimulado da remuneração, estando alheada aos parâmetros
de razoabilidade, interesse público e necessidade do serviço que devem presidir
a concessão de vantagens pecuniárias aos servidores públicos.
4) Benefício que não atende à
legalidade, interesse público e às exigências do serviço. Violação
dos arts. 5º, 24, § 2º, 1, 111, 128 e 144 da Constituição Estadual.
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da
atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734
de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º,
e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda no art. 74,
inciso VI, e no art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo,
com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 7.972/2017,
que segue como anexo), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 48,
incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº
2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo, pelos fundamentos expostos a
seguir:
1.
DO ATOS NORMATIVOS
IMPUGNADOS
O protocolado que instrui
esta inicial de ação direta de inconstitucionalidade foi instaurado a partir de
representação da Promotora de Justiça da Comarca de São José do Rio Pardo,
pleiteando o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade em face dos
dispositivos que instituíram o prêmio por tempo de serviço, previsto no
estatuto dos servidores públicos desta municipalidade (fls. 02/11).
A Lei nº 2.712, de 16 de
março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo, que “Dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de São
José do Rio Pardo e dá outras providências”, no que interessa assim dispõe
(fls. 166/201):
“SUBSEÇÃO
II
Dos Prêmios
Do Prêmio por Tempo de
Serviço
Art. 48. Os
servidores públicos municipais receberão o Prêmio por Tempo de Serviço
Municipal, que será calculado sobre a remuneração, excetuando-se os benefícios
decorrentes de horas extras, gratificações, acúmulo de cargo, substituições,
prêmio por assiduidade e ajuda de custo, nos seguintes termos:
I – 10 anos:
2 (duas) vezes sua remuneração;
II – 15
anos: 3 (três) vezes sua remuneração;
III – 20
anos: 4 (quatro) vezes sua remuneração;
IV – 25
anos: 5 (cinco) vezes sua remuneração;
V – 30 anos:
6 (seis) vezes sua remuneração;
VI – 35
anos: 10 (dez) vezes sua remuneração;
VII – 40
anos: 15 (quinze) vezes sua remuneração.
§1º - O
prêmio instituído no “caput” será pago de uma só vez no prazo de 30 (trinta)
dias, a contar da data em que o servidor fizer jus a percepção, e não se
incorporará ao vencimento para nenhum efeito.
§2º - O
servidor terá direito aos prêmios se preencher os seguintes requisitos:
a)
Não
se afastar do serviço público municipal:
1.
Por
mais de 60 (sessenta) dias, para fazer jus ao prêmio previsto no inciso I deste
artigo;
2.
Por
mais de 30 (trinta) dias, a cada 5 (cinco) anos, para fazer jus aos prêmios
previstos nos incisos II, III, IV, V, VI e VII deste artigo;
b)
Não
ter sofrido suspensão ou quaisquer penalidades disciplinares, observando-se
nestes casos as decisões finais de sindicâncias, processos administrativos ou
decisões judiciais transitadas em julgado.
§3º - Para
efeito do que dispõe este artigo, não se consideram faltas abonadas e médica
para tratamento de saúde do próprio servidor, devidamente comprovada e sujeita
a inspeção médica a critério da autoridade competente.
§4º - O
servidor terá assegurado o direito, de acordo com sua necessidade, a 6 (seis)
faltas abonadas no exercício anual, sem prejuízo da sua remuneração.
(...)”
2. DO PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE
CONSTITUCIONALIDADE
Os dispositivos impugnados contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31, da Constituição Federal.
Os preceitos da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art. 144, que assim estabelece:
“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política,
legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica,
atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta
Constituição”.
As regras jurídicas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
(...)
Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias
cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do
Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos,
na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
(...)
§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a
iniciativa das leis que disponham sobre:
1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos
públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva
remuneração;
(...)
Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou
fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade,
motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Artigo 128 - As vantagens de qualquer natureza só poderão ser
instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às
exigências do serviço.
(...)”.
3. DA FUNDAMENTAÇÃO
Da inconstitucionalidade do Prêmio por
Tempo de Serviço
Inicialmente convêm
consignar que as vantagens pecuniárias são acréscimos permanentes ou
efêmeros ao vencimento dos servidores públicos, compreendendo adicionais e
gratificações.
Enquanto o adicional significa recompensa ao tempo de serviço (ex facto temporis) ou retribuição pelo desempenho de atribuições especiais ou condições inerentes ao cargo (ex facto officii), a gratificação constitui recompensa pelo desempenho de serviços comuns em condições anormais ou adversas (condições diferenciadas do desempenho da atividade – propter laborem) ou retribuição em face de condições pessoais ou situações onerosas do servidor (propter personam) [Hely Lopes Meirelles. “Direito Administrativo Brasileiro”, 26ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 449; Diógenes Gasparini. Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 2008, 13ª ed., p. 233; Marçal Justen Filho. “Curso de Direito Administrativo”, São Paulo: Saraiva, 2008, 3ª ed., p. 760].
A doutrina assinala que “o que caracteriza o adicional e o distingue da gratificação é o ser aquele uma recompensa ao tempo do serviço do servidor, ou uma retribuição pelo desempenho de funções especiais que refogem da rotina burocrática, e esta, uma compensação por serviços comuns executados em condições anormais para o servidor, ou uma ajuda pessoal em face de certas situações que agravam o orçamento do servidor” (Hely Lopes Meirelles. “Direito Administrativo Brasileiro”, 26ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 452), agrega-se a partir de uma distinção mais aprofundada que “a gratificação é uma vantagem relacionada a circunstâncias subjetivas do servidor, enquanto o adicional se vincula a circunstâncias objetivas. (...) dois servidores que desempenhem um mesmo cargo farão jus a adicionais idênticos. Já as gratificações serão a eles concedidas em vista das características individuais de cada um. No entanto, é evidente que tais gratificações se sujeitam ao princípio da isonomia, de modo a que dois servidores que apresentem idênticas circunstâncias objetivas farão jus a benefícios iguais” (Marçal Justen Filho. “Curso de Direito Administrativo”, 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 761).
Ou seja, os adicionais são compensatórios dos encargos decorrentes de funções especiais apartadas da atividade administrativa ordinária e as gratificações dos riscos ou ônus de serviços comuns realizados em condições extraordinárias. Com efeito, “se o adicional de função (ex facto officii) tem em mira a retribuição de uma função especial exercida em condições comuns, a gratificação de serviço (propter laborem) colima a retribuição do serviço comum prestado em condições especiais” (Wallace Paiva Martins Junior. “Remuneração dos Agentes Públicos”, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 85).
Ademais, oportuno admoestar que “as vantagens pecuniárias, sejam adicionais, sejam gratificações, não são meios para majorar a remuneração dos servidores, nem são meras liberalidades da Administração Pública. São acréscimos remuneratórios que se justificam nos fatos e situações de interesse da Administração Pública” (Diógenes Gasparini. “Direito Administrativo”, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 233).
As gratificações são precária e contingentemente instituídas para o desempenho de serviços comuns em condições anormais de segurança, salubridade ou onerosidade (gratificações de serviço) ou a título de ajuda em face de certos encargos pessoais (gratificações pessoais). A gratificação de serviço é “propter laborem” e “é outorgada ao servidor a título de recompensa pelos ônus decorrentes do desempenho de serviços comuns em condições incomuns de segurança ou salubridade, ou concedida para compensar despesas extraordinárias realizadas no desempenho de serviços normais prestados em condições anormais” (Diógenes Gasparini. “Direito Administrativo”, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 232), albergando, por exemplo, situações como risco de vida ou saúde, serviços extraordinários (prestação fora da jornada de trabalho), local de exercício ou da prestação do serviço, razão do trabalho (bancas, comissões).
É relevante destacar que “o que caracteriza essa modalidade de gratificação é sua vinculação a um serviço comum, executado em condições excepcionais para o funcionário, ou a uma situação normal do serviço mas que acarreta despesas extraordinárias para o servidor”, razão pela qual “essas gratificações só devem ser percebidas enquanto o servidor está prestando o serviço que as enseja, porque são retribuições pecuniárias pro labore faciendo e propter laborem. Cessado o trabalho que lhes dá causa ou desaparecidos os motivos excepcionais e transitórios que as justificam, extingue-se a razão de seu pagamento” (Hely Lopes Meirelles. “Direito Administrativo Brasileiro”, 26ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, pp. 457-458).
Diante
destas considerações, verifica-se incompatibilidade constitucional do Prêmio
por Tempo de Serviço previsto no art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1,
2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de são
José do Rio Pardo.
Com efeito, o Prêmio por
Tempo de Serviço é auferido por servidores com base no tempo de serviço de 10,
15, 20, 25, 30, 35 ou 40 anos de serviço público.
Todavia, o próprio Município
já dispõe da vantagem da sexta parte e do adicional por tempo de serviço, os
quais recompensam o servidor pelo tempo de serviço público, nos seguintes
termos:
“SUBSEÇÃO
I
DA SEXTA PARTE
Art. 47 – O servidor público que completar 25
(vinte e cinco) anos de serviço fará jus a receber a sexta parte,
correspondente a 1/6 (um sexto) de sua remuneração.
(...)
Do Adicional por Tempo
de Serviço
Art. 57- O adicionar por tempo de
serviço é devido à razão de 5% (cinco por cento) por cada 3 (três) anos de
efetivo exercício no serviço público municipal, incidindo sobre o vencimento do
servidor, incorporando-se o valor correspondente à remuneração do servidor por
todos os efeitos legais.
§1º - O
direito ao recebimento do adicional por tempo de serviço ocorrerá a partir do
mês em que o servidor completar o triênio, independentemente de qualquer
requerimento de sua parte.
§2º - A
contagem para aquisição do triênio será observada a partir do último adicional
concedido, ou da data da posse do servidor, a qual será deverá ser apurada pela
Divisão de Recursos Humanos.
(...)” g.n
Assim, é inconstitucional a criação de benefício do prêmio por tempo de serviço, disciplinado no art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de são José do Rio Pardo.
Os dispositivos impugnados
conferiram indiscriminado aumento indireto e dissimulado da remuneração,
estando alheia aos parâmetros de razoabilidade, interesse público e necessidade
do serviço que devem presidir a concessão de vantagens pecuniárias aos
servidores públicos, conforme alude o artigo 128 da Constituição Bandeirante.
Cabe ressaltar que a moralidade administrativa está intimamente ligada ao conceito do “bom administrador”. Quando se trata da gestão do patrimônio público, todas as condutas devem concorrer para a criação do bem comum, e, para tanto, devem observar não somente o que é lícito ou ilícito, o justo ou injusto, mas atender a critérios morais que hoje dão valor jurídico à vontade psicológica do administrador. A gestão do dinheiro público exige do administrador prudência muito maior do que aquela que empregamos na gestão dos nossos bens.
Hoje a moralidade administrativa foi erigida em fator de legalidade não só do ato administrativo, mas também da produção normativa.
A instituição do prêmio por tempo de serviço, tomando por base o tempo de serviço público e levando-se em consideração de que já existe no ordenamento jurídico do Município de São José do Rio Pardo o adicional por tempo de serviço e sexta parte não se conforma com a moral administrativa e com o interesse público.
A necessidade de se verificar se a vantagem pecuniária atende efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço está motivada pela sobriedade e prudência que os Municípios devem ter em relação à gestão do dinheiro público. Não se desconsidera a importância e necessidade de bem remunerar os servidores públicos, no entanto, devem ser observados os princípios orientadores da Administração Pública, constitucionalmente previstos.
Ademais, os dispositivos impugnados que instituíram o prêmio por tempo de serviço contraria o princípio da razoabilidade e moralidade, que devem nortear a Administração Pública e a atividade legislativa e tem assento no art. 111 da Constituição do Estado, aplicável aos Municípios por força do art. 144 da mesma Carta.
Por força desse princípio, é necessário que a norma passe pelo denominado “teste” de razoabilidade, ou seja, que ela seja: (a) necessária (a partir da perspectiva dos anseios da Administração Pública); (b) adequada (considerando os fins públicos que com a norma se pretende alcançar); e (c) proporcional em sentido estrito (que as restrições, imposições ou ônus dela decorrentes não sejam excessivos ou incompatíveis com os resultados a alcançar).
O prêmio por tempo de serviço auferido por servidores públicos que permaneçam na administração pública por 10, 15, 20, 25, 30, 35 ou 40 anos não passa por nenhum dos critérios do teste de razoabilidade: (a) não atende a nenhuma necessidade da Administração Pública, vindo em benefício exclusivamente da conveniência dos servidores públicos beneficiados por essa vantagem pecuniária; (b) é, por consequência, inadequada na perspectiva do interesse público; (c) é desproporcional em sentido estrito, pois cria ônus financeiros que naturalmente se mostram excessivos e inadmissíveis, tendo em vista a existência de outras vantagens que levam em consideração o tempo de serviço público, como, por exemplo, adicional por tempo de serviço e sexta parte.
Bem observa Wellington Pacheco Barros, destacado Professor e Desembargador:
“Comungo com
o pensamento político moderno de que uma das causas do inchaço da despesa
pública é a remuneração com pessoal, que não raramente inviabiliza a tomada de
decisões do agente político sobre investimentos de obras públicas de caráter
benéfico à população. E uma das causas da despesa pública com pessoal é a
atribuição indiscriminada pelo legislador de vantagens pecuniárias a servidor
público sem que haja uma contraprestação de serviço e, o que é pior, com o
rótulo de permanente e de efeito incorporador ao vencimento, elitizando a
administração de existência de remunerações desproporcionais entre o maior e o
menor vencimento de um cargo público” (O
município e seus agentes, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p.
128).
Vale lembrar o ensinamento de Hely Lopes Meirelles criticando a excessiva liberalidade da Administração Pública na concessão de vantagens pecuniárias “anômalas”, sem qualquer razão de interesse público:
“Além dessas vantagens, que encontram justificativa em fatos
ou situações de interesse administrativo, por relacionadas direta ou
indiretamente com a prestação do serviço ou com a situação do servidor, as
Administrações têm concedido vantagens anômalas, que refogem completamente dos
princípios jurídicos e da orientação técnica que devem nortear a retribuição do
servidor. Essas vantagens anômalas não se enquadram quer como adicionais, quer
como gratificações, pois não têm natureza administrativa de nenhum destes
acréscimos estipendiários, apresentando-se como liberalidades ilegítimas que o
legislador faz à custa do erário, com o só propósito de cortejar o servidor
público” (Direito Administrativo
Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2008, 34ª ed., p. 495).
Não
se deve olvidar ainda neste concerto clássica admoestação salientando que:
“(...) a imoralidade salta aos olhos quando a Administração
Pública é pródiga em despesas legais, porém inúteis, como propaganda ou
mordomia, quando a população precisa de assistência médica, alimentação,
moradia, segurança, educação” (Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Discricionariedade administrativa na
Constituição de 1988, São Paulo: Atlas, 1991, p. 111).
A instituição de vantagens
pecuniárias para servidores públicos só se mostra legítima se realizada em
conformidade com o interesse público e com as exigências do serviço, nos termos
do art. 128 da Constituição do Estado, aplicável aos municípios por força do
art. 144 da mesma Carta.
Por fim, esse egrégio
Tribunal de Justiça tem se manifestado pela inconstitucionalidade de normas que
instituem vantagens que violam o art. 111 e art. 128 da Constituição Estadual:
“Ação direta de inconstitucionalidade Município de Bilac.
Leis nº 858, de 19 de fevereiro de 1988, e 1.139, de 23 de dezembro de 1994,
que instituem o 14º salário aos servidores do Município e o estendem aos
aposentados – Afronta aos princípios constitucionais da moralidade,
razoabilidade, finalidade e interesse público Inconstitucionalidade
configurada. Modulação de efeitos. Leis que vigoram há vários anos. Necessidade
de modulação dos efeitos da declaração, tendo em vista razões de segurança
jurídica, com o fim de salvaguardar os pagamentos já realizados e os
recebimentos efetivados de boa-fé. Declaração que deve produzir seus efeitos a
partir da prolação do acórdão - Ação direta julgada procedente, para declarar a
inconstitucionalidade das referidas leis, com modulação” (ADI nº
2204151-69.2015.8.26.0000, Rel. Des. Ademir Benedito, v.u., j. 03.02.2016).
“AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE. Impugnação dos §§ 1º e 5º, do artigo 63, bem como do
parágrafo único do artigo 64, da Lei Complementar nº 55, de 17 de junho de
2010, do Município de Ubarana, na parte em que (i) instituem Gratificação de
Regime Especial de Trabalho para servidores ocupantes de cargos de provimento
em comissão (§ 5º do art. 63) e que (ii) delegam à autoridade concedente o
critério para fixação dessa verba (§ 1º do art. 63 e parágrafo único do art.
64). 2 - Alegação de ofensa às disposições do art. 5º, art. 24, § 2º, l, art.
111, art. 128 e art. 144, todos da Constituição do Estado de São Paulo. Reconhecimento.
3 – Primeiro aspecto. Extensão da Gratificação aos ocupantes de cargos em
comissão (art. 63, § 5º). Inadmissibilidade. Vantagem pecuniária (instituída
para recompensar o servidor que for designado para ficar à disposição da
Administração 24 horas por dia) que não poderia contemplar os ocupantes de
cargos comissionados, porque eles já trabalham em regime especial que pressupõe
dedicação integral, como decorrência da relação de confiança com a autoridade
nomeante. Inconstitucionalidade manifesta, não só por esse fundamento (incompatibilidade da gratificação com a
natureza do cargo), mas também por ofensa aos princípios da razoabilidade e
moralidade administrativa. 4 – Segundo aspecto. Critério para fixação da verba.
Delegação à autoridade concedente. Impossibilidade. Ofensa ao princípio da
legalidade. Embora seja do Prefeito Municipal a iniciativa da proposta
(dispondo sobre remuneração de servidores) toda questão (inclusive a
regulamentação) envolvendo fixação do valor da gratificação deve ser tratada
por meio de lei (em sentido estrito), sob pena de ofensa ao princípio da
separação dos poderes, pois, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal,
"traduz situação configuradora de ilícito constitucional a outorga
parlamentar ao Poder Executivo de prerrogativa jurídica cuja 'sedes materiae' –
tendo em vista o sistema constitucional de poderes limitados vigentes no Brasil
– só pode residir em atos estatais primários editados pelo Poder
Legislativo" (ADI 1.296-MC, Rel. Min. Celso de Mello, j. 14/06/1995,
Plenário). 5 – Ação julgada procedente, com modulação”. (TJ/SP, ADI nº
2220791-50.2015.8.26.0000, Rel. Des. Ferreira Rodrigues, julgado em 1º de junho
de 2016) g.n
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Artigo
155, caput e § 1º, expressão "bem como nas demais situações em que a
autoridade entender pertinente à sua representação", constante do § 1º do
artigo 158, e § 3º deste mesmo artigo, da Lei nº 2.693, de 26 de agosto de
1997, com a redação dada pela Lei Complementar nº 104, de 5 de agosto de 2014, ambas
do Município de Bebedouro, que dispõem sobre a concessão das gratificações de
nível universitário e de representação aos servidores da administração
municipal direta, indireta, autárquica e fundacional – Vantagem relativa ao
"nível universitário" que beneficia de forma ampla todos os agentes
públicos com formação superior na Administração Municipal de Bebedouro,
estendendo-se, também, "aos ocupantes de cargos de direção ou
chefia", não tendo, portanto, relação com a função exercida e nem tem como
fundamento uma habilitação técnica específica necessária ao seu desempenho –
Concessão da Gratificação de Representação, por outro lado, que foi atribuída
aos superiores hierárquicos diretos dos servidores beneficiados, mediante
simples ato administrativo, em violação ao princípio da reserva legal –
Discricionariedade deferida às autoridades responsáveis também quanto à fixação
do valor dessa vantagem que permite a ocorrência de favorecimentos indevidos na
Administração Municipal, em ofensa aos princípios da moralidade e
impessoalidade – Vícios de inconstitucionalidade aduzidos na exordial que,
destarte, ficaram evidenciados na espécie, por afronta aos preceitos contidos
nos artigos 5º, caput e § 1º, 24, § 2º, "1", 111, 128 e 144, todos da
Constituição do Estado de São Paulo – Declaração de inconstitucionalidade da
Lei nº 2.693/1997 que, diante dos efeitos repristinatórios que lhe são
inerentes, implicará na revalidação das redações anteriores dos dispositivos
municipais questionados nos autos, os quais padecem dos mesmos vícios
reconhecidos em relação à legislação vigente, devendo, então, por arrastamento,
ser-lhes estendidos os efeitos dessa declaração de inconstitucionalidade –
Precedentes desta Corte – Valores já concedidos aos servidores a título das
vantagens previstas nos artigos objeto da ação que são irrepetíveis, ante seu
caráter alimentar e recebimento de boa-fé, recomendando a manutenção daqueles
pagamentos – Ação julgada procedente, para o fim de declarar a
inconstitucionalidade da legislação objurgada nos autos, com a modulação dos
efeitos dessa declaração”. (TJ/SP, ADI nº 2128351-35.2015.8.26.0000, Rel. Des.
Paulo Dimas Mascaretti, julgado em 09 de dezembro de 2015)
“Ação direta de inconstitucionalidade. Leis nº 644/1991 e
1.156/2011 do Município de Pontes Gestal. Instituição de gratificação a
servidores portadores de diploma universitário. Vantagem concedida de modo
indistinto, inclusive para ocupantes de cargos para os quais a habilitação
universitária é pré-requisito ao provimento, sem qualquer contrapartida quanto
à produtividade ou qualidade do serviço, nem pertinência entre as funções
exercidas pelo servidor e a graduação em nível superior. Afronta aos artigos
111 e 128 da Constituição do Estado. Ação procedente, com modulação de
efeitos”. (TJ/SP, ADI nº 2133104-35.2015.8.26.0000, Rel. Des. Arantes Teodoro,
julgado em 11 de novembro de 2015)
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Arts. 141 a 145 da Lei
Complementar nº 300, de 30 de março de 2012, do Município de Serrana.
Gratificação de aniversário. Vantagem pecuniária dissociada das exigências do
serviço e do interesse público (art. 128 da Constituição do Estado).
Inadmissibilidade. Jurisprudência do Órgão Especial. Declaração de
inconstitucionalidade “pro futuro”, para evitar prejuízos à segurança jurídica
e à isonomia. Ação julgada procedente, com modulação de efeitos a partir de
2016” (ADI Nº 2001606-10.2015.8.26.0000, Rel. Des. Antonio Carlos Villen, v.u.,
j. 29.07.2015).
“Ação direta de inconstitucionalidade. Adicional de
assiduidade. Município de Chavantes. Artigos 43, 44 e 45 da Lei Complementar
127/2012 (Dispõe sobre o Plano de Cargos, Vencimentos e Evolução Funcional dos
Profissionais do Magistério Público e dá outras providências).
Inconstitucionalidade. Ausência de critério, pois não se foi além da
assiduidade, dever e obrigação do servidor. Dispositivos que em nada asseguram
valorização dos profissionais do magistério. Ação procedente” (ADI
2140689-75.2014.8.26.0000, Rel. Des. Borelli Thomaz, v.u., 28-01-2015).
Posto isso, o art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo, são inconstitucionais uma vez que contraria os artigos 111 e 128 da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios por força do art. 144 da mesma Carta.
4.
DOS PEDIDOS
a. Do pedido liminar
À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura da norma impugnada, apontada como violadora de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação porque permite dispêndio público de maneira ilegítima, periclitando as forças do erário com a potencialidade real e concreta de danos irreversíveis ou de difícil reparação.
O perigo da demora decorre,
especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da
eficácia das disposições normativas questionadas, continuarão sendo aplicadas.
Serão realizadas despesas que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres
públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.
Basta lembrar que os
pagamentos relativos ao prêmio por tempo de serviço não serão revertidos ao
erário pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter
alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.
A ideia do fato consumado,
com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da
concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.
Note-se que, com a
procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.
Assim, a imediata suspensão
da eficácia dos dispositivos impugnados evitará a ocorrência de maiores
prejuízos, além dos que já se verificaram.
À luz deste perfil, requer-se a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta, do art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo.
b. Do Pedido Principal
Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade do art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo.
Requer-se ainda que sejam
requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de
São José do Rio Pardo,
bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se
sobre o ato normativo impugnado.
Posteriormente, aguarda-se
vista para fins de manifestação final.
Termos em que,
Aguarda-se deferimento.
São
Paulo, 17 de julho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral
de Justiça
aca/mi
Protocolado
nº 7.972/2017
Interessada: Dra. Marília Molina Schlittler - Promotora de
Justiça
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face do art. 48, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, §§1º e 2º, a, 1, 2, b, §§3º e 4º da Lei nº 2.712, de 16 de março de 2004, do Município de São José do Rio Pardo.
2. Oficie-se ao representante, informando a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 17 de julho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
aca/mi