Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 0032713-48.2011.8.26.0000

Suscitante: 15ª Câmara de Direito Público

Objeto: inconstitucionalidade do inciso XI do art. 3º da Lei n. 3.398, de 22 de fevereiro de 1989, do Município de Mogi das Cruzes

 

 

Ementa: Constitucional. Tributário. Incidente de Inconstitucionalidade. Lei n. 3.398/89 do Município de Mogi das Cruzes. ITBI. Fato gerador. Compromisso de compra e venda. Inconstitucionalidade. O compromisso de compra e venda não transmite direitos reais nem configura cessão de direitos à aquisição deles, violando o art. 156, II, da CF, a lei local que o tenha como fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a ele relativos.

 

 

 

 

  

 

Colendo Órgão Especial:

 

 

 

 

1.                Cuida-se de incidente de inconstitucionalidade do inciso XI do art. 3º da Lei n. 3.398/89, do Município de Mogi das Cruzes, suscitado pela colenda 15ª Câmara de Direito Público do egrégio Tribunal de Justiça no julgamento de apelação oposta contra sentença que julgou procedente ação de repetição de indébito movida por contribuinte contra a Municipalidade de Mogi das Cruzes (fls. 199/205).

2.                O venerando acórdão está assim ementado:

“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – ITBI – Exercício de 2003 – Município de Mogi das Cruzes – Compromisso de compra e venda – Hipótese de não incidência – Fato gerador do tributo que ocorre com a transmissão da propriedade imobiliária – Necessidade do registro, título constitutivo da transferência patrimonial – Acenada Inconstitucionalidade do artigo 3º, da Lei Municipal nº 3.398/89, ante o artigo 156, inciso II, da Constituição Federal – Aplicação da Súmula vinculante nº 10 do E. STF – Julgamento suspenso, determinada a remessa dos autos ao C. Órgão Especial” (fl. 200).

3.                É o relatório.

4.                O dispositivo legal contestado tem o seguinte teor:

“Art. 3º - O imposto incidirá especificamente sobre:

(...)

XI – a cessão de direitos decorrentes de compromisso de compra e venda e de promessa de cessão”.

5.                A regra legal enfocada não é compatível com a hipótese de incidência tributária descrita no art. 156, II, da Constituição Federal.

6.                Neste sentido, colhe-se da jurisprudência:

“Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que negou processamento a recurso extraordinário interposto de acórdão cuja ementa tem o seguinte teor:

‘TRIBUTÁRIO. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ITBI. FATO GERADOR. CTN, ART. 35 E CÓDIGO CIVIL, ARTS. 530, I, E 860, PARAGRAFO ÚNICO. REGISTRO IMOBILIÁRIO.

1. O fato gerador do imposto de transmissão de bens imóveis ocorre com a transferência efetiva da propriedade ou do domínio útil, na conformidade da Lei Civil, com o registro no cartório imobiliário.

2. A cobrança do ITBI sem obediência dessa formalidade ofende o ordenamento jurídico em vigor.

3. Recurso ordinário conhecido e provido.’ (Fls. 133)

2.  No recurso extraordinário, alega o recorrente que o entendimento esposado pelo Tribunal de origem contraria a inteligência do art. 156, II, da Constituição.

3.  Análise acurada do acórdão recorrido revela que a irresignação não comporta conhecimento.

Com efeito, o acórdão impugnado adotou como razão de decidir, entre outros fundamentos, a interpretação da legislação local, vale dizer, o Decreto local 16.114/1994. A ofensa que pudesse daí emergir não se configuraria de maneira direta e frontal, mas reflexa.

Por derradeiro, cumpre assinalar que o Supremo Tribunal Federal assentou jurisprudência quanto ao mérito em sentido diametralmente oposto à pretensão formulada pelo recorrente. Confira-se, a propósito, o precedente firmado na Rp 1.121 (rel. min. Moreira Alves, DJ 13.04.1984), o qual, a despeito de confeccionado sob a égide da Constituição pretérita, ainda guarda sintonia com a questão versada neste recurso.

Assim ficou redigida a ementa do referido acórdão:

‘EMENTA: Fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a ele relativos. Compromisso de compra e venda.

- O compromisso de compra e venda, no sistema jurídico brasileiro, não transmite direitos reais nem configura cessão de direitos à aquisição deles, razão por que é inconstitucional a lei que o tenha como fato gerador de imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos.

Representação julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do inciso I do parágrafo único do artigo 114 da Lei 7730, de 30 de outubro de 1973, do Estado de Goiás.’

Do exposto, nego seguimento ao agravo” (STF, AI 454.767-DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 27-11-2009, DJe 10-12-2009).

“IMPOSTO DE TRANSMISSÃO INTER VIVOS DE BENS IMÓVEIS - FATO GERADOR - REGISTRO IMOBILIÁRIO - AGRAVO DESPROVIDO.

1.      O recurso extraordinário cujo trânsito busca-se alcançar foi interposto contra decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que implicou o acolhimento de pedido formulado em apelação interposta pelo agravado e o desprovimento do apelo do Distrito Federal. Eis a síntese do que restou decidido (folha 85):

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS. FATO GERADOR. REGISTRO IMOBILIÁRIO.

1. O fato gerador do imposto de transmissão de bens imóveis ocorre com a transferência efetiva da propriedade e do domínio útil, o que, na conformidade da Lei Civil, ocorre com o registro do respectivo título no cartório imobiliário.

2. A pretensão de cobrar o ITBI antes do registro imobiliário contraria o ordenamento jurídico.

3. Recurso do autor provido e improvido o do Distrito Federal.

2.      O Tribunal Pleno, apreciando a Representação de Inconstitucionalidade nº 1.121-6/GO, da relatoria do ministro Moreira Alves, assentou a inconstitucionalidade de lei que tenha o compromisso de compra e venda como fato gerador de imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Eis a ementa do acórdão, publicado no Diário de Justiça em 13 de abril de 1984:

‘Fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a ele relativos. Compromisso de compra e venda.

- O compromisso de compra e venda, no sistema jurídico brasileiro, não transmite direitos reais nem configura cessão de direitos à aquisição deles, razão por que é inconstitucional a lei que o tenha como fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a ele relativos.

Representação julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do inciso I do parágrafo único do artigo 114 da Lei 7730, de 30 de outubro de 1973, do Estado de Goiás.’

3.      No mesmo sentido, as decisões monocráticas proferidas no Agravo de Instrumento nº 457.177/DF, da lavra do ministro Joaquim Barbosa; no Agravo de Instrumento nº 522.048/DF, da relatoria do ministro Gilmar Mendes; e no Agravo de Instrumento nº 554.586/DF, também relator o ministro Gilmar Mendes.

4.      Conheço do agravo e o desprovejo” (STF, AI 646.443-DF, Rel. Min. Marco Aurélio, 06-09-2007, DJe 03-10-2007).

“Trata-se de agravo contra decisão que negou processamento a recurso extraordinário, fundado no art. 102, III, ‘a’, da Constituição Federal, em face de acórdão assim ementado:

‘TRIBUTÁRIO - ITBI - ESCRITURA PARTICULAR DE COMPRA E VENDA SEM REGISTRO - FATO GERADOR NÃO CARACTERIZADO - LEI DISTRITAL 11/88.

O disposto no art. 2º da Lei Distrital 11/88 não se coaduna com o sistema jurídico pátrio, para o qual só se adquire a propriedade imobiliária mediante registro do título que lhe deu causa. Ilegal, portanto, o lançamento do ITBI antes da apresentação da escritura de compra e venda ao oficial registrador.’

Alega-se violação ao artigo 156, II, da Carta Magna.

No julgamento da Rp no 1.121, o Plenário desta Corte assentou que ‘o compromisso de compra e venda, no sistema jurídico brasileiro, não transmite direitos reais nem configura cessão de direitos à aquisição deles, razão por que é inconstitucional a lei que o tenha como fato gerador de imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos.’ (DJ 13.04.84).

Nesse mesmo sentido, monocraticamente, AI 457.177, Rel. Joaquim Barbosa, DJ 26.06.05.

Dessa orientação não divergiu o acórdão recorrido.

Assim, nego seguimento ao agravo (art. 557, caput, do CPC)” (STF, AI 522.048-DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, 05-04-2006, DJ 04-05-2006, p. 34).

7.                Opino pela declaração de inconstitucionalidade do inciso XI do art. 3º da Lei n. 3.398, de 22 de fevereiro de 1989, do Município de Mogi das Cruzes.

 

         São Paulo, 02 de março de 2011.

 

 

         Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

         Jurídico

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