Parecer em incidente de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 0034039-09.2012.8.26.0000

Suscitante: 15ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

Objeto: letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau

 

Ementa: Incidente de inconstitucionalidade da letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau, que exige a apresentação de declaração de utilidade pública das instituições de educação para fins de imunidade tributária. Exigência desarrazoada. Violação à garantia tutelada no art. 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição Federal. Parecer pela declaração da inconstitucionalidade da norma questionada.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

(...)., pessoa jurídica de direito privado do município de Jau, ingressou com mandado de segurança contra a Prefeitura Municipal daquele Município, pleiteando a declaração de inconstitucionalidade, pelo controle difuso, letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau.

Pela r. Sentença de fls. 95/100, a pretensão foi acolhida, da qual adveio apelação (fls. 103/121).

O recurso foi regularmente processado, com contrarrazões a fls. 124/137, sendo distribuído à Colenda 13ª. Câmara de Direito Público.

O v. Acórdão de fls. 154/160 determinou a suspensão do julgamento da apelação, para que, em atenção à cláusula da reserva de Plenário (Súmula vinculante nº 10), o E. Órgão Especial se pronuncie sobre a constitucionalidade da letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau.

Este é resumo do que consta dos autos.

De fato, sem qualquer sombra de dúvida, observa-se, ictu oculi, efetiva afronta à garantia constitucional tutelada no art. 150, VI, letra “c” da Carta Magna.

Com efeito, a Lei Municipal criou exigência desarrazoada que obstaculiza o exercício do direito constitucionalmente protegido, já que a restrição à regra em comento encontra sede no § 4º, do inc. VI, do art. 150 da Constituição Federal.  A Lei Municipal não pode ir além e criar outras exigências que fogem ao perfil traçado constitucionalmente, chegando a fazer tábua rasa da proteção abraçada pela Lei Maior.

            Essa é uma situação que revela clara violação ao princípio da razoabilidade, imanente ao nosso sistema constitucional, cujo respeito exige que o ato normativo supere o “teste” consubstanciado: (a) na necessidade do ato normativo; (b) na sua adequação à situação material normatizada; (c) na proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, na compatibilidade entre os meios empregados pelo legislador e as metas que ele desejou alcançar.

         Esse raciocínio tem sido acolhido pela doutrina como argumento suficiente para, por desconsideração a um dos três aspectos do “teste de razoabilidade”, afastar-se a legitimidade do ato normativo ou administrativo. Confira-se: Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p. 101; Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p.95; Gilmar Ferreira Mendes, “A proporcionalidade na jurisprudência do STF”, publicado em Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos Editor, 1998, p.83.

         A respeito desta questão, veja-se o posicionamento do E. STF nos seguintes v. arestos, aplicável ao caso, mutatis mutandis:

“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INSTITUIÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. ART. 150, VI, “c”. O Supremo fixou jurisprudência no sentido de que a imunidade de que trata o art. 150, VI, “c”, da CB/88, não se submete a critérios de classificação dos impostos adotados por normas infraconstitucionais. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” RE 540725 AgR/SC – Santa Catarina. Rel. Min. Eros Grau. J. 10/02/2009.

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ‘ENTIDADE EDUCACIONAL’. CONCEITO. LEI COMPLEMENTAR. 1. A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que, por se tratar de limitação constitucional ao poder de tributar, a demarcação do objeto material da imunidade das instituições de educação é matéria afeita à lei complementar (ADI 1.802-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 13.02.2004). 2. Agravo regimental improvido.” RE 354988 AgR/DF – Distrito Federal – j. 21/03/2006. Rel. Min. Ellen Gracie

Portanto, lícita é a conclusão de que os requisitos a serem atendidos para a configuração da imunidade tributária devem ser colhidos somente no art. 14 do CTN e não em outra legislação infraconstitucional tal qual a vergastada norma instituída pela letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau.

Diante do exposto, o parecer é pela declaração da inconstitucionalidade da letra “f” do art. 3º, da Lei Complementar n. 166/2001, do Município de Jau.

São Paulo, 1 de março de 2012.

 

 

        Sérgio Turra Sobrana

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

fjyd