Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 0042664-32.2012.8.26.0000

Suscitante: 7ª Câmara de Direito Público

Objeto: art. 2º, §§ 2º e 3º, Lei Complementar n. 1.010/07 do Estado de São Paulo

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Incidente de inconstitucionalidade. Lei Complementar n. 1.010/07 (art. 2º, §§ 2º e 3º) do Estado de São Paulo. Submissão dos servidores públicos estaduais admitidos com fundamento na Lei n. 500/74 ao regime próprio de previdência social. 1. A norma enfocada não investiu servidores públicos (lato sensu considerados) admitidos com fundamento na Lei n. 500/74 em cargos públicos, de modo a desautorizar arguição de ofensa ao art. 37, II, da Constituição da República, mas, tão somente os incluiu no regime próprio de previdência social. 2. A extensão do regime próprio de previdência dos servidores públicos estaduais titulares de cargos efetivos aos admitidos para o exercício de funções-atividade de natureza permanente da Lei n. 500/74 não ofende o art. 40, § 13, da Constituição Federal, em razão da especial natureza destas, bem assemelhadas àquele. 3. Constitucionalidade da norma.

 

 

 

Egrégio Tribunal:

 

A colenda 7ª Câmara de Direito Público suscitou incidente de inconstitucionalidade do art. 2º, §§ 2º e 3º, da Lei Complementar n. 1.010/07, do Estado de São Paulo, que alçou à condição de titulares de cargos de provimento efetivo os servidores públicos estaduais admitidos com base na Lei n. 500/74 (fls. 110/114).

Segundo o venerando acórdão, somente os servidores titulares de cargos públicos de provimento efetivo estão sujeitos ao regime próprio de previdência social, não podendo a lei contestada alçar a essa condição os servidores admitidos com base na Lei n. 500/74 para o exercício de função-atividade, pois, mesmo aquele que ocupa cargo em comissão está sujeito ao regime geral de previdência social.

A Lei Complementar Estadual n. 1.010/07 assim dispõe:

“Artigo 2º - São segurados do RPPS e do RPPM do Estado de São Paulo, administrados pela SPPREV:

I - os titulares de cargos efetivos, assim considerados os servidores cujas atribuições, deveres e responsabilidades específicas estejam definidas em estatutos ou normas estatutárias e que tenham sido aprovados por meio de concurso público de provas ou de provas e títulos ou de provas de seleção equivalentes;

II - os membros da Polícia Militar do Estado, assim definidos nos termos do artigo 42 da Constituição Federal.

§ 1º - Aplicam-se as disposições constantes desta lei aos servidores titulares de cargos vitalícios, efetivos e militares, da Administração direta e indireta, da Assembleia Legislativa, do Tribunal de Contas do Estado e seus Conselheiros, das Universidades, do Poder Judiciário e seus membros, e do Ministério Público e seus membros, da Defensoria Pública e seus membros.

§ 2º - Por terem sido admitidos para o exercício de função permanente, inclusive de natureza técnica, e nos termos do disposto no inciso I deste artigo, são titulares de cargos efetivos os servidores ativos e inativos que, até a data da publicação desta lei, tenham sido admitidos com fundamento nos incisos I e II do artigo 1º da Lei 500, de 13 de novembro de 1974.

§ 3º - O disposto no § 2º deste artigo aplica-se aos servidores que, em razão da natureza permanente da função para a qual tenham sido admitidos, estejam na mesma situação ali prevista”.

A norma enfocada não investiu servidores públicos (lato sensu considerados) admitidos com fundamento na Lei n. 500/74 em cargos públicos, de modo a desautorizar arguição de ofensa ao art. 37, II, da Constituição da República, mas, tão somente os incluiu no regime próprio de previdência social.

Portanto, objeto do controle de constitucionalidade é exatamente a submissão desses servidores, investidos em função-atividade, e não em cargo de provimento efetivo, ao regime próprio de previdência social.

A leitura conjugada do caput e do § 13 do art. 40 da Constituição Federal revela que o regime próprio de previdência social é destinado, exclusivamente, aos servidores públicos stricto sensu, ou seja, os titulares de cargos de provimento efetivo investidos mediante aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, até porque há norma constitucional expressa excluindo desse regime (e os inserindo no regime geral de previdência social) os servidores ocupantes, exclusivamente, de cargos de provimento em comissão, bem como de outro cargo temporário ou de emprego público.

Todavia, Maria Sylvia Zanella Di Pietro bem examina e equaciona a questão:

“Verifica-se que não houve qualquer referência ao regime previdenciário dos servidores que exercem função. Seria de indagar-se se foi intenção do legislador constituinte excluí-los de qualquer regime previdenciário. A resposta só pode ser negativa.

(...)

Há que se lembrar também que alguns Estados e Municípios não implantaram o regime jurídico único previsto no artigo 39 da Constituição, em sua redação original. Foi o que ocorreu no Estado de São Paulo, onde até hoje existem servidores que exercem a chamada função-atividade, com base na Lei nº 500, de 13-11-74, que corresponde a funções de caráter permanente, para as quais o ingresso se fazia mediante processo seletivo. Tais servidores nem ocupam cargo efetivo a que se refere o caput do artigo 40, nem ocupam cargo em comissão, cargo temporário ou emprego público, referidos no § 13 do mesmo dispositivo. Eles têm uma situação muito semelhante a dos servidores efetivos, à medida em que foram admitidos por processo seletivo; seu regime é estatutário, porque estabelecido por lei; a maior parte deles adquiriu estabilidade com base no artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. O caráter de temporariedade e de precariedade da forma de provimento e exoneração, presente nos casos previstos no § 13, não existe com relação a esses servidores. A eles deve aplicar-se, por analogia, o caput do artigo 40.

Além disso, os servidores que foram admitidos, a qualquer título, antes da Emenda Constitucional nº 20 (ressalvados os celetistas, que já eram vinculados ao regime previdenciário geral), tinham sua aposentadoria regida pelos dispositivos constitucionais relativos aos servidores públicos. O artigo 40 da Constituição não fazia qualquer distinção quanto ao tipo de servidor, fosse ele ocupante de cargo ou função; apenas remetia para a legislação a disciplina legal sobre a aposentadoria em cargos ou empregos temporários. Fora essas duas hipóteses, todos os demais servidores faziam jus às modalidades de aposentadoria previstas no artigo 40 e continuam sujeitos a esse dispositivo, já que tiveram os seus direitos preservados pela regra do artigo 3º, § 3º, da Emenda nº 20” (Direito Administrativo, São Paulo: Atlas, 2008, 22ª ed., pp. 557-558).

A adoção desse entendimento é amparada por uma perspectiva de segurança jurídica e de razoabilidade, e não significa heresia em virtude da proximidade morfológica dos regimes jurídicos incidentes e da natureza permanente da função-atividade.

Opino pelo reconhecimento da constitucionalidade do art. 2º, §§ 2º e 3º, da Lei Complementar n. 1.010/07, do Estado de São Paulo.

                   São Paulo, 13 de março de 2012.

 

 

        Sérgio Turra Sobrane

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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