Parecer em incidente de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 0059004-85.2011.8.26.0000  (994.09.239931-5)

Suscitante: 13ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

Objeto: art. 124, da Lei n. 165, de 15 de dezembro de 1997, do Município de São José dos Campos

 

Ementa: Incidente de inconstitucionalidade do art. 124º, da Lei n. 165, de 15 de dezembro de 1997, do Município de São José dos Campos, que "Dispõe sobre a ordenação do território mediante controle do parcelamento, do uso e da ocupação do solo do Município de São José dos Campos". Imposição de recuo diferenciado a determinado imóvel.   Aumento desarrazoado. Violação aos princípios da isonomia e da impessoalidade. Parecer pela declaração da inconstitucionalidade da norma questionada.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Flaguma Empreendimentos Ltda., empresa do município de São José dos Campos, ingressou com ação contra a Prefeitura Municipal daquele Município, pleiteando a declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 165/97, na parte em que a obriga manter recuo mínimo de 25 metros no fundo de sua propriedade e que lhe seja exigido o mesmo recuo imposto aos demais munícipes, que é de 03 metros.

Pela r. Sentença de fls. 353/359, a pretensão foi acolhida, da qual adveio apelação (fls. 361/367).

O recurso foi regularmente processado, com contra-razões a fls. 372/382, seguido de recurso adesivo, sendo distribuído à Colenda 13ª. Câmara de Direito Público.

O v. Acórdão de fls. 434/438 determinou a suspensão do julgamento da apelação, para que, em atenção à cláusula da reserva de Plenário (Súmula vinculante nº 10), o E. Órgão Especial se pronuncie sobre a constitucionalidade do art. 124, da Lei n. 165, de 15 de dezembro de 1997, do Município de São José dos Campos.

Este é resumo do que consta dos autos.

De fato, sem qualquer sombra de dúvida, observa-se, a olho nu, efetiva afronta ao princípio da isonomia, tutelado pelo art. 5º, caput, da CF.

A Lei Municipal impõe recuo de fundo de 03 metros para todos os imóveis do município e de 25 metros tão somente para o imóvel da requerente.

Para que tal distinção pudesse ser feita, necessário seria que o imóvel da requerente estivesse em situação tão ímpar, que exigisse tratamento diferenciado, em observância à própria definição de isonomia, que significa tratar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam.

Porém, esta realidade não existe e o imóvel da requerente encontra-se na mesma situação que os demais lindeiros merecendo, por isso, o mesmo tratamento, qual seja: recuo aos fundos de 03 metros e não de 25, como lhe foi imposto pela impugnada norma.

A Constituição Federal, como se sabe, ao abraçar o princípio da igualdade de direitos, veda os tratamentos diferenciados, arbitrários e as discriminações.

Ensina Alexandre de Moraes que:

"Importante, igualmente, apontar a tríplice finalidade limitadora do princípio da igualdade: limitação ao legislador, ao intérprete/autoridade pública e ao particular.

O legislador, no exercício de sua função constitucional de edição normativa, não poderá afastar-se do princípio da igualdade, sob pena de flagrante inconstitucionalidade." (Constituição do Brasil Interpretada, Ed.2002, Atlas, pág. 181)

Ademais, desarrazoado o incremento de recuo levado a efeito única e exclusivamente para o imóvel da requerente.

            Essa é uma situação que revela clara violação ao princípio da razoabilidade, imanente ao nosso sistema constitucional, cujo respeito exige que o ato normativo supere o “teste” consubstanciado: (a) na necessidade do ato normativo; (b) na sua adequação à situação material normatizada; (c) na proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, na compatibilidade entre os meios empregados pelo legislador e as metas que ele desejou alcançar.

         Esse raciocínio tem sido acolhido pela doutrina como argumento suficiente para, por desconsideração a um dos três aspectos do “teste de razoabilidade”, afastar-se a legitimidade do ato normativo ou administrativo. Confira-se: Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p. 101; Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p.95; Gilmar Ferreira Mendes, “A proporcionalidade na jurisprudência do STF”, publicado em Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos Editor, 1998, p.83.

         Por fim, não se poderia deixar de observar que, como consta na r. sentença de primeiro grau:

         "Violado está, também, o princípio da impessoalidade, na medida em que a restrição, ao que se pode concluir pela documentação constante dos autos (fls. 33/37), foi instituída para beneficiar um grupo limitado de pessoas, moradores do Condomínio Bosque Imperial."  (fls.357)

Diante do exposto, o parecer é pela declaração da inconstitucionalidade do art. 124º, da Lei n. 165, de 15 de dezembro de 1997, do Município de São José dos Campos.

São Paulo, 6 de abril de 2011.

 

 

         Sérgio Turra Sobrana

         Subprocurador-Geral de Justiça

         Jurídico

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