Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade
Autos nº. 0137106-24.2011.8.26.0000
Suscitante: 18ª Câmara de Direito Privado
Objeto: art. 5º da MP 2.170-36/2001
Ementa: Incidente de inconstitucionalidade. MP 2.170/01 (art. 5º). Permissão de capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. A permissão da capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano é assunto que, no contexto da política de crédito e de regulação e fiscalização do setor financeiro, tem relevância e urgência, pois, demanda providências imediatas e que, por essa razão, não é lícito que fiquem à mercê da rigidez ritualística do processo legislativo.
Colendo Órgão Especial
Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente
Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado pela C. 18ª Câmara de Direito Privado, nos autos de Apelação Cível nº 9054067-49.2006.8.26.0000, em que figuram como partes PROP CAR RACING LTDA (apelante) e BANCO DO BRASIL S/A (apelado).
Objetiva-se atender à cláusula de reserva de plenário (Súmula Vinculante nº 10 do STF), cogitando-se do eventual afastamento, por inconstitucionalidade, do art. 5º da MP 2.170-36/2001.
Não há notícia de pronunciamento anterior do Órgão Especial ou do Plenário do Supremo Tribunal Federal[1] sobre a questão suscitada (art. 481, parágrafo único, do CPC).
Consigne-se, entretanto, que o tema também é objeto da arguição de inconstitucionalidade nº 0128514-88.2011.8.26.0000, igualmente suscitada pela C. 18ª Câmara de Direito Público, nos autos da qual já ofertamos parecer.
Este é resumo do que consta dos autos.
A colenda 18ª Câmara de Direito Privado suscita a inconstitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 2.170-36/01 em razão da ausência dos requisitos de relevância e urgência (fls. 611/625).
Assim dispõe a norma impugnada:
“Art. 5º. Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.
Parágrafo único. Sempre que necessário ou quando solicitado pelo devedor, a apuração do valor exato da obrigação, ou de seu saldo devedor, será feita pelo credor por meio de planilha de cálculo que evidencie de modo claro, preciso e de fácil entendimento e compreensão, o valor principal da dívida, seus encargos e despesas contratuais, a parcela de juros e os critérios de sua incidência, a parcela correspondente a multas e demais penalidades contratuais”.
A questão relativa à discrepância com o art. 7º, II, da Lei Complementar n. 95/98, não anima este incidente de inconstitucionalidade porque se sedimenta sobre conflito de legalidade.
Idêntica observação é devida a eventual ineficácia do disposto na medida provisória em face do art. 591 do Código Civil, reputado pela douta turma suscitante como lei de maior hierarquia.
O controle judiciário de constitucionalidade de medida provisória é autorizado excepcionalmente quando se revela o abuso ou desvio do poder de legislar ou a manifesta ausência dos requisitos constitucionais de urgência ou relevância.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. POSSIBILIDADE.
1. A capitalização dos juros em periodicidade mensal é admitida para os contratos celebrados a partir de 31 de março de 2000 (MP nº 1.963-17/2000), desde que pactuada.
2. Não é aplicável aos contratos de mútuo bancário a periodicidade da capitalização prevista no art. 591 do novo Código Civil, prevalecente a regra especial do art. 5º, caput, da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (2.170-36/2001), que admite a incidência mensal.
3. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ, AgR-REsp 1.005.183-RS, 4ª Turma, Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro, 10-11-2009, v.u., DJe 23-11-2009).
A permissão da capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano é assunto que, no contexto da política de crédito e de regulação e fiscalização do setor financeiro, tem relevância e urgência, pois, demanda providências imediatas e que, por essa razão, não é lícito que fiquem à mercê da rigidez ritualística do processo legislativo.
Opino pela rejeição do incidente de inconstitucionalidade.
São Paulo, 29 de julho de 2011.
Sérgio Turra Sobrane
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
jesp
[1] Registre-se que o STF deverá se pronunciar sobre o tema constitucional em análise, pois este é objeto da ADI 2316, ajuizada em 20.09.2000, pelo Partido da República. A inconstitucionalidade, segundo a agremiação política, decorre dos seguintes fundamentos: (1) Violação do caput do artigo 62 da Constituição Federal, haja vista que a questão já se encontrava sumulada pelo Supremo Tribunal Federal há quase 40 anos, ou seja, não havia o requisito da urgência para permitir a regulamentação do tema por medida provisória; (2) Violação do atual artigo 62, § 1º, inciso II c/c 192, ambos da Constituição Federal, uma vez que as normas gerais relativas ao Sistema Financeiro Nacional só podem ser tratadas por Lei Complementar e, portanto, seria incabível a medida provisória; e (3) Violação dos artigos 5º e 7º da Lei Complementar 95/98, pois a MP tratava de matéria completamente estranha ao Sistema Financeiro Nacional, dado que regulamentava a administração de créditos do Tesouro Nacional (cf. Leonardo Araújo Marques, Contratos bancários: polêmicas e ilegalidades. In: Revista da EMERJ, v. 14, n. 53, 2011, p. 152-178).