Parecer
Autos nº 0141977-63.2012.8.26.0000
Suscitante: 13ª. Câmara de Direito Público
Objeto: Art. 97 da Lei Orgânica do Município de São
Paulo.
Ementa: Incidente de inconstitucionalidade suscitado pela 13ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do art. 97 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, o qual assegura ao servidor público municipal o percebimento do adicional por tempo de serviço público, concedido por quinquênio. Princípio da legalidade remuneratória. Necessidade de previsão orçamentária específica. Procedência. Não é dado à Lei Orgânica criar vantagem pecuniária a seus servidores, pois a matéria está integralmente reservada à lei em sentido formal e depende de previsão orçamentária (arts. 37, X e 169, § 1º, CF/88). Parecer pela admissão e acolhimento do incidente de inconstitucionalidade.
Colendo Órgão Especial
Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente
1.
Relatório.
Trata-se de incidente de
inconstitucionalidade suscitado pela C. 13ª
Câmara de Direito Público, nos autos de Apelação
Cível nº 90025628.80.26.0053, em que figuram como partes (...) e outros
(apelantes) e Prefeitura Municipal de São (apelada).
Objetiva-se atender à cláusula de reserva de plenário (Súmula Vinculante nº 10 do STF), eis que se cogita de eventual inconstitucionalidade do art. 97 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, o qual assegura ao servidor público municipal o percebimento do adicional por tempo de serviço público, concedido por quinquênio.
Não há notícia de pronunciamento
anterior do Órgão Especial, do Plenário ou do Supremo Tribunal Federal sobre a
questão suscitada (art. 481, parágrafo único, do CPC).
2. Da
admissibilidade do incidente de inconstitucionalidade.
A questão de direito deve ser solucionada para que seja possível concluir-se o julgamento da apelação interposta por (...) e outros.
Como anota José Carlos Barbosa Moreira, comentando o parágrafo único do art. 481 do CPC, “são duas as hipóteses em que se deixa de submeter a arguição ao plenário ou ao órgão especial: (a) já existe, sobre a questão, pronunciamento de um desses órgãos do tribunal em que corre o processo; (b) já existe, sobre a questão, pronunciamento do plenário do STF. A redação alternativa indica que é pressuposto bastante da incidência do parágrafo a ocorrência de uma delas” (Comentários ao CPC, vol.V, 13ªed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p.44).
No caso em exame, salvo eventual equívoco, a quaestio iuris – que se restringe à verificação da constitucionalidade do art. 97 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, o qual assegura ao servidor público municipal o percebimento do adicional por tempo de serviço público, concedido por quinquênio – não foi examinada pelo Plenário ou Órgão Especial.
De outro lado, e de acordo com pesquisa informatizada, não há notícia de
que a validade dessa norma foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal ou
analisada por esse Sodalício sob a perspectiva aqui abordada.
Assim, considerando que (a) a solução da quaestio iuris é imprescindível para o julgamento do recurso de
apelação, e (b) ainda não houve declaração de inconstitucionalidade a seu
respeito pelo E. STF ou por esse E. Tribunal de Justiça, é
de ser admitido o processamento do presente incidente de inconstitucionalidade.
3.
Fundamentação
A questão constitucional foi
delimitada pelo Órgão Fracionário nos seguintes termos:
“Como
visto, esse artigo traz direitos e benefícios aos servidores, motivo de ser
mesmo caso de inconstitucionalidade, por ser matéria sob competência privativa
do Poder Executivo, não do Legislativo, que não pode invadir seara daquele, por
força do princípio federativo e por expressa proibição do art. 5º, parágrafo
segundo da Constituição do Estado, principalmente se se cuida de criação e
imposição de despesas” (fls. 174).
Conforme bem ressaltado no Acórdão de fls. 168/174, da lavra do Ilustre e Culto Desembargador BORELLI THOMAZ, a Lei Orgânica do Município de São Paulo exorbitou ao disciplinar direitos e benefícios de servidores, uma vez que referida matéria é privativa do Poder Executivo, e não do Poder Legislativo.
Com efeito, a fixação ou alteração da remuneração lato sensu dos servidores públicos está sujeita ao princípio da legalidade, indicativo da reserva absoluta de lei (lei em sentido formal), como consta do art. 37, X, da Constituição Federal. Neste sentido, já pronunciou a Suprema Corte:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: RESERVA DE LEI. CF, ART. 37, X; ART. 51, IV, ART. 52, XIII. ATO CONJUNTO Nº 01, DE 05.11.2004, DAS MESAS DO SENADO FEDERAL E DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. I. - Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. II. - Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto nº 01, de 05.11.2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. III. - Cautelar deferida” (RTJ 192/901).
A dimensão da reserva de lei abrange quaisquer espécies remuneratórias e, aliás, quaisquer estipêndios pagos pelo poder público sob qualquer rubrica, alcançando acréscimos e vantagens pecuniários, indenizações, auxílios e abonos.
O processo legislativo estabelecido pela Constituição do Estado (em norma repetida da Constituição Federal) prevê que, na criação de leis que tratem de servidores públicos e seu regime jurídico-remuneratório, a iniciativa é privativa do chefe do Poder Executivo. Isso porque, sendo a matéria referente aos servidores públicos de interesse preponderante desse Poder, é importante que a ele se reserve a iniciativa de leis que tratem dessa matéria.
Ademais, a inconstitucionalidade também se articula por ofensa ao art. 169, § 1º, da Constituição Federal, pois, como consolidado na Suprema Corte, “não é possível o deferimento de vantagem ou aumento de vencimentos sem previsão orçamentária, nos termos do que estabelece o art. 169, § 1º, I e II, da Constituição do Brasil” (STF, AO 1.339-MA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 25-10-2006, v.u., DJ 02-02-2007, p. 71).
4. Conclusão.
Diante do exposto, somos pela admissão e pelo acolhimento do presente
incidente.
São Paulo, 13 de agosto de 2012.
Sérgio Turra Sobrane
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
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