Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Autos nº 0155203-38.2012.8.26.0000

Órgão Especial

Suscitante: 12ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Apelante: (...) e Juízo Ex-officio

Apelado: Prefeitura Municipal de Sorocaba

Objeto: art. 1º da Lei n. 1.602/1970, do Município de Sorocaba

 

 

Ementa:

Lei anterior à Constituição. Inadmissibilidade. 1. Sendo a norma questionada anterior à vigente Constituição, a situação de incompatibilidade se resolve pela revogação tácita, tornando desnecessária a realização do controle de constitucionalidade. 2. Parecer pela não admissão do incidente de inconstitucionalidade.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

Trata-se de arguição de inconstitucionalidade suscitada pela C. 12ª Câmara de Direito Público, quando do julgamento da apelação cível nº 0034135-23.2010.8.26.0602, cujo Acórdão foi relatado pelo Desembargador Edson Ferreira, em 15 de fevereiro de 2012.

A Col. Câmara arguiu a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei n. 1.602/1970, do Município de Sorocaba. Em conformidade com o v. acórdão de fls. 86/92, a inconstitucionalidade do ato normativo estaria centrada na obrigatoriedade imposta aos proprietários de terrenos, edificados ou não, de construção de passeio ou calçada entre o alinhamento da rua e o meio-fio.

Objetiva-se atender à cláusula de reserva de plenário (Súmula Vinculante nº 10 do STF). Não há notícia de pronunciamento anterior do Órgão Especial, do Plenário ou do Supremo Tribunal Federal sobre a questão suscitada (art. 481, parágrafo único, do CPC).

É o relato do essencial.

O incidente não merece conhecimento.

A norma questionada é anterior à Constituição Federal de 1988 e à Constituição Estadual de 1989.

Sua compatibilidade ou não com a ordem constitucional vigente resolve-se pela análise da questão da revogação tácita ou recepção, não havendo espaço, nesse quadro, para a inconstitucionalidade.

Normas anteriores à Constituição, quando são incompatíveis com aquela, são tacitamente revogadas. Não se discute nessa situação existência de inconstitucionalidade. Trata-se de fenômenos normativos distintos.

E a revogação tácita pode ser declarada pelo órgão fracionário do tribunal, não se sujeitando à observância da cláusula de reserva de plenário, prevista no art. 97 da Constituição de 1988.

Esse entendimento já foi, há muito, assentado pelo Supremo Tribunal Federal, como se infere dos precedentes exemplificativamente mencionados a seguir:

“O vício da inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição vigente ao tempo de sua elaboração. Lei anterior não pode ser inconstitucional em relação à Constituição superveniente; nem o legislador poderia infringir Constituição futura. A Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores com ela conflitantes: revoga-as. Pelo fato de ser superior, a Constituição não deixa de produzir efeitos revogatórios. Seria ilógico que a lei fundamental, por ser suprema, não revogasse, ao ser promulgada, leis ordinárias. A lei maior valeria menos que a lei ordinária. (ADI 2, Rel. Min. Paulo Brossard, julgamento em 6-2-1992, Plenário, DJ de 21-11-1997.) No mesmo sentido: ADI 4.222-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 8-2-2011, DJE de 14-2-2011; ADI 888 Rel. Min. Eros Grau, decisão monocrática, julgamento em 6-6-2005, DJ de 10-6-2005. Vide: ADI 2.158 e ADI 2.189, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 15-9-2010, Plenário, DJE de 16-12-2010. (g.n.)

(...)

A fiscalização concentrada de constitucionalidade supõe a necessária existência de uma relação de contemporaneidade entre o ato estatal impugnado e a Carta Política sob cujo domínio normativo veio ele a ser editado. O entendimento de que leis pré-constitucionais não se predispõem, vigente uma nova Constituição, à tutela jurisdicional de constitucionalidade in abstrato – orientação jurisprudencial já consagrada no regime anterior (RTJ 95/980 – 95/993 – 99/544) – foi reafirmado por esta Corte, em recentes pronunciamentos, na perspectiva da Carta Federal de 1988. A incompatibilidade vertical superveniente de atos do Poder Público, em face de um novo ordenamento constitucional, traduz hipótese de pura e simples revogação dessas espécies jurídicas, posto que lhe são hierarquicamente inferiores. O exame da revogação de leis ou atos normativos do Poder Público constitui matéria absolutamente estranha à função jurídico-processual da ação direta de inconstitucionalidade. (ADI 74, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 7-2-1992, Plenário, DJ de 25-9-1992.) No mesmo sentido: ADI 4.222-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 8-2-2011, DJE de 14-2-2011. (g.n.)

(...)”.

         Por esses motivos, é descabida a instauração do incidente de inconstitucionalidade, não devendo ser conhecida a arguição, restituindo-se os autos à colenda 12º Câmara de Direito Público para a conclusão do julgamento da apelação.

         São Paulo, 23 de agosto de 2012.

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico