Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 01799552-08.2012.8.26.0000

Suscitante: 2ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Objeto: Resoluções nº 871/97 e 902/2000, da Câmara Municipal de São Caetano do Sul

 

Ementa:

1) Incidente de inconstitucionalidade suscitado pela 2ª Câmara de Direito Público, tendo por objeto as Resoluções nº 871/97 e 902/2000, da Câmara Municipal de São Caetano do Sul, que não excepcionaram para fins de aplicação de teto remuneratório, as vantagens pessoais recebidas pelos servidores.

2)  Existência de inconstitucionalidade, pela  ofensa aos arts. 37, XV e 5º, XXXVI, ambos da Constituição Federal.

3)   Parecer pelo acolhimento parcial da arguição.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado pela C. 2ª  Câmara de Direito Público, nos autos de Apelação Cível nº 0019371-31.2005.8.26.0565, em que figuram como partes (...) E OUTROS (apelantes) e MUNICÍPIO DE SÃO CAETANO DO SUL E OUTRO (apelados).

Objetiva-se atender à cláusula de reserva de plenário (Súmula Vinculante nº 10 do STF), eis que se cogita do eventual afastamento, por inconstitucionalidade, das Resoluções nº 871/97 e 902/2000, ambas do Município de São Caetano do Sul, in verbis:

“Resolução n. 871- (fls.28/29)

‘Altera os padrões de vencimento dos Diretores e Subdiretores do quadro de funcionários da secretaria da Câmara Municipal de São Caetano do Sul e dá outras providências’.

Art. 1º - O vencimento dos ocupantes dos cargos de diretores e subdiretores da Câmara Municipal de São Caetano do Sul, classificados no padrão “T” e “S”, da Tabela de Vencimentos, respectivamente, corresponderá a 30% (trinta por cento) dos subsídios do Prefeito Municipal, fixados em R$ 8.000, 00 (oito mil reais).

Parágrafo único- O vencimento aludido neste artigo será atualizado anualmente, no mês de janeiro, mediante aplicação do reajuste estabelecido no artigo 1º, § 1º, alínea “a”, do Decreto Legislativo n. 249, de 04 de setembro de 1996, considerando-se o percentual acumulado no período.

Art. 2º - A remuneração, bem como os proventos de aposentadoria, nestes incluídas as vantagens e adicionais, dos servidores ativos e inativos da Câmara Municipal, terão como limite máximo os valores percebidos como subsídios, em espécie, pelo Prefeito, conforme dispõe a Constituição Federal.

Parágrafo único- Na hipótese de ultrapassarem do valor total atribuído ao Prefeito serão imediatamente reduzidos aos limites previstos nesta Lei, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título.

Art. 3º - As despesas com a execução do disposto nesta Lei correrão por conta de verbas próprias do orçamento.

Art. 4º - Revogam-se as disposições em contrário, e em especial, a Lei n. 2.988, de 31 de janeiro de 1989.”

Resolução n. 902 – (fls.30/31)

 ‘Fixa os vencimentos dos Diretores de Subdiretores, e dá outras providências’

Art. 1º - O vencimento dos ocupantes dos cargos de Diretores, Sub-Diretores e outros assemelhados, classificados nos Padrões “T” e “S”, da Tabela de Vencimentos, corresponderá a 30% (trinta por cento) dos subsídios do Prefeito Municipal, fixados em             R$ 12.000,00 (doze mil reais).

Parágrafo único- O vencimento de que  trata este artigo será atualizado, anualmente, no mês de janeiro, mediante a variação do IPC calculada pela FIPE, ou qualquer outro índice que venha a substituí-lo, considerando-se o percentual acumulado no período.

Art. 2º - A remuneração, bem como os proventos de aposentadoria, nestes incluídas as vantagens e adicionais, dos servidores ativos e inativos da Câmara Municipal, terão como limite máximo os valores percebidos como subsídios, em espécie, pelo prefeito, conforme dispõe a Constituição Federal, não podendo ultrapassar o valor dos subsídios atribuídos ao Prefeito Municipal.

Parágrafo único- Na hipótese de ultrapassarem o valor total do subsídio atribuído ao Prefeito Municipal, serão imediatamente reduzidos os limites previstos nesta Resolução.

Art. 3º - As despesas com a execução do disposto nesta Resolução correrão por conta das verbas próprias do orçamento.

Art. 4º - Esta Resolução entrará em vigor em 1º de janeiro de 2001, revogadas as disposições em contrário, especialmente às Resoluções nºs. 871, de 17 de janeiro de 1997, e 873, de 18 de abril de 1997”.

Para o Órgão fracionário, nada justifica a redução de vencimentos dos servidores que já haviam incorporado em seu patrimônio jurídico vantagens pessoais antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 41/2003. Tal prática contraria o art. 60, § 4º, IV, c.c art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.

Este é resumo do que consta dos autos.

A matéria objeto do presente incidente foi apreciada pela Col. 7ª Câmara de Direito Público (Apelação nº 382.221.5/4-00, Rel. Moacir Peres), oportunidade em que se assegurou aos autores o pagamento das parcelas dos vencimentos do servidor sem os descontos de limite salarial , observando que, a partir da emenda Constitucional n. 41, de 19.12.2003, devem ser congelados os valores recebidos que excedam o teto constitucional, a fim de, preservando o direito adquirido reconhecido, no entendimento supramencionado, respeitar-se o limite constitucional, mantendo-se no mais a r. sentença recorrida que reconheceu a inconstitucionalidade  das mencionadas resoluções.

Pois bem. Com efeito, verifica-se que, tanto o art. 2º da Resolução n. 871/97, como o da Resolução 902/2000, determinam que a remuneração, bem como os proventos de aposentadoria, nestes incluídas as vantagens e adicionais, dos servidores ativos e inativos da Câmara Municipal, terão como limite máximo os valores percebidos como subsídios, em espécie, pelo prefeito, conforme dispõe a Constituição Federal, não podendo ultrapassar o valor dos subsídios atribuídos ao Prefeito Municipal, e, na hipótese de ultrapassarem o valor total do subsídio atribuído ao Prefeito Municipal, serão imediatamente reduzidos ao mencionado limite. 

Fato é que a garantia da irredutibilidade de vencimentos é modalidade qualificada do direito adquirido, pressupondo-se a aquisição do direito a determinada remuneração, como já restou decidido no RE 298.694, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 23/4/04).

Bem a propósito, a correta interpretação da cláusula constitucional da “irredutibilidade” já foi estabelecida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:

“A garantia constitucional da irredutibilidade do estipêndio funcional traduz conquista jurídico-social outorgada, pela Constituição da República, a todos os servidores públicos (CF, art. 37, XV), em ordem a dispensar-lhes especial proteção de caráter financeiro contra eventuais ações arbitrárias do Estado. Essa qualificada tutela de ordem jurídica impede que o Poder Público adote medidas que importem, especialmente quando implementadas no plano infraconstitucional, em diminuição do valor nominal concernente ao estipêndio devido aos agentes públicos. A cláusula constitucional da irredutibilidade de vencimentos e proventos — que proíbe a diminuição daquilo que já se tem em função do que prevê o ordenamento positivo (RTJ 104/808) — incide sobre o que o servidor público, a título de estipêndio funcional, já vinha legitimamente percebendo (RTJ 112/768) no momento em que sobrevém, por determinação emanada de órgão estatal competente, nova disciplina legislativa pertinente aos valores pecuniários correspondentes à retribuição legalmente devida." (ADI 2.075-MC, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ 27/06/03)”

Portanto, a redução de vantagens pessoais já incorporadas para a aplicação do teto remuneratório imposta pelos arts. 2º, de ambas as Resoluções impugnadas padecem de inconstitucionalidade por violarem os arts. 37, XV e 5º, XXXVI, ambos da Constituição Federal, eis que implicam em redução salarial e violação do direito adquirido.

O art. 2º da Resolução n. 902/2000, contraria, ainda, o art. 37, XI da Constituição Federal, cuja redação foi pela Emenda Constitucional n. 19/1988, na medida em que o teto remuneratório não podia exceder o subsídio mensal em espécie dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, não sendo incluídas, no entanto, as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

Note-se, por fim, que o caso em tela, não deve ser examinado sob a nova redação do art. 37, XI, dada pela EC n. 41/2003, na medida em que o pedido dos autores diz respeito ao período compreendido entre abril de 1997 e junho de 2001.  

Diante do exposto, opino pelo acolhimento parcial do presente incidente reconhecendo-se a inconstitucionalidade do art. 2º das Resoluções n. 871/97 e n. 902/2000.

São Paulo, 05 de novembro de 2012.

 

 

        Sérgio Turra Sobrane

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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